quarta-feira, 6 de novembro de 2024

Laudo de Marçal e PCC de Tarcísio: imprensa foi cúmplice de crimes eleitorais

Papel da imprensa é investigar se uma alegação é verdade, não reproduzi-la em benefício de mentirosos. Logo, falharam feio na eleição de São Paulo.

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Às vésperas do primeiro e segundo turno, o candidato Pablo Marçal e o governador Tarcísio de Freitas mentiram de maneira descarada e criminosa com a intenção de prejudicar a votação do candidato Guilherme Boulos.

Marçal divulgou um laudo clínico falso que atestava que o psolista teria sido internado por uso abusivo de cocaína. Tarcísio inventou, sem apresentar um mísero indício, que o PCC havia orientado seus integrantes a votarem em Boulos.

Foram duas mentiras grosseiras impulsionadas não por gabinetes do ódio que espalham as mamadeiras de piroca pelo Whatsapp, mas pela imprensa profissional, que abusou do jornalismo declaratório ao tratar desses episódios.

Uma breve apuração nas informações contidas no laudo publicado por Marçal já bastaria para se ter certeza de que o documento é falso. Foi assinado por um médico que já morreu, o número de RG de Boulos estava errado e o dono da clínica é um amigo de Marçal que já foi condenado por falsificar diploma de Medicina.

Mas o que fizeram os grandes veículos de imprensa? Deram o benefício da dúvida para Marçal e se fizeram de sonsos em relação à autenticidade do laudo. Há dois dias da votação, o jornal O Globo fez a seguinte manchete circular nas redes sociais: “Marçal divulga suposto laudo de uso de cocaína de Boulos, que nega e vai pedir prisão de ex-coach”.

O documento era flagrantemente forjado, mas o jornal o preferiu chamá-lo de “suposto”, como se houvesse alguma dúvida de que ele é falso.

Como diz aquela máxima clichê dos cursos de jornalismo:  “Se alguém diz que está chovendo, e outra pessoa diz que não está, não é seu trabalho citar as duas. Seu trabalho é olhar pela janela e descobrir quem está falando a verdade”.

Foi exatamente o que O Globo não fez. O jornal abdicou de fazer uma apuração jornalística básica e colocou todas as informações do texto na boca de Boulos ou na conta do laudo de Marçal. Vejamos:

“Boulos afirma que o documento é falso”

“Boulos indicou que o número de documento dele exposto na imagem está errado. O candidato também afirmou que o dono da clínica seria apoiador de Marçal”.

“O laudo diria que Boulos estaria sendo encaminhado para uma emergência com quadro de ‘surto psicótico grave, delírio persecutório e ideias homicidas'”.

“O receituário seria assinado pelo médico José Roberto de Souza”.

No fim das contas, fica parecendo que estamos diante de uma polêmica, de um acontecimento que tem duas versões diferentes e poucas certezas — o que é absolutamente falso.

O laudo é tão falso quanto a terra é redonda. Diante de um crime gravíssimo, com potencial para influenciar o rumo das eleições da maior cidade do país, os grandes veículos apelaram para o jornalismo declaratório e abusaram do futuro do pretérito como escudo.

Pulemos para a manhã do dia da votação no segundo turno. Tarcísio foi votar e deu uma entrevista em que associa criminosamente Boulos à organização criminosa PCC. Com o prefeito ao seu lado e o número 15 colado no peito, o governador afirmou que a polícia teria interceptado mensagens da facção orientando seus integrantes a votarem em Boulos.

A afirmação foi feita de maneira categórica pelo bolsonarista, mas não foi apresentado um mísero indício para sustentá-la. A história faz pouco sentido, já que está fartamente comprovado que há digitais do PCC na gestão de Nunes.

O chefe de gabinete da Secretaria de Infraestrutura Urbana e Obras da prefeitura, por exemplo, é ex-cunhado de Marcola, chefe do PCC. Além disso, o prefeito pagou mais de R$ 800 milhões para empresas de ônibus ligadas à facção.

Que motivo teria o PCC para querer a troca de governo? A informação, portanto, tinha jeito, cara e cheiro de mais uma fake news bolsonarista. Mas o que fez a Folha de S. Paulo? Recorreu ao jornalismo declaratório, lavou as mãos e impulsionou nas redes sociais a circulação da mentira contada pelo governador em pleno dia da votação.

Ou seja, Tarcísio usou criminosamente o seu poder de governador para atacar o candidato adversário em pleno dia da votação com uma mentira grosseira. Mais tarde, a Folha passou a colocar nas manchetes e reportagens que a afirmação do governador havia sido feita sem apresentar provas.

Mas aí o estrago já estava feito. A mentira já havia se espalhado pelas redes sociais. Algumas postagens, como a de cima, continuam no ar até hoje. Esse mesmo padrão se repetiu em outros veículos.

Trata-se apenas de mau jornalismo ou, digamos assim, uma “suposta” má fé? Bom, não sejamos ingênuos. Tarcísio é o político queridinho da grande imprensa e é tratado como um bolsonarista moderado — como se isso fosse possível. Ricardo Nunes despejou milhões de dinheiro público na Folha de S. Paulo, conforme revelou o Intercept.

Com o fim da apuração das urnas, Nunes e Tarcísio foram comemorar a vitória no Clube Banespa. Sabe quem foi convidado a subir no palco para celebrar? O ex-prefeito de Embu das Artes, Ney Santos, acusado pelo Ministério Público de São Paulo de ser integrante do PCC. O prefeito reeleito recebeu esse “salve” com um abraço caloroso e um largo sorriso no rosto.

O ex-prefeito de Embu debutou no mundo crime assaltando um carro forte com uma metralhadora 9mm. Depois disso, o seu currículo no mundo do crime só cresceu. E aqui não precisamos recorrer ao jornalismo declaratório nem usar o futuro do pretérito como escudo, já que Ney Santos já foi condenado e preso.

Com exceção do Metrópoles, a confraternização entre Nunes, Tarcísio e Ney Santos não foi reportada por nenhum veículo da grande imprensa. Para a Folha e O Globo, que alardearam aos quatro cantos a falsa acusação do governador, essa festinha jamais aconteceu.

O falso laudo e a falsa acusação da ligação com o PCC não foram os responsáveis pela derrota de Boulos. Ele perderia de qualquer maneira. Mas é estarrecedor assistir à grande imprensa legitimando e atuando como correia de transmissão das baixarias eleitorais promovidas por candidatos da extrema direita.

Nos dois episódios do qual foi vítima, Boulos teve que se virar nos 30 para desmentir as informações rapidamente, porque uma imprensa intencionalmente preguiçosa deixou a apuração para depois.  Assim, as mentiras criminosas de Marçal e Tarcísio tiveram tempo para se espalhar nas redes.

O coach e o governador devem ser responsabilizados por esses ataques contra a democracia, mas os veículos de grande imprensa, que atuam como linha auxiliar de crimes eleitorais, também.

 

•        Imparcialidade no Jornalismo: mito ou meta? Por Emanuel Lima

Você já se perguntou quem observa as histórias que contamos? Sr. Ninguém, um personagem da DC Comics, faz exatamente isso. Ele habita as partes brancas das páginas entre os quadrinhos, observando os acontecimentos e, por vezes, narrando a história. Eventualmente, o Sr. Ninguém aparece nos quadrinhos para apontar algo, elucidar e também interferir… E é aí que mora o perigo.

Pensei muito nesse personagem quando decidi me tornar jornalista. Gosto de observar, analisar e explicar os acontecimentos, mas vejo hoje muitos jornalistas colocando suas posições pessoais e políticas à frente dos fatos.

Uma relação complicada, uma profissão complicada. Lois Lane sempre puxou a “sardinha” para o Superman, mesmo o Planeta Diário tendo mais interesse no caos.

Se mesmo os personagens de desenho têm viés, imagine nós, meros humanos. Há, sim, grandes jornalistas, de direita e de esquerda, que mostram os fatos e se posicionam. O perigo está nos que fingem imparcialidade. Subvertem a profissão.

Notícias são notícias, não análises. E nas análises, acredito na necessidade de posicionamento explícito. Hoje, a informação está disponível em todo lugar e para qualquer pessoa. A comunicação é rápida e, por vezes, efêmera.

Um grande jornalista, que faz seu trabalho, será amado e odiado. Falará a verdade, dará a notícia e pode, sim, dar sua opinião. Se for dissimulado, será obliterado, esquecido, ou, se famoso, motivo de chacota.

Ao interferir nas histórias, o Sr. Ninguém se torna um vilão. Geralmente, com ódio e querendo mudar algo, torna tudo pior. Ser jornalista e 100% imparcial o tempo todo é praticamente impossível, mas podemos ao menos ser sinceros.

<><> História do Jornalismo

O jornalismo tem uma longa história de evolução, desde os primeiros panfletos e gazetas até os modernos meios digitais. A imparcialidade sempre foi um desafio, com jornalistas frequentemente enfrentando pressões políticas e sociais. No entanto, a busca pela verdade e pela transparência sempre foi o norte da profissão.

<><> Desafios atuais

Hoje, enfrentamos o fenômeno das fake news e a influência das redes sociais na disseminação de informações. A velocidade com que as notícias se espalham pode ser tanto uma bênção quanto uma maldição, exigindo dos jornalistas uma responsabilidade ainda maior na verificação dos fatos e na manutenção da credibilidade.

<><> O futuro do Jornalismo

O futuro do Jornalismo está intrinsecamente ligado à tecnologia. A inteligência artificial e outras inovações tecnológicas têm o potencial de transformar a profissão, oferecendo novas ferramentas para a coleta e análise de dados. No entanto, a essência do jornalismo – a busca pela verdade e a comunicação clara e honesta – deve permanecer inalterada.

No final, a verdade é a nossa maior aliada. Ser sincero com o público é o que diferencia um grande jornalista de um mero narrador de histórias.

 

Fonte: Por João Filho, em The Intercept

 

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