sábado, 21 de setembro de 2024

Ricardo Nêggo Tom: Jojo Todynho - a nova "ama de leite" da casa grande bolsonarista

Como se já não bastasse a nossa política estar bem abaixo do nível da desqualificação, tendo figuras como o ex-presidente Jair Bolsonaro, e agora o coach picareta Pablo Marçal, como heróis populares e possíveis salvadores da pátria, a cantora (?) e influenciadora (de quê?) Jojo Todynho manda avisar que será candidata a alguma coisa em 2026 e declarou eufórica e orgulhosa: “Eu sou uma mulher preta de direita”, acrescentando que não está nem aí para um possível cancelamento e postando uma foto ao lado de Alexandre Ramagem e Michelle Bolsonaro. Se alguém me perguntar que tiro foi esse?, eu respondo que é um tiro que acerta em cheio a capacidade de raciocinar da futura candidata, e a coloca em estado grave no CTI racial dos pretos e pretas cujas almas agonizam em estado de embranquecimento.

Evoco aqui a figura das amas de leite do período colonial, mulheres pretas que eram selecionadas para amamentar os filhos das sinhás. Também conhecidas como “mães pretas”, essas mulheres tinham a função cuidar do aleitamento dos brancos recém-nascidos da casa grande. Geralmente, eram mulheres que haviam acabado de parir, estavam cheias de leite no peito e eram forçadas a deixar os seus próprios filhos também recém-nascidos aos cuidados de outras escravizadas, para cuidarem dos filhos dos senhores de engenho. Isto é apenas um recorte sobre as formas como os pretos e pretas escravizados eram utilizados no período escravista. Algo que Jojo talvez deva desconhecer. Do contrário, não se prestaria ao papel de servir como “mãe preta” dos fascistas brasileiros, fortalecendo o bolsonarismo, não com leite materno, mas com o sangue que foi vertido pelos seus ancestrais e será vertido por seus irmãos de cor se a extrema direita voltar ao poder.

Jojo Todynho sempre foi uma figura controversa, pouco lúcida em seu raciocínio, mas contundente em suas palavras. Ainda que não soubesse bem o que estava dizendo. Uma prova disso, é que ela acaba de declarar apoio a Alexandre Ramagem, o chefe da Abin paralela de Bolsonaro, como candidato a prefeito do Rio de Janeiro, e ameaçou processar quem criticasse o seu posicionamento. Mais uma prova de sua pouca lucidez de raciocínio e desconhecimento do que fala. Processar quem critica o seu posicionamento político? Como assim, futura candidata? Afinal, a turma que a senhora agora apoia, é defensora da liberdade de expressão irrestrita. Inclusive, para pesar em arrobas, homens e mulheres pretas como você, e dizer que elas não servem nem para procriarem mais. É possível que Jojo também desconheça Paulo Freire, embora, se encaixe perfeitamente numa de suas frases mais compartilhadas: “Quando a educação não é libertadora, o sonho do oprimido é se tornar opressor”

Miss Todynho transita entre a ignorância histórica e a convicção pessoal de que pode ser superior por ser de direita. É o tipo de preto que tenta se descolar ao máximo de suas raízes e origens, para ganhar um biscoito da branquitude. De olho no voto conservador, ela disse que vai retirar das plataformas digitais a música “Arrasou, viado”, que fez sucesso entre o público LGBTQIA+. As acusações de oportunismo incomodaram a bolsonarista, que saiu gritando aos quatro cantos nunca ter precisado se aproveitar de causa nenhuma para fazer sucesso. Vale lembrar que Jojo chegou a ser apadrinhada por Anitta, que a ajudou bastante no meio musical. A música causadora da discórdia entre Jojo e o público LGBTQIA+, é uma composição de Anitta e DJ Batata, e fez com que a nova amiga da família Bolsonaro ganhasse mais visibilidade e acolhimento por parte do campo progressista. Hoje, Jojo não fala mais com Anitta e justifica a distância entre as duas dizendo que “ciclos se encerram”

Longe de querer promover o cancelamento de Jojo, ou direcionar ataques pessoais à influenciadora, é preciso fazer a crítica do ponto de vista político, ideológico e racial, de um movimento inconsequente e alienado feito por uma mulher que simboliza tudo aquilo que a extrema-direita pretende destruir e eliminar da nossa sociedade. As minorias. Minorias estas que Jair Bolsonaro do alto de seu palanque de candidato à presidência em 2018, vociferou que deveriam se render ou sumirem do país. O “fuzilar a petralhada” também verbalizado pelo ex-presidente, mirava todos aqueles que pertencem aos chamados grupos minoritariamente representados, embora sejam maioria numérica na sociedade. A turma a qual Jojo agora se alia, odeia ter que respeitar a existência de pretos, pobres, mulheres, homossexuais, e qualquer pessoa que não lhes reflita através do espelho.

Ao se olhar no espelho, Jojo Todynho não vê refletida a imagem física da branquitude, mas o seu embranquecimento cultural, político, ideológico e econômico, já gritava dentro de si como um condicionamento mental e existencial. Tanto, que no vídeo do seu chá de revelação ela grita e se diz aliviada por não precisar mais esconder de ninguém que ela sempre foi “branca”. Como naquela cena de novela que virou meme com a atriz Carolina Ferraz gritando: “Eu sou rica! Rica! Rica!” Todynho virou galak e agora pode defender como seus, os ideais e os padrões sociais da branquitude escravocrata brasileira. Ela já tinha posado com fuzil, participado de treinamento do BOPE e espalhado a fake News de que Lula defendia o roubo de celulares para tomar uma cervejinha. Indícios claros de que daria à luz ao seu bolsonarismo mais cedo ou mais tarde. Nenhuma surpresa.

 

•        FASCISMO BOLSONARISTA: Irmão de Jordy faz gesto racista a deputado negro em bate-boca sobre Jojo Todynho

Irmão do extremista Carlos Jordy (PL-RJ), o deputado estadual Renan Jordy (PL-RJ) fez um gesto racista, esfregando os dedos no braço, em um ataque racista ao deputado Renato Machado (PT-RJ) durante bate-boca sobre a influenciadora Jojo Todynho nesta terça-feira (17) na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj).

Após Jojo posar ao lado de Michelle Bolsonaro (PL), o irmão de Carlos Jordy quer conceder à influenciadora a Medalha Tiradentes, maior honraria do estado.

Em seu pronunciamento na Alerj, Jordy atacou o que classificou como "claque esquerdista" por críticas ao posicionamento da artista.

"Gostaria de prestar minha solidariedade à artista Jojo Todynho, que saiu da senzala ideológica da esquerda. PT, PSOL, essa claque esquerdista do mais amor e menos ódio. Eles odeiam todos aqueles que pensam ao contrário, verdadeiros escravocratas do século XXI, senhores de engenho, capatazes de quem pensa contrário", disparou o bolsonarista.

Machado pediu a palavra para responder aos ataques e pediu respeito.

"Quando você se dirige à "claque", está me incluindo. Você me respeite. Sou um cidadão de bem, pai de família, pastor evangélico e negro. Se você quiser arrumar problema pessoal comigo, você arruma lá fora. Me espera sair ali fora, depois que acabar o plenário. Se quiser falar de pessoas, aqui tem nome de pessoas nessa casa. Me espera lá fora e me chama de claque lá fora", disse o petista.

Enquanto Machado discursava, Jordy parou em frente a ele e fez um gesto racista, esfregando o dedo sobre o braço.

A Guilherme Amado, no portal Metrópoles, Machado afirmou que entrará com ação no Ministério Público do Rio de Janeiro.

 

•        O que a esquerda pode aprender com o caso Jojo Todynho. Por Rodrigo França

Afirmar-se em meio ao cenário político brasileiro é um desafio que vai além de ideologias. Jojo Todynho, com sua afirmação recente, confirmando ser uma mulher negra de direita, nos provoca a questionar o quanto a esquerda brasileira está realmente em sintonia com a maioria da população. A direita e a extrema, por mais que não abracem efetivamente as pautas do movimento negro, LGBTQIAP+, ou feministas, aprenderam a apresentar uma face que dialoga com os morros, periferias e subúrbios do Brasil. Seus quadros estão cada vez mais preenchidos com candidatos e candidatas que têm a cara do povo, que conseguem se fazer entender e se identificar visualmente com as pessoas. A esquerda, em contrapartida, ainda se mostra majoritariamente composta por homens brancos – quem está no topo da pirâmide social, distanciando-se da realidade da população que pretende representar.

Além disso, é preciso reconhecer que a esquerda brasileira tem historicamente deixado as pautas raciais em último plano – pense se já existiu um projeto de segurança pública que deixe de encarcerar e assassinar jovens negros. Mesmo se propondo a ser um espectro político de inclusão e justiça social, ela falha em priorizar as demandas da população negra, que constitui a maior parte do país. Essa falta de comprometimento com as questões raciais contribui para a desconexão entre a esquerda e a maioria da população brasileira, que espera ver suas realidades e lutas refletidas na agenda política.

É inegável que há uma lacuna gigantesca de representatividade nos espaços de poder. Quando olhamos para as secretarias municipais e até mesmo para os ministérios, apesar de algum avanço, o cenário ainda é pouco diverso. A falsa simetria é perigosa e ineficaz; ela camufla a real desigualdade na ocupação desses espaços. A população negra representa 56% dos brasileiros, mas essa maioria não se reflete nos espaços de tomada de decisão, muito menos na cúpula dos partidos de esquerda. A extrema direita entendeu isso de uma forma pragmática, ainda que questionável em suas motivações e sinceridade, e tem se aproximado da população, mesmo que por vias conservadoras.

O público em geral muitas vezes não distingue claramente entre direita e esquerda, menos ainda entre os extremos. A escolha política muitas vezes é pautada pela identificação visual e social, por quem parece com eles, quem fala a mesma língua e vive as mesmas dores. É aí que figuras como Jojo Todynho se tornam relevantes. Ela tem a cara da minha mãe, das minhas tias e primas, e reconhece isso em seu discurso. Essa identificação é poderosa e tem sido um ponto de interrogação crescente sobre o quanto a esquerda está disposta a se repensar.

Temos uma infinidade de pessoas negras de esquerda com competência se candidatando, mas que se veem esmagadas pela falta de recursos e apoio dentro dos próprios partidos. E isso ocorre, lamentavelmente, principalmente na esquerda, que se propõe a ser o lado da inclusão e da representatividade. A distribuição desigual de poder dentro dessas estruturas partidárias ainda beneficia homens brancos, que muitas vezes parecem mais preocupados com seus próprios projetos pessoais de poder do que com uma real mudança estrutural que beneficie a maioria da população.

Ainda há tempo para virar esse jogo. A esquerda precisa aprender com os erros do passado e olhar para o futuro com uma estratégia que coloque em primeiro plano as necessidades e rostos da população que diz representar. Isso requer um movimento interno, um repensar das práticas e prioridades. Os homens brancos que hoje ocupam grande parte dos espaços de poder precisam, em um gesto de inteligência e abnegação, abrir espaço e colaborar para que novas vozes, que de fato refletem a diversidade brasileira, assumam seus lugares.

Jojo Todynho nos lembra que a política não é feita apenas de ideias, mas de pessoas reais com rostos e histórias. A esquerda precisa entender que para voltar a conquistar a maioria, é preciso ter a coragem de renunciar a velhas estruturas e abraçar, de fato, a pluralidade que compõe o Brasil. Sem isso, continuaremos a ver um distanciamento crescente entre a política e o povo, e a perda de uma oportunidade histórica de transformação verdadeira.

 

Fonte: Brasil 247/Fórum/Metrópoles

 

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