sexta-feira, 30 de agosto de 2024

"Vivemos como em uma prisão", desabafa afegã

O governo do Talibã no Afeganistão baixou recentemente uma nova "Lei de Virtudes" para garantir o cumprimento de regras sociais que antes já eram rigorosamente fiscalizadas pela polícia dos costumes.

Com isso, o Talibã endurece mais ainda as restrições a mulheres e meninas. Agora, além de serem obrigadas a esconder o rosto e o corpo quando saem de casa, elas também não poderão mais se fazer ouvir em espaços públicos. 

A justificativa do regime é que a voz de uma mulher é algo íntimo, e que por isso elas não devem cantar, declamar ou ler em voz alta.

As novas regras aumentam o controle do grupo fundamentalista islâmico sobre a vida privada das mulheres e as interações na sociedade afegã.

A Organização das Nações Unidas (ONU) e grupos de direitos humanos rechaçaram a lei. Chefe da missão da ONU no Afeganistão, Roza Otunbayeva afirma que ela sinaliza uma "visão perturbadora" do futuro do país e acentua as "já insuportáveis restrições" aos direitos de mulheres e crianças. "Até mesmo o som de uma voz feminina" fora de casa, comenta a diplomata, já é tratado como violação moral.

Mulheres banidas da vida pública

Desde que tomou novamente o poder em agosto de 2021, o Talibã destruiu os avanços nos direitos das mulheres conquistados nas últimas duas décadas.

Mulheres e meninas foram banidas de quase todos os setores da vida pública. Elas não podem frequentar a escola além do sétimo ano, nem acessar empregos locais e organizações não governamentais.

Elas também não podem frequentar academias e parques, tampouco salões de beleza, que se tornaram ilegais sob o Talibã. Para sair à rua, precisam estar acompanhadas de um "Mahram" (parente do sexo masculino).

As novas regras também afetam os homens, ditando o vestuário masculino e o comprimento da barba.

Ficam proibidas por lei também a homossexualidade, as lutas de animais, música em público, a queima de fogos de artifício e celebrações culturais e de feriados não muçulmanos, como o Nowruz, que marca a chegada da primavera.

<><> Poder e impunidade

Para Fereshta Abbasi, da ONG Human Rights Watch (HRW), a introdução dessas novas proibições não apenas sinaliza controle, mas também reforça o domínio autoritário do Talibã.

"Essa lei trata das menores interações humanas e vai além da vigilância das relações pessoais na sociedade", diz Abbasi à DW. "Nossa preocupação é que o Talibã a implemente de maneira extremamente dura. Não haverá mais privacidade para os cidadãos do Afeganistão, e essa lei cria uma plataforma aberta para mais violações dos direitos humanos no país."

Segundo Abbasi, o Ministério da Prevenção do Vício e Promoção da Virtude tem "enorme poder e impunidade". A pasta recentemente anunciou ter demitido mais de 280 membros das forças de segurança em 2023 por não deixarem a barba crescer. Outras mais de 13 mil pessoas teriam sido detidas por "ações imorais" de acordo com a sharia, a lei islâmica.

"Em uma situação em que não há processos judiciais no Afeganistão, os membros desse ministério podem, na maioria dos casos, punir indivíduos diretamente. Isso viola as leis e princípios mais básicos dos direitos humanos", observa Abbasi.

<><> O que dizem mulheres afegãs

Amira – que por temer por sua segurança pediu para não ter seu verdadeiro nome revelado – foi forçada a interromper os estudos de jornalismo em uma universidade em Cabul após a chegada do Talibã ao poder. Ela se diz preocupada com a atual situação.

"Após tantos anos de guerra ainda não nos sentimos seguras e nos vemos diante de um novo tipo de guerra, travada em nome da religião. Somos excluídas da sociedade e vivemos como em uma prisão, enquanto as mulheres em outros lugares do mundo continuam a avançar."

Desabafo semelhante é feito por Roya (nome também alterado), que trabalha em uma organização para refugiados na província de Nangarhar.

"Como mulher afegã é difícil imaginar a vida sob essas condições. Se eu, como mulher que trabalha, me sinto reprimida, como se sentem mulheres que ficam em casa?", questiona. "Não esperamos que nossa situação melhore no futuro. Seremos forçadas ao suicídio."

Apesar de estar sob ampla crítica, o regime dos talibãs ainda não deu nenhum sinal de que está disposto a abrir mão de sua política linha-dura. O líder supremo do grupo, Hibatullah Achundsada, insiste que as mulheres afegãs têm uma vida "confortável e próspera".

<><> Talibã retoma pouco a pouco laços internacionais

A comunidade internacional tem condenado energicamente o Talibã pelo tratamento dispensado às mulheres. Alguns países condicionaram quaisquer relações com o Afeganistão à melhora dos direitos humanos e do acesso das mulheres à educação, bem como à formação de um governo mais inclusivo.

Apesar disso, o Talibã conseguiu estabelecer relações diplomáticas com alguns países na região, como Rússia, China, Paquistão, Índia e outras nações da Ásia Central.

Recentemente, os Emirados Árabes Unidos (EAU) aceitaram as credenciais diplomáticas de um indicado do Talibã ao posto de embaixador. Até então, só a China tinha aceitado um embaixador do Talibã.

Os EAU justificaram a medida afirmando que ela é parte de uma série de esforços mais amplos para assegurar a ajuda humanitária e a estabilidade do Afeganistão. Ainda não se sabe, porém, quais serão as consequências da cooperação com um regime fundamentalista islâmico que afronta abertamente os direitos humanos.

<><> Controvérsia na Alemanha

O debate sobre como lidar com o Talibã se torna cada vez mais controverso também na Alemanha.

A ministra do Exterior, Annalena Baerbock, referiu-se às novas leis como "quase cem páginas de misoginia" para calar a metade da população afegã e descartou veementemente a retomada das relações com o regime do Talibã.

Partidos de oposição como a União Democrata Cristã (CDU) , da ex-chanceler federal Angela Merkel, insistem em uma postura mais pragmática, argumentando que uma cooperação com o Talibã é desejável para facilitar a deportação de afegãos criminosos ou cujos pedidos de asilo tenham sido negados.

A proposta da CDU é polêmica: críticos alertam que tal postura poderia legitimar o Talibã e minar o engajamento da Alemanha pelos direitos humanos.

Enquanto isso, o futuro das mulheres e meninas afegãs torna-se cada vez mais sombrio. Ativistas pró-direitos humanos defendem que a comunidade internacional vá além da mera retórica e tome ações concretas para apoiar as afegãs e responsabilizar o Talibã por suas ações.

¨      Talibã proíbe mulheres de falar em público

Na última semana, o Talibã anunciou uma série de novas leis que impõem restrições ainda mais rigorosas às mulheres no Afeganistão. As novas medidas, aprovadas pelo líder supremo do grupo, Hibatullah Akhundzada, exigem que as mulheres cubram completamente seus corpos e rostos com roupas grossas ao sair em público, justificando essa imposição como uma maneira de evitar que os homens sejam levados à tentação e ao vício.

Além das restrições ao vestuário, as leis também proíbem que as mulheres sejam ouvidas em público, considerando suas vozes como potenciais instrumentos de vício. Isso inclui até mesmo atividades dentro de casa, como cantar ou ler em voz alta. A legislação estipula que as mulheres não devem olhar diretamente para homens com quem não tenham parentesco, e taxistas serão punidos se aceitarem transportar uma mulher desacompanhada de um homem.

Essas novas regras, que visam promover a “virtude” segundo os ensinamentos islâmicos do Talibã, permitem que as autoridades detenham e punam mulheres que não cumprirem as normas, com punições a serem aplicadas conforme julgado adequado pelos encarregados.

A representante especial da ONU para o Afeganistão, Roza Otunbayeva, condenou as novas restrições, afirmando que elas ampliam as “restrições intoleráveis” já impostas às mulheres e meninas pelo Talibã. Ela destacou que essas medidas representam uma visão sombria para o futuro do país, onde inspetores morais têm poder para ameaçar e deter qualquer pessoa com base em infrações amplas e vagas.

Mir Abdul Wahid Sadat, presidente da Associação de Advogados Afegãos, também criticou as leis, apontando que elas violam as leis nacionais e os princípios fundamentais do Islã, além de contradizerem todos os 30 artigos da Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Em meio a essas restrições crescentes, há relatos de que muitos afegãos estão sendo alcançados pelo Evangelho por meio de dispositivos de áudio movidos a energia solar na língua pashto. Greg Yoder, do “Keys for Kids Ministries”, destacou que há um desejo pela verdade entre os afegãos, especialmente entre os jovens e as mulheres, à medida que eles começam a entender quem é Jesus e seu amor por eles.

Desde que o Talibã reassumiu o poder em agosto de 2021, o grupo tem gradualmente excluído as mulheres e meninas de quase todos os aspectos da vida pública, proibindo-as de frequentar escolas, exercer empregos remunerados, andar em parques públicos, frequentar academias ou salões de beleza, e impondo um código de vestimenta rigoroso. Recentemente, o grupo também reintroduziu punições brutais, como flagelação e apedrejamento públicos, por crimes como adultério.

O Afeganistão atualmente ocupa o 10º lugar na Lista Mundial da Perseguição 2024, que classifica os 50 países onde os cristãos enfrentam maior perseguição.

¨      Como é a perseguição aos cristãos no Afeganistão? 

Desde que o Talibã assumiu o poder do Afeganistão, em agosto de 2021, os jihadistas implantaram mudanças extremas. A pressão e a violência sobre grupos minoritários, como cristãos, foi esmagadora. Para o Talibã, não há seguidores de Jesus no país. A maioria das igrejas domésticas que existiam foram fechadas, pois os cristãos foram forçados a fugir ou a se esconder ainda mais. 

Os jihadistas prometeram conceder mais liberdades do que em seu primeiro governo, mas isso não aconteceu. Um exemplo é que se a fé cristã de um afegão for descoberta, ele pode ser morto, preso ou torturado para delatar outros seguidores de Jesus.  

A sociedade e a estrutura familiar afegã não dão espaço para a liberdade religiosa e o governo mantém uma postura rígida. Isso significa que os cristãos de origem islâmica devem manter a fé em segredo ou correm o risco de simplesmente “desaparecer”. 

Milhares de refugiados afegãos vivem em países vizinhos, muitas vezes em campos de refugiados sem alimentação adequada, água potável ou estrutura sanitária. Há muitos cristãos entre eles. 

“Algumas pessoas começaram a suspeitar das atividades [cristãs] do meu marido. Certa manhã, quando ele ia comprar pão, duas pessoas o seguiram. Ele foi atacado e morto perto de nossa casa.”  - Yasaman (pseudônimo), cristã secreta no Afeganistão  

<><> Como as mulheres são perseguidas no Afeganistão? 

Mesmo antes da tomada do poder pelo Talibã em 2021, as mulheres no Afeganistão viviam como cidadãs de segunda classe. Devido à cultura de “honra e vergonha” que está presente em contextos tribais no país e à falta de leis específicas, é pouco provável que as mulheres denunciem casos de violência física e sexual que enfrentam. 

Sob o domínio talibã, as mulheres são proibidas de frequentar escolas e trabalhar fora de casa. As mulheres também são tratadas segundo os preceitos da interpretação radical da sharia (conjunto de leis islâmicas). 

A conversão de muçulmanas é rara, mas quando acontece é preciso manter segredo de suas famílias. Elas podem enfrentar violência física e sexual, prisão domiciliar, casamento forçado e até morte. Ser mulher pode ser perigoso no Afeganistão, mas ser cristã pode ser mortal. 

<><> Como os homens são perseguidos no Afeganistão? 

Desde que o Talibã tomou o poder, os cristãos e seus líderes religiosos precisaram fugir. Aqueles que são capturados enfrentam agressão, prisão, tortura, morte ou simplesmente desaparecem. Além disso, os rapazes correm o risco de serem obrigados a se juntar ao grupo extremista no governo.   

A pressão sobre os homens cristãos estende-se à vida familiar e comunitária, pois eles representam seus familiares publicamente. Por isso, os cristãos de origem muçulmana correm o risco de serem discriminados, excluídos, raptados, agredidos e mortos. Isso significa que geralmente os homens cristãos mantêm a fé em segredo. Alguns até evitam empregos de alto escalão para não chamarem atenção.   

Os homens cristãos são forçados a viver, trabalhar e identificar-se como muçulmanos. Além disso, são os únicos responsáveis pelo sustento de suas famílias e, quando são mortos, a esposa e os filhos ficam na miséria. Os rapazes cristãos, considerados sem valor, também são vulneráveis à exploração sexual. 

<><> Quem persegue os cristãos no Afeganistão?  

O termo “tipo de perseguição” é usado para descrever diferentes situações que causam hostilidade contra cristãos. Os tipos de perseguição aos cristãos no Afeganistão são: opressão islâmica, opressão do clã, paranoia ditatorial e corrupção e crime organizado. 

Já as “fontes de perseguição” são os condutores/executores das hostilidades, violentas ou não violentas, contra os cristãos. Geralmente são grupos menores (radicais) dentro do grupo mais amplo de adeptos de uma determinada visão de mundo. As fontes de perseguição aos cristãos no Afeganistão são: oficiais do governo, líderes de grupos étnicos, líderes religiosos não cristãos, grupos religiosos violentos, parentes, grupos paramilitares, cidadãos e quadrilhas,  redes criminosas. 

Fonte: Deutsche Welle/Gospel Prime/Portas Abertas

 

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