quarta-feira, 8 de novembro de 2023

'Milei é pior que Bolsonaro': como eleições podem mexer nas relações entre Brasil e Argentina

A Argentina vive dias de apreensão, às vésperas da eleição que colocará o peronista Sérgio Massa ou o ultradireitista Javier Milei no comando da Casa Rosada. O segundo turno da corrida presidencial, que acontece no dia 19 de novembro, pode ser determinante para o futuro do país.

As primeiras pesquisas eleitorais mostram uma vitória confortável de Massa, que chega a aparecer com 11 pontos de frente para Milei. Nem mesmo o apoio de Patrícia Bullrich, terceira colocada no primeiro turno, conseguiu alavancar a candidatura da extrema-direita argentina.

Preocupado, Milei tenta moderar o discurso e chegou a declarar que pode ter quadros da esquerda em seu ministério. Vendo que a candidatura da extrema direita está perdendo força, velhos rostos conhecidos dos argentinos se aproximaram para tentar alavancar a campanha.

O mais conhecido é o ex-presidente Maurício Macri, liberal de direita, que perdeu nas urnas para o atual mandatário, Alberto Fernandez, e que tem feito exigências para apoiar Milei incondicionalmente. Ele pede, por exemplo, que o candidato recue do “Plano Motossera” na Economia, que inclui o fim do Banco Central e a dolarização da moeda argentina.

De acordo com o jornal Página 12, de Buenos Aires, nos bastidores, a Liberdade Avança quer distância do ex-presidente, pois entende que Milei conseguiu estabelecer uma distância ideológica mais à direita de Macri, que apoiava Bullrich no primeiro turno.

Em entrevista ao Brasil de Fato, o deputado federal peronista Eduardo Valdés, que é presidente da Comissão de Relações Exteriores do Parlamento argentino, afirmou que “Massa mostrou claramente ser o oposto de Milei e Bullrich” e a sua “vitória será contundente no segundo turno.”

Ainda de acordo com o parlamentar, a eventual vitória de Massa deve beneficiar o Brasil, que terá um presidente aliado na Casa Rosada. Milei já afirmou que considera Luiz Inácio Lula da Silva (PT) “comunista” e que pretende modificar a relação entre os dois países.

>>>> Confira a entrevista na íntegra:

·         Como avalia a relação entre Brasil e Argentina?

Creio que o melhor momento da relação entre Brasil e Argentina é a que temos hoje, nas pessoas de Lula da Silva e Alberto Fernandez. Na Argentina, acompanhamos os piores momentos do presidente brasileiro mais amado pelos argentinos. Alberto Fernandez esteve à altura das circunstâncias, quando vistou o Lula em Curitiba, denunciando com sua presença a injustiça de sua prisão. Isso foi muito importante para a relação atual dos países.

·         O Brasil tem entrado no rol de “países comunistas” para Milei. Como imagina que essa relação fica, caso o candidato da extrema-direita ganhe?

Em nenhum momento penso que Javier Milei possa ganhar as eleições no segundo turno. Se isso acontecer, não poderá romper relações com o Brasil, porque o principal parceiro comercial que temos é o Brasil. Os empresários e trabalhadores argentinos não permitiriam que isso aconteça.

·         No começo do ano, a Argentina impôs barreiras às importações para tentar controlar a cadeia de abastecimento e monitoramento das operações de comércio exterior diante da situação fiscal e da queda nas reservas cambiais. Mas essas barreiras prejudicaram mais de 70% dos exportadores brasileiros para o país. Essas barreiras devem continuar num eventual governo Massa?

As barreiras não devem continuar a partir do momento que assuma o novo governo de Massa. São barreiras excepcionais, resultado das exigências extorsivas do Fundo Monetário Internacional (FMI), que retirou os dólares de circulação no país e isso não acontecerá mais.

·         No Brasil, é comum a comparação entre Milei e Bolsonaro. Encontra traços similares entre os dois?

Milei é pior que Bolsonaro. Creio que Milei tem uma ideia de construção do Estado que Bolsonaro não chegou a implementar no Brasil. Além disso, Milei cultiva um ódio a quem pensa diferente dele que eu não sei se chegou a esse extremo no Brasil. Milei é antítese da democracia, ele é a antidemocracia.

·         Milei tem ameaçado romper com o Mercosul e quebrar os acordos comerciais com a China, que se tornou um importante parceiro comercial da Argentina. Como essas declarações impactam as relações de vocês com esses países?

Os tratados internacionais, neste caso o Mercosul, são impossíveis de serem quebrados sem acordo com o Congresso. Milei pode dizer o que quiser, sem acordo com os parlamenteares, nunca retirará a Argentina do Mercosul. Jamais os deputados e senadores argentinos votarão contra uma política de Estado inaugurada com o presidente Raul Alfonsín com José Sarney e que muito nos orgulha.

Hoje, o maior parceiro comercial da Argentina, depois do Brasil, é a China. É impossível que Milei tente anular os acordos com os chineses, porque os industriais e representantes do agronegócio, que ele quer seduzir, viram suas exportações aumentarem com a China, sobretudo a produção de grãos. Então, essa Argentina não vai tolerar que Milei rompa com a Argentina.

·         Qual sua expectativa para a votação do dia 19 de novembro?

A partir das primárias, a Argentina tomou consciência de quem era Milei e Bullrich, por isso votaram massivamente a favor de Sérgio Massa, o ministro da Economia argentina, que mostrou claramente ser o oposto de Milei e Bullrich. Creio que a vitória de Massa e União pela Pátria será contundente no segundo turno.

 

·         Milton Alves: A ‘milonga peronista’ e a dança macabra de Milei e Macri

 

Nas próximas duas semanas, a Argentina vai ter um novo encontro com as urnas. Uma eleição decisiva para o futuro do país, e o resultado eleitoral terá um forte impacto no projeto de integração regional – Mercosul – e na expansão do Brics na América do Sul.

A Argentina atravessa uma prolongada e dolorosa crise econômica, que afeta de forma severa as condições de vida do povo trabalhador e das camadas médias. Uma dívida externa dolarizada – que sufoca o país -, uma inflação galopante de 130% ao ano, desemprego crescente, desindustrialização, e como no Brasil, uma economia, cada vez mais, dependente da exportação de insumos primários e do agronegócio.

Nesse contexto, ocorre o processo eleitoral mais polarizado e eletrizante das últimas décadas, sem um claro favoritismo para os dois candidatos que alcançaram o segundo turno, ou a balotagem, como dizem os argentinos.

Apesar da virada espetacular do candidato Sergio Massa (Unión por La Pátria), atual ministro da Fazenda, do impopular presidente Alberto Fernández, que atingiu 36% dos votos válidos contra 30% de Javier Milei (La Libertad Avanza) e 24% da candidata Patricia Bullrich (Juntos por el Cambio), a aliança da direita tradicional – liderada pelo ex-presidente Mauricio Macri – o segundo turno será uma disputa voto a voto, e vai levar quem errar menos, e quem exercer a maior capacidade de explorar as contradições políticas de aliados de primeira e última hora entre os dois campos em disputa até o dia 19 de novembro.

A campanha de Massa acertou quando mirou no candidato da ultradireita, o escatológico Javier Milei, batendo duro nas propostas mais antipopulares e pró-mercado do candidato da extrema direita, como o fim de todos os programas sociais e de subsídios estatais, privatização da saúde, da educação, liberação das armas, a questão dos mortos durante a ditadura militar, a permissão para a comercialização de órgãos humanos, a extinção do Banco Central, o fim de qualquer regulação da atividade econômica e a dolarização completa da economia argentina.

O acerto no discurso político foi acompanhado também de promessas de manutenção dos programas sociais e de transferência de renda, de combate ao monstro inflacionário, da retomada de obras públicas, programa de construção de casas populares e a defesa da educação pública de qualidade, entre outras propostas.

·         Manobra das petroleiras

Nos últimos dias, as petroleiras que controlam a venda de combustíveis na Argentina, o país é autossuficiente, provocaram um processo generalizado de desabastecimento na Grande Buenos Aires e exigem do governo um aumento de preços. A questão atravessa o debate político e eleitoral e, sem dúvida, é uma manobra política que favorece a candidatura da extrema direita.

O governo do presidente Alberto Fernández tem denunciado a manipulação política e econômica das petroleiras e garante que o abastecimento será normalizado nos próximos dias. De toda forma, a crise provocada pelo desabastecimento indica os perigos que a campanha de Massa tem pela frente nas próximas duas semanas.

·         Pesquisas e debates

As diversas pesquisas divulgadas após o primeiro turno confirmam um cenário de empate técnico e algumas apontam um ligeiro favoritismo de Sergio Massa. Pesquisa da Atlas/Intel, divulgada na sexta-feira (3), apontou o seguinte quadro da disputa: Javier Milei com 52% de intenções de votos e Sergio Massa com 48%. A margem de erro da pesquisa é de 2%. Ou seja, um quadro de empate técnico. A Atlas/Intel ouviu 3.218 eleitores entre os dias 1º a 3 de novembro.

Pesquisa Zuban/Córdoba, divulgada pelo jornal Clarín, realizada nos dias 28 e 29 de outubro, com 2 mil eleitores/as, apontou Massa com 45,4% dos votos válidos e Milei com 43,1% dos votos.

O debate nacional mais importante do segundo turno acontecerá no próximo dia 12 de novembro.

·         Voto a voto e alianças

A estratégia da campanha de Sergio Massa segue sem turbulências e avança na direção da conquista de novos aliados, além de unificar a “nação” peronista, as formações políticas da extrema esquerda agrupadas na FIT (Frente de Esquerda e dos Trabalhadores), da candidata Myriam Bregman (cerca de 3% dos votos no 1º turno), que estão integradas na campanha, agora busca atrair os setores descontentes da aliança que impulsionou a candidatura de Patricia Bullrich, em particular dos liberais clássicos da União Cívica Radical (UCR), partido que rejeita publicamente as propostas mais grotescas e extremistas de Milei.

A campanha de Massa também reforça o trabalho eleitoral no cinturão peronista da Grande Buenos Aires, que congrega 37% do eleitorado, esforço coordenado pelo governador reeleito da Província de Buenos Aires, Axel Kicillof, um aliado político da vice-presidenta Cristina Kirchner.

O ótimo desempenho na Grande Buenos Aires, o voto do eleitorado feminino e a mobilização intensa das bases sociais e institucionais do conjunto do peronismo foram os fatores chaves para o resultado exitoso da campanha de Massa no primeiro turno. E a aposta nessa fórmula continua para o segundo turno, ampliando com a conquista de dissidentes do bloco Milei-Macri — com isso, é possível a vitória.

Por sua vez, a campanha de Milei tenta atenuar os seus aspectos mais grotescos e extremistas no segundo turno, uma exigência de seus aliados da direita neoliberal, liderados por Mauricio Macri.

Resta saber, como um Milei “repaginado” vai impactar em seu eleitorado mais duro e consistente, jovens na faixa de 16 a 24 anos, que foi capturado pelo falso discurso anti-sistema e do “contra tudo e todos” do establishment político.

Por ora, a milonga peronista demonstra ritmo e eficácia contra a dança macabra, que juntou os neofascistas de Milei com os neoliberais de Macri.

 

·         Boric convoca plebiscito para nova proposta de Constituição no Chile após fracasso em 2022

 

O presidente do Chile, Gabriel Boric, convocou nesta terça-feira (7) um plebiscito nacional para que a população chilena decida sobre uma segunda proposta para substituir a Constituição do país vigente desde a ditadura.

O documento foi finalizado na semana passada por um Conselho Constitucional, dominado por forças de direita, encarregado de redigir o texto. Uma primeira tentativa de substituir a Constituição, dominada por forças de esquerda e independentes, fracassou em setembro do ano passado.

 “O plebiscito de 17 de dezembro está oficialmente convocado e eu convido todos os nossos compatriotas a se informarem e participarem”, disse Boric em uma cerimônia em Santiago, capital do Chile. “Confio plenamente na sabedoria do povo chileno”.

A maioria dos eleitores planeja rejeitar o texto proposto, segundo as últimas pesquisas, mas a diferença de opiniões tem diminuído nas últimas semanas.

Beatriz Hevia, a presidente do agora dissolvido Conselho Constitucional, disse que a proposta “finalmente tem a capacidade de acabar com a incerteza institucional e política, fortalecer o estado de direito e a segurança jurídica, e fornecer as ferramentas necessárias para reativar nossa economia”.

Em um relatório divulgado em outubro, a S&P revisou a perspectiva econômica do Chile, citando o fraco consenso político. O governo de Boric, que apoiou a primeira proposta, disse que não pressionará por uma terceira reformulação constitucional.

Se o documento for rejeitado em dezembro, o texto atual, que remonta à ditadura militar de Augusto Pinochet, de 1973 a 1990, permanecerá em vigor.

 

Fonte: Brasil de Fato/Brasil 247/CNN Brasil

 

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