quarta-feira, 8 de novembro de 2023

Mario Sabino: A Enel pode não ser grande coisa, mas nós também não somos

De vez em quando, de quando em vez, eu me espanto: dada a nossa inépcia ampla, geral, conhecida e acrescida de desídia, como é que o Brasil consegue ter luz, água tratada, coleta de esgoto e telefone? Quer dizer, no Brasil em que vivo, porque metade dos brasileiros (100 milhões) não conta com esgoto e um sexto (35 milhões) não dispõe de água tratada. Já luz (Enel, logo chegarei a você) e telefone podem ser considerados serviços universalizados. No caso do telefone, flagrantemente graças à privatização a que Lula e o PT se opuseram.

A sexta-feira passada foi um desses dias em que fui tomado pelo assombro com a existência desses serviços no Brasil. Um temporal bíblico deixou 2,1 milhões de endereços sem luz na cidade de São Paulo e entorno. No momento em que escrevo, tarde da segunda-feira, ainda havia 400 mil paulistanos sem energia elétrica.

A ventania chuvosa do Armagedon foi extraordinária, mas não pode ser comparada à tempestade Ciaran, que atingiu França, Espanha, Itália, Bélgica, Reino Unido e Alemanha na semana passada, com ventos que ultrapassaram 160 quilômetros por hora. O efeito nesses países foi devastador, causou alagamentos e mortes, mas muito menos gente ficou sem energia elétrica. Na França, o país mais afetado, um total de 1,2 milhão de casas e escritórios permaneceu às escuras por relativamente pouco tempo (só áreas rurais e litorâneas ainda sofrem com falta de luz).

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Por quê? Porque nesses países existe infraestrutura digna desse nome, com gestão pública à altura. Já no Brasil, a infrestrutura é esta desgraça cotidiana: quando é o estado que administra diretamente o serviço, a porcaria é garantida; quando é o estado que fiscaliza uma concessionária do serviço, a garantia é uma porcaria.

Depois do temporal bíblico, todo mundo está culpando a Enel, concessionária de serviços de energia elétrica, pela falta de luz em São Paulo. É a revolta dos sem-energia. Até o combativo Flávio Dino, o ministro da Justiça que beijou a cruz das Forças Armadas, mas não perde o jogo de corpo esquerdista, resolveu pedir satisfações à empresa. Governo petista é assim mesmo: se é privado, soy contra, porque bons eram os tempos em que a gente não tinha apenas as agências reguladoras para lotear entre amigos que não fiscalizam nada.

Flávio Dino quer uma resposta em 24 horas. Não precisa. A resposta é instantânea como qualquer choque de realidade. A Enel pode não ser grande coisa, quer aumentar a sua margem de lucro com custo operacional abaixo da linha da decência, o tempo é traiçoeiro no subtropical de altitude e a nossa meteorologia é tão precisa quanto pontaria de PM. Tudo é verdade, está certo, mas vem cá: como é possível, diga aí, achar que uma cidade com fiação elétrica aérea seria capaz de resistir a um evento catastrófico como o de sexta-feira, sem que a sua rede não fosse ao chão?

Desde que comecei a trabalhar neste troço aqui, perguntei a vários prefeitos de São Paulo quando é que os fios da cidade seriam finalmente enterrados. Todos me responderam que era caro demais. O quão caro? Mais de 100 bilhões de reais, no último cálculo conhecido, e a conta só faz aumentar à medida que os bairros se expandem.

Hoje, apenas 6% dos 43 mil quilômetros de fiação da cidade são enterrados, de acordo com a própria Enel. Estava previsto por lei municipal que as concessionárias de serviços enterrassem 250 quilômetros de cabos por ano, não fosse a Justiça decidir que elas não estão obrigadas a fazer isso porque a concessão está no âmbito federal. Pois é, então, e ainda bem: porque a conta de luz seria impagável nos dois sentidos. As empresas repassariam o preço do enterramento para nós na cara dura, e morreríamos de rir para não chorar.

O imbróglio só realça o fato de que os diversos níveis da administração pública brasileira são tão ruins, o que inclui os termos dos contratos assinados com terceiros, que todos teríamos a ganhar com aquela grande virtude ausente nos trópicos— a honrosa mediocridade. Se houvesse mediocridade, aliada a um mínimo de preocupação com o bem-estar público (aí estaria a sua honra), os fios seriam enterrados ao menos nos troncos de distribuição de energia. Mas nem isso está previsto para ocorrer. Culpa da Enel ou dos governos que não enterraram fios lá atrás e agora fingem que fiscalizam tudo só hora na chuva?

A fiação aérea enfeia a cidade, é mais suscetível a intempéries e também à teimosia humana de continuar plantando árvores de grande porte fora de logradouros apropriados para tal.

No total, há 900 mil árvores nas ruas de São Paulo. Quando crescem, as mais portentosas rompem a fiação; como não passam por manutenção, muitas apodrecem devoradas por cupins e, fustigadas pelo vento e pela chuva, desabam sobre os cabos circunstantes, como damas das camélias da difícil vida fácil da fotossíntese. Afora que as suas raízes enormes e mal fixadas destroem os simulacros de calçadas sobre as quais os cidadãos se equilibram.

No Palazzo Pubblico de Siena, na Toscana, há uma série de afrescos alegóricos de Ambrogio Lorenzetti, pintados no século XIV, que mostram os efeitos do bom e do mau governo. Foi concebido para lembrar aos nove magistrados que governavam a cidade na Idade Média (Siena era uma república poderosa nessa época) como muitos aspectos da vida estavam em jogo quando eles tomavam as suas decisões.

Os efeitos do mau governo, ilustra Ambrogio Lorenzetti na sua obra-prima, são o abandono, a degradação, a ruína; os do bom governo são o cuidado, a conservação, a prosperidade. Basta sair à rua de qualquer cidade brasileira, não apenas São Paulo, para constatar os efeitos dos maus governos que elegemos a cada quatro anos. Que raios nos partam na nossa própria falta de luz. A Enel pode não ser grande coisa, mas nós também não somos.

 

·         Noblat: Os paulistas que sofrem com o apagão são felizes e não sabem

 

315 mil imóveis ainda estão sem luz em São Paulo depois do apagão da semana passada. A quatro pessoas por imóvel, seria algo como 1.260.000 pessoas sem luz; pouco mais da metade da população da Faixa de Gaza sem energia, e por tabela, sem água, a não ser a salgada do mar que, se bebida, provoca doenças.

O Exército de Israel, que partiu o enclave ao meio e bombardeia pesadamente a cidade de Gaza, a essa altura semidestruída, nega comida, transporte e assistência médica aos palestinos que morrem como moscas – mais de 10 mil até ontem. Os paulistas ainda às escuras reclamam de boca cheia. São felizes e não sabem.

<><> Nunes puxa fila de prefeitos com projeto pró privatização da Sabesp

O prefeito da capital, Ricardo Nunes (MDB), se envolverá diretamente na proposta de privatização da Sabesp do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), seu aliado político.

Nunes avisou aliados na Câmara Municipal que vai enviar um projeto de lei autorizando a cidade a manter o contrato com a Sabesp tão logo a Assembleia Legislativa (Alesp) aprove o projeto de privatização da companhia, proposto há duas semanas por Tarcísio.

O atual contrato de prestação de serviço da Sabesp com a Prefeitura, assinado em 2009, tem uma cláusula que diz que, caso a empresa seja privatizada, o acordo perde a validade e precisa ser revisto. A expectativa é que Nunes envie um texto apenas para cumprir a formalidade de estender os termos do contrato para a nova empresa.

Porém, os vereadores já estão planejando profundas mudanças na proposta. Eles querem condicionar a extensão do contrato com a Sabesp a uma série de exigências de investimentos que a empresa terá de fazer nas redes de água e esgoto da cidade.

Essa cláusula, presente nos contratos da companhia com 375 cidades paulistas, é um ponto de atenção do governo que pode esvaziar a privatização. A expectativa entre aliados do governador é que o movimento de Nunes na capital possa servir como farol para os demais prefeitos.

O valor desses contratos, considerados de suma importância para os investidores calcularem o potencial das ações da Sabesp que seram vendidas pelo governo, vai ser determinado por uma comissão de estudos que a Câmara instalou no último dia 26/10.

Na reunião de instalação da comissão, os vereadores aprovaram, de largada, a convocação do diretor-presidente da empresa, André Salcedo, para que ele preste contas sobre o que eles têm classificado como “passivo” da empresa na cidade.

Nesse passivo, há investimentos para coleta e tratamento do esgoto de córregos da zona sul, que levam a sujeira para as represas Billings e Guarapiranga — ambas usadas para o abastecimento de água da população — e de redes clandestinas que chegam ao Rio Tietê.

Além disso, os vereadores veem espaço para aumentar o percentual de investimentos dos recursos da Sabesp na cidade. No contrato atual, 7,5% de toda a receitas da empresa têm de ser investidos na cidade.

Nunes no embate entre aliados

A imposição dessa conta extra na privatização da Sabesp tem como pano de fundo um embate envolvendo dois dos principais aliados políticos do prefeito: o governador Tarcísio e o presidente da Câmara, Milton Leite (União).

Leite perdeu o espaço expressivo que tinha no governo estadual, com destaque para o bilionário Departamento de Estradas de Rodagem (DER), após a derrota do PSDB e a posse de Tarcísio. O governador também suspendeu a duplicação da Estrada do M’Boi Mirim, na zona sul, obra que o vereador já havia prometido a seu eleitorado.

Agora, o presidente da Câmara é o principal patrocinador da série de condicionantes que os vereadores pretendem impor à privatização da Sabesp. No começo do mês, ele puxou o coro para uma série de críticas à empresa, dizendo que ela lançava “um lodo de fezes” nas represas. Depois, deu tração à proposta de criação da comissão de estudos, apresentada pelo vereador Sidney Cruz (Solidariedade).

Nunes, por sua vez, vai manter uma postura neutra em relação ao embate, segundo seus aliados. Seu discurso será o de que a privatização é positiva para a população, uma vez que pode garantir recursos para antecipar investimentos planejados a longo prazo, como promete o governo Tarcísio.

Tarcísio e Nunes têm pressa para resolver a questão o quanto antes e evitar que o tema chegue até o ano que vem, com potencial para contaminar o debate eleitoral. O governador espera aprovar a privatização da Sabesp na Alesp até o início de dezembro.

 

·         Nunes garante que não haverá criação de taxa para enterrar fios em SP

 

O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), afirmou nesta terça-feira (7/11) que foi mal interpretado e garantiu que não há possibilidade de criar uma taxa à população para o enterramento dos cabos e fios.

Em coletiva na noite dessa segunda-feira (6/11), Nunes sugeriu a cobrança de uma taxa opcional de moradores com condições financeiras de pagar para acelerar o enterramento de fios da rede elétrica em alguns quarteirões da cidade em parceria com a Prefeitura.

Em nota, o prefeito disse que a administração municipal está disposta a ajudar quem queira investir no aterramento. “Não farei nenhum tipo de cobrança para a população na cidade de São Paulo. Pelo contrário, se alguém quiser enterrar os fios, a Prefeitura está disposta a pagar metade justamente para evitar que árvores caiam sobre a cidade. Meu compromisso sempre foi desonerar o paulistano, assim como fizemos quando não aumentamos a tarifa do transporte público ou demos isenção de IPTU na região central, por exemplo”.

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O aterramento é uma das apostas, de acordo com especialistas, para evitar apagões em dia de tempestades. Segundo a Prefeitura de São Paulo, o programa São Paulo Sem Fios já conta com 60 quilômetros com a fiação 100% subterrânea.

O programa de aterramento de fios de energia e telecomunicações diminui ocorrências que podem causar queda de árvores ou outros incidentes. A Prefeitura de São Paulo prevê a utilização de recursos do Fundo Municipal de Iluminação, por meio da contribuição de custeio da iluminação pública (COSIP), para ajudar no programa de expansão do aterramento de fios, numa ação compartilhada com as concessionárias.

O prefeito de São Paulo explicou que, desde o ano passado, a Prefeitura e a concessionária Enel estão “desenvolvendo um plano para apresentar para a sociedade para alguns casos aonde o contribuinte, o morador, o munícipe pode aceitar pagar uma taxa de contribuição”.

Nunes afirmou que o tema é “complexo” e caro, já que o custo do enterramento de toda a fiação da cidade é estimado em R$ 20 bilhões. Atualmente, a Prefeitura acumula valor recorde de R$ 36 bilhões em caixa.

O prefeito disse que pretende entregar, até o fim do próximo ano, 83 km de aterramento de fios na cidade – até o momento, segundo Nunes, a quantidade entregue pela sua gestão foi de 60 km. Ele disse que precisa do auxílio das empresas de telecomunicação para poder enterrar a fiação.

Na coletiva dessa segunda, o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) declarou que “o grande vilão [da falta de energia] foi a queda de árvores, que por falta de manejo acabaram caindo” e propôs que as árvores sejam manejadas para não atingirem as fiações em caso de queda provocada por chuva forte como a que ocorreu na sexta-feira.

 

·         Traumatizados com a privatização da energia elétrica, bolsonaristas tentam barrar venda da Sabesp

 

Segundo a FOLHA, um conjunto de economistas e advogados que fazia parte da administração de Jair Bolsonaro (Partido Liberal) ou apoiava o ex-presidente está planejando opor-se à privatização da Sabesp, desafiando uma das principais iniciativas do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), que também é alinhado com Bolsonaro.

Uma das estratégias envolve a busca pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), André Mendonça, a fim de fornecer-lhe informações sobre os supostos prejuízos que a venda da participação do Governo de São Paulo na estatal poderia causar aos consumidores. Mendonça é o relator de uma ação judicial movida pelo PSOL e pelo PT contra a privatização.

“Existe uma direita preocupada com a soberania do Brasil. E a Sabesp é um ativo estratégico do país, é uma das maiores empresas do mundo na distribuição de água e também na área do saneamento básico”, disse o Fabio Wajngarten, que comandou a Secretaria de Comunicação do governo Bolsonaro e hoje advoga para o ex-presidente.

“Não faz sentido sairmos do monopólio público para cair no monopólio privado”, informou Wajngarten.

·         Energia elétrica privatizada

Com o respaldo de sua base governista, Jair Bolsonaro conseguiu aprovar a privatização da Eletrobras no mês de junho de 2021. A proposta seguiu pelo Congresso Nacional por meio da Medida Provisória (MP) 1031/21, o que limitou um debate mais abrangente devido ao prazo de validade da MP, que é de 60 dias e pode ser prorrogado uma única vez por período igual.

De acordo com especialistas no setor elétrico, a privatização da maior empresa de energia elétrica da América Latina acarretará sérias implicações para a população brasileira e a economia do país. Entre as preocupações destacam-se o potencial aumento das tarifas, a desindustrialização e o desemprego, a possibilidade de ocorrência de novos apagões, riscos de problemas sociais e ambientais, violações de direitos, ameaças à soberania energética do país, e outros desafios.

·         Apagão em SP e a redução de funcionários na empresa

A Enel, empresa que tem sido objeto de críticas devido ao longo período de interrupção no fornecimento de energia que já se estende por mais de 40 horas em algumas áreas de São Paulo, afetando ainda aproximadamente 1 milhão de pessoas, implementou uma significativa redução no quadro de funcionários desde 2019.

Os dados fornecidos pela própria empresa à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) revelam que houve uma redução de quase 36% no número de funcionários da Enel entre 2019 e 2023. Esses números foram divulgados pela CNN.

No ano de 2019, a Enel mantinha um contingente de 23.835 funcionários e colaboradores, incluindo profissionais contratados diretamente pela empresa e terceirizados que faziam parte da antiga Eletropaulo. Ao final de setembro de 2023, o número de trabalhadores na concessionária havia diminuído para 15.366 profissionais, representando uma redução de 35,5% ao longo de quatro anos.

No mesmo intervalo de tempo, o número de clientes atendidos pela Enel na região metropolitana de São Paulo aumentou em 7%, totalizando 7,85 milhões de consumidores em residências e empresas.

Em 2019, a Enel possuía uma proporção de um funcionário para cada 307 clientes. Atualmente, cada colaborador da empresa está encarregado de atender, em média, um grupo de 511 consumidores.

 

Fonte: Metrópoles/O Cafezinho

 

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