terça-feira, 1 de agosto de 2023

Níger: Junta Militar acusa a França de querer "intervir militarmente"

A junta militar do Níger, que tomou o poder na semana passada e depôs o presidente eleito democraticamente Mohamed Bazoum, disse nesta segunda-feira (31) que o governo deposto autorizou a França a realizar ataques na presidência para tentar libertar Bazoum.

A junta, que confinou Bazoum ao palácio presidencial desde quarta-feira (26), já havia alertado contra tentativas estrangeiras de retirá-lo, dizendo que isso resultaria em derramamento de sangue e caos.

"Na sua busca de formas e meios para intervir militarmente no Níger, a França, com a cumplicidade de alguns nigerianos, reuniu-se com o chefe do Estado-Maior da Guarda Nacional do Níger para obter a necessária autorização política e militar", diz uma declaração lida na televisão nacional.

Num outro comunicado, os golpistas acusaram os serviços de segurança de uma embaixada ocidental anónima de terem disparado gás lacrimogéneo no domingo contra os manifestantes pró-golpe na capital Niamey.

O comunicado refere que seis pessoas foram hospitalizadas após o incidente.

Os comentários dos militares foram feitos pelo coronel do Exército Amadou Abdramane, um dos golpistas, na televisão estatal. Ele disse que a autorização foi assinada pelo ministro das Relações Exteriores do Níger Hassoumi Massoudou, atuando como primeiro-ministro.

Massoudou não foi encontrado para comentar. A França condenou o golpe e pediu que Bazoum fosse restabelecido, mas não anunciou nenhuma intenção de intervir militarmente.

A única autoridade que a França reconhece como legítima no Níger é a do presidente Bazoum, disse o Ministério das Relações Exteriores francês nesta segunda-feira, quando perguntado se havia obtido autorização do Níger para realizar ataques para libertar o líder deposto.

 “Nossa prioridade é a segurança de nossos cidadãos e nossas instalações, que não podem ser alvo de violência”, acrescentou o Ministério das Relações Exteriores da França em comunicado à Reuters.

O Presidente francês, Emmanuel Macron, prometeu no domingo uma ação "imediata" se cidadãos ou interesses franceses fossem atacados no Níger, depois de milhares de nigerianos se terem concentrado em frente à embaixada francesa.

O sentimento antifrancês é elevado em algumas antigas colónias africanas, à medida que o continente se torna um novo campo de batalha diplomático, com a crescente influência russa e chinesa.

A França tem cerca de 1500 soldados na nação da África Ocidental, que é um dos seus últimos aliados na região do Sahel, depois de as forças francesas terem sido obrigadas a retirar do vizinho Mali no início deste ano.

O golpe no Níger seguiu-se a golpes militares nos vizinhos Mali e Burkina Faso nos últimos dois anos, todos os quais ocorreram em meio a uma onda de sentimento anti-francês.

A França mantém tropas na região há uma década em ajuda para combater uma insurgência islâmica, mas alguns moradores locais dizem que querem que o ex-governante colonial pare de intervir em seus assuntos.

O Níger tem sido um aliado importante nas campanhas ocidentais contra insurgentes ligados à Al Qaeda e ao Estado Islâmico no Sahel, e há preocupações de que o golpe possa abrir as portas para uma maior influência russa na região e também permitir que a insurgência se espalhe.

·         União Europeia apoirá CEDEAO

"A União Europeia apoia todas as medidas tomadas pela CEDEAO em resposta a este golpe de Estado e apoiá-las-á de forma rápida e decisiva", afirmou Borrell, em comunicado.

O chefe da diplomacia europeia indicou que a União Europeia "associa-se às fortes condenações" expressas pelos chefes de Estado da região contra o "inaceitável golpe de Estado" perpetrado no Níger.

"O Presidente, [Mohamed] Bazoum, democraticamente eleito, continua a ser o único chefe de Estado do Níger. Nenhuma autoridade para além da sua pode ser reconhecida. Ele deve recuperar, sem demora e sem condições, a liberdade e a plenitude do cargo", afirmou.

"É importante que a vontade do povo do Níger, tal como expressa nos votos, seja respeitada. (...) Consideramos os golpistas responsáveis por quaisquer ataques contra civis, pessoal ou instalações diplomáticas", acrescentou Borrell.

Milhares de pessoas protestaram no domingo em frente à embaixada francesa em Niamey, numa manifestação de apoio ao golpe militar no país, antes de serem dispersadas por bombas de gás lacrimogéneo, segundo a agência de notícias AFP.

No domingo, a CEDEAO lançou um ultimato aos golpistas do Níger, afirmando que não exclui o uso da força se não libertarem e devolverem ao poder o Presidente deposto, no prazo de uma semana.

Bazoum está detido na sua residência desde quarta-feira.

 

Ø  Imprensa francesa analisa perfil controverso de general que assumiu poder

 

A escalada de hostilidade antifrancesa no Níger, desde o golpe de Estado na semana passada, é acompanhada com preocupação por Paris e pelo mundo. O Palácio do Eliseu aumentou o tom depois que uma manifestação de apoio aos militares golpistas reuniu milhares de pessoas em frente à embaixada da França na capital Niamey, no domingo (30). E a figura controversa do general que assumiu o poder no país aumenta as incertezas em torno do desfecho deste cenário de tensão.

Em resposta à manifestação em frente à embaixada, o Palácio do Eliseu declarou que a França responderá "de maneira imediata e firme" em caso de ataque contra seus cidadãos que estejam no Níger. Também no domingo, os dirigentes da Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental (Cedeao) fixaram um ultimato de uma semana aos golpistas para restaurarem a ordem constitucional.

O tema é um dos destaques da capa do Figaro desta segunda-feira (31), que afirma que a junta militar que tenta tomar o poder joga "o jogo antifrancês", tentando escapar, dessa forma, das pesadas sanções impostas pelos países vizinhos.

A publicação destaca o sentimento da população, que culpa o governo de optar por "continuar a colonização francesa", e descreve a hostilidade em relação a jornalistas franceses presentes no país, os acusando de "colaborarem com a desinformação francesa".

Os gritos de rejeição à França foram entoados em coro durante a manifestação, afirma o texto, em que repetem: "o que a França fez por nós, a não ser roubar nossas riquezas?".

Mas foram sobretudo os gritos de apoio à Rússia e ao presidente Vladimir Putin que aumentaram o clima de descontentamento da França e de outros países em relação ao protesto.

·         "Mesmo cenário que no Mali e em Burkina Faso"

Libération chama a manifestação para "uma demonstração de força contra a França", ainda que o golpe, iniciado na quarta-feira (26) com o sequestro do presidente Mohamed Bazoum, seja condenado por quase toda a comunidade internacional.

Para a população do Níger, não somente a França, mas a União Europeia e os Estados Unidos causariam danos a esse "jovem país", assim como a seus vizinhos Mali e Burkina Faso, ao alimentar uma guerra sem fim contra os grupos jihadistas do Sahel.

Um diplomata francês admite: "Temos a impressão que é exatamente o mesmo cenário que no Mali e em Burkina Faso [palco de quatro golpes de Estado desde 2020 e com a mesma tendência pró-Rússia]".

Para os golpistas, a ameaça que circula, desde a manhã de sábado (29), de que uma intervenção militar estrangeira possa eliminá-los, é preocupante, mas eles se dizem determinados a "protegerem sua pátria".

O jornal enfatiza que, fora da capital Niamey, cidade tradicionalmente de oposição, nenhuma outra manifestação foi registrada no país.

·         General frágil e controverso

Le Monde analisa o perfil do general Abdourahamane Tchiani, o "novo dirigente de poder frágil", afirma o título da matéria, acrescentando que o chefe da guarda presidencial, que reivindicou o poder na sexta-feira (28), não seria uma unanimidade no meio das forças armadas.

Em seu discurso televisionado, ele declarou o fim da VII República e justificou que o golpe teria sido motivado para preservar o Níger "da degradação contínua da situação de segurança e sem que as autoridades depostas os deixassem buscar uma verdadeira solução para a crise".

Homem de confiança do ex-presidente Mahamadou Issoufou (2011-2021), o general Tchiani, de 59 anos, é acusado de ter afastado outros altos oficiais que eram contrários ao governo anterior.

A fidelidade ao antigo chefe de Estado lhe teria rendido uma grande fortuna. Destituído de suas funções por Bazoum, teria ele motivado o golpe para reaver seus privilégios?, se pergunta o diário francês.

Para diplomatas e analistas do Níger, a escolha do general para assumir o governo pode não ser definitiva, "seu poder continua frágil e ele estaria pisando em ovos". Contestado internamente, ele deve enfrentar a comunidade internacional e mostrar uma postura mais rígida para se manter à frente da presidência.

 

Ø  Senegal suspende acesso à internet para travar apoio ao líder da oposição

 

As autoridades senegalesas anunciaram hoje (31.07) a suspensão do acesso à internet através de dados móveis devido à "difusão de mensagens "odiosas e subversivas" nas redes sociais e apelos a manifestações após a detenção do político da oposição Ousmane Sonko.

Ousmane Sonko, o maior opositor do Presidente Macky Sall e candidato declarado às eleições presidenciais de 2024, está a ser processado por apelo à insurreição e outros crimes e infrações, anunciou o Ministério Público no sábado.

"Devido à difusão de mensagens odiosas e subversivas nas redes sociais, no contexto de uma ameaça à ordem pública, a internet móvel de dados está temporariamente suspensa em determinadas faixas horárias a partir de segunda-feira, 31 de julho", anunciou o ministro das Telecomunicações e da Economia Digital através de um comunicado de imprensa.

Ousmane Sonko deverá ser interrogado por um juiz esta segunda-feira, disse um dos seus advogados à agência AFP. O juiz decidirá se mantém ou não as acusações contra ele.

·         Sonko inicia greve de fome

Sonko foi condenado a 1 de junho a dois anos de prisão, um veredito que o torna inelegível a eleições, de acordo com os seus advogados e peritos jurídicos.

A sua condenação, no início de junho, desencadeou a mais grave agitação dos últimos anos no Senegal, que causou 16 mortos, segundo as autoridades, e cerca de 30, segundo a oposição.

Segundo o procurador, a detenção de sexta-feira não teve "nada a ver" com o primeiro processo em que Sonko foi julgado à revelia.

O opositor anunciou no domingo nas redes sociais que tinha iniciado uma greve de fome. Apelou também à população para que "se mantenha de pé" e "resista".

Esta segunda-feira, a coligação da oposição Yewwi Askan Wi apelou ao "povo senegalês" para que "compareça em grande número" no tribunal principal de Dakar, onde Sonko irá enfrentar o juiz.

Ao início da manhã, os manifestantes tinham bloqueado a autoestrada com portagem, informou o seu departamento de comunicação nas redes sociais, acrescentando que a polícia estava a caminho.

Sete acusações

O Ministério Público do Senegal anunciou no domingo que imputou sete acusações contra Ousmane Sonko, depois de este ter sido detido por um incidente com um polícia.

"Ele vai ser processado por incitação à insurreição, associação criminosa, atentado contra a segurança do Estado, formação de quadrilha contra a autoridade do Estado, atos e manobras para comprometer a segurança pública e criar graves distúrbios políticos, associação criminosa e roubo de um telemóvel", informou Abdou Karim Diop, procurador de Dakar.

O anúncio das acusações contra Sonko surgiu depois de este ter sido detido, na sexta-feira, por alegadamente ter "roubado violentamente um telemóvel a um polícia cujo veículo avariou perto da sua casa", tendo de seguida feito um "apelo subversivo" à população nas redes sociais.

Segundo a versão de Sonko, divulgada nas suas redes sociais, o incidente ocorreu com agentes dos serviços de informações que ele alega estarem colocados à volta da sua casa 24 horas por dia.

Sonko explicou que os agentes começaram a gravar imagens, pelo que lhes retirou o telemóvel, pedindo "à pessoa que estava a gravar para o desbloquear e apagar as imagens que captou, o que ele se recusou a fazer".

Diop explicou que o alegado furto do telemóvel de um polícia "foi apenas um dos pretextos para a sua detenção, que era iminente".

 

Ø  Ditadura de Mianmar adia eleição mais uma vez e recrudesce autoritarismo

 

A ditadura Mianmar anunciou nesta segunda-feira (31) que irá prorrogar o estado de exceção em vigor no país asiático por mais seis meses, em mais um recrudescimento do regime que vigora desde 1º de fevereiro de 2021. Na prática, a medida adia as eleições que estavam previstas para ocorrer em agosto.

Segundo informou a mídia estatal, a decisão teria sido aprovada pelo Conselho Nacional de Segurança e Defesa formado inteiramente por militares. O líder da junta que lidera o país, o general Min Aung Hlaing, disse que "arranjos de segurança" ainda são necessários.

"Para ter eleições que sejam livres e justas, e para que as pessoas possam votar sem medo, ainda são necessários arranjos de segurança, e por isso o estado de emergência precisa ser prorrogado", dizia o comunicado da junta lido em cadeia nacional de TV.

Mianmar segue imerso em uma série de conflitos em diversas áreas do país desde que militares derrubaram o governo civil da vencedora do prêmio Nobel da Paz, Aung San Suu Kyi, em 2021. À época, alegações de fraude eleitoral foram usadas para justificar a tomada de poder.

Desde então, a junta à frente da ditadura prometeu realizar eleições, mas vem atrasando o prazo de um ano inicialmente estabelecido e usa a violenta guerra civil que ocorre no país como pretexto.

Ainda nesta segunda-feira, o alto comissário de direitos humanos da ONU, o austríaco Volker Türk, disse que, desde o golpe, mais de 40 trabalhadores humanitários foram mortos pelos militares no país e quase 200 foram detidos. Segundo as Nações Unidas, 15,2 milhões de pessoas precisam de ajuda alimentar e nutricional urgente no país de 54 milhões de pessoas. Mas a ditadura se nega a fornecê-la.

"[Os militares] colocam em prática uma série de obstáculos legais, financeiros e burocráticos para garantir que as pessoas que precisam não recebam ajuda e não possam ter acesso a ela", afirmou Türk. "Esse impedimento é deliberado e seletivo, o que levou grande parte da população a se ver privada de suas liberdades e direitos fundamentais."

Para além das mortes de trabalhadores humanitários, ele afirmou que a ONU calcula, segundo fontes confiáveis que não detalhou quais. que ao menos 3.747 pessoas morreram em ações dos militares desde fevereiro de 2021 e outras 23,7 mil foram detidas pelo regime.

Um outro relatório, este do Instituto de Pesquisa da Paz de Oslo, traz cifra maior e afirma que 6.000 civis morreram nos 20 meses que se seguiram ao golpe. "Nossos dados mostram que as perdas do conflito são superiores do que se dizia e que, embora a junta seja claramente a principal culpada, as forças oposicionistas também têm muito sangue nas mãos", afirmou um dos autores do estudo, Stein Tønnesson.

O regime militar também tinha anunciado em março a dissolução da Liga Nacional pela Democracia (LND), partido de Suu Kyi, deposta e presa após o golpe de Estado. Outros 39 partidos também foram dissolvidos por não se registrarem de acordo com a nova e dura legislação eleitoral escrita pelos militares.

Com pena que soma 33 anos, a ex-líder civil de 78 anos segue detida em um presídio na capital. Grande parte da comunidade internacional encara os julgamentos como uma farsa, embora o regime insista que ela foi submetida a um processo justo.

Em abril, ao menos 50 pessoas foram mortas, após aviões do Exército bombardearem um evento que reunia oponentes da ditadura. Como justificativa, o porta-voz da junta militar, Zaw Min Tun, disse que o ataque visava a restaurar a paz e a estabilidade na região.

Uma série de países ocidentais impôs sanções à junta militar e à sua vasta rede de negócios para tentar sufocar suas receitas e o acesso a armas de fornecedores-chave, como a Rússia.

Entre os atores internacionais que têm criticado a ditadura local estão os países-membros da Asean, a Associação de Nações do Sudeste Asiático. Mais recentemente, no último dia 14, os chanceleres dessas nações estiveram reunidos na Indonésia e voltaram a dizer que condenam, "veementemente, os atos contínuos de violência, incluindo ataques aéreos, bombardeios e destruição de instalações públicas".

 

Fonte: Deutsche Welle/RFI/FolhaPress

 

 

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