domingo, 27 de agosto de 2023

Guilherme Mazieiro: Por que a Polícia Federal deve investigar ladroagens nas Forças Armadas

Se fizermos uma rápida leitura na história republicana do Brasil, esbarraremos repetidas vezes na atuação de um grupo intruso na política, os militares. Na proclamação da República, no golpe de 1930, no golpe de 1964, no impeachment de Dilma Rousseff (PT), na eleição de 2018, em ameaça ao Supremo Tribunal Federal (STF) para manter Lula (PT) preso e eleger o capitão Jair Bolsonaro (PL) à Presidência, etc. Seja com arma na mão, seja com um tweet. Onde teve instabilidade institucional, tinha militar.

A vitória de Lula (PT) e o fracasso dos atos golpistas do dia 8 de janeiro trouxeram ao país a volta à normalidade institucional. Ainda que a vida siga aos trancos e barrancos, a rotina dos civis vai indo. Já a rotina dos militares, lembra mais a dos bombeiros: correndo para controlar o incêndio provocado pelas investigações da Polícia Federal.

No último sábado, 19, o ministro da Defesa, José Múcio, reuniu os comandantes da Marinha, Aeronáutica e Exército para um encontro com Lula. A reunião, fora das agendas, serviu para dizerem ao presidente que "interessa às Forças que os fatos [investigados pela PF] sejam devidamente esclarecidos e a decorrente individualização das condutas".

Ao longo da semana, essa mesma conversa foi levada por Múcio ao ministro da Justiça, Flávio Dino, ao presidente da CPMI do 8/1, deputado Arthur Maia, e ao diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues. Percebe-se o quanto as investigações tiraram o sono dos milicos.

As falas de Múcio não têm amparo na realidade. As Forças não disseram (ou não querem dizer) quem são os militares golpistas? Quem são os criminosos que queriam enganar o eleitor fingindo haver fraude nas urnas? Aliás, quando um general envolvido em venda ilegal de joias sofreu busca e apreensão, o ministro disse que atuaria para “evitar uma crise”.

O general, vocês sabem, é o pai do tenente-coronel Mauro Cid, Mauro Lorena Cid. A afirmação sobre “evitar crise” foi dada à jornalista Daniela Lima, da GloboNews, poucas horas depois da PF cumprir uma busca e apreensão na casa do general.

Os fardados passaram praticamente ilesos após 21 anos de tortura e desordem com uma ditadura nojenta. Na CPI da Covid militares que mandavam de verdade foram dispensados. O ex-Casa Civil e general, Braga Netto (candidato a vice na chapa de Bolsonaro), que, por decreto de Bolsonaro, se tornou o chefe do Centro de Coordenação de Operações do Comitê de Crise da Covid-19, sequer foi ouvido. Ora, como investigar a gestão da crise sem ouvir o chefe?

Você, caro leitor, tem tanque de guerra na sua casa? Não tem. Então é impossível que tanques tenham sido apontados para Polícia Militar do Distrito Federal, no dia 8 de janeiro, por uma ação “individual” para proteger o acampamento golpista. A CPMI, até aqui, segue o roteiro da CPI da Covid e passa a mão na cabeça da cúpula das três forças militares.

Sobre investigações policiais, os militares se mantêm corporativistas, ninguém deda ninguém. Nas relações políticas, seguem bem posicionados. No PAC de Lula, a Defesa é quem tem a maior fatia, R$ 52,8 bilhões. Acima de Saúde (R$ 30,5 bilhões) e Educação (R$ 45 bilhões) e obras de infraestrutura.

Hoje, dia 25 de agosto, é celebrado o dia do soldado. Uma referência ao patrono do Exército Brasileiro, Luís Alves de Lima e Silva, o Duque de Caxias, nascido nesta data, em 1803. Ainda que se posicionem politicamente, o avanço inédito da PF sobre as muralhas das Forças Armadas deixa pouco para a cúpula militar comemorar.

 

Ø  Diretor-geral da Polícia Federal fala sobre possibilidade de Bolsonaro ser preso

 

O diretor-geral da Polícia Federal, delegado Andrei Passos Rodrigues, deu uma entrevista na tarde desta sexta-feira (25) ao jornalista Josias de Souza, do portal UOL, na qual falou sobre as possibilidades reais do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ser preso em decorrência das investigações que estão em curso contra ele, nos mais diversos casos, como dos atos golpistas do 8 de janeiro, da venda de joias e relógios da Presidência ou ainda da falsificação de carteiras de vacinação.

“O que a equipe tem de se pautar é na responsabilidade e na qualidade da prova. Deve se pautar pelo que está na lei e pelo que está apurando. Se nessa conjunção de elementos se chegar a essa conclusão (de que Bolsonaro deve ser preso), se os requisitos legais são atendidos, esse é um caminho possível, e aqui falo hipoteticamente”, disse Rodrigues.

O chefe da PF afirmou que não há dúvidas de que existem indícios contra o ex-ocupante do Palácio do Planalto, mas que as equipes devem se manter atentos na coleta de provas, que precisam ser consistentes.

“Indícios há. Temos visto várias provas que são tornadas públicas pelo ministro relator (Alexandre de Moraes, do STF), onde a gente identifica vários elementos que podem apontar neste caminho. Agora, como disse, esse é um ponto muito caro para nós investigadores e policiais federais de ter essa responsabilidade à medida que provas forem colhidas, depoimentos colhidos, análises de materiais apreendidos, a gente vai avançando sempre com muita consistência naquilo que estamos fazendo”, explicou.

Rodrigues chamou a atenção para o fato dos atores que se envolveram em todos os diferentes escândalos ligados a Bolsonaro serem os mesmos, e que a partir daí o cenário sugere que existiria uma teia ligando todos os nomes, o que ainda precisa ser melhor analisado.

“Nosso trabalho procura desvendar todo esse cenário. O que a gente tem visto é que há a conexão entre todos esses elementos. O próprio questionamento de integridade do sistema eleitoral, o ataque às instituições brasileiras, ao poder Judiciário, a interferência na instituição como por exemplo me parece que houve na Polícia Federal. Tudo isso se conecta e o que a gente vê nessa investigação é que há uma conexão, os atores se repetem”, esclareceu o delegado.

Ele reiterou ainda que as investigações avançam em todos os casos de crimes nos quais o ex-presidente de extrema direita é suspeito de participação, não apenas no caso das joias e relógios, que ganhou mais destaque recentemente na imprensa.

“Há crimes contra o Estado Democrático de Direito, há crimes em relação à falsificação de cartões de vacina, uso de documento falso, crime contra a saúde pública, há crime em relação à questão das joias. Há todo um contexto onde as investigações estão acontecendo e estão sendo produzidas provas”, falou ainda Rodrigues.

Já em relação à fortuna de R$ 17 milhões que Bolsonaro afirma ter recebido de doações via Pix de seus fanáticos seguidores radicais, cujo bloqueio foi ventilado nos últimos dias, o delegado não desmentiu, mas explicou como isso aconteceria e em que circunstâncias seria necessária a apreensão.

“Nós estamos recebendo agora os dados bancários e fazendo análise desses R$ 17 milhões, e aí são milhões de transações. Ou seja, há possibilidade legal do bloqueio, sim, se houver qualquer suspeição de que não sejam transações normais, que levantem alguma margem de desconfiança”, concluiu.

 

Ø  Ministros e aliados do governo veem com apreensão eventual prisão de Bolsonaro

 

Ministros do governo e aliados do presidente Lula (PT) no Congresso veem com apreensão uma eventual prisão de Jair Bolsonaro (PL) em decorrência do avanço das investigações contra o ex-presidente.

O cenário em que Bolsonaro poderia ser preso atiçou a militância petista, e movimentos sociais ligados ao governo pretendem incorporar o pedido de prisão de Bolsonaro no rol de reivindicações das manifestações no 7 de Setembro.

Apesar disso, integrantes do governo e articuladores políticos dizem torcer para que uma prisão, caso ocorra, seja em cumprimento a uma solicitação do Ministério Público Federal e com robustez de provas.

Isso porque a eventual detenção de Bolsonaro poderia contribuir para inflamar e dividir mais a sociedade, avaliam.

O ex-presidente está no centro de apurações que apontam a existência ao seu redor, e com o seu estímulo, de um grupo que alimentava reais expectativas de aplicar um golpe de Estado e barrar a posse do presidente eleito em 1º de janeiro.

No decorrer dessas apurações, veio a público também indícios de tentativa de vender no exterior presentes que o ex-mandatário havia recebido em visitas oficiais a países do Oriente Médio.

Apesar de todas essas apurações, um parlamentar muito próximo de Lula cita a própria anulação das acusações contra o petista e a posterior absolvição de Dilma Rousseff (PT) em processos como exemplos do que pode vir a ocorrer com Bolsonaro.

Este congressista lembra que muitos petistas foram alvos de investigação e avalia que esse "mangue" tem que acabar, numa referência a decisões da Justiça que considera arbitrárias.

Mais dois ministros ouvidos sob reserva avaliam ser necessário ter maiores evidências antes que seja tomada uma medida desta, já que a prisão do ex-presidente poderia, em vez de enfraquecê-lo politicamente, contribuir para inflar seus apoiadores.

Eles lembram que Lula, mesmo preso, conseguiu articular a candidatura de Fernando Haddad (PT) no seu lugar e levou o aliado a ficar em segundo lugar na disputa presidencial de 2018.

Nesta sexta (25), em entrevista ao UOL, o diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues, afirmou que os investigadores devem se pautar na lei, na apuração, na "responsabilidade e na qualidade da prova" e que Bolsonaro pode ser preso se os requisitos forem atendidos.

"Se nessa conjunção de elementos se chegar a essa conclusão [pela prisão], se os requisitos legais são atendidos, esse é um caminho possível, e aqui falo hipoteticamente", disse o diretor da PF.

Na última semana, o ministro Flávio Dino (Justiça) também afirmou que as investigações contra o ex-presidente são conduzidas de forma séria, isenta e técnica. Afirmou ainda que as apurações estão longe do fim.

"Cabe a mim garantir ao povo brasileiro, especialmente à população de Minas Gerais, que a investigação é técnica, séria, isenta e está sendo bem conduzida. Bem conduzida no sentido de não haver interferência externa, nem no sentido de perseguições, nem no sentido de haver proteções", disse o ministro na última segunda-feira (21), ao ser questionado sobre a possibilidade de o ex-presidente ser preso.

O ministro admitiu a possibilidade de o passaporte de Bolsonaro ser apreendido, mas afirmou que, por enquanto, essa solicitação ainda não foi feita à Justiça. "Não antecipo investigação, não presido investigação. O que posso falar é que legalmente é possível. Nesse momento ainda não houve esse pedido", afirmou.

Em outra frente, os aliados de Bolsonaro querem usar as acusações para tentar transformá-lo em uma espécie de mártir.

O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) aposta que a sociedade enxerga o que ele classifica como perseguição ao pai.

"A perseguição [a Bolsonaro] faz com que a população fique mais simpática a ele. Pesquisas mostram que ele continua forte e que o apoio dele para eleição de 2024 vai ser decisivo", diz o filho mais velho do ex-presidente.

Essas afirmações são contestadas pelo entorno de Lula, que afirma que o ex-presidente tem sofrido uma erosão em seu apoio devido às investigações.

Bolsonaro despencou em relevância nas redes após a operação da PF no caso das joias e as declarações de Walter Delgatti Netto, conhecido como hacker da Vaza Jato, de acordo com o IPD (Índice de Popularidade Digital), analisado diariamente pela empresa de pesquisa e consultoria Quaest.

A leitura de aliados de Bolsonaro, entretanto, é que, como o ex-presidente já está inelegível, o avanço uma uma investigação manca vai passar a imagem de que a Polícia Federal, o STF e o Ministério da Justiça conduzem um processo político.

Essas pessoas acham que é o caso especialmente da investigação do envio de mensagem que sugeria, sem provas, uma fraude do TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

Bolsonaro confirmou na quarta (23) o teor da mensagem enviada ao empresário Meyer Nigri que levou a Polícia Federal a intimar o ex-presidente para explicar a difusão de fake news sobre o processo eleitoral brasileiro. "Eu mandei para o Meyer, qual o problema?", disse à Folha de S.Paulo.

Um dos casos mais delicados até agora é a apuração sobre as joias e presentes dados por autoridades de outros países ao ex-mandatário. Ao autorizar diligências no processo, o ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), apontou investigação de possível cometimento de crimes de peculato e de lavagem de dinheiro.

Aliados do ex-presidente dizem que, com o tempo, a população vai interpretar o episódio como uma falha causada por uma legislação capenga, que inclusive deverá ser refeita pelo Congresso, mostrando que havia inconsistências.

Flávio Bolsonaro afirmou que, como resultado dessas investigações, o ex-presidente terá ainda mais poder de transferência de votos.

O discurso de vitimismo, portanto, tem sido a principal aposta do entorno do ex-presidente desde que denúncias e acusações contra ele passaram a ficar mais claras.

 

Ø  “É um absurdo acusar de lavagem de dinheiro”, diz Bolsonaro Pix de R$17 milhões

 

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) afirmou à CNN que não há irregularidade nas doações via Pix, feitas por apoiadores dele nos últimos meses.

“O Pix começou em junho. É um absurdo acusar de lavagem de dinheiro. Não existe nada errado. Vão ver. Um milhão de pessoas fizeram doações”, disse Bolsonaro à CNN na quinta-feira (24).

Segundo apuração da CNN, a Polícia Federal vai cruzar dados para tentar identificar todos os doadores dos R$ 17 milhões que o ex-presidente recebeu via Pix.

Os investigadores querem saber se houve fraudes e suspeitam de lavagem de dinheiro.

Para fazer a “varredura”, a PF vai utilizar as informações obtidas com a quebra do sigilo bancário e fiscal de Bolsonaro e da esposa, Michelle, autorizada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes.

A PF ainda pretende fazer uma colaboração com o Ministério Público para acessar o Sistema de Investigação de Movimentações Interbancárias (Simba).

Um relatório produzido pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), órgão de combate à lavagem de dinheiro do governo federal, aponta que o ex-presidente recebeu R$ 17,2 milhões via Pix em sua conta pessoal nos primeiros seis meses deste ano.

Os dados do Coaf mostram que, entre 1º de janeiro e 4 de julho, Bolsonaro recebeu mais de 769 mil transações por meio de Pix, que totalizaram R$ 17.196.005,80.

O valor corresponde quase à totalidade do movimentado pelo ex-presidente no período, de R$ 18.498.532,66.

Os dados foram enviados pelo Coaf à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que investiga os atos criminosos do dia 8 de janeiro no Congresso Nacional.

No início do mês, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), um dos filhos do ex-presidente, afirmou que os dados do Coaf foram vazados da CPMI.

 

Ø  Mijoias: Michelle Bolsonaro anuncia que vai lançar empresa pra aproveitar escândalo

 

A ex-primeira-dama e presidenta do PL Mulher, Michelle Bolsonaro, decidiu debochar do caso das joias na qual ela é uma das investigadas da PF.

Ela afirmou que vai lançar uma linha de produtos chamada "Mijoias". Recentemente, ela lançou, em parceria com o maquiador Agustin Fernandez, uma coleção de produtos de maquiagem.

Michelle também afirmou que o caso das joias é uma "cortina de fumaça" para a CPI do 8 de janeiro.

“Mas vocês pediram tanto, vocês falaram tanto de joias, que em breve teremos lançamento Mijoias para vocês”, anunciou. “Mas sabe o que aconteceu? Vou fazer limonada docinha desse limão. Vou. E vou falar para vocês: quem me colocou aqui vai me fortalecer, que é Deus”, disse a ex-primeira-dama.

 

Fonte: Terra/Fórum/FolhaPress/CNN Brasil

 

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