segunda-feira, 29 de maio de 2023

Reforma tributária anima mercado e Congresso começa a articular aprovação

A aprovação folgada do novo marco fiscal na Câmara dos Deputados, concluída na quarta-feira (24), já começa a aquecer as expectativas para o próximo grande projeto econômico prometido pelo governo de Luiz Inácio Lula da Silva: a reforma tributária.

Para economistas do mercado financeiro, ela é, naturalmente, o próximo tema a começar a tomar a agenda do governo, dos parlamentares e do próprio mercado — e a votação expressiva que o governo conseguiu para o seu projeto fiscal na Câmara ajuda a elevar o otimismo com relação à aprovação desta, que é uma das reformas mais complexas de se fazer.

No Congresso, a passagem do marco fiscal pela sua fase mais difícil, na Câmara, já está levando os parlamentares a retomarem as discussões acerca da reforma tributária, que estava em compasso de espera, com perspectiva de entregar as primeiras versões do projeto para discussão ainda em junho.

Dentro do governo, não é diferente: em entrevista à CNN nesta quinta-feira (25), o secretário extraordinário da Reforma Tributária, Bernard Appy, contou que as tratativas pela reforma foram intensificadas após a aprovação do marco fiscal na Câmara, inclusive com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, começando a se envolver “diretamente” na articulação da matéria junto às equipes técnicas.

O texto-base do novo marco fiscal, legislação que deverá substituir o atual teto de gastos, foi aprovado na Câmara com 372 votos. Por ser um projeto de lei complementar, era necessário ao menos metade deles, ou 257 votos favoráveis dos 513 deputados.

O projeto segue agora para votação no Senado, onde uma base mais alinhada ao governo do que na Câmara dá aos políticos e especialistas a tranquilidade de que o texto não deve enfrentar mais tantas alterações, nem barreiras até ser terminalmente aprovado e sancionado.

·         Ajuda para a bolsa

“A votação do arcabouço foi impressionante e mostra um alinhamento entre Congresso, Ministério da Fazenda e o governo como um todo, que deve transparecer, agora, na reforma tributária”, diz o economista-chefe do Banco Master, Paulo Gala.

“Ela é a última grande reforma que ficou faltando, depois da trabalhista e da Previdência, e a sua aprovação traria um cenário bastante positivo, podendo, inclusive, ajudar a melhorar a bolsa de valores”, acrescentou.

É este momento de sintonia entre parlamentares e governo que, na avaliação dos economistas, deve ajudar a contornar as históricas e inevitáveis resistências que surgem sempre que se tenta fazer uma reformulação dos tributos.

“O debate deve ficar mais complexo na hora de discutir a combinação dos tributos estaduais e municipais”, diz o estrategista-chefe do Banco Mizuho, Luciano Rostagno. “Alguns estados vão se beneficiar, outros vão sair perdendo, então vai começar a gerar a insatisfação de alguns governantes.”

O ministro da Economia de Jair Bolsonaro, Paulo Guedes, chegou a apresentar projetos avançados para dar andamento à reforma tributária em 2020 e 2021, mas as discussões acabaram paralisadas em meio à falta de articulação e de consensos.

O próprio Lula, em seus primeiros mandatos, chegou também a tentar uma reforma tributária e a apresentar projetos, todos, porém, também sem avanço.

O principal objetivo da primeira grande etapa da reforma tributária é unificar e simplificar a miríade de impostos indiretos que o país possui, aplicados nas empresas sobre as mercadorias e serviços.

PIS, Cofins e IPI, federais, o ICMS, que é estadual, e o ISS, municipal, são alguns deles, muitos cobrados cumulativamente uns sobre os outros.

Trata-se de um tema que já vem sendo discutido há anos, inclusive com projetos já bem maduros e amplamente debatidos dentro e fora do Congresso. Um deles, inclusive, elaborado pelo próprio Appy, um dos maiores nomes em economia tributária do país e que acabou levado para dentro do governo por Lula para comandar o tema.

Tudo isso, na visão dos especialistas, ajuda na perspectiva de que a aprovação de um projeto consensual seja finalmente viabilizada, ainda neste ano.

“É uma discussão que já avançou bastante e tem condições de ser aprovada ainda este ano”, disse Gala, do Master. “Se não for neste ano, em que os governos tradicionalmente tem um capital político maior, depois fica bem mais difícil.”

·         Parlamentares retomam os trabalhos

No Congresso, a expectativa é que o foco dos deputados se volte à reforma tributária agora que o novo marco fiscal foi aprovado e despachado para o Senado.

Parte dos parlamentares acreditava ser necessário tratar antes das novas regras fiscais para então delinear como ficam as mudanças no sistema tributário brasileiro.

Um grupo de trabalho para elaborar um parecer atualizado da reforma tributária chegou a ser criado em 15 de fevereiro na Câmara dos Deputados, e, na terça-feira da semana passada (16), ele teve as atividades prorrogadas por mais 20 dias. Ou seja, deve trabalhar até o início de junho.

A cúpula do grupo tinha em mente pedir a prorrogação dos trabalhos caso ainda não houvesse um ambiente pronto para a aprovação da matéria. A ideia é evitar que o parecer seja apresentado antes do tempo e acabe ficando parado, levando ao risco de ser desidratado.

O relator, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), já disse que pretende entregar o parecer em 6 de junho e que a votação do documento deve acontecer até o final do mês.

A intenção é aprovar o projeto na Câmara antes do recesso parlamentar, que começa em 18 de julho.

Enquanto Aguinaldo não apresenta o parecer, o grupo deve continuar promovendo mais audiências públicas e reuniões, especialmente com representantes de setores afetados, o que inclui governadores, prefeitos e bancadas estaduais.

Essa atuação continuará até a apreciação em plenário. A tendência é que, com o passar das semanas, haja maior consenso.

·         Discordâncias

Até o momento, porém, a ideia de uma reforma tributária como a desenhada pelo Congresso causa apreensão em alguns setores da economia.

Setores do agronegócio e de comércio e serviços veem com ressalvas a proposta e dizem que preferem aguardar o texto do relator antes de emitirem opiniões concretas.

Deputados e senadores que representam esses setores, porém, têm se posicionado contra alguns trechos e a favor de uma compensação financeira.

A bancada ruralista, por exemplo, reclama do trecho proposto pelo governo de “cashback” dos impostos pagos em produtos da cesta básica.

A ideia do governo é que apenas as pessoas mais pobres tenham acesso a esse desconto dos tributos. Para os críticos, porém, essa proposta é irreal, de difícil aplicação e poderia provocar um aumento dos preços.

Outra demanda dos setores é que haja alíquotas diferenciadas no novo tributo de consumo que vem sendo desenhado com a unificação proposta dos impostos atuais.

Aguinaldo Ribeiro tem indicado que aceitará incluir em seu texto alguma diferenciação de alíquota para não onerar excessivamente um setor em detrimento de outro.

Apesar das reivindicações, há também a avaliação no Parlamento de que o ambiente para a aprovação de uma reforma tributária agora pode ser maior do que em tentativas anteriores.

Isso porque há uma linha de discussão mais unificada, sem vários textos sobre o tema concorrendo entre si, e conta a favor o apoio do governo federal, com Haddad se envolvendo diretamente nas tratativas, por exemplo.

A gestão petista não consolidou ainda a base aliada no Congresso. Mesmo assim, a aprovação do novo marco fiscal na Câmara com forte apoio de partidos do centrão também foi percebido como um ponto positivo.

 

Ø  Tributos sobre combustíveis sobem em junho; governo espera conter alta

 

Duas rodadas de aumento na tributação sobre combustíveis estão previstas para os próximos meses, o que pode impactar os preços ao consumidor — pressionando-os para cima.

Porém, o ministro da Fazenda, Fernando Haddadindicou que a Petrobras, estatal controlada pela União, pode agir para impedir ou, pelo menos, atenuar altas nos preços em razão da elevação de impostos.

Para isso, a empresa teria de baixar os preços dos combustíveis na bomba quando os aumentos de tributos começarem a valer – o que já foi feito anteriormente, em fevereiro deste ano (quando houve aumento de impostos federais).

·         Mudanças no ICMS em junho

No início de junho, os estados promoverão alterações no formato de cobrança do ICMS sobre gasolina. O tributo estadual, até então calculado em porcentagem do preço (de 17% a 23%, dependendo do estado), passará a incidir com uma alíquota fixa, em reais, de R$ 1,22 por litro.

"A média das alíquotas dos estados [atualmente, no Brasil] fica em torno de 19%, o que representa R$ 1,0599/litro. Com a vigência do valor ad rem, de R$ 1,22/litro, a partir de 1º de junho, um aumento médio de R$ 0,16/litro, o que representa um aumento médio de 22% no preço final ao consumidor, na média Brasil", estimou o Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE).

·         Tributos federais em julho

Já no começo de julho, o governo federal retomará a tributação com alíquota cheia do PIS/Cofins sobre gasolina e etanol.

A expectativa, com isso, é que o preço suba cerca de R$ 0,22 por litro no caso dos dois combustíveis, segundo cálculos do governo.

·         Governo pode atuar, indica Haddad

Em meados de maio, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, indicou, durante audiência pública na Câmara dos Deputados, que a Petrobras pode reduzir os preços dos combustíveis nos próximos meses para compensar o aumento dos tributos federais previstos para julho.

"Com o aumento [de tributos] previsto para 1º de julho, vai ser absorvido pela queda do preço deixada para esse dia. Nós não baixamos tudo o que podíamos. Justamente esperando o 1º de julho, quando acaba o imposto de exportação e acaba o ciclo de reoneração", declarou, ele na ocasião.

Com ações listadas em bolsa, a Petrobras divulgou um fato relevante no mesmo dia.

"A Petrobras não antecipa decisões de reajustes e reforça que não há nenhuma decisão tomada por seu Grupo Executivo de Mercado e Preços (GEMP) que ainda não tenha sido anunciada ao mercado", informou a empresa, em 17 de maio.

Haddad não citou especificamente a alteração no ICMS, com impacto nos preços, que acontecerá na próxima semana.

De acordo com ele, essa redução prevista para julho, na gasolina e no álcool pela Petrobras, estaria em linha com os preços internacionais.

"A Petrobras deixou claro que obviamente vai olhar o preço internacional. Não tem como escapar disso porque ela importa. Ela pode, em uma situação mais favorável como agora em que o preço do petróleo caiu, mas que o preço do dólar caiu, combinar os dois fatores e reonerar sem impacto na bomba", declarou Haddad.

Ele também sinalizou que o mesmo procedimento deve ser feito com o diesel, cuja desoneração vale até o fim desse ano. "E tudo bem, como vai acontecer com o diesel no final do ano. Já deixou uma gordura para computar a reoneração", acrescentou.

·         Política de preços da Petrobras

Neste mês de maio, a Petrobras anunciou uma nova política para os combustíveis, que considerará usa duas referências de mercado:

  • o "custo alternativo do cliente, como valor a ser priorizado na precificação", e
  • o "valor marginal para a Petrobras".

Especialistas ouvidos pelo g1 consideram que a nova política deve beneficiar o consumidor final no curto prazo, porque impede que oscilações muito drásticas no preço do dólar ou do petróleo sejam repassadas nos combustíveis.

Após o anúncio da nova política, a estatal anunciou mais uma redução do preço do diesel e da gasolina para as distribuidoras.

Em entrevista à GloboNews, em 17 de maio, o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, admitiu que a empresa poderá seguir orientações do governo para precificar os combustíveis.

"A Petrobras do governo anterior é uma Petrobras que combinava esse jogo, mas a Petrobras que combinava jogo acabou e ela vai fazer o que é importante para o Brasil. E se tiver que seguir a orientação do governo, seguirá se fizer sentido para ela, para o consumidor e acionista", disse Prates, em meados de maio.

Questionado na mesma entrevista se a Petrobras vai baixar os preços para compensar o aumento dos tributos, o presidente da estatal, Jean Paul Prates, disse que a companhia vai avaliar.

"Não sei, vamos ver até lá, as circunstâncias vão dizer, se a gente estiver num ciclo de baixa [do preço do barril de petróleo]", respondeu. "Quando chegar lá, no dia, a gente vai dizer se cabe ou não cabe absorver o tanto de imposto que vai reentrar", completou.

 

Fonte: CNN Brasil/g1

 

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