Quais
são os direitos das pessoas trans no Brasil? Semana foi marcada por polêmicas
aqui, nos EUA e no Reino Unido
Desde o
começo do ano, polêmicas envolvendo os direitos das pessoas transexuais e
transgêneros reacenderam o debate sobre o tema no Brasil e no mundo.
• No Reino Unido, a Suprema Corte decidiu
nesta semana que mulheres trans não se enquadram na definição legal de mulheres
segundo a legislação de igualdade do país. Ou seja, a definição deve se
restringir ao "sexo biológico", definido no nascimento.
• Nos Estados Unidos, o presidente Donald
Trump emitiu uma ordem executiva com o mesmo teor no primeiro dia do novo
mandato. O texto diz que gêneros não são mutáveis e baseiam-se em “realidade
fundamental e incontestável”.
• Por conta dessa medida de Trump, o
governo americano concedeu nesta semana um visto de entrada à deputada federal
brasileira Erika Hilton (PSOL-SP) considerando seu gênero como sendo masculino.
• O Brasil tem duas parlamentares trans na
Câmara dos Deputados, as primeiras da história. A outra, Duda Salabert
(PDT-MG), também informou que seu visto de entrada nos EUA teve o gênero
alterado para masculino.
• Aqui no Brasil, também nesta semana, o
Conselho Federal de Medicina (CFM) publicou uma resolução que altera a idade
mínima permitida para terapias hormonais e para cirurgias por pessoas que
buscam mudança de gênero, além de proibir o bloqueio da puberdade em crianças e
adolescentes trans.
Ao
longo de décadas, transexuais e transgêneros – pessoas que não se identificam
com o sexo que lhes foi atribuído no nascimento – têm lutado para garantir
direitos constitucionais e mais respeito na sociedade.
<><>
Risco de retrocessos
Especialistas
ouvidos pelo g1 avaliam que há um risco de retrocesso de direitos conquistados
pelo grupo ao longo do tempo.
O
principal "fator de risco", no país, é a fragilidade dos direitos
conquistados – que não constam em leis, e sim, em decisões judiciais usadas
como parâmetro.
"É
um ataque coordenado que faz parte de um projeto político. Os avanços no Brasil
foram majoritariamente em decisões judiciais. A falta de compromisso do governo
em ratificar as mudanças em políticas públicas fica evidente e faz com que a
cidadania não chegue de fato aos 3 milhões de pessoas trans", avalia a
presidente da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), Bruna
Benevides.
De
acordo com Benevides, os governos usam a defesa dos "bons costumes"
ou "os direitos das mulheres e meninas" para restringirem questões
fundamentais das pessoas trans.
Coordenadora
de um núcleo sobre diversidade sexual e de gênero na Universidade de Brasília
(UnB), a professora Silvia Marques vê no Brasil um "panorama muito
conservador", sobretudo na última década.
"Dentro
do Congresso, a população LGBTQIA+ não consegue aprovar nenhuma iniciativa. É
uma pauta que envolve uma moral sexual, na qual os parlamentares tendem a
usufruir", diz.
>>>>
Mas... de quais direitos estamos falando, e qual a situação deles no Brasil?
Confira abaixo:
<><>
Cirurgias de redesignação sexual no SUS
Em
2008, uma portaria do Sistema Nacional de Saúde (SUS) definiu a habilitação do
processo transexualizador (para transição de gênero) em hospitais públicos
brasileiros.
<><>
Quais são os critérios para fazer a cirurgia?
Segundo
o Conselho Federal de Medicina, o interessado em realizar a cirurgia deve:
• realizar acompanhamento terapêutico pelo
prazo mínimo de dois anos; e
• ser maior de 21 anos.
Presidente
da Antra, Bruna Benevides criticou a decisão recente do CFM sobre a idade
mínima para começo das terapias hormonais.
Ela
defende que a realização da cirurgia seja feita quando o paciente se sentir
apto à mudança, já que ele passa por um rígido acompanhamento terapêutico.
"Proibir
crianças trans vai fazer com que elas façam o uso do medicamento por conta
própria. Uma vez que a gente vive em um país que se auto medica, os setores de
defesa dos direitos humanos estão preocupados com a mudança", afirma
Benevides.
Em
2018, o Conselho Federal de Psicologia (CFP) emitiu uma resolução que orienta a
atuação profissional de psicólogas e psicólogos para que travestilidades e
transexualidades não sejam consideradas patologias.
<><>
Registro civil para pessoas trans
Em
2018, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que transexuais e transgêneros
podem alterar o nome no registro civil sem a necessidade de realização de
cirurgia.
À
época, a maioria dos ministros decidiu pela autorização independentemente de
decisão judicial.
“É
inaceitável no estado democrático de direito inviabilizar a alguém a escolha do
caminho a ser percorrido, obstando-lhe o protagonismo pleno e feliz da própria
jornada”, afirmou o relator do caso, o então ministro Marco Aurélio Mello.
<><>
Criminalização da homofobia
Em
2019, o STF reconheceu a discriminação por orientação sexual e identidade de
gênero como crime. A prática foi comparada ao crime de racismo, até que o
Congresso Nacional aprove uma legislação específica sobre o tema.
Com a
decisão, pessoas que cometam atos de discriminação contra pessoas LGBTQIA+
podem ser punidas com penas que variam de 1 a 5 anos de reclusão.
<><>
Maria da Penha para pessoas trans
Por
unanimidade, em 2022, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ)
estabeleceu que a Lei Maria da Penha se aplica aos casos de violência doméstica
ou familiar contra mulheres transexuais.
Os
ministros analisaram um recurso do Ministério Público contra decisão da Justiça
de São Paulo, que negou medidas protetivas previstas na lei para uma mulher
transgênero agredida pelo pai.
Em
entendimento unânime, a Sexta Turma concluiu que o artigo 5º da Lei Maria da
Penha caracteriza a violência doméstica e familiar contra a mulher como
qualquer ação ou omissão baseada no gênero, e que isso não envolve aspectos
biológicos.
<><>
Cota trans nas universidades
A
aplicação de cotas para pessoas trans em universidades não é uma medida
governamental, e sim uma decisão de cada instituição de ensino. Para
especialistas, a medida pode ser um instrumento de acesso ao ensino e justiça
social.
"A
gente acredita que a luta pelo acesso de pessoas trans ao ensino superior pode
beneficiar a longo prazo a qualificação profissional dessas pessoas,
considerando que essa população é marginalizada e que muitas vezes não consegue
ter uma permanência adequada nas escolas", afirma a coordenadora de um dos
núcleos sobre diversidade sexual de gênero da Universidade de Brasília Silvia
Marques.
Cada
universidade fica responsável por delimitar a quantidade de vagas reservadas e
critérios de permanência para o grupo.
<><>
Onde funciona?
Atualmente,
23 universidades públicas aprovaram políticas de inclusão para pessoas trans. O
levantamento é da Seção Sindical dos Docentes das Universidades Federais do
Estado do Ceará.
Em
2018, a Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB) foi a primeira instituição
brasileira a reservar vagas para pessoas trans. No ano seguinte, a Universidade
Federal do ABC (UFABC), inaugurou a medida no estado de São Paulo. A
Universidade Federal da Bahia também adotou o sistema de cotas e reservou uma
vaga por turma para pessoas trans.
🔎Veja abaixo a lista com as principais
unidades de ensino que vão começar a oferecer a cota neste ano:
• Universidade Federal Rural do Rio de
Janeiro (UFRRJ):
• Universidade Federal Fluminense (UFF)
• Universidade Federal de São Paulo
(Unifesp)
• Universidade de Brasília (UnB)
• Universidade Estadual de Campinas
(Unicamp)
<><><>
Transfobia é crime no Brasil e em alguns estados dos EUA; veja regras em cada
país
A
deputada federal brasileira Erika Hilton (PSOL) disse que o governo dos EUA
cometeu "transfobia de Estado" após receber um visto de entrada para
um evento no país com o gênero masculino.
Erika
Hilton se identifica como mulher e é a segunda pessoa trans a integrar a Câmara
dos Deputados.
O caso
de Erika Hilton é reflexo de uma ofensiva do governo Trump contra o que ele
chama de “ideologia de gênero radical”. Ele determinou que o governo
considerasse apenas dois gêneros - masculino e feminino -, e assinou várias
medidas para, em suas palavras, "deter a loucura transgênero".
Segundo
a equipe da parlamentar, não há como questionar juridicamente o documento, pois
se trata de um ato de soberania do governo federal americano.
Erika
Hilton recusou-se a viajar ao receber o documento em desacordo com sua
autodeterminação de gênero como mulher.
Mesmo
que o caso do visto não tenha consequências jurídicas diretas, ele levanta
dúvidas sobre como cada país trata a transfobia atualmente.
<<<<<<
Veja abaixo as diferenças:
>>>
Brasil
O
Supremo Tribunal Federal (STF) determinou em agosto de 2023 que atos de
transfobia sejam igualados ao crime de injúria racial. E quem os fizer não tem
direito a fiança, nem limite de tempo para responder judicialmente.
Em
2019, o STF já tinha reconhecido o crime de transfobia, mas deveria ser
enquadrado como crime de racismo. Quatro anos depois, ampliou a proteção e
determinou que as ofensas deverão ser punidas como injúria racial. A diferença
entre os dois é:
• crime de racismo - é um ato de
discriminação contra um grupo ou coletividade;
• Injúria racial - é uma ofensa à
dignidade de uma única pessoa.
Ambos
os crimes são inafiançáveis e não prescrevem. A pena é de prisão de dois a
cinco anos, que pode ser dobrada se o crime for cometido por duas ou mais
pessoas.
>>>
Estados Unidos
Os EUA
aplicam leis federais contra crimes de ódio, que podem abranger crimes
cometidos com base em raça, cor, religião, nacionalidade, orientação sexual,
gênero, identidade de gênero ou deficiência.
Mesmo
com a ofensiva de Trump contra a regras de proteção de pessoas transgênero no
âmbito federal, a interpretação e a aplicação de leis contra crimes de ódio com
a proteção da identidade de gênero variam entre as jurisdições estaduais.
❌ Extinção de programas de diversidade
A forma
como o documento foi emitido é resultado das políticas do presidente dos
Estados Unidos, Donald Trump. Desde seu primeiro discurso de posse, ele
prometeu a extinção de programas de diversidade e reiterou que alterará
políticas federais sobre gênero nos Estados Unidos.
Na
fala, em 20 de janeiro, o republicano misturou conceitos sobre gênero e sexo
biológico.
"Esta
semana, também porei fim à política governamental de tentar incorporar
socialmente a raça e o gênero em todos os aspectos da vida pública e privada.
Vamos forjar sociedade que não enxergará duas cores e será baseada no mérito.
Será política oficial dos EUA que existam apenas dois gêneros, masculino e
feminino", afirmou ele.
>>>>
Veja todas as medidas assinadas por Trump desde que assumiu:
• 20 de janeiro: palavras e expressões em
desacordo com a nova política de dois gêneros foram removidas de sites
federais, como gay, lésbica, bissexual, LGBTQ, HIV, orientação sexual e
transgênero.
• 22 de janeiro: Casa Branca ordenou o
fechamento dos programas de diversidade do governo federal e colocou seus
funcionários em licença remunerada.
• 24 de janeiro: o governo determinou que
mulheres trans presas passem a cumprir pena em cadeias para homens. No dia 4 de
fevereiro, a Justiça americana, no entanto, suspendeu a decisão.
• 25 de janeiro: suspensão da emissão de
passaportes com o gênero "X" para pessoas que se identificam como não
binárias.
• 27 de janeiro: Trump assinou ordem que
abria portas para o banimento de soldados abertamente transgênero no Exército
do país. Exatamente um mês depois, o Pentágono anunciou que começaria a
removê-los nos próximos 30 dias, mas uma juíza federal suspendeu a ação no dia
18 de março.
• 28 de janeiro: restrição de transições
de gênero para menores de 19 anos.
• 29 de janeiro: Trump assina ordem
executiva para acabar com fundos para disciplinas que abordam racismo e teoria
de gênero nas escolas.
• 5 de fevereiro: proibição da
participação de meninas e mulheres transgêneros em eventos esportivos femininos
em escolas e faculdades - nesta quarta-feira (16), o governo anunciou que vai
processar o estado do Maine por não cumprir ordem.
<><>
Saiba a diferença entre orientação sexual, expressão e identidade de gênero
você
sabe o que é identidade de gênero, orientação sexual e expressão de gênero?
Nesta reportagem o g1 ouviu especialistas e explica os diferentes termos que
envolvem as questões de gênero.
Primeiramente,
é importante definir o que se entende como gênero e sexo. Conforme Coral
Herrera, escritora e doutora em Humanidades e Comunicação pela Universidade
Carlos III de Madrid (Espanha), gênero é uma criação da cultura e sexo da
natureza, geralmente, associado à genitália.
Por
exemplo, gênero inclui papéis e expectativas que a sociedade tem sobre
comportamentos, pensamentos e características que acompanham o sexo atribuído a
uma pessoa. Segundo Maria Trumpler, diretora do departamento LGBT+ da
Universidade de Yale (EUA), este é um conceito relativamente recente.
"A
crença de que as pessoas são homens ou mulheres tem apenas 200 ou 300 anos. Eu
diria que surgiu na Europa no século 18, quando os governos começaram a querer
classificar as pessoas", disse Trumpler à BBC News Mundo, o serviço em
língua espanhola da BBC.
Diante
disso, pesquisadores da comunidade LGBTQIAPN+ classificaram que dentro da sigla
existem algumas categorias. Basicamente, a nomenclatura divide em dois grandes
grupos: identidade de gênero e orientação sexual.
• Identidade de gênero diz respeito à
experiência interna e individual relacionada ao gênero com o qual a pessoa se
identifica (masculino, feminino, não-binário, agênero ou fluido). Quando a
identidade de gênero de uma pessoa corresponde ao seu sexo biológico, dizemos
que essa pessoa é cis. Quando, por outro lado, a pessoa se identifica com um
gênero diferente do sexo que lhe foi atribuído ao nascer, trata-se de pessoa
trans.
• Orientação sexual diz respeito à atração
que se sente por outros indivíduos. Ela geralmente também envolve questões
sentimentais, e não somente sexuais.
• Há ainda a expressão de gênero que pode
ser considerada a forma que a pessoa manifesta socialmente sua identidade de
gênero, por meio da sua identificação nominal, suas roupas, seu cabelo, a forma
de usar a voz, a forma de expressão do corpo. Ela não aponta o gênero, a
orientação ou a identidade necessariamente.
Apesar
de socialmente associada à comunidade gay, a arte drag não tem a ver com gênero
ou sexualidade e também não é uma expressão de gênero. Um homem hétero pode se
montar para fins artísticos e mulheres, gays ou não, também. A vertente drag
king é o oposto: geralmente mulheres vestidas de homens exagerando o lado
masculino.
"Quando
a gente fala de expressão de gênero, a gente fala de uma coisa que vive no
nosso dia a dia, as drags não vivem de drags no seu dia a dia. É um personagem
e gênero não é personagem. Eu me monto assim para performances
artísticas", explicou Lorelay Fox, drag youtuber e consultora do programa
"Amor e Sexo" da TV Globo.
<><>
Quais são as orientações sexuais?
As
orientações sexuais podem ser múltiplas, porém as cinco mais comuns são:
heterossexual, homossexual, bissexual, assexual e pansexual.
• Heterossexual: uma pessoa heterossexual
é alguém que sente atração por pessoas do gênero oposto ao seu. Assim, as
relações heterossexuais são as que acontecem entre uma mulher e um homem.
• Homossexual: uma pessoa homossexual é
alguém que sente atração e se relaciona com pessoas do mesmo gênero que o seu.
Por exemplo, as relações entre duas mulheres ou entre dois homens. O termo
homoafetivo também é usado para definir as relações de casais que formados por
duas pessoas do mesmo gênero.
• Bissexual: as pessoas bissexuais são as
que sentem ligação emocional e sexual por pessoas dos dois ou mais gêneros,
como pessoas cis ou trans.
• Assexual: no caso das pessoas assexuais
pode existir pouco ou mesmo nenhum interesse em ter relacionamentos sexuais com
outras pessoas.
• Pansexual: pessoas pansexuais sentem
atração romântica e sexual por pessoas independente do gênero.
<><>
Quais são as identidades de gênero?
A
diversidade das identidades de gênero são infinitas, já que elas representam a
pluralidade das identidades de gênero. Existem três mais comuns:
• Cisgênero: é o termo usado para definir
as pessoas que se identificam com o gênero associado ao seu sexo biológico. Uma
pessoa cisgênero se sente confortável e pertencente ao gênero de nascimento,
ela vive e se expressa conforme com o gênero atribuído por suas
características.
• Transgênero: são pessoas que não se
identificam com o gênero que lhes foi atribuído ao nascimento, não se
identificam com as características (físicas e/ou sociais).
• Não binário: as pessoas não-binárias são
aquelas que não se sentem enquadradas e identificadas com os gêneros
tradicionais, ou seja, não se identificam como mulher ou homem. Existem
variações na não-binariedade. Há quem sinta que não pertence a nenhum dos
gêneros tradicionais (masculino ou feminino), há quem sinta que pertence ao
dois ou em um momento, um, depois, outro, há também quem se identifique com
outros gêneros.
Fonte:
g1

Nenhum comentário:
Postar um comentário