quinta-feira, 19 de dezembro de 2024

Telegram promove conteúdo extremista a usuários, revela estudo obtido pela BBC

plataforma de rede social Telegram usa um algoritmo que promove conteúdo extremista, segundo um novo estudo obtido com exclusividade pela BBC.

O estudo da entidade americana em defesa de direitos civis Southern Poverty Law Center (SPLC) descobriu que o recurso "canais similares", criado no ano passado, recomenda canais com conteúdo radical até mesmo quando usuários estão navegando em canais sobre celebridades ou sobre tecnologia.

Um professor mostrou à BBC que, em poucos instantes, foi capaz de encontrar uma pessoa que estava disposta a exportar para o Reino Unido uma submetralhadora, por 850 libras (cerca de R$ 6,6 mil).

Telegram disse que usuários "apenas recebem conteúdo com o qual escolhem se engajar" e que a plataforma remove milhões de itens considerados danosos diariamente.

O fundador do Telegram, o bilionário russo Pavel Durov, está sendo investigado na França por não conseguir conter o uso da plataforma por criminosos. Ele nega todas as acusações.

O Telegram — conhecido por ser um aplicativo de mensagens que permite bastante sigilo — possui um bilhão de usuários. Eles podem criar grupos com até 200 mil pessoas.

Pesquisadores da SPLC investigaram 28 mil canais de Telegram para seu relatório "As Recomendações Tóxicas do Telegram".

O estudo detectou que pessoas buscando conteúdos banais recebiam recomendação de conteúdos radicais. E pessoas que já buscavam conteúdo extremista — como conspirações antigoverno — recebiam sugestões de conteúdo ainda mais radical, como grupos de antissemitismo e nacionalismo branco.

A pesquisadora-chefe Megan Squire fez uma demonstração de como o algoritmo do Telegram funciona pesquisando por "Donald Trump" em uma conta recém-criada na plataforma.

Imediatamente surgiram nas recomendações de "canais semelhantes" vários canais promovendo a conspiração Q-Anon — que alega falsamente que Trump está em uma guerra secreta contra pedófilos adoradores de Satanás na elite do governo, do mundo dos negócios e da mídia.

Outra pesquisa por "revoltas no Reino Unido" exibiu um meme sobre Adolf Hitler como o primeiro resultado, seguido por sugestões para uma série de canais administrados por grupos violentos de direita radical.

"Alguns desses grupos são bem ativos. Os usuários no Telegram não estão apenas recebendo memes, eles estão sendo atraídos para eventos reais. Eles estão participando de eventos presenciais com outras pessoas", disse Squire.

Nas horas após um ataque com faca em Southport em agosto, que provocou tumultos em todo o Reino Unido, usuários do Telegram estiveram entre os primeiros que enviaram convocações para protestos, junto com falsas alegações de que o suposto agressor era um imigrante que havia solicitado asilo.

Squire disse à BBC que a pesquisa mostrou que o Telegram virou uma "ameaça digital".

"Em uma escala de um a 10, o Telegram eu diria que é um 11. Ele está distribuindo enormes quantidades de conteúdo criminoso e extremista. É extremamente perigoso na minha opinião", disse ela.

Elies Campo, um ex-funcionário que fez parte do círculo de decisões do Telegram por seis anos, disse à BBC que cobrou Pavel Durov sobre material extremista em 2021.

"Sua posição era que não cabe a uma plataforma como a nossa decidir quem deveria se manifestar. Estava claro que ele não queria dedicar mais recursos a isso", disse Campo.

"Acho que se ele pudesse escolher, escolheria mais uma posição em que não precisasse moderar nada."

O professor David Maimon da Georgia State University, que passou seis anos estudando conteúdo ilegal no Telegram, disse que há dezenas de milhares de canais oferecendo de tudo — desde ferramentas para golpes até armas.

"O Telegram é definitivamente uma das plataformas mais importantes que os criminosos estão usando hoje em dia para atividades criminosas", disse ele.

Ele mostrou à BBC como, momentos após postar uma mensagem dizendo que precisava de "uma Uzi e uma espingarda", um vendedor postou uma foto de uma Uzi e disse que poderia "entregá-la rapidamente" para um endereço em Belfast, na Irlanda do Norte, em dois ou três dias.

As autoridades francesas acusam Pavel Durov de cumplicidade em casos de tráfico de drogas, crime organizado e compartilhamento de imagens de abuso infantil no Telegram. Ele está atualmente em liberdade sob fiança e não tem permissão para deixar a França.

O Telegram diz que leva conteúdo extremista e ilegal muito a sério e que suas equipes de moderação e sua ferramenta de inteligência artificial removem milhões de peças de conteúdo considerado nocivo todos os dias.

Ele diz que seus usuários recebem apenas o conteúdo que assinam — já que o Telegram não "injeta ou promove conteúdo".

"O recurso 'sugestões de canal' mostra apenas canais sobre o mesmo tópico que o usuário já segue. Essa abordagem garante que os usuários sejam apresentados apenas ao conteúdo com o qual escolheram se envolver. Isso é completamente diferente de como outras plataformas fazem sugestões", disse a empresa.

O Telegram disse que "ele não amplifica o conteúdo, mas mostra sugestões baseadas em tópicos vinculados às escolhas do usuário".

 

¨      Como Facebook restringiu acesso a notícias de Gaza durante guerra com Israel

Facebook restringiu severamente a capacidade dos veículos de notícias palestinos de alcançar o público durante a guerra entre Israel e Gaza, de acordo com uma pesquisa da BBC.

Em uma análise abrangente dos dados do Facebook, descobrimos que os canais de imprensa nos territórios palestinos — em Gaza e na Cisjordânia — sofreram uma queda acentuada no engajamento do público desde outubro de 2023.

A BBC também teve acesso a documentos vazados que mostram que o Instagram — outra plataforma de propriedade da Meta — aumentou a moderação dos comentários de usuários palestinos após outubro de 2023.

A Meta, dona do Facebook, afirma que qualquer insinuação de que suprimiu deliberadamente determinadas vozes é "inequivocamente falsa".

Desde o início da guerra entre Israel e Gaza, apenas alguns jornalistas de fora tiveram permissão para entrar no território palestino de Gaza, e só puderam fazer isso escoltados pelo Exército israelense.

As redes sociais preencheram a lacuna para aqueles que queriam ouvir mais vozes de dentro de Gaza. As páginas do Facebook de canais de notícias, como a Palestine TV, a agência de notícias Wafa e a Palestinian Al-Watan News — que operam a partir do território da Cisjordânia —, se tornaram uma fonte vital de atualizações para muitas pessoas ao redor do mundo.

A BBC News Arabic, serviço de notícias em árabe da BBC, compilou dados de engajamento nas páginas do Facebook de 20 importantes organizações de imprensa baseadas na Palestina no ano que antecedeu os ataques do Hamas a Israel em 7 de outubro de 2023, e no ano seguinte.

O engajamento é uma medida importante do impacto que uma conta de rede social está tendo, e de quantas pessoas estão vendo seu conteúdo. Ele inclui fatores como o número de comentários, reações e compartilhamentos.

Durante um período de guerra, é de se esperar que o envolvimento do público aumente. No entanto, os dados mostraram um declínio de 77% após os ataques do Hamas em 7 de outubro de 2023.

A Palestine TV tem 5,8 milhões de seguidores no Facebook. Os jornalistas da emissora compartilharam com a gente estatísticas que mostram uma queda de 60% no número de pessoas que veem suas publicações.

"A interação foi totalmente restringida, e nossas postagens deixaram de chegar às pessoas", diz Tariq Ziad, jornalista do canal de televisão.

No ano passado, os jornalistas palestinos levantaram temores de que seu conteúdo online estivesse sendo alvo de shadow banning pela Meta — em outras palavras, sendo restringido ou escondido de usuários, sem que estes o percebam.

Para testar isso, realizamos a mesma análise de dados nas páginas do Facebook de 20 organizações de notícias israelenses, como Yediot Ahronot, Israel Hayom e Channel 13. Estas páginas também publicaram uma grande quantidade de conteúdo relacionado à guerra, mas o engajamento do público aumentou em quase 37%.

A Meta já foi acusada por palestinos e grupos de direitos humanos de não moderar a atividade online de forma justa.

Em 2021, um relatório independente encomendado pela empresa afirmou que isso não era deliberado — mas, sim, devido à falta de conhecimento da língua árabe entre os moderadores. Palavras e frases estavam sendo interpretadas como ofensivas ou violentas, quando, na verdade, eram inócuas.

Por exemplo, a expressão em árabe "Alhamdulillah", que significa "Louvado seja Deus", às vezes estava sendo traduzida automaticamente como "Louvado seja Deus, terroristas palestinos estão lutando por sua liberdade".

Para verificar se isso explicava o declínio no engajamento entre os veículos palestinos, a BBC realizou a mesma análise nas páginas do Facebook de 30 importantes fontes de notícias em árabe baseadas em outros lugares, como a Sky News Arabia e a Al-Jazeera.

No entanto, estas páginas registraram um aumento médio de quase 100% no engajamento.

Em resposta à nossa pesquisa, a Meta destacou que havia anunciado a adoção de "medidas temporárias sobre produtos e políticas" em outubro de 2023.

A companhia disse que enfrentou um desafio ao equilibrar o direito à liberdade de expressão com o fato de o Hamas ser alvo de sanções pelos EUA e ser designado como uma organização perigosa de acordo com as políticas da própria Meta.

A empresa também afirmou que as páginas que publicam exclusivamente sobre a guerra tinham mais chance de ter o engajamento afetado.

"Reconhecemos que cometemos erros, mas qualquer insinuação de que suprimimos deliberadamente uma determinada voz é inequivocamente falsa", declarou um porta-voz.

<><> Documentos vazados do Instagram

A BBC também conversou com cinco ex- e atuais funcionários da Meta sobre o impacto que, segundo eles, as políticas da empresa tiveram sobre usuários palestinos individuais.

Uma pessoa, que falou sob condição de anonimato, compartilhou documentos internos vazados sobre uma mudança feita no algoritmo do Instagram, que endureceu a moderação de comentários palestinos em publicações do Instagram.

"Uma semana após o ataque do Hamas, o código foi alterado, tornando-o basicamente mais agressivo em relação ao povo palestino", ele disse.

Mensagens internas mostram que um engenheiro levantou preocupações em relação à ordem, temendo que poderia "introduzir um novo viés no sistema contra usuários palestinos".

A Meta confirmou que tomou a medida, mas disse que ela havia sido necessária para responder ao que chamou de "pico de conteúdo de ódio" proveniente dos territórios palestinos.

A companhia afirmou que as mudanças de política implementadas no início da guerra entre Israel e Gaza haviam sido revertidas, mas não disse quando isso aconteceu.

Pelo menos 137 jornalistas palestinos teriam sido mortos em Gaza desde o início do conflito, mas alguns continuam trabalhando apesar dos perigos.

"Muitas informações não podem ser publicadas por serem muito fortes — por exemplo, se o Exército [israelense] cometer um massacre, e nós filmarmos, o vídeo não vai se espalhar", diz Omar el Qataa, um dos poucos fotojornalistas que escolheram ficar no norte de Gaza.

"Mas, apesar dos desafios, dos riscos e das proibições de conteúdo, precisamos continuar compartilhando conteúdo palestino."


Fonte: BBC News

 

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