terça-feira, 5 de novembro de 2024

Quais jornais apoiam Kamala ou Trump e o que eles dizem sobre os candidatos

Muitos jornais americanos publicaram editoriais neste fim de semana — o último antes da eleição americana, que acontece na terça-feira (5/11) — em que manifestam apoio a um dos candidatos na disputa presidencial: a democrata Kamala Harris ou o republicano Donald Trump.

Apoiar abertamente candidatos é uma tradição de jornais em alguns países, como Estados Unidos e Reino Unido.

Confira abaixo o que alguns do principais jornais americanos anunciaram em seus editoriais.

<><> Washington Post: nenhum candidato

O principal jornal da capital americana surpreendeu o mundo da política e seus próprios leitores ao anunciar que nesta eleição não vai apoiar nenhum dos candidatos.

O CEO do Washington Post, William Lewis, disse que a decisão de não apoiar nenhum dos candidatos foi um retorno "às nossas raízes de não apoiar candidatos presidenciais" e que o jornal estava encerrando essa prática daqui para frente.

A mudança rompe com décadas de tradição, com o jornal tendo apoiado um candidato na maioria das eleições presidenciais desde a década de 1970 — em todas as ocasiões com apoio ao candidato dos Democratas.

A decisão do jornal foi alvo de crítica de jornalistas do próprio jornal e do sindicato.

O próprio Washington Post noticiou — citando fontes anônimas — que funcionários do setor de editoriais já haviam redigido um artigo manifestando apoio do jornal a Kamala Harris que não foi publicado.

Citando as mesmas fontes, o jornal disse que a decisão de não publicar o endosso foi tomada pelo proprietário do jornal, o fundador da Amazon, Jeff Bezos.

Alguns jornalistas se demitiram e o jornal teria perdido milhares de assinantes, críticos à decisão.

Dias depois, Bezos publicou um artigo no qual argumentou que apoiar um candidato cria uma "percepção de parcialidade" e não "muda a balança" de uma eleição.

"Nenhum eleitor indeciso na Pensilvânia dirá: 'Vou seguir o que diz o Jornal A'. Nenhum", escreveu Bezos.

"O que os apoios presidenciais realmente fazem é criar uma percepção de parcialidade. Uma percepção de não independência. Acabar com eles é uma decisão baseada em princípios, e é a correta."

<><> The Washington Times: Trump

O segundo maior jornal da capital americana, o conservador Washington Times, anunciou seu apoio a Donald Trump.

"Trump passou sua carreira construindo coisas e empregando pessoas. Ele concorreu à Casa Branca em 2016 não para enriquecer — ele já era bilionário — mas para retribuir ao seu país. Ele foi atacado como nenhum outro chefe executivo por uma razão simples: ele se recusa a fazer o que a máquina manda", escreve o jornal.

"O ex-presidente foi espionado, investigado, auditado e examinado mais de perto do que qualquer outro candidato na história da nossa república. O FBI revistou sua casa, bisbilhotando os pertences de sua esposa e filho adolescente. Trump foi levado a julgamento por crimes ridículos diante de um juiz em conflito e um júri tendencioso."

"Ele até levou um tiro na cabeça, mas se levantou, desafiador, jurando 'lutar, lutar, lutar'. Aquele momento capturou quem ele é. Em vez de se encolher diante da oposição, ele se comprometeu a vencer a eleição e quebrar a máquina."

<><> The New York Times: Kamala

O jornal com maior número de assinantes dos Estados Unidos — o New York Times — anunciou em seu editorial que apoia Kamala Harris. O jornal já apoiou candidatos republicanos no passado, mas desde 1960 ele sempre apoia democratas na disputa presidencial.

Em editorial pubilcado neste domingo, o jornal pede que os americanos ponham fim à era Trump.

"Você já conhece Donald Trump. Ele não é apto para liderar. Observe-o. Ouça aqueles que o conhecem melhor. Ele tentou subverter uma eleição e continua sendo uma ameaça à democracia", diz o jornal.

"Ele mente sem limites. Se for reeleito, o partido republicano não o conterá. Trump usará o governo para perseguir oponentes. Ele perseguirá uma política cruel de deportações em massa. Ele causará estragos nos pobres, na classe média e nos empregadores. Outro mandato de Trump prejudicará o clima, destruirá alianças e fortalecerá autocratas."

Em outro editorial, em setembro, o jornal disse que Kamala Harris é a única escolha "patriótica" possível para os eleitores.

"Ela pode não ser a candidata perfeita para todos os eleitores, especialmente aqueles que estão frustrados e irritados com as falhas do nosso governo em consertar o que está quebrado — do nosso sistema de imigração às escolas públicas, aos custos de moradia e à violência armada. No entanto, pedimos aos americanos que comparem o histórico de Harris com o de seu rival."

<><> New York Post: Trump

Após os tumultos em Washington em janeiro de 2021, o Washington Post havia dito que Trump não tinha mais capacidade de liderar os EUA.

Mas nesta eleição, o jornal de Nova York mudou de opinião e passou a apoiar o republicano.

"Sim, muitos o acham ofensivo — e nós dizemos que é justo: ele pode ser ridiculamente hiperbólico. Mas antes que a Covid causasse estragos pelo mundo, os resultados do primeiro mandato de Trump eram salários que cresciam notavelmente mais rápido que a inflação, o menor desemprego em 50 anos, uma fronteira segura e paz no exterior", escreve o editorial.

"O mundo está à beira de uma guerra generalizada. Hoje, Trump exibe a mesma força e vigor que ele exibiu em 2016, apesar do vergonhoso e inédito uso do sistema de justiça contra ele, duas tentativas de assassinato e a constante e muito familiar onda de ataques histéricos da mídia contra ele.”

<><> Wall Street Journal: nenhum candidato

O jornal americano Wall Street Journal — o principal do mercado financeiro — publicou dois editoriais esta semana, cada um deles analisando um dos candidatos.

Mas o jornal não anunciou apoio a nenhum deles. O jornal tem uma tradição de não apoiar candidatos. Ele segue essa política desde 1928.

"Que escolha presidencial os dois principais partidos políticos dos Estados Unidos ofereceram ao país", diz o jornal.

"A democrata é uma progressista da Califórnia, escolhida no último minuto, que parece despreparada para um mundo em chamas. O republicano é Donald Trump, que ainda nega ter perdido em 2020 e pouco fez para tranquilizar os eleitores indecisos de que seu segundo mandato será mais calmo do que seu amargo primeiro."

Sobre Kamala Harris, o jornal escreveu que uma vitória sua seria "um quarto mandato ao presidente Barack Obama".

"Ela fez uma campanha suficientemente competente em pouco tempo, e derrotou Donald Trump no único debate. Se eleita, ela traria mais energia para a Presidência do que Biden", diz o jornal.

"Mas temos procurado em vão por sinais de que ela romperia, ou mesmo moderaria, o excesso progressivo que define o atual Partido Democrata."

"Muitos americanos veem tudo isso e ainda votarão em Harris porque acham que mais quatro anos de Trump são um risco maior. Não temos ilusões sobre as falhas de Trump e o risco que elas representam. Mas os eleitores também têm motivos para temer a teimosia da esquerda moderna, com sua coerção regulatória, imperialismo cultural, estatismo econômico e desejo de tirar a independência judicial. Se Harris perder, esse terá sido o motivo."

Sobre Trump, o jornal diz: "Os oponentes dizem que um segundo mandato de Trump representa um risco muito grande, dadas suas falhas de caráter, e certamente não seria um retorno à 'normalidade'. Não acreditamos no argumento de que é fascista, e duvidamos que os democratas também acreditem."

"Nossa própria preocupação é se ele conseguirá resolver com sucesso os problemas urgentes do país. A maioria dos segundos mandatos presidenciais são decepcionantes, ou piores, e Trump não estabeleceu uma agenda clara além de controlar a fronteira e liberar a produção de energia dos EUA."

<><> Los Angeles Times: nenhum candidato

Assim como o Washington Post, o maior jornal da Califórnia — o Los Angeles Times (LA Times) — também se viu envolvido com uma polêmica nesta eleição.

A direção do jornal anunciou que não apoiaria nenhum candidato. Depois do anúncio, a diretora de editoriais do LA Times renunciou.

"Estou renunciando porque quero deixar claro que não concordo com o silêncio", disse Mariel Garza à Columbia Journalism Review. "Em tempos perigosos, pessoas honestas precisam se levantar. É assim que estou me levantando."

De acordo com Garza, o LA Times havia planejado apoiar Harris, mas o plano foi bloqueado pelo dono do jornal, o bilionário Patrick Soon-Shiong, que é empresário do setor farmacêutico e de biotecnologia.

Após a renúncia de Garza, Soon-Shiong rejeitou essa afirmação, escrevendo nas redes sociais que ele havia "fornecido a oportunidade" para o conselho editorial do jornal "de redigir uma análise factual de todas as políticas positivas e negativas de cada candidato durante seus mandatos na Casa Branca e como essas políticas afetaram a nação".

Ele disse que o conselho "escolheu permanecer em silêncio" em vez de seguir sua sugestão.

<><> The Economist: Kamala

A revista The Economist não é americana — ela é britânica. Mas é uma das publicações mais influentes em diversos círculos políticos e econômicos dos Estados Unidos. E a revista tem a tradição de manifestar apoios a candidatos americanos.

Nos últimos 30 anos, a revista apoiou republicanos em apenas duas ocasiões: Bob Dole em 1996 e George W. Bush em 2000. Em todas as outras ocasiões, a Economist apoiou candidatos democratas.

"Um segundo mandato de Trump traz riscos inaceitáveis", escreveu a revista em editorial esta semana. "Se o Economist tivesse um voto, nós o daríamos a Kamala Harris."

"Na próxima semana, dezenas de milhões de americanos votarão em Donald Trump. Alguns o farão por ressentimento, porque acham que Kamala Harris é uma marxista radical que destruirá seu país. Alguns são movidos pelo orgulho nacional, porque Trump inspira neles a crença de que, com ele na Casa Branca, a América se manterá firme. No entanto, alguns optarão friamente por votar em Trump como um risco calculado", diz a revista.

"Este último grupo de eleitores, que inclui muitos leitores do Economist, pode não ver Trump como uma pessoa com quem gostariam de fazer negócios, ou um exemplo para seus filhos. Mas eles provavelmente pensam que quando Trump foi presidente, ele fez mais bem do que mal."

"Esta revista vê esse argumento como imprudentemente complacente. Ao eleger Trump como líder do mundo livre, os americanos estariam fazendo uma aposta arriscada na economia, no estado de direito e na paz internacional. Não podemos quantificar a chance de algo dar terrivelmente errado: ninguém pode. Mas acreditamos que os eleitores que minimizam isso estão se iludindo."

Sobre Kamala, o Economist diz que ela é uma candidata "estável" e que possui "falhas, mas nenhuma delas que a desqualifique" para ser presidente.

"É difícil imaginar Harris sendo uma presidente sensacional, embora as pessoas possam sempre surpreender. Mas não conseguimos imaginá-la causando uma catástrofe."

 

¨      Os EUA no fio da navalha

Os Estados Unidos, e boa parte do mundo, estão em suspense aguardando o resultado das eleições americanas na terça-feira, 5 de novembro. O guru das pesquisas, Nate Silver, apontava nesse sábado, às 10h45, em seu boletim, um quadro de 50% de chances para o candidato republicano e para a candidata democrata, mas com a indicação de recuperação de Kamala Harris nas duas últimas semanas. “Neste ponto, há pesquisas novas o suficiente para que seja difícil saber exatamente o que está influenciando o modelo, mas Harris está ganhando em nossa previsão, e está convergindo para uma previsão verdadeiramente 50/50. Um forte conjunto de pesquisas do YouGov, mais uma pesquisa do Washington Post mostrando-a à frente por 1 ponto na Pensilvânia, são certamente parte do motivo. Sua probabilidade de vitória permanece ligeiramente abaixo da de Trump, mas é a mais alta em duas semanas”, diz Silver.

Ele acredita que a batalha da Pensilvânia, o estado-pêndulo com mais votos no Colégio Eleitoral (19) será decisiva para apontar o novo presidente. Sua última compilação mostrava Trump ligeiramente à frente com 48,3% dos votos, contra 48% de Kamala Harris. O corpo-a-corpo nas principais cidades da Pensilvânia será decisivo, assim como em Wisconsin (também com 19 votos no Colégio Eleitoral), onde Harris vencia com 48,6% a 47,7%. Quem fizer a maioria dos 538 votos do Colégio, ou seja, quem fizer maioria de 270 votos, é o presidente.

Mas Nate Silver fez uma constatação importante esta semana. Para ele foi um erro estratégico a escolha do governador de Minesota, Tim Waltz, para vice de Kamala, em vez do também governador democrata da Pensilvânia, Josh Shapiro. Popular, Shapiro como vice teria garantido, com folga, os 19 votos do Colégio da Pensilvânia. Já Waltz, com Minesota, garante 10 votos, e sua suposta influência sobre os eleitores do meio-oeste não ficou comprovada.

Os dois principais jornais americanos já marcaram posição. Em editorial desse sábado, o “New York Times” é categórico contra Trump:

<<< “Vote para acabar com a era Trump”

“Você já conhece Donald Trump. Ele não é apto para liderar. Observe-o. Ouça aqueles que o conhecem melhor. Ele tentou subverter uma eleição e continua sendo uma ameaça à democracia. Ele ajudou a derrubar Roe, com consequências terríveis. A corrupção e a ilegalidade do Sr. Trump vão além das eleições: é todo o seu “ethos”. Ele mente sem limites. Se for reeleito, o Partido Republicano não o conterá. O Sr. Trump usará o governo para perseguir oponentes. Ele perseguirá uma política cruel de deportações em massa. Ele causará estragos nos pobres, na classe média e nos empregadores. Outro mandato de Trump prejudicará o clima, destruirá alianças e fortalecerá autocratas. Os americanos devem exigir melhor. Vote”, concluiu o editorial.

Já o “Washington Post”, jornal controlado por Jeff Bezos, dono da Amazon, que se posicionou neutro nesta eleição, sem indicar um candidato, abriu sábado as páginas para um libelo do colunista de política, Dana Milbank. O título do artigo é sugestivo: “Quem somos nós, América?”. O subtítulo é: “Se escolhermos Trump desta vez, ninguém poderá alegar que foi enganado ou desavisado”.

A seguir, um trecho da abertura:

“Na Ellipse, no mesmo local de onde Donald Trump despachou uma multidão violenta para o Capitólio em 2021, dezenas de milhares de pessoas, de todas as idades e cores, se reuniram em paz na terça-feira à noite, acenando pequenas bandeiras americanas. Milhares a mais estavam na encosta que levava ao Monumento a Washington”.

“Kamala Harris, protegida por vidro à prova de balas em três lados e atiradores empoleirados em cima de um caminhão, fez seu último e melhor discurso para sua candidatura. A vice-presidente falou as palavras que definem este momento”.

“Donald Trump passou uma década tentando manter o povo americano dividido e com medo um do outro. É isso que ele é”, ela disse, com um dedo indicador no ar. “Mas, América, estou aqui esta noite para dizer: não é isso que somos”.

“Em quatro dias, a nação se olhará no espelho e responderá à pergunta que não pode mais adiar: Quem somos nós?”.

“Em 2016, muitos americanos não sabiam no que estavam se metendo com Trump. Expectativas de uma vitória fácil de Hillary Clinton embalaram muitos em um senso de complacência”.

“Em 2020, após uma resposta fracassada à pandemia e um colapso econômico, os americanos rejeitaram Trump”.

“Mas agora Trump está de volta pela terceira vez, mais sombrio e errático do que nunca, e ele deixou perfeitamente claro o que planeja fazer se retornar ao poder. Se a América escolher Trump desta vez, não será nenhuma aberração”.

“Desta vez, ninguém pode alegar ter sido enganado ou desavisado. Desta vez, será difícil alegar que os democratas não tiveram um candidato forte ou que ela não fez uma boa campanha. Harris gera entusiasmo em massa, não cometeu grandes erros e apresentou poderosamente o caso contra Trump”.

“Por meio de nossos votos, ou por não votarmos, estamos afirmando inequivocamente quem somos como povo”.

A sorte está lançada. Trump é um perigo para a democracia no mundo.

 

Fonte: BBC News Mundo/JB 

 

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