sexta-feira, 29 de novembro de 2024

Intolerância religiosa e associação com criminalidade: os preconceitos que a cultura negra ainda sofre no Brasil

No Brasil, a cultura negra ainda enfrenta uma série de preconceitos enraizados que refletem as desigualdades históricas e estruturais vividas pela população negra. Esses preconceitos se manifestam de diversas formas, desde a demonização de religiões de matriz africana até a associação equivocada entre a cultura negra e criminalidade, que perpetua estigmas nocivos.

A seguir, confira 6 preconceitos que a cultura negra ainda sofre no Brasil:

•                        Demonização das religiões afro-brasileiras

Religiões de matriz africana, como o Candomblé e a Umbanda, carregam significados profundos e uma rica herança cultural, mas enfrentam intolerância religiosa e preconceito no Brasil. Muitos brasileiros veem essas práticas como "cultos ao mal" ou "feitiçaria", uma visão enraizada na desinformação e no preconceito. Esse estigma resulta na demonização de símbolos sagrados, como os orixás, e contribui para ataques e depredações de terreiros, intensificando a marginalização de seus praticantes.

•                        Desvalorização das expressões musicais negras

Estilos musicais de origem negra, como funk e rap, muitas vezes são associados à "violência" e enfrentam preconceito elitista. Essas expressões culturais, que refletem as vivências e identidades da população negra, são desvalorizadas e tratadas como "ameaças" em vez de serem reconhecidas como patrimônios culturais e artísticos legítimos.

•                        Folclorização das festas e tradições negras

Festas e celebrações com raízes africanas, como a Congada, o Maracatu e o Afoxé, são frequentemente estereotipadas como meros "atrativos turísticos", esvaziadas de sua profundidade cultural e religiosa. Essa folclorização reforça uma visão exótica e superficial, que ignora a importância histórica e espiritual dessas tradições.

Associação entre cultura negra e criminalidade

A associação equivocada entre cultura negra e criminalidade é um dos estigmas mais prejudiciais. Eventos culturais negros, como bailes funk, rodas de capoeira e encontros de rap, são frequentemente associados ao crime, reforçando um imaginário social que vê pessoas negras como "perigosas". Isso não só desqualifica essas manifestações culturais, mas também aumenta a repressão policial nessas comunidades.

•                        Invisibilização da moda e estética negra

Características estéticas negras, como cabelos crespos, tranças e turbantes, que possuem significados culturais e identitários profundos, frequentemente enfrentam preconceito. Em ambientes formais, a estética negra ainda é estigmatizada como "não profissional" ou "desleixada", pressionando muitas pessoas negras a alterar suas características naturais para evitar discriminação.

•                        Apropriação cultural

A cultura negra também costuma ser apropriada sem o devido reconhecimento. Elementos culturais como o uso de turbantes, aspectos do hip-hop e a estética do funk são absorvidos por outros grupos, mas sem valorizar a contribuição das pessoas negras. Essa apropriação reforça o apagamento cultural, pois desassocia esses elementos de suas origens e significados, transformando eles em "moda" ou "tendência".

 

•                        Entenda o que é racismo silencioso - e veja se você pratica no seu dia a dia

O racismo silencioso é um conjunto de atitudes e comportamentos discriminatórios sutis e, muitas vezes, quase imperceptíveis que reforçam desigualdades raciais sem manifestações explícitas de preconceito. Ele pode ocorrer em interações diárias, em ambientes profissionais, educacionais e sociais, sendo caracterizado pela exclusão indireta, insinuações e suposições negativas baseadas em estereótipos raciais.

Enquanto o racismo explícito é evidente e direto, o racismo silencioso frequentemente se disfarça em ações e palavras que parecem neutras, mas que carregam uma base preconceituosa.

Comentários como "você fala muito bem para uma pessoa negra" são exemplos de atitudes que, ainda que inconscientes, revelam preconceitos subjacentes. Além disso, o racismo silencioso está presente em práticas de exclusão social disfarçada, como a tendência de evitar ou desconfiar de pessoas negras em ambientes predominantemente brancos, ou na negação de oportunidades profissionais e educacionais com justificativas que desconsideram a qualificação da pessoa afetada.

Esse tipo de racismo, justamente por ser sutil e menos visível, pode passar despercebido, também sendo muitas vezes difícil para quem o pratica reconhecer o seu comportamento.

<><> Exemplos de racismo silencioso no cotidiano

# Microagressões:

- são comentários ou atitudes que, de forma implícita, perpetuam estereótipos raciais. Exemplos incluem elogiar uma pessoa negra por ser "bem articulada" ou questionar a origem de um indivíduo negro com a frase "de onde você realmente é?". Embora pareçam inofensivos, esses comentários subentendem que a pessoa negra não é esperada naquele contexto.

# Suposições automáticas:

- outro exemplo comum é supor que uma pessoa negra seja menos qualificada para cargos de alta posição ou que seu lugar no ambiente acadêmico ou profissional tenha sido obtido necessariamente através de políticas de cotas, sem considerar seu mérito individual.

# Evasão de temas relacionados à raça:

- pessoas brancas muitas vezes evitam abordar questões raciais por medo de desconforto, o que é uma forma de racismo silencioso. Issopode impedir discussões importantes sobre igualdade e justiça racial.

<><> Como identificar e combater o racismo silencioso

Para combater o racismo silencioso, é importante exercitar a autorreflexão e estar atento aos próprios comportamentos e pensamentos. Isso inclui se questionar sobre a forma como você percebe e trata pessoas negras.

Ler sobre questões raciais, ouvir relatos de pessoas negras e praticar a empatia são formas essenciais de desenvolver uma consciência mais inclusiva. Reconhecer o racismo silencioso é o primeiro passo para eliminar atitudes racistas do cotidiano.

 

•                        Conheça história da santa negra que vendeu joias compradas com dinheiro de prostituição e doou aos pobres

Nascida na África Ocidental, no Benim, Rosa Egipcíaca foi trazida ao Brasil como escravizada em 1725, aos seis anos de idade. Vendida e submetida a anos de exploração, sua trajetória é uma das mais fascinantes do Brasil colonial. Rosa não apenas enfrentou as violências da escravidão e da prostituição forçada, mas também transcendeu essas condições, tornando-se uma figura considerada santa por muitos devotos.

Durante oito anos, ela viveu como escrava doméstica no Rio de Janeiro antes de ser enviada para Minas Gerais, onde foi submetida à prostituição, uma prática comum imposta às mulheres escravizadas na época. Entre abusos e exploração, Rosa acumulou joias e roupas que, anos mais tarde, seriam vendidas para ajudar os pobres.

Quanto tinha cerca de 30 anos, enfrentou uma grave enfermidade no estômago que causava intensas dores. Nesse mesmo período, Rosa começou a ter visões místicas. Essa experiência a levou a mudar de vida: abandonou a prostituição, vendeu suas roupas e joias e doou aos pobres.

Rosa passou a frequentar missas e começou a ser reconhecida como profetisa em cidades mineiras como Mariana, Ouro Preto e São João del Rei. Inspirada por Santa Maria Egipcíaca, também uma ex-prostituta convertida em santa segundo a tradição, Rosa adotou o nome Rosa Maria Egipcíaca da Vera Cruz.

Em 1751, retornou ao Rio de Janeiro e foi acolhida pelo Convento de Santo Antônio, onde recebeu orientação do padre Francisco Gonçalves Lopes, conhecido como "Xota-Diabos". Nesse mesmo período, ela fundou o Recolhimento do Parto, uma casa que abrigava mulheres, especialmente ex-prostitutas e negras.

Após aprender a ler, Rosa escreveu "Sagrada Teologia do Amor Divino das Almas Peregrinas", o primeiro livro conhecido de autoria de uma mulher negra no Brasil. A obra, composta por mais de 250 páginas, narrava suas experiências místicas e sua relação com o divino. Rosa relatava ter recebido o título de "Mãe da Justiça" do menino Jesus e afirmava ser a esposa da Santíssima Trindade.

Apesar de sua devoção e das ações caridosas, Rosa não escapou da vigilância da Igreja. Suas práticas religiosas, que misturavam elementos cristãos e afro-brasileiros, despertaram suspeitas entre as autoridades religiosas. Em 1762, a Igreja Católica a acusou de ser herege e falsa santa.

Denunciada ao Tribunal da Inquisição, ela foi enviada para Lisboa junto ao padre Francisco. Durante o julgamento, Rosa não desmentiu suas visões nem suas declarações místicas. Em uma visão, Rosa disse que um dilúvio iria inundar o Rio de Janeiro e que apenas os que estivessem no Recolhimento do Parto seriam salvos, pois o local se transformaria em uma arca.

Rosa Egipcíaca permaneceu presa pelo Santo Ofício até sua morte por causas naturais, deixando um legado que mescla fé, resistência e controvérsia. No ano passado, a escola de samba do Rio de Janeiro, Unidos do Viradouro, homenageou Rosa no Carnaval 2023.

 

Fonte: Redação Nós

 

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