terça-feira, 12 de novembro de 2024

Geoeconomia da globalização versus geopolítica imperialista

A geoeconomia da globalização, de fato, limita a expansão geopolítica de grandes potências econômicas, principalmente por afetar o desempenho e a valorização das ações de empresas transnacionais e, por consequência, seu poder de capitalização. A interdependência econômica criada pela globalização coloca as empresas e, por extensão, as economias nacionais, em uma posição vulnerável às oscilações do mercado, tensões geopolíticas e instabilidades econômicas globais. Isso interfere diretamente no capital necessário para financiar novos investimentos e promover um crescimento sustentado. No caso atual da ascensão ao governo norte-americano da extrema-direita nativista e populista, é interessante analisar a contraposição das forças de mercado, no caso, representadas por cotações das ações de big techs transnacionais em bolsa de valores relevante.

A promessa de campanha de Donald Trump de elevar muito as tarifas sobre produtos importados da China, e o avanço da inflação nos EUA, projetado por economistas, são problemas na expansão global das big techs. Seis das “sete magníficas” – Alphabet (controladora do Google) com valor de mercado US$ 2,2 trilhões, Amazon (US$ 2,2 trilhões), Apple (US$ 3,4 trilhões), Meta (US$ 1,4 trilhão), Microsoft (3,1 trilhões), Nvidia (US$ 3,6 trilhões) e Tesla (US$ 926 bilhões) – investiram em doações para a democrata Kamala Harris, exceto a Tesla, do bilionário Elon Musk, maior apoiador de Donald Trump, inclusive com uso e abuso de seu X.

Em janeiro de 2021, após a invasão ao Congresso americano, Donald Trump foi banido das redes sociais Facebook e Instagram, controladas pela Meta. Por isso, essa rede social foi chamada de “inimigo do povo” no início da campanha de Donald Trump. Também foi banido do antigo Twitter, mas depois tornou-se X sob a gestão de Elon Musk em apoio à ultradireita. Ele defende seu interesse de haver um relaxamento regulatório em questões anticoncorrenciais, de privacidade e monitoramento de conteúdos.

As big techs esperam logo a revogação de um decreto de regulamentação da Inteligência artificial nos EUA, assinado por Joe Biden, em novembro de 2023. Outra medida prática de Donald Trump deve ocorrer no comando de agências reguladoras, mais rígidas com as big techs na gestão Joe Biden, acusando-as de monopólios em comércio eletrônico, celulares, buscas na internet etc. em processos antitruste e de privacidade. O relacionamento com investidores bilionários do Vale do Silício também favorece o cenário de relaxamento de leis antitruste. O bilionário eleito conhece o segmento de capital de risco e critica a postura regulatória mais dura por reduzir os movimentos de aquisições de startups por big techs.

Um enfraquecimento de leis nacionais e de órgãos reguladores nos EUA levaria as decisões em torno das big techs, inclusive os processos antitruste e de privacidade, aos estados americanos. O vácuo regulatório seria ocupado pelas unidades federativas e criaria “paraísos regulatórios” ocupados por empresas de tecnologia.

O estado da Virginia, por exemplo, já ofereceu benefícios fiscais para a expansão de centros de dados, as bases para o avanço da Inteligência artificial. Outro é o Arizona, onde gigantes de semicondutores como a americana Intel, a sul-coreana Samsung e a taiwanesa TSMC receberam bilhões de dólares em incentivos da gestão de Joe Biden para instalar fábricas de semicondutores, reduzindo a dependência de componentes da China. Donald Trump não deve alterar a injeção de recursos na indústria local de semicondutores, mas deve redirecioná-la às empresas norte-americanas como a Intel. No entanto, é necessário analisar alguns dos principais fatores dessa relação de confronto entre a pretensão geopolítica ultranacionalista do novo governo norte-americano e a reação geoeconômica globalista de empresas transnacionais. Algumas têm valores de mercado somente abaixo dos quatro maiores PIBs: EUA (US$ 27,361 trilhões), China (US$ 17,795 trilhões), Alemanha (US$ 4,456 trilhões), Japão (US$ 4,213 trilhões). A soma dos valores de mercado das ações das “sete magníficas” dá US$ 16,8 trilhões, valor quase equivalente ao PIB anual da China!

A globalização econômica, com suas redes complexas de cadeias de suprimentos e interdependência de mercados, significa as ações de empresas transnacionais serem altamente sensíveis a crises regionais, políticas e econômicas. As tensões comerciais, sanções e restrições geopolíticas entre grandes potências (como EUA e China) costumam resultar em queda dos preços das ações dessas empresas. Essa desvalorização reduz o valor de mercado das empresas com operações internacionais. Ao diminuir seu poder de capitalização, afeta a capacidade de realizar novos investimentos em inovação e infraestrutura para crescimento.

As incertezas geopolíticas, como sanções, guerras comerciais, nacionalizações e mudanças abruptas nas políticas econômicas, criam um ambiente desfavorável para investimentos de longo prazo. A confiança dos investidores é essencial para a valorização das ações e para a estabilidade dos fluxos de capital. Quando os investidores percebem riscos geopolíticos elevados, eles tendem a vender as ações das empresas expostas a esses riscos. Essa fuga de capital limita as oportunidades de financiamento para as empresas mais afetadas.

Empresas transnacionais dependem de um ciclo econômico global estável e de um crescimento sustentado para maximizar seus lucros e expandir suas operações. No entanto, a geoeconomia globalizada impõe uma dependência complexa das condições macroeconômicas internacionais com ciclos de incerteza e fragilidade. Em tempos de crise global, como a GCF de 2008 ou a crise pandêmica de 2020, houve forte impacto nas ações de empresas transnacionais, refletindo diretamente na capacidade de investimento de longo prazo e afetando suas operações em nível global.

A geoeconomia global, ao estabelecer uma rede de fluxos financeiros e de investimentos internacionais, gera interdependência econômica entre países. Cria um cenário no qual grandes potências econômicas, como EUA, China e União Europeia, precisam equilibrar seus interesses econômicos globais com suas ambições geopolíticas. Medidas de expansão ou proteção, como imposição de sanções ou tarifas, enfraquecem os próprios ativos das empresas nacionais em mercados globais. Se reduzem o valor de mercado dessas empresas, tornam-se uma barreira para o financiamento de políticas de expansão ou influência geopolítica no longo prazo.

A globalização pressiona as empresas a buscar rentabilidade e maximizar o valor para os acionistas em um curto prazo. Essa postura conflita com estratégias de investimentos de longo prazo e de desenvolvimento sustentável. Muitas empresas transnacionais, especialmente aquelas com operações em setores intensivos em capital, energia e manufatura, enfrentam a dificuldade de equilibrar a rentabilidade com a necessidade de adaptação às novas exigências regulatórias ambientais e sociais. Essa pressão, imposta pela necessidade de responder a mercados globais, retira o apoio delas às políticas geopolíticas.

A expansão de novos atores econômicos e o ressurgimento de estratégias de autossuficiência regional (como a iniciativa “Made in China 2025” ou a política industrial da União Europeia) criam uma fragmentação da globalização econômica. Esse processo impõe novas barreiras para empresas transnacionais necessitadas de enfrentar diferentes regulamentações e políticas de proteção regional. A fragmentação também reforça a rivalidade geopolítica e assim cria incertezas para o investimento e para a valorização de ativos transnacionais.

A geoeconomia da globalização, com sua interdependência complexa e sensibilidade a crises e conflitos, efetivamente, cria barreiras para a expansão geopolítica das grandes potências econômicas. As empresas transnacionais, ao serem influenciadas pelas oscilações geopolíticas e tensões globais, enfrentam dificuldades em manter a valorização das suas ações e, consequentemente, sua capacidade de financiar novos investimentos. Para superar essas limitações, é necessário reavaliar as estratégias de investimento de longo prazo diante as políticas de proteção econômica. É possível sustentar a expansão geopolítica sem comprometer a resiliência financeira das empresas transnacionais?

Além disso, iniciativas de fortalecimento de mercados financeiros locais e desenvolvimento de uma maior autossuficiência econômica são estratégias capazes de mitigar alguns desses impactos. Talvez elas agravem a fragmentação da globalização e intensifiquem as rivalidades geopolíticas.

Veremos se, de fato, as empresas transnacionais atuarão como um contrapeso ao poder estrutural da geopolítica imperialista. Buscarão ainda influenciar a definição de normas globais para favorecer a abertura e reduzir o protecionismo?

 

¨      Mas, afinal, o que é o G20? Por Carol Proner

O Rio de Janeiro se prepara para receber o G20 nos dias 18 a 19 de novembro. Com anúncios de boas-vindas em diversos pontos da cidade, o Brasil espera exercer a presidência de turno encantando as delegações internacionais com as belezas da cidade maravilhosa e uma agenda ambiciosa em matéria social e ambiental. Para além dos temas próprios de regulação do comércio e finanças globais, a liderança brasileira coordena uma pauta dedicada ao combate à fome e à pobreza, reação às mudanças climáticas e tributação cooperativa internacional.

Mas afinal, o que é o G20? 

Diferentemente de outras agremiações do organograma ONU ou da União Europeia, o Grupo dos 20 provém de uma sucessão de fórmulas implementadas pelas maiores economias com o objetivo de regular o sistema financeiro internacional.  Originalmente, o G20 tinha o propósito de estabelecer princípios e regras que pudessem favorecer a estabilidade da economia mundial e o desenvolvimento de um sistema financeiro mais previsível e equilibrado. Esperava-se que, pela liderança das grandes economias, certa uniformidade de regras pudesse ser alcançada e, consequentemente, existisse maior previsibilidade nas ações da comunidade internacional. Nesse sentido, o G20 surgiu como um fórum de reunião dos Ministros da Fazenda e Presidentes dos Bancos Centrais das maiores economias do mundo, dedicando-se a temas eminentemente financeiros.

Ao mesmo tempo, acompanhando as instituições de Bretton Woods, outros espaços multilaterais eram estimulados. Na origem, prevaleciam também as chamadas “rodadas de negociação da OMC” e a imposição das cláusulas de certo equilíbrio do comércio mundial, como “a cláusula do tratamento nacional” e da “cláusula da nação mais favorecida”, ambas aplicadas aos mais diversos temas de comércio e finanças. Havia expectativa, ao menos em teoria, de que o comércio multilateral pudesse criar compensações, diminuir assimetrias e preservar a paz, e o G20 serviria de fórum para facilitar as relações entre as maiores econômicas na definição das regras do jogo.

As palavras-chave em cada encontro orbitam ao redor da “economia global”, em especial em torno do comunicado aprovado em 2004, na reunião de Berlim, realçando uma variedade da política neoliberal que inclui, como princípios a serem alcançados, i) a eliminação de restrições no movimento de capital internacional; ii) a desregulação; iii) a privatização; iv) a garantia de direitos de propriedade intelectual e de outros direitos de propriedade; e v) a liberalização do comércio global (OMC e outros acordos de comércio).

Já em 2006, ganhou destaque o tema da prosperidade e as questões que envolviam reformas domésticas para um crescimento sustentado, energia, mercado global das commodities, reforma do Banco Mundial e Fundo Monetário Internacional, bem como o impacto das mudanças demográficas decorrentes do envelhecimento da população. A reunião de 2006, na cidade de Melbourne, na Austrália, foi especialmente marcada por protestos antiglobalização. Em 2007, na África do Sul, os temas passaram à evolução econômica global e doméstica, reforma das instituições de Bretton Woods, espaço fiscal, commodities e estabilidade financeira, temas discutidos com certa inércia e sem antever as drásticas mudanças que ocorreriam no ano seguinte. 

Com o impacto da crise de 2008, chamada “crise das hipotecas subprime”, várias premissas das regras de comércio foram contestadas e o tema da governança global passou a ser prioritário, com destaque aos mecanismos de prevenção e reforma das instituições financeiras e ênfase na participação das economias emergentes. O G20 passou a receber maior relevância e a União Africana tornou-se integrante desde então, conformando a atual composição de membros.  Paralelamente e como reação às contradições do G20, a crise mundial de 2008 também levou à criação de outras parcerias econômicas e políticas internacionais. Exemplo dessa multiplicação de fóruns intergovernamentais, representantes da chamada multipolaridade, é o surgimento dos BRICS, um bloco de países emergentes formado pelo Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, hoje em expansão.

Este entendimento elementar, de que o G20 é um fórum para a cooperação e a consulta em temas pertinentes ao sistema financeiro internacional a partir de experts de bancos centrais e ministros da economia e finanças de cada economia, esclarece os propósitos e os limites do que se pode esperar do G20 em cada nova reunião ministerial. E também desvenda sua principal contradição, a manutenção das instituições, regras e do poder unipolar. Outra mudança surgida no rescaldo da crise de 2008 foi a ampliação do escopo das discussões do G20, que incorporou a chamada Trilha de Sherpas (representantes de chefes de Estado), para tratar de temas sociais, em paralelo à Trilha de Finanças, para tratar dos temas financeiros debatidos desde a concepção deste fórum. Para refletir a crescente importância do G20 naquele momento histórico e sua evolução, as Cúpulas do Grupo de 20 passaram a receber não mais apenas os ministros encarregados da política econômica e monetária, mas também os chefes de Estado, presidentes e primeiros-ministros de seus países membros.

A Reunião Ministerial de 2008, inclusive, foi sediada no Brasil, na cidade de São Paulo (embora a Cúpula de Chefes de Estado tenha ocorrido nos Estados Unidos). Naquela ocasião, o então Ministro da Fazenda brasileiro, Guido Mantega, questionou o consenso pró-austeridade formado em resposta à crise dos subprime, e defendeu, ao invés disso, políticas fiscais e monetárias anticíclicas. Além disso, ele enfatizou a responsabilidade dos países desenvolvidos em relação aos países emergentes.

Atualmente, a composição do grupo é de 19 países, incluindo os EUA, China, Rússia, Índia e as maiores economias da Europa, entre outros, e 2 órgãos regionais, a União Europeia e a União Africana. Juntos, os membros do G20 e representam cerca de 85% do PIB e dois terços da população do mundo.

Acompanhando a evolução das reuniões a partir de 2008, são destaque a preocupação com a retomada sustentável do emprego e do crescimento (Cúpula do G20 - Londres – 2009), agendas específicas como o combate à corrupção (Cúpula do G20 - Toronto – 2010), medidas para evitar o recrudescimento do protecionismo comercial e medidas de manipulação cambial, além de regras novas de regulação bancária e preocupação com a desvalorização do dólar (Cúpula do G20 - Seoul – 2010).  A agenda anticorrupção é cumulativa e inclui o lançamento, em 2010, de um Plano de Ação internacional que serviria de modelo para a legislação regulatória em diversos países. Paralelamente ao debate sobre sistema monetário internacional, ganharam destaque temas sociais, sobre segurança alimentar e agricultura (Cúpula do G20 – Cannes – 2011) e o tema da governança global e do financiamento, por parte do FMI, aos países emergentes. Também surgem algumas propostas que conectam os países dos BRICS como financiadores do modelo de desenvolvimento do futuro (Cúpula do G20 – Los Cabos – 2012).

As políticas protecionistas e a desvalorização competitiva entre futuras potências mundiais foram tema da Cúpula de 2013, incluindo propostas de empréstimos soberanos como parte de um conjunto de medidas para estimular o desenvolvimento (Cúpula do G20 – São Petersburgo – 2013). Essa cúpula na cidade russa foi dominada por questões envolvendo a guerra civil na Síria e o papel da ONU diante das intervenções e conflitos bélicos.  As cúpulas sucessivamente trabalharam o chamado Acordo-Quadro em relação ao crescimento forte, sustentável e equilibrado,  à facilitação da criação de empregos, à reforma da moeda e dos sistemas de regulação e à supervisão financeira. Em 2013 e 2014 também esses eram os temas centrais, assim como o prolongamento dos efeitos da crise de 2008 e os vazamentos ou sistemas de evasão fiscal (Cúpula do G20 – Brisbane – 2014).

Os chamados três “ís”, “inclusão, investimento e implementação” foram prioridade em 2015, com destaque para preocupações com mudanças climáticas e desafios globais, como terrorismo e a crise dos refugiados (Cúpula do G20 – Antália – 2015). Em 2016, a centralidade dos debates incluiu os temas da inovação, interconectividade e inclusão, com o endosso de “Plano de Ação do G20 sobre Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável” e a “Estratégia do G20 para Crescimento do Comércio Global”, como o objetivo de atribuir maior transcendência para as decisões do G20 diante da comunidade internacional (Cúpula do G20 – Hangzhou – 2016).

As cúpulas seguintes também priorizaram cooperação multilateral e a transcendência das decisões do grupo para a comunidade internacional. Em 2017 destacam-se iniciativas do G20 para a África, bem como ações nos temas climáticos, atualização do Acordo de Paris e implementação da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, bem como migrantes e refugiados. O tema do combate ao terrorismo e ações financeiras também foi destaque (Cúpula do G20 – Hamburgo – 2017). 

O meio ambiente e a crise climática passaram a ser prioridade em todas as seguintes cúpulas. Em 2018 também houve protagonismo da agenda das mudanças climáticas e do futuro alimentar sustentável, cruzando-se com temas transversais e o papel dos países em desenvolvimento para atingir objetivos globais (Cúpula do G20 – Argentina – 2018). Em 2019, o grupo voltou a discutir a insatisfação quanto ao sistema de governança global, prevalecendo propostas em torno do livre comércio, da inovação, do combate às desigualdades e soluções para os desafios ambientais e sociais (Cúpula do G20 – Osaka– 2019). 

Em 2020, em razão da pandemia da Covid-19, a cúpula de Riad foi realizada virtualmente e dominada pela preocupação planetária em coordenar soluções diante de um sistema frágil e vulnerável. Além das questões sociais e laborais, especialmente destacadas em 2020, os líderes se dedicaram a coordenar esforços para apoiar economias mais vulneráveis, principalmente na África (Cúpula do G20 – Riad – 2020). Em 2021 o lema foi “pessoas, planeta, prosperidade”, incluindo questões ligadas ao desenvolvimento macroeconômico global e à crise de saúde, soluções para desafios climáticos e ambientais e superação da pandemia da Covid-19. Os líderes acordaram a aceitação formal da “Declaração de Matera”, sobre segurança alimentar e a meta de plantio de árvores até 2030 (Cúpula do G20 – Roma – 2021).

Nos anos seguintes, em 2022 e 2023, as cúpulas em Bali e em Nova Deli foram realizadas já no contexto bélico da Ucrânia, da crise de abastecimento energético europeu e diante de forte contestação das regras e sanções unilaterais produzidas pelas distorções do sistema financeiro internacional. Os temas amplos foram saúde, economia digital e agenda energética em 2022 (Cúpula do G20 – Bali – 2022) e desenvolvimento verde, crescimento sustentável, resiliência, tecnologia, reforma das instituições multilaterais em 2023 (Cúpula do G20 – Nova Deli – 2023).

Em 2024, a presidência do grupo é brasileira sob o lema “construindo um mundo justo e um planeta sustentável”. Como agendas prioritárias, destacam-se: inclusão social e combate à fome, transição energética e desenvolvimento social, ambiental e econômico e reforma das instituições de governança global.  Sem dúvidas, a enumeração dessas prioridades indica que a liderança brasileira está especialmente interessada em promover transformações nas relações entre países, de modo a garantir às nações emergentes (o chamado Sul Global) uma participação justa e equitativa nos principais debates do século XXI. Estão em pauta, entre outros temas, a mudança climática e preservação do meio ambiente, o combate à miséria e às desigualdades nas escalas nacional e internacional, e a busca da paz, que é urgente diante dos devastadores conflitos armados na Ucrânia e no Oriente Médio. Para atingir essas metas, o Brasil reconhece a necessidade de reestruturação das instituições globais criadas no contexto do pós-guerra no século passado, como o Banco Mundial, o FMI, a OMC e a própria ONU.

Entre as principais propostas do governo estão: i) a criação de um grupo de trabalho sobre Mobilização Global Contra as Mudanças Climáticas; ii) o estabelecimento de uma Força-tarefa para Aliança Global contra a Fome e a Pobreza; e iii) a Cooperação Tributária Internacional. Esta última proposta, no âmbito da Trilha Financeira, é iniciativa do Ministro da Fazenda Fernando Haddad, que traz como pauta prioritária a taxação de fortunas bilionárias. Recentemente, esses esforços se concretizaram na forma de um compromisso internacional a favor da taxação em no mínimo 2% das fortunas pessoais superiores a US$1bi, que promete uma arrecadação global de US$250bi ao ano.

Ao longo de seus 15 anos de história, o G20 evoluiu de um grupo informal dedicado tão somente a discussões de natureza financeira para um dos principais fóruns para debates intergovernamentais estratégicos. Em seu âmbito são desenvolvidas iniciativas globais ligadas não apenas à economia, mas também ao desenvolvimento sustentável, à justiça social, e à paz e segurança global. Por outro lado, não se pode ignorar a crescente frustração quanto às instâncias tradicionais de cooperação internacional, que muitas vezes fracassam ou tardam a atingir seus objetivos. Em resposta a tais insuficiências, o chamado mundo multipolar se reorganiza em torno de outros fóruns, liderados por países emergentes e pautados por seus interesses e peculiaridades. Mesmo assim, sem menosprezo às merecidas ressalvas ao G20 e ao sistema de governança global no qual está inserido, é preciso aproveitar as oportunidades de diálogo que este fórum ainda proporciona. O atual governo faz questão de anunciar que “o Brasil está de volta” e de assegurar o protagonismo brasileiro nos grandes debates internacionais. Nesse contexto, a culminância da presidência brasileira do G20 na vindoura Cúpula do Rio de Janeiro deve ser comemorada, tendo proporcionado algumas conquistas valiosas na luta por um mundo mais justo. 

 

Fonte: Por Fernando Nogueira da Costa, em A Terra é Redonda/Brasil 247

 

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