Tales Ab'Sáber: “Rede social é uma
indústria cultural de propaganda fascista”
Em entrevista ao
programa Brasil Agora, da TV 247, Tales Ab'Sáber, professor do
Departamento de Filosofia da Unifesp e autor de O Soldado Antropofágico:
Escravidão e Não-Pensamento no Brasil, fez uma profunda análise sobre o
cenário político brasileiro dos últimos anos. Com uma visão crítica, Ab'Sáber
expôs a construção histórica que permitiu a ascensão de figuras como Jair
Bolsonaro e os desdobramentos que levaram ao atual estado de degradação
política com Pablo Marçal e outros personagens.
Ab'Sáberafirma que
"ainda não foi feita com cuidado uma historiografia consequente do que
aconteceu no Brasil nos últimos dez anos". Para ele, o processo que
permitiu que "um delinquente desqualificado" ocupasse o espaço da
política no Brasil tem raízes profundas, e não é algo recente. Ele remonta a um
"complexo processo que tem origem na quebra do circuito
institucional" que ocorreu entre 2014 e 2016. Durante esse período, tanto
o lavajatismo quanto o antipetismo ganharam força e se articularam em duas frentes:
uma institucional e outra popular.
O professor descreve
como a grande mídia e a indústria cultural de informação apoiaram e avalizaram
ações institucionais como a Lava Jato, que ele classifica como "uma grande
armação histórica", além de legitimar o discurso de uma direita radicalmente
antidemocrática e autoritária, que emergiu das ruas junto com antigos
defensores da ditadura militar.
"Esse era o mal
horroroso que valia a pena todo o movimento", diz Ab'Sáber, referindo-se
às críticas aos governos petistas, que, segundo ele, promoveram uma gestão
modernizante que inseriu as massas no trabalho e aumentou a renda popular.
Ab'Sáber sublinha que
o bolsonarismo foi resultado desse processo de degradação, apoiado por setores
liberais e econômicos do país, como a Faria Lima, agronegócio e
milicianos.
"O bolsonarismo
reorganizou à direita setores sociais violentos, de muitos modos", afirma,
destacando a unificação de grupos sociais violentos que, até então, estavam
dispersos. Ele critica duramente o papel de setores do poder político e econômico
que "fizeram ouvidos moucos" para a ascensão do neofascismo.
Na pandemia, Tales
relembra que Bolsonaro expôs a natureza fascista de seu governo ao dizer que
não compraria vacinas e ao incentivar que as pessoas, especialmente os mais
pobres, trabalhassem sem proteção. "Esse é o neofascismo", declara,
enfatizando a crueldade com que o governo lidou com a crise sanitária,
colocando deliberadamente a população em risco. Ele vê essa atitude como parte
de uma lógica fascista de violência social, legitimada por um pacto social
degradante.
Ab'Sáber destaca o
papel das redes sociais nesse contexto, afirmando que elas se tornaram uma
indústria cultural de propaganda fascista. Para ele, as redes criam um espaço
em que figuras como Bolsonaro e outros se posicionem como mercadoria para
consumo e personagens de uma narrativa de choque.
Ao analisar Pablo
Marçal, candidato à Prefeitura de São Paulo pelo PRTB, o professor afirma que
"ele é o Hitler, o Goebbels, o Silvio Santos e a própria mercadoria que
ele vende: vento para as pessoas". Segundo ele, além de deter o poder de
mobilizar e radicalizar discursos autoritários, as redes sociais não apenas
substituíram os partidos políticos, mas tornaram-se os novos centros de poder
político, desequilibrando o sistema eleitoral e democrático. A força dessas
plataformas permitiu que candidatos como Pablo Marçal, com milhões de
seguidores, tivessem uma vantagem desproporcional nas disputas políticas,
enquanto outros candidatos têm apenas poucos segundos na televisão para se
comunicar. Segundo Ab'Sáber, essa nova dinâmica demonstra como a comunicação
política se transformou em uma ferramenta controlada por interesses que
disseminam o neofascismo.
Tales Ab'Sáber, em sua
análise, nos convida a refletir sobre o papel das redes sociais e da mídia na
construção de narrativas políticas que favorecem a ascensão de discursos
autoritários, enquanto a sociedade enfrenta as consequências de um sistema
degradado e fascista.
¨
"A liberdade de
expressão será cada vez mais restrita", diz Lejeune Mirhan
Em entrevista ao
programa "Bom Dia 247" nesta terça-feira (17), o analista geopolítico
Lejeune Mirhan alertou sobre o que considera ser uma crescente restrição à
liberdade de expressão no cenário internacional. "A liberdade de expressão
será cada vez mais restrita", afirmou, referindo-se às recentes ações de
empresas de tecnologia dos Estados Unidos contra veículos de mídia russos.
Lejeune criticou
duramente a decisão da Meta Corporation de bloquear contas de diversas mídias
russas em suas plataformas, incluindo o canal RT e o grupo de mídia Rossiya
Segodnya. "As big techs são um grande instrumento do imperialismo e do
controle da informação", disse ele, enfatizando o papel dessas empresas na
limitação do acesso a diferentes perspectivas.
O analista defendeu o
RT como uma opção válida para quem busca informações mais equilibradas sobre
conflitos internacionais. "Obviamente, eles trazem uma visão pró-Rússia,
mas a verdade histórica não está mais com o Ocidente", argumentou. Para Lejeune,
o bloqueio dessas mídias faz parte de uma estratégia mais ampla de controle
narrativo por parte dos países ocidentais.
A decisão da Meta
ocorre em um contexto de crescente pressão sobre veículos de mídia russos no
Ocidente. De acordo com informações divulgadas pela rede NBC, a empresa baniu
globalmente o Rossiya Segodnya, RT e outras entidades relacionadas de suas
plataformas por "envolvimento em atividades de interferência
estrangeira". Desde o início do conflito na Ucrânia em 2022, cerca de 150
restrições diferentes foram impostas contra mídias e jornalistas russos,
segundo o Ministério das Relações Exteriores da Rússia.
Lejeune também
comentou sobre o conflito na Ucrânia, expressando otimismo cauteloso em relação
a uma possível resolução próxima. "Mas a guerra da Ucrânia tem data para
terminar. Ela acaba em 5 de novembro, após a eleição nos Estados Unidos, quando
as partes terão que conversar", previu ele, sugerindo que mudanças
políticas nos EUA poderiam influenciar o desenrolar do conflito.
Ao final da
entrevista, Lejeune reforçou a importância de manter abertas as vias de
informação e diálogo. "Sem acesso a múltiplas fontes de informação,
ficamos reféns de uma única narrativa, o que empobrece o debate público e a
compreensão dos fatos", concluiu.
¨ Quais são os limites da Liberdade de Expressão?
Constituição Federal
de 1988, artigo 5º, parágrafo IV: “É livre a manifestação do pensamento, sendo
vedado o anonimato”. Esse é o artigo que, para muitas pessoas, resume o direito
à liberdade de expressão, um conceito que tem sido muito debatido na sociedade
brasileira nos últimos anos. Mas até onde vai esse direito? Divulgação de informações
falsas e discursos de ódio contra minorias, por exemplo, podem ser defendidos à
luz deste artigo da Constituição?
O tema é tão sensível
que já vamos dar a resposta: não, nem tudo pode ser justificado como “liberdade
de expressão”. Esse direito não é absoluto e deve ser exercido nos limites da
lei, sob pena de caracterizar abuso de direito. Vamos explicar o porquê.
Para o defensor
público que atua em Umuarama Cauê Bouzon Ribeiro, a liberdade de expressão
engloba a liberdade de crítica e de discordância, desde que respeitosa, sem
xingamentos e sem mentiras. “É interessante que a gente tenha discordância. A
gente mora em um país democrático, a discordância é o coração da democracia.
Mas a partir do momento em que a discordância vira discurso de ódio, a gente
tem que combater”. Para ele, com respeito é possível discordar e criticar
absolutamente tudo, mas o limite será sempre o direito do outro.
“O limite do direito
de liberdade de expressão se dá quando, sob essa pretensa liberdade, atinge-se
a honra, a dignidade ou mesmo a democracia. Inclusive existem crimes, previstos
no Código Penal, que definem a limitação da chamada liberdade de expressão,
como os crimes de injúria, difamação e calúnia”, explica o defensor público,
ele mesmo vítima de injúria em 2020, quando um morador da cidade usou as redes
sociais para comentar uma decisão do defensor.
“Ele utilizou uma
expressão que atingiu diretamente a minha honra e é exatamente este o limite da
liberdade de expressão. Além disso, disse que eu estaria em outro estado,
quando na verdade eu estava em Umuarama, trabalhando em prol da população
local, logo, ele mentiu, outro limite claro da liberdade de expressão”,
relembra. A notícia falsa e a ofensa ainda geraram outras manifestações em
grupos de whatsapp de moradores da cidade. O defensor teve a placa do carro
divulgada nestes grupos e chegou a receber ameaças. “A consequência da postagem
virtual dele foi real e séria, e esse é o perigo dos posts falsos e injuriosos.
É preciso destacar que as manifestações em redes sociais em nada diferem das
manifestações em revistas, jornais ou até mesmo orais. A injúria, a difamação e
a calúnia devem ser combatidas, seja no mundo real seja no mundo virtual.
Devemos, de uma vez por todas, eliminar o mito de que o que se faz por trás de
uma tela de computador ou de celular não tem consequências”.
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Saiba o que diz a lei
Os crimes de calúnia,
difamação e injúria estão previstos no Capítulo V do Código Penal (Decreto-Lei
2.848/1940), chamado de “Dos Crimes Contra A Honra”, e têm como possível
punição a pena de detenção e de multa. As penas podem ser aumentadas se o crime
for cometido na presença de várias pessoas ou por meio que facilite a
divulgação da calúnia, da difamação ou da injúria, ou, ainda, caso a vítima
seja: o Presidente da República ou chefe de governo estrangeiro; funcionário
público; Presidente do Senado Federal, da Câmara dos Deputados ou do Supremo
Tribunal Federal (STF); criança, adolescente, pessoa maior de 60 anos ou pessoa
com deficiência. A pena dobra se o crime for cometido por alguém que recebeu ou
iria receber uma recompensa financeira para cometê-lo, e triplica se o crime
for cometido ou divulgado “em quaisquer modalidades das redes sociais da rede
mundial de computadores”.
Outra lei importante
para estabelecer os limites da liberdade de expressão é a Lei 7.716/1989 (a
chamada “Lei dos crimes raciais”), que define os crimes resultantes de
preconceito de raça ou de cor. Recentemente, ela foi alterada pela Lei
14.532/2023 para dispor que, “injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o
decoro, em razão de raça, cor, etnia ou procedência nacional” é crime com penas
que podem ser aumentadas quando estes crimes ocorrerem “em contexto ou com
intuito de descontração, diversão ou recreação” ou “quando praticados por
funcionário público (...) no exercício de suas funções ou a pretexto de
exercê-las”.
Outro acréscimo
importante à Lei 7.716/1989 é o artigo 20-C, que dispõe que “na interpretação
desta Lei, o juiz deve considerar como discriminatória qualquer atitude ou
tratamento dado à pessoa ou a grupos minoritários que cause constrangimento,
humilhação, vergonha, medo ou exposição indevida, e que usualmente não se
dispensaria a outros grupos em razão da cor, etnia, religião ou procedência”.
Os Estatutos da Igualdade Racial (Lei 12.288/2010) e da Pessoa com Deficiência
(Lei 3.146/2015) também são instrumentos de combate à discriminação e de
proteção a estes grupos contra ataques de pessoas que ainda confundem
manifestações de preconceito com liberdade de expressão.
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Entenda a diferença:
¬¬¬¬ Injúria
– Crime previsto no artigo 140 do Código Penal: “Injuriar alguém,
ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro”. Trata-se de ofensa que atinge a honra
subjetiva, isto é, o modo como essa pessoa se reconhece e/ou se sente em
relação a si mesma. Quase sempre são xingamentos.
¬¬¬¬ Difamação
– Previsto no artigo 139 do Código Penal: “Difamar alguém,
imputando-lhe fato ofensivo à sua reputação”. Aqui, o ataque é a honra
objetiva, isto é, como os outros veem essa pessoa. Dizer que alguém pratica um
ato moralmente reprovável, como trabalhar bêbada ou sob efeito de drogas, por
exemplo, é uma difamação.
¬¬¬¬ Calúnia
– Crime previsto no artigo 138 do Código Penal: “Caluniar alguém,
imputando-lhe falsamente fato definido como crime”. É uma falsa acusação de
crime, dizer que alguém faz algo contra a lei penal.
Fonte: Brasil 247/DPE-PR
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