terça-feira, 17 de setembro de 2024

Os prós e contras da semana de 4 dias de trabalho no Brasil

Durante seis meses, 19 empresas brasileiras participaram de um experimento para reduzir a jornada de trabalho. A ideia era que os funcionários trabalhassem apenas quatro dias por semana, porém mantendo 100% do salário e da produtividade.

Com base nos relatos de líderes e funcionários de algumas dessas companhias, o g1 elaborou uma lista de prós e contras da semana de 4 dias de trabalho.

Entre os desafios, trabalhadores relataram dias mais corridos e a necessidade de aprender as funções dos colegas, para cobri-los na folga. Ainda assim, todos concordam que os benefícios da jornada reduzida se sobressaíram.

O que dizem os participantes

          PRÓS

“A gente tem a ‘hora do foco’ diária. É um momento sem reunião, sem responder mensagens. A gente também tem feito reuniões mais concisas, mais rápidas, com menos gente”, detalha a diretora Roberta Faria, da Mol Impacto, empresa de produtos sociais.

Assim, “a área [que aderiu à semana de 4 dias] se tornou a mais eficiente da empresa, disparando na frente das outras”.

“Eu participei da minha primeira corrida de rua”, diz Rafaela Carvalho, funcionária da Mol. “Criei o hábito de fazer mais atividade física e também consigo visitar mais locais em São Paulo, posso ser turista na minha própria cidade.”

“Uso a folga para resolver questões burocráticas, fazer exames, coisas que precisam ser feitas em dias úteis”, comenta Emília Junqueira, coordenadora de projetos da Greco, empresa de design gráfico.

"As faltas e atrasos realmente melhoram bastante porque a pessoa consegue se organizar melhor. É claro que se ocorre um acidente, tudo bem, mas as ausências sem justificativa diminuíram", afirma Eduardo Hagiwara, diretor geral do Hospital Indianópolis, que aderiu ao projeto com a área administrativa.

“É um diferencial muito grande da empresa. Todos os meus amigos falavam sobre isso, perguntavam como estava sendo. Todo mundo queria mandar currículo para a gente”, afirma Tadeu Carazza, associado do escritório Clementino e Teixeira Advocacia.

          CONTRAS

“A parte em que mais tivemos desafios foi a dos advogados que trabalham com processos porque eles têm prazos judiciais, audiências e compromissos com clientes atrelados a esses prazos. Às vezes, o advogado já fez a parte dele, mas depende de um documento que o cliente não entregou”, conta Soraya Clementino, sócia-fundadora do escritório Clementino e Teixeira.

“O ritmo de trabalho definitivamente aumenta e a pressão também porque a gente tem muita vontade de entregar resultado e fazer [o projeto] dar certo. O que funciona na prática é cortar as distrações”, afirma Rafaela, da Mol Impacto.

“Um precisa saber como cobrir o trabalho do outro”, destaca a diretora Roberta Faria.

“Todos nós tivemos que nos empoderar. O que o analista precisa saber para estar preparado para uma determinada reunião, no lugar do gerente?”, continua a funcionária Rafaela.

“Temos que pensar que a empreitada é coletiva. Não posso fazer o que estou com vontade no dia. Tenho que seguir o planejamento”, explica Cláudia Carmello, sócia-fundadora da agência de publicidade PiU Comunica.

“A gente contratou uma pessoa, mais no final do projeto, e uma ferramenta de inteligência artificial, de pesquisa de jurisprudência. Teve um custo inicial de 3 a 4% da nossa empresa, mas acredito que é um investimento baixo face ao tamanho do ganho”, diz Soraya, do escritório de advocacia.

 

          Semana de 4 dias: por que algumas empresas decidiram não manter todas as folgas após teste

Algumas empresas que participaram de um experimento sobre a semana de 4 dias de trabalho no Brasil precisaram fazer ajustes para permitir que os funcionários continuem atuando com uma jornada reduzida, ainda que não todas as semanas, após o teste de seis meses.

Um escritório de advocacia em São Paulo (SP) decidiu diminuir o número de folgas inicialmente previstas no projeto piloto. O descanso semanal foi substituído por apenas um dia livre no mês, além dos fins de semana e feriados.

“Começamos de maneira muito empolgada, mas não coube”, afirma Soraya Clementino, sócia-fundadora do escritório Clementino e Teixeira.

“A parte em que mais tivemos desafios foi a dos advogados que trabalham com processos porque eles têm prazos judiciais, audiências e compromissos com clientes atrelados a esses prazos. Às vezes, o advogado já fez a parte dele, mas depende de um documento que o cliente não entregou.”

O experimento em questão é uma iniciativa da "4 Day Week Brazil", parceira no Brasil da "4 Day Week Global", uma organização sem fins lucrativos que já fez vários testes parecidos ao redor do mundo. O objetivo é reduzir a jornada de trabalho, mantendo 100% dos salários e da produtividade.

Ao todo, 19 empresas concluíram a primeira edição do experimento no Brasil. Todas decidiram manter, permanentemente ou ainda como teste, a redução do expediente, mas algumas em menor escala, como o escritório de advocacia.

As companhias são de cinco cidades em quatro estados (SP, RJ, MG e PR) e participaram do projeto com, no máximo, 25 colaboradores. A maioria é da área de tecnologia, comunicação e consultoria, mas um hospital também participou, com funcionários da área administrativa.

A segunda edição está com inscrições abertas até o fim de setembro. E, além do investimento no projeto, que custa a partir de R$ 7 mil, as empresas participantes relataram gastos com contratações e tecnologia.

“Mas entendo que é um valor baixo face ao tamanho do ganho porque essas ferramentas e contratações permitirão, a longo prazo, absorver mais trabalho com a mesma equipe", pondera Soraya, do escritório de advocacia.

No escritório de advocacia, que tem 15 funcionários, alguns setores tiveram mais facilidade para reduzir a jornada, como a área administrativa e a dos advogados que trabalham com consultoria, conta o associado Tadeu Carazza.

É que essa equipe, da qual ele faz parte, analisa contratos, desenvolve documentos para adequação de uma empresa a alguma lei, resolve questões de compliance, entre outras funções que, normalmente, permitem que os prazos de entrega sejam negociados apenas com os clientes.

No entanto, após o fim do experimento, a decisão do escritório foi modificar o esquema de folgas para todos os funcionários.

A empresa substituiu a semana de 4 dias por um único dia de descanso por mês, mas, agora, a ideia é aumentar as folgas aos poucos.

“É uma questão de equidade. Quando alguém não está trabalhando, alguma atividade vai ficar sem ser feita e aí, se mais pessoas estiverem no escritório, mesmo que não sejam da área, elas podem ajudar. Fica mais fácil para todos conseguirem a folga”, diz Soraya Clementino.

A importância da colaboração entre os funcionários durante o experimento também foi destacada pela Mol Impacto, uma empresa de São Paulo (SP) que desenvolve produtos para ajudar causas sociais, como as revistinhas de doações vendidas em farmácias.

Após o piloto, a companhia decidiu manter a semana de 4 dias e, agora, pretende expandir para todos os colaboradores. Inicialmente, o teste foi feito com 13 dos 55 funcionários, que se dividiram em duplas, para um folgar na segunda e o outro, na sexta-feira.

Para o método dar certo, segundo a CEO Roberta Faria, “um precisa saber como cobrir o trabalho do outro”.

E isso significa, inclusive, em alguns casos, desempenhar tarefas que não fazem parte da sua lista original de atribuições.

Ainda assim, a diretora afirma que os funcionários não se importaram em aprender novas funções porque havia um espírito de equipe, para fazer o projeto funcionar. “Tivemos que dar mais autonomia, confiar mais nos colegas”, diz.

“Todos nós tivemos que nos empoderar. O que o analista precisa saber para estar preparado para uma determinada reunião, no lugar do gerente? E a postura do analista, geralmente, era de ‘me ensina, porque aí vai dar certo para todos nós’”, relata a funcionária Rafaela Carvalho.

<><> Dias mais corridos 🏃‍♀️‍➡️

Outra percepção comum entre as empresas participantes do projeto foi a de um ritmo mais acelerado nas horas efetivas de trabalho. Quase metade dos líderes e trabalhadores notaram esse aumento, de acordo com o relatório final do teste.

É que a proposta do experimento era diminuir os dias de serviço, mas sem, jamais, aumentar o número de horas trabalhadas por dia.

“Certamente, os dias ficaram mais corridos. Tem tudo a ver com eliminar distrações, mas o feedback é que o benefício de um dia de folga é muito grande, então vale a pena o esforço”, observa Cláudia Carmello, sócia-fundadora da agência de publicidade PiU Comunica.

A empresa, também de São Paulo (SP), tem 25 funcionários e faz parte do grupo de participantes que teve que dar um passo para trás para continuar com a jornada reduzida.

Inicialmente, a agência aderiu ao teste com uma parte dos funcionários folgando na quarta-feira e a outra, na sexta. Agora, o método mudou para todos descansarem às sextas, mas a cada 15 dias.

Para a empresa não ter que fechar neste dia da semana, os funcionários se revezam: uma parte deles folga na primeira sexta-feira do mês, por exemplo, e a outra, na sexta-feira seguinte.

“A gente percebeu que folgar de quarta não era o melhor modelo para a gente. Acontece coisa demais. De sexta, os próprios clientes pedem menos coisas, é mais parado. Resolvemos fazer isso para ter tempo de cuidar dos aprimoramentos e ver qual modelo vamos adotar de maneira fixa”, explica Cláudia.

Na Mol Impacto, empresa de produtos sociais, o que funcionou foi "cortar as distrações", diz a funcionária Rafaela Carvalho. Ela percebeu, inclusive, que começou a terminar os dias de trabalho com várias mensagens não lidas no WhatsApp, porque passou a evitar respondê-las durante o expediente.

“A gente tem a ‘hora do foco’ diária. É um momento sem reunião, sem responder mensagens. A gente também tem feito reuniões mais concisas, mais rápidas, com menos gente”, detalha a diretora Roberta.

No caso do escritório de advocacia, a semana de 4 dias ficou ainda mais puxada porque, na prática, os funcionários chegavam a extrapolar os 5 dias de trabalho antes da tentativa de reduzir a jornada, conta Soraya, a sócio-fundadora.

"Às vezes, os advogados precisam responder a clientes fora do horário, no fim de semana... Então, para nós, tirar um dia de trabalho significou reduzir mais do que 20% da jornada e, mesmo com as melhorias, as pessoas ficaram muito sobrecarregadas."

<><> Cumprir prazos é obrigatório 🗓️

O ritmo mais acelerado de trabalho também pode ser explicado pela necessidade de cada funcionário adiantar suas tarefas. Na agência de publicidade, eles não costumam desempenhar as funções do colega que está de folga.

“Não tem como. Cada um é técnico, então a gente se programa para fazer as entregas antes. [A substituição] é mais em caso de emergência, enviar algum e-mail, algo mais simples”, relata a gerente de mídia Carolina Giacomelli.

E, para que isso seja possível, todo o time precisa entender as prioridades e entregar as demandas dentro dos prazos. “É uma escadinha. Tem o atendimento ao cliente, o time de mídia, criação, e a gente conversa o tempo todo”, afirma.

“Temos que pensar que a empreitada é coletiva. Não posso fazer o que estou com vontade no dia. Tenho que seguir o planejamento”, explica Cláudia, a sócia-fundadora da agência.

Na Greco, empresa de design gráfico sediada em Belo Horizonte (MG), antecipar a produção também ajudou.

"A gente conseguiu se organizar para entregar todas as demandas até quinta-feira. Não poderíamos passar para segunda porque a ideia do projeto é manter 100% da produtividade", relata o dono Gustavo Greco.

É que todos os 22 funcionários da companhia folgam de sexta-feira, e isso será mantido após o teste.

“Ainda temos momentos de muitas entregas, e a gente não se culpa. Se a pessoa precisar muito ir trabalhar na sexta, por causa de algum evento, cliente, ela vai e depois folga em outro dia", diz Gustavo

<><> As decisões de cada empresa após o teste:

          Clementino e Teixeira, escritório de advocacia de São Paulo (SP)

- participou do projeto com todos os 15 funcionários

- semana de 4 dias virou 1 folga mensal

          Mol Impacto, empresa de produtos sociais de São Paulo (SP)

- participou do projeto com 13 dos 55 funcionários

- vai manter semana de 4 dias e tentar expandir para mais colaboradores

          PiU Comunica, agência de publicidade de São Paulo (SP)

- participou do projeto com todos os 25 funcionários

- semana de 4 dias virou 1 folga quinzenal

          Greco, empresa de design gráfico de Belo Horizonte (MG)

- participou do projeto com todos os 22 funcionários

- vai manter semana de 4 dias

 

•        'Short friday': sair mais cedo do trabalho às sextas já é realidade para alguns brasileiros; entenda sistema

O "sextou" do gerente de treinamentos Marcus Vieira começa mais cedo, às 13h. É que ele trabalha para uma indústria farmacêutica que adotou a política da "short friday", que reduz a jornada de trabalho às sextas e antecipa o início do fim de semana.

Não existe lei que regulamente especificamente este sistema, mas não é permitido descontar do salário as horas não trabalhadas.

<><> Cabe a cada empresa determinar:

          ☀️🌙 o horário para a liberação dos funcionários;

          ⏱️se haverá necessidade de compensação em outro dia da semana;

          ✍️ se o benefício constará do contrato;

          👷a quais áreas ele se aplica.

"Aproveito para colocar as coisas em ordem, sabe? Resolver uma pendência, cortar o cabelo, fazer uma consulta, coisas assim", conta Marcus, que recompensa as horas não trabalhadas nos demais dias da semana.

Empresas que aderiram ao sistema afirmam que as consequências são positivas, mas a implantação exige atenção às leis trabalhistas.

➡️ Na tradução para o português, "short friday" significa "sexta-feira curta". A cultura acompanha outra tendência no mundo corporativo: a valorização do bem-estar profissional, explica Victor Richarte, especialista em gestão de pessoas.

"Isso não tem a ver com gerações. É um movimento no qual se tem um posicionamento dos trabalhadores frente às realidades organizacionais."

Não é à toa que a procura por políticas mais flexíveis tem chamado tanto a atenção. Uma delas é a semana de quatro dias, que reduz a quantidade de dias trabalhados sem alterar o salário dos funcionários.

Esse benefício também não exige a compensação das horas não trabalhadas, como pode acontecer na "short friday".

"O que as empresas ofereciam antes já não é mais atrativo. Eles (funcionários) querem empresas que pensam no bem-estar, na saúde e que ofereçam flexibilidade", complementa Richarte.

<><> Horários não trabalhados recompensados

Foi para promover essas condições no ambiente de trabalho que a farmacêutica Takeda resolveu implantar a "short friday" em sua política interna.

Lá, apesar de o benefício não constar no contrato, os horários não trabalhados são recompensados ao longo da semana.

"Começamos com a 'summer friday' - saída antecipada às sextas de verão - e a gente viu que era um diferencial. Pensamos: 'Por que não estender?' Foi então que migramos para a 'short' em 2010", explica Eliane Pereira, executiva de recursos humanos da empresa.

Segundo ela, a farmacêutica oferece ainda outros quatro benefícios que envolvem a flexibilização do expediente: três dias de folga - além das férias - para usar ao longo de 1 ano, saída antecipada às vésperas de feriados, folga extra ao trabalhador em razão do aniversário de cada filho dele e folga extra ao trabalhador em razão do seu aniversário.

Um levantamento da consultoria Mercer Marsh Benefícios feito no primeiro semestre de 2023 com 850 empresas brasileiras identificou que 78% delas oferecem algum tipo de flexibilidade no trabalho. Deste grupo, 13% adotam a "short friday".

Participaram da pesquisa empresas dos setores financeiro, de tecnologia, de manufatura, bens de consumo não duráveis, de agropecuária e da área da saúde.

Quem também segue a tendência é a Bayer. A medida, implantada em 2011, é feita através da compensação de horas nos demais dias da semana e beneficia funcionários das áreas administrativas (comunicação, recursos humanos e tecnologia da informação).

Embora o horário padrão da "short friday" seja das 7h30 às 13h30, a empresa oferece aos funcionários a opção de entrarem até duas horas mais tarde, o que significa que eles podem sair duas horas mais tarde. A regra também é aplicada em vésperas de feriados nacionais.

Ainda segundo a Bayer, os funcionários podem aceitar ou não fazer parte da política.

💰 A 'short friday' vale a pena?

Além de simplesmente seguir uma tendência, reduzir o expediente às sextas pode refletir positivamente na imagem da empresa, segundo Richarte.

"Para a organização, cria uma imagem preocupada com o bem-estar, com a qualidade de vida e antenada com as necessidades atuais".

Ainda segundo as empresas participantes, apesar da redução das horas trabalhadas, os profissionais beneficiados acabam se tornando mais produtivos em suas funções.

"Isso trouxe um nível de comprometimento e engajamento maior. A gente sente isso, principalmente, nas nossas pesquisas [...]. As pessoas querem estar numa companhia que tenha os mesmo valores que ela", afirma a executiva de RH da Takeda.

Já na Bayer, a adesão "tem sido vista como um ponto de retenção e atração de talentos", afirma Erica Barbagalo, vice-presidente de recursos humanos na sede brasileira.

⚖️ O que diz a lei trabalhista?

Como não há leis que regulamentem a "short friday”, ela pode ser aplicada em diferentes mecanismos, como a redução do expediente ou a compensação das horas não trabalhadas em outros dias da semana.

"A redução de salários, com redução de jornada, só é possível mediante acordo coletivo de trabalho. No caso da 'short-friday', por ser uma proposta de bem-estar, ou será realizada mediante compensação destas horas ou realmente um benefício concedido pelo empregador", diz a advogada trabalhista Ana Gabriela Burlamaqui.

Caso o empregador não solicite o esquema de compensação, o contrato de trabalho não precisa ser alterado. Basta apenas implementar uma política interna.

🚨 Mas, atenção: após conceder o benefício, o empregador não poderá desistir da decisão e exigir o expediente como antes da redução sem a aprovação dos funcionários - desde que a política esteja prevista no contrato de trabalho - explica Ana Gabriela Burlamaqui.

Se a 'short friday' for implantada mediante compensação posterior das horas não trabalhadas, o contrato de trabalho precisará ser alterado, formalizando o regime de compensação nos termos da Consolidação das Leis do Trabalho. Caso contrário, não existem garantias de que a "short friday" permaneça.

 

Fonte: g1

 

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