sábado, 21 de setembro de 2024

Campanha de Pablo Marçal paga R$ 230 mil a produtor que ele diz ser seu sócio

O candidato à prefeitura de São Paulo Pablo Marçal (PRTB) afirmou ser sócio de Nahuel Gomez Medina em diversos vídeos postados neste ano – informação que também consta no site de Medina que vende cursos de produção audiovisual. O problema: Marçal não declarou oficialmente essa sociedade. A participação de Marçal na empresa de Medina não consta nem no registro junto à Receita Federal nem na declaração de patrimônio na Justiça Eleitoral.

Segundo a regra eleitoral, ser sócio oculto em empresas pode configurar falsidade ideológica eleitoral.

De acordo com apuração da Agência Pública, a campanha de Marçal a prefeito pagou R$ 230 mil a Medina para produzir vídeos. Extratos da Justiça Eleitoral mostram que os pagamentos foram feitos neste mês para Medina Maker, nome fantasia da empresa. Medina é o único sócio que consta no registro da produtora cinematográfica, localizada em Confresa, cidade de 35 mil habitantes no nordeste do Mato Grosso.

Segundo o advogado Fernando Tozi, o caso merece um olhar especial da Justiça Eleitoral. “Se ele [Marçal] é sócio oculto da empresa [de Medina], temos uma séria dúvida se estamos tratando de contratação do próprio candidato para a campanha. Sendo sócio ou não, dependendo de como tudo isso for feito, principalmente de como esta pessoa jurídica apoia ele, podemos estar diante de uma proibição expressa: o financiamento de campanha por pessoa jurídica ou um abuso de poder econômico”, explica.

Para o especialista em direito público e privado Tauat Resende, a omissão de informações sobre a propriedade ou sociedade em empresas, especialmente por candidatos, pode ser interpretada como falsidade ideológica eleitoral, conforme o Código Eleitoral (Lei 4.737/65, no artigo 350). “Esta legislação exige que todos os candidatos declarem seus bens e participações empresariais para garantir transparência. Se for comprovado que Marçal é sócio oculto em uma empresa e não declarar isso à Justiça Eleitoral, ele poderá estar violando a legislação eleitoral, podendo ser investigado pelo Ministério Público Eleitoral e enfrentar sanções, como impugnação de candidatura ou do mandato, caso seja eleito”, afirma.

“Além de violar a proibição de doações empresariais, essa prática pode ser vista como fraude ou lavagem de dinheiro, resultando em sérias sanções eleitorais e penais se comprovada a intenção de burlar as regras de financiamento”, acrescenta.

A reportagem procurou a assessoria de Marçal e as empresas Medina Maker e Marshall Filmes, que não responderam até a publicação.

<><> Por que isso importa?

•        A empresa de Medina é hoje o segundo maior gasto da campanha de Marçal.

•        Apesar de dizer em diversas ocasiões que é sócio de Medina, Marçal não consta no registro da produtora. É obrigatório que candidatos declarem participação em empresas.

<><> “Nós viramos sócios, eu e esse cara”, diz Marçal

As relações entre Marçal e Medina estão evidentes no site da Marshall Filmes, que desde março vende um curso audiovisual para produtores de conteúdo. Logo na abertura da página há uma foto do candidato ao lado do empresário. Quem dá os cursos é Medina. São aulas que vão de operação de drones à criação de conteúdos com o celular. Vídeos mostram que Marçal aparecia ao final dos cursos para avaliar os materiais produzidos pelos alunos.

A página foi registrada no nome de Medina com um e-mail ligado à Medina Maker. No link que direciona para a “Marshall Films Experience”, uma experiência para passar o dia com o Marçal vendida por R$ 28 mil, há o CNPJ da empresa Medina Maker.

O site apresenta Medina como sócio de Marçal. “Hoje, Medina abandonou todos os seus empreendimentos para se tornar sócio de Pablo Marçal na Marshall Filmes, com o objetivo de atender clientes de alto nível, e criar um braço educacional, capacitado para formar uma nova leva de cineastas pelo Brasil”, diz o texto.

A página vende o curso por R$ 3.564 em 12 parcelas. A compra direciona para uma plataforma online de pagamentos que foi fundada pelo próprio Marçal, a XGROW (Marçal teve participação na XGROW até julho de 2022 através da sua empresa Marçal Participações Ltda.). O curso da Marshall, atualmente com as vendas encerradas, deixa a seguinte mensagem: “para dúvidas com sua compra fale com comercial@medinamaker.com.br”.

Em outro vídeo, postado no TikTok da Medina Maker em maio deste ano, Marçal afirma: “Nós viramos sócios, eu e esse cara [Medina]. Nós criamos uma empresa de filmes chamada Marshall Filmes. Ele que deu o nome, não fui eu que pediu isso. Ou seja, ele é um artista”, diz.

O relacionamento entre os dois fica ainda mais claro em um vídeo filmado dentro de um jatinho, postado também em maio, no qual eles fazem propaganda da empresa e, novamente, declaram ser sócios. Nesse vídeo, eles discutem a necessidade de contratar mais videomakers.

A produtora de Medina também postou vídeos de Marçal em um jet ski em meio às enchentes que devastaram o Rio Grande do Sul neste ano. O político foi ao estado, segundo ele, várias vezes, para auxiliar as vítimas do desastre. No mesmo mês, a Advocacia-Geral da União (AGU) ingressou com ação judicial com pedido de direito de resposta em face de Marçal. A ação foi motivada por vídeos na qual o político afirmava que as Forças Armadas brasileiras estariam inertes diante da calamidade.

Há um vídeo de Marçal no TikToK, de março, no qual ele já fazia propaganda da Marshall Filmes. O vídeo não está mais disponível devido às restrições da Justiça Eleitoral. Em agosto, a Justiça suspendeu perfis de Marçal em redes sociais por abuso de poder econômico. A decisão entendeu que haveria pagamentos para editar e publicar cortes de vídeos do candidato. A Pública mostrou em agosto como cortes de vídeos de Marçal que violavam a lei eleitoral já haviam sido vistos mais de 825 milhões de vezes no YouTube e TikTok.

Em janeiro deste ano, o canal de YouTube da Medina Maker, com 2,2 mil pessoas inscritas, publicou um vídeo de Marçal. O “Chamado dos Generais” é uma gravação de uma palestra de Marçal no ginásio da Portuguesa, em São Paulo. O clipe é uma propaganda da assinatura “vitalícia” de conteúdos do guru. O candidato a prefeito tem um livro com esse nome.

 

•        Banditismo e Política. Por Alberto Cantalice

O absurdo da presença de Pablo Marçal na disputa pela prefeitura de São Paulo amplia o escárnio que envolve o processo eleitoral de 2022 Brasil afora.

O recente episódio da cadeirada do apresentador e candidato José Luiz Datena em Marçal, no último debate da TV Cultura, revela o quão baixo pode chegar uma disputa eleitoral.

Exímio mentiroso, divulgador e criador de inúmeras notícias falsas, as chamadas fakes News, o “ex-coach”, ao arremedo de seu inspirador, o capitão Bolsonaro, foi correndo ao hospital atrás de uma imagem, uma gravação da imagem da vítima.  Essa encenação escandalizada na maior cidade do país reflete, miseravelmente, nas outras capitais e no interior do Brasil.  

A quantidade de pândegos da extrema direita desfilando pelas telas e ruas, cada um com um figurino mais deletério, é de fazer corar frade de pedra. Uma vergonha.

Fosse só isso, já serviria para a cidadania brasileira buscar se afastar dos elementos nocivos à democracia, cuja participação sem observância das regras, serve para a sua desmoralização. Entretanto, percebe-se, em áreas periféricas, o crescimento de candidaturas vinculadas ao crime organizado: tráfico e milícias se espalhando a olhos vistos.

Há comunidades controladas pelo crime em que postulantes à vereança vêm sofrendo constrangimento ao atuar com suas campanhas eleitorais; por outro lado, há apoio do crime a alguns candidatos, garantido exclusividade de atuação em determinadas áreas, inibindo outros políticos e moradores. Já não é a velha e criminosa compra de votos, que se aproveita das carências de alguns. É imposição. Nas redes sociais, circulam dezenas de imagens de criminosos arrancando placas e adesivos nas casas. Intimidando e expulsando cabos eleitorais e militantes. 

Essa escalada de violência política afeta e constrange os variados partidos e candidaturas. Seu enfrentamento tem que se dar pela institucionalidade, se preciso com o uso da força pelos agentes do Estado. Esse fenômeno é relatado em todos os estados da federação.

Ou o Brasil enfrenta o crime organizado com a integração entre todos os entes federados: União, estados e municípios. Poder judiciário e Ministério Públicos, e a população e os políticos colaborando com informações. Ou o que nos espera é a lógica criminosa corroendo o tecido social brasileiro até deixá-lo em frangalhos.

 

•        No circo de José Datena e Pablo Marçal, os palhaços somos nós. Por Mário Sabino

No circo de José Luís Datena e Pablo Marçal, os palhaços somos nós, os pagadores de impostos que sustentamos um sistema político que vem selecionando os piores desde a redemocratização. A saber, os mais ignorantes, os mais incapazes, os mais desonestos.

O resultado é este que se vê: um circo de horrores do qual José Luís Datena e Pablo Marçal são ilustração: serzinhos estridentes que divertem quem não enxerga o tamanho da tragédia.

Assim como a fauna restante de candidatos nas diferentes cidades, eles são produto do conjunto de organizações que se autodeclaram partidos, embora o seu único programa seja avançar sobre o dinheiro público, explicitando pornograficamente o patrimonialismo de que são herdeiros.

Supostamente nascido para contrapor-se a tal estado de coisas, o discurso antissistema integra-se ao sistema e o degenera ainda mais com os seus outsiders de araque.

O apresentador de programas policiais José Luís Datena é uma apelação oportunista do PSDB, o partido que nasceu para espelhar a social-democracia europeia e que acabou em cena de telecatch. Pablo Marçal, sujeito sem profissão definida, mas muito rentável na sua indefinição, é um avatar de Jair Bolsonaro. Almeja ter vida própria e continuar reproduzindo a miséria intelectual da direita brasileira.

Ambos são coadjuvantes pequenos neste espetáculo de depravação institucional a que assistimos, censurados por ordem judicial, enquanto o país arde literalmente, queimado também nas suas finanças por um parlamento que seria virtuoso se fosse apenas concupiscente e pelo governo dessa esquerda interminável no seu anacronismo, na sua incompetência e na sua má-fé.

A cadeirada que José Luís Datena desferiu em Pablo Marçal foi um número histriônico, mais um, do circo brasileiro no qual o palhaço sou eu, é você, somos todos nós, apesar das aparências em contrário.

 

•        Plano de Pablo Marçal é a presidência da República, alerta cientista

O propósito do candidato à Prefeitura de São Paulo, Pablo Marçal, é claro, mas precisa ser reforçado como um alerta para o futuro democrático: consolidar-se como uma figura de renovação no cenário político brasileiro, com a meta de alcançar o cargo mais alto na hierarquia política — a presidência da República.

Para isso, Marçal se autodeclara um candidato “genuinamente evangélico” adotando uma postura religiosa recheada de símbolos bíblicos, e que não precisa do apoio institucional de líderes maiores, posicionamento que o coloca em contraste com o “velho”, representado por figuras como o pastor Silas Malafaia e o ex-presidente Jair Bolsonaro.

A análise é do cientista político Pedro Costa Júnior, em entrevista à jornalista Lourdes Nassif, no programa TVGGN 20H.

O diferencial religioso pode atrair eleitores evangélicos que Bolsonaro não conseguiu conquistar completamente. Embora Bolsonaro tenha participado de um batismo simbólico no Rio Jordão, em Israel — local onde, segundo a Bíblia, Jesus foi batizado — ele nunca se declarou explicitamente evangélico, preferindo identificar-se como um seguidor de valores cristãos.

Pedro Costa Júnior argumenta que Marçal é um novo fenômeno político, com um discurso alinhado à direita global, cuja fonte de inspiração parece estar em modelos autoritários como o de Nayib Bukele, presidente de El Salvador, conhecido por suas políticas que desafiam os direitos humanos e enfraquecem as liberdades civis.

“Ele [Bukele] é um açougueiro dos direitos humanos, e Pablo Marçal mira em Bukele. Esse é o projeto dele em escala nacional. O que está acontecendo agora na prefeitura é apenas um laboratório para ele ganhar visibilidade no cenário nacional”, destaca Costa Júnior.

A estratégia de Marçal de fomentar caos e polarização é central em seu modus operandi, explica o cientista político, tática comum entre líderes da extrema-direita global. Assim como Trump e outros líderes autoritários, Marçal constrói uma narrativa de enfrentamento ao “sistema”, a fim de posicionarem-se como a solução para os problemas que, muitas vezes, são exacerbados ou criados por suas próprias retóricas.

“Eles não são contra a política, isso é algo do passado; eles são contra o sistema. O que todos eles dizem, o que Trump afirmou em 2016 e 2020, é que, se perderem a eleição, é porque houve fraude. O antissistema não aceita o resultado das urnas. O objetivo deles é destruir e descredibilizar as instituições”, explica Costa Júnior.

 

Fonte: Por Diego Feijó de Abreu e Giovana Girardi, da Agência Pública/Brasil 247/Metrópoles/Jornal GGN

 

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