sexta-feira, 26 de julho de 2024

VIOLÊNCIA DE GÊNERO: Brasil registra 1 estupro a cada 6 minutos; maioria das vítimas é de meninas de até 13 anos

O Brasil bateu um novo recorde e registrou um crime de estupro a cada 6 minutos em 2023. O dado é do 18° Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgado nesta quinta-feira (18), que também aponta para o crescimento de todas as formas de violência contra a mulher.

De acordo com o documento, feito pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o crime de estupro cresceu 6,5% em relação a 2022 e 91,5% se comparado aos últimos 12 anos. Em 2023, foram 83.988 vítimas de estupro e estupro de vulnerável.

O perfil das vítimas se repete: meninas (88,2%), negras (52,2%) de até 13 anos (61,6%). Na faixa de 10 a 13 anos, foram 233,9 casos para cada 100 mil habitantes, o que representa uma taxa quase seis vezes maior que a média nacional, de 41,4 por 100 mil. A taxa de estupros entre bebês e crianças de 0 a 4 anos também é superior à média nacional, chegando a  68,7 casos por 100 mil habitantes.

Entre os agressores, os principais são familiares e conhecidos. No caso de estupro contra vítimas de 0 a 13 anos, eles são autores de 64% dos crimes; já contra vítimas maiores de 14 anos, familiares representam 31,2% e parceiros íntimos 28,1%.

O Anuário também aponta que a grande maioria (54%) dos casos de estupro ocorrem dentro da casa da vítima. Em segundo lugar, estão as vias públicas. Entre as principais cidades com as maiores taxas de estupro e estupro de vulnerável, estão: Sorriso (MT), Porto Velho (RO), Boa Vista (RR), Itaituba (PA) e Dourados (MS).

•        Crescimento de todas as formas de violência

O levantamento apontou que o Brasil registrou crescimento em todas as formas de violência contra a mulher, como a doméstica, psicológica, ameaças e tentativa de feminicídio. O crime de importunação sexual foi o que mais aumentou. Em 2023, foram 41.371 ocorrências, um aumento de 48,7% em relação ao ano passado.

Em segundo lugar, o crime que mais aumentou foi o de divulgação de cena de estupro / sexo/ pornografia (7.188 casos), registrando um aumento 47,8%.

Em terceiro lugar, foi registrado o crime de stalking (77.083) casos que aumentaram 34,5%. Para o Fórum, esse dado é relevante porque o stalking (perseguição) pode ser o primeiro passo para a ocorrência de outros crimes, como o feminicídio.

Em relação às outras formas de violência, foram registradas as seguintes taxas de aumento:

•        Violência psicológica: 33,5% (38.507 casos);

•        Assédio sexual: 28,5% (8.135 casos);

•        Ameaças: 16,5%; (778.921 casos);

•        Violência doméstica: 9,8% (258.941 casos);

•        Tentativa de homicídio contra mulheres: 9,2% (8.372);

•        Tentativa de feminicídio: 7,1% (2.797 casos).

Entre as vítimas do feminicídio, as principais são mulheres negras (63,6%) e a maioria é assassinada dentro da própria casa (63,3%). Os principais assassinos são parceiros íntimos (63%). Ex-parceiros representam 21,2% e familiares 8,7%.

Os homens

O coordenador de projetos do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, David Marques, afirma que o aumento dos registros de violências contra a mulher pode estar relacionado tanto ao aumento dos crimes quanto ao aumento das denúncias. “Por um lado, vários trabalhos estão tentando discutir a respeito do crescimento da própria violência, do fenômeno da violência, e por outro lado, também com variáveis que indicam também um maior nível de registro desse fenômeno acontecendo”.

Para David, é preciso se atentar ao fato de que a grande maioria dos crimes são protagonizados por homens, o que pode parecer óbvio, principalmente para as mulheres, mas que reforça a urgência de políticas públicas voltadas para eles. “O que é incontornável, quando a gente olha para o perfil, por exemplo, dos agressores, sempre são os homens. 90% dos assassinos das mulheres são homens. E geralmente é parceiro íntimo, ex-parceiro íntimo. Em outras modalidades também, o homem aparece como o agressor", diz o coordenador.

Ele acrescenta que é necessário discutir sobre o aprimoramento das políticas públicas para o atendimento dessas mulheres vítimas de violência e, por outro lado, falar do papel do homem como o autor das violências.

“Os homens precisam participar desse debate e a gente precisa pensar, enquanto sociedade, em como ter ações, ter proposições para que a gente mude, inclusive socialmente, o papel dos homens nessa posição de autores de violência", defende.

O coordenador reafirma que a mudança na forma de abordagem é urgente, "senão o debate vai ser sempre apenas como melhor atender às vítimas de violência, e não o que a gente pode fazer para tentar evitar que essas tendências, que esse fenômeno da violência contra a mulher, continue crescendo”.

•        Meninas de até 14 anos são as principais vítimas de violência sexual, mostra pesquisa

Meninas de até 14 anos foram as principais vítimas de violência sexual em 2022, segundo o Atlas da Violência,  que reforçou, em dados, que o Brasil continua sendo um dos países mais perigosos para as mulheres.

Ao todo, mais de 221 mulheres e crianças foram vítimas de algum tipo de violência naquele ano e 46% dos casos de natureza sexual foram contra meninas de até 14 anos. A pesquisa mostrou, também, que a maioria dessas violência ocorre dentro da casa da vítima. Na faixa etária entre 0 e 4 anos, a residência correspondeu a 67,5% do local de violência e, entre 10 e 14 anos, a 65,6%.

Além disso, o estudo revela que essas meninas são vítimas, principalmente, de seus próprios pais e padrastos.

Para o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, os dados do Atlas revelam uma "epidemia" de violência sexual contra crianças. A pesquisa também mostrou que entre bebês e meninas de 0 e 9 anos, esse tipo de violência corresponde a 30,4%.

Violência sexual, por definição, é "qualquer ação na qual uma pessoa, valendo-se de sua posição de poder e fazendo uso de força física, coerção, intimidação ou influência psicológica, com uso ou não de armas ou drogas, obriga outra pessoa, de qualquer sexo e idade, a ter, presenciar ou participar de alguma maneira de interações sexuais, ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, com fins de lucro, vingança ou outra intenção".

O estudo também mostrou que a violência acompanha as mulheres por toda a sua vida, independentemente da faixa etária. De acordo com os dados, entre 0 e 9 anos, a violência mais frequente é negligência, já nas faixa de 10 a 14, a violência sexual prevalece. A partir dos 15 até os 69 anos, ou seja, em toda a vida adulta da mulher, a violência física passa a ser a mais comum. A partir dos 70, a negligência volta a ser uma forma de violência bastante presente na vida das mulheres, crescendo até o fim da vida.

"Ou seja, se tivéssemos que descrever o que é ser uma mulher no Brasil, poderíamos dizer que na primeira infância é a negligência a forma mais frequente de violência, cujos principais autores são pais e mães, na mesma proporção. A partir dos 10 até os 14 anos, essas meninas são vitimadas principalmente por formas de violência sexual, com homens que ocupam as funções de pai e padrasto como principais algozes. Dos 15 até os 69 anos, é a violência física provocada por pais, padrastos, namorados ou maridos a forma de violência prevalente entre as mulheres. Quando idosas, as mulheres voltam a ser vítimas de negligência e a participação feminina entre os autores volta a crescer.

Em disparado, alcançando quase 90%, os homens são os principais agressores dessas mulheres, entre familiares e companheiros. Em 86,6% dos casos, as violências foram protagonizadas por eles.

O Atlas da Violência foi produzido pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública e também traz outros dados relativos a violências contra pessoas negras, com deficiência, indígenas e outros grupos.

 

•        MSF realiza treinamento sobre atendimento a sobreviventes de violência sexual em Portel, na região da Ilha do Marajó, no Pará

Equipes de Médicos Sem Fronteiras (MSF) estão trabalhando em parceria com a Secretaria Municipal de Saúde de Portel, na região da Ilha do Marajó, no Pará, para otimizar o atendimento a sobreviventes de violência sexual no município. Como organização internacional médico-humanitária, MSF tem vasta experiência na criação de fluxos e no atendimento de saúde a casos de violência sexual em diversos países. 

Em Portel, as equipes de MSF colaboram em dois eixos principais relacionados à essa temática: na definição das etapas necessárias para o atendimento humanizado às pessoas sobreviventes e na capacitação de profissionais que realizam o acompanhamento de saúde a esses pacientes. 

Recentemente, mais de 100 profissionais do Hospital Municipal e de Unidades Básicas de Saúde (UBS) participaram de um treinamento sobre os impactos da violência sexual na saúde física e mental dos sobreviventes. Médicos, enfermeiros e assistentes sociais são algumas das especialidades dos participantes dessa série de treinamentos realizada por MSF, a pedido das autoridades de saúde do município, entre junho e julho de 2024. 

“Nosso objetivo é apoiar o desenvolvimento das habilidades desses profissionais para um atendimento adequado que uma emergência médica deste tipo requer, de acordo com as etapas estabelecidas no protocolo clínico e de apoio psicossocial estabelecidos pelo Ministério da Saúde . Ao mesmo tempo, é fundamental que o atendimento a esses pacientes seja feito de forma humanizada e empática, evitando a revitimização dos pacientes”, explica a gerente de saúde mental e apoio psicossocial de MSF Veronica Yanic. 

<><> Trabalho de MSF na região da Ilha do Marajó 

O trabalho de Médicos Sem Fronteiras (MSF) relacionado à temática de violência sexual em Portel faz parte de uma parceria com a Secretaria Municipal de Saúde iniciada em março de 2023, quando a organização começou as atividades na região da Ilha do Marajó para levar cuidados de saúde à população, principalmente em comunidades ribeirinhas localizadas em áreas remotas.

Desde então, equipes de MSF trabalham para ampliar a oferta de cuidados de saúde mental e saúde sexual e reprodutiva, apoiando Unidades Básicas de Saúde (UBS) e postos de saúde nas zonas urbana e rural. Além disso, contribuem capacitando profissionais (médicos, enfermeiros e agentes comunitários) que atuam na atenção básica voltada a sobreviventes de violência sexual e em temas de saúde sexual e reprodutiva. 

 

Fonte: Fórum/MSF – Imprensa

 

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