'Não é a 2ª Guerra Fria': economista
questiona coragem dos EUA de se desprender da economia chinesa
O segundo dia do
States of the Future, evento paralelo do G20, recebeu grandes nomes da economia
mundial, a fim de debater as medidas necessárias para desenvolver as economias
do Sul Global, como a taxação de grandes fortunas ao redor do mundo e a necessidade
de realizar novas políticas industriais.
Realizado pelo Banco
Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) — em parceria com os
ministérios da Gestão e Inovação, Relações Exteriores e do Desenvolvimento,
Indústria, Comércio e Serviços —, o encontro reuniu nomes de peso da economia
nacional e internacional.
Estiveram presentes
Tereza Campello, diretora socioambiental do BNDES; Miriam Belchior, secretária
executiva da Casa Civil, ex-presidente da Caixa Econômica Federal e ex-ministra
do Planejamento (2011–2014); Nelson Barbosa, diretor do BNDES e ex-ministro da
Fazenda (2015–2016); e Marco Aurélio Crocco, professor de economia da
Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Após Campello abrir o
evento destacando o projeto do Arco da Restauração do BNDES, que planeja
restaurar a Floresta Amazônica perdida pelo desmatamento, Belchior afirmou que,
na luta pela criação de melhores políticas de desenvolvimento, é preciso "superar
as pressões do mercado financeiro especulativo".
"Superar as
pressões do mercado financeiro especulativo, rentista e apátrida, com natureza
'curto prazista', que impõe limites para a gente pensar o desenvolvimento de
uma nação a médio e longo prazo."
Ainda estiveram
presentes Jose Antonio Ocampo, ex-ministro das Finanças da Colômbia; Fiona
Tregenna, economista da Universidade de Joanesburgo; e Giovanni Dosi, professor
e diretor do Instituto de Economia da Scuola Superiore Sant'Anna, em Pisa.
O grande destaque da
manhã, no entanto, foi o economista sul-coreno Ha-Joon Chang, professor na
Faculdade de Estudos Orientais e Africanos da Universidade de Londres, que
ficou mundialmente famoso por afirmar que os países desenvolvidos estão
tentando "chutar a escada" que usaram para chegar ao seu estágio de
desenvolvimento.
Em sua fala, Chang
ressaltou que o debate mundial sobre o futuro do planeta está sendo prejudicado
por uma "compreensão superficial da realidade e por falta de desafiar o
status quo".
"Precisamos
ultrapassar essa situação se quisermos encontrar formas de cooperação global,
intervenção estatal a nível nacional e ações coletivas da sociedade civil que
abordem genuinamente os nossos desafios de uma forma mais equilibrada e
progressiva."
Para ele, um dos
exemplos dessa compreensão superficial é o discurso que atualmente gira em
torno da relação China-Estados Unidos.
"Para ser franco,
esse confronto não é a segunda Guerra Fria. Nem os EUA nem a China podem se dar
ao luxo de se desligar seriamente um do outro", afirmou. "Não se
esqueçam de que na Guerra Fria original os EUA e o bloco soviético não tinham
nenhuma relação econômica séria."
"Hoje a China
possui 13% da dívida americana. Você pode realmente prejudicar muito um país
que possui um sétimo de sua dívida nacional?"
Mais importante do que
isso, sublinhou Chang, a China forneceu uma enorme quantidade de bens de
consumo baratos aos EUA nas últimas décadas, "tornando possível às
empresas norte-americanas suprimirem os salários".
<><> Taxação
de grandes fortunas
Em seu discurso,
Nelson Barbosa destacou que desde a crise do modelo neoliberal, que começou com
a crise econômica de 2008 e a resposta insuficiente dos governos —
subsequentemente prejudicada ainda mais pela pandemia da COVID-19, "que
gerou outra necessidade de atuação do Estado" —, houve uma necessidade de
os países recomporem suas receitas.
Uma resposta óbvia
para esse problema, diz Barbosa, é a taxação de pessoas e corporações. "Só
que no mundo globalizado isso exige coordenação internacional."
"Um país tentando
fazer isso sozinho provavelmente vai sofrer evasão de capital, vai sofrer uma
realocação de recursos."
Por isso, afirma o
ex-ministro da Fazenda, foi de grande importância o Brasil ter levado esse tema
para o encontro do G20 deste ano.
¨ Taxação de super-ricos, uma das prioridades do Brasil, avança no
G20
A taxação
internacional das grandes fortunas, os chamados super-ricos, uma das
prioridades da presidência brasileira no G20 (Grupo dos 20, que reúne as
principais economias do mundo), avança nas negociações para que seja tema
exclusivo de declaração que será aprovada pelos ministros de finanças e
presidentes de bancos centrais, que se reunirão na quinta (25) e na sexta-feira
(26), no Rio de Janeiro.
A informação é da
secretária de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda, embaixadora
Tatiana Rosito. Ela coordena a Trilha de Finanças do G20, que conduz uma
pré-negociação com representantes dos ministérios e bancos centrais. O encontro
começou na segunda-feira (22) e está no segundo dia, podendo “avançar por horas
excedentes”.
As delegações buscam
um consenso para que uma declaração seja encaminhada às autoridades que farão o
encontro do fim da semana.
Tatiana Rosito fez um
balanço sobre o segundo dia de conversas na noite desta terça-feira (23). Ela
conversou com jornalistas por pouco mais de 20 minutos e justificou que teria
que voltar para a mesa de negociação.
A secretária adiantou
que o grupo deve fazer três declarações formais. Uma exclusiva sobre cooperação
tributária internacional, que inclui a taxação de grandes fortunas. A segunda
reunirá mais assuntos, como atuação de bancos multilaterais, arquitetura financeira
internacional, fluxo de capitais e clima. Um terceiro comunicado terá uma
“linguagem geopolítica”.
A negociadora
brasileira destacou que são necessárias mais horas para encontrar consensos em
todos os temas, mas afirmou que as conversas “estão indo bem”. A embaixadora
não sinalizou quais são os pontos em que ainda não há consonância de ideias.
“Temos que zelar por construir consensos”, justificou.
No entanto, a
representante do ministério da Fazenda destacou a proposta de taxação dos
super-ricos, lembrando que é uma das prioridades da presidência brasileira no
G20, tendo sido assunto de discursos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e
do ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
“Será uma
declaração inédita”, afirmou. “Todos os termos levantados pela presidência
brasileira estão dentro do documento [de cooperação internacional], incluindo
tributação de super-ricos. Os pontos estão bem avançados”, detalhou.
A embaixadora
ressaltou que o fato de estar sendo elaborada uma declaração separada para o
tema “tem a intenção de dar a devida projeção à centralidade que isso tem para
a presidência brasileira”.
“É a primeira vez que
haverá uma declaração dessa natureza na área de tributação. Achamos que essa
iniciativa merecia uma declaração específica”, disse.
Cálculos do economista
francês Gabriel Zucman apontam que a taxação dos super-ricos afetaria
apenas 3 mil indivíduos em todo o
planeta, dos quais cerca de 100 na América Latina. Em contrapartida, teria
potencial de arrecadar cerca de US$ 250 bilhões por ano.
Rosito manifestou
estar confiante de que as declarações serão emitidas, diferentemente do que
aconteceu em encontro da Trilha de Finanças do G20 em fevereiro, quando não
houve consenso sobre determinadas questões.
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Solução diplomática
A negociadora
contextualizou que nas reuniões deste mês de julho, como a que acontece em
paralelo na Trilha de Sherpas (lado mais político do G20), a presidência
brasileira adotou a postura de emitir uma declaração separada chamada
“Comunicado”, que trata de temas geopolíticos. É uma forma de fazer com que
posicionamentos que causam divergências não impeçam que uma declaração seja
emitida em consonância.
Mais cedo, na Trilha
de Sherpas, que também acontece no Rio, o ministro das Relações Exteriores,
Mauro Vieira, comentou que desde o início do conflito entre a Rússia e a
Ucrânia, em fevereiro de 2022, o G20 não conseguia aprovar documentos de nível
ministerial, por causa de divergências entre os países acerca desse tema.
No braço político do
G20, um comunicado indicou que questões geopolíticas como as guerras em Gaza e
entre a Rússia e a Ucrânia deverão ser discutidas pelos líderes na reunião, que
ocorrerá em 18 e 19 de novembro no Rio de Janeiro. “É uma vitória da diplomacia
brasileira e da presidência brasileira do G20”, avalia Vieira.
“A única razão para
não ter tido declaração em fevereiro foi a forma geopolítica. Agora os sherpas
encontraram um caminho”, assinalou Rosito. Sherpas são líderes que conduzem
negociações, em nome de chefes de Estado e de governo.
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Grupos de engajamentos
A coordenadora da
Trilha de Finanças do G20 destacou ainda que, pela primeira vez, grupos de engajamento e organizações da
sociedade civil, que formam o G20 Social, puderam
levar reinvindicações diretamente aos representantes de ministérios e bancos
centrais. Eles participaram de sessão de conversa na segunda-feira (22).
Tatiana Rosito
ressaltou que além do ineditismo proposto pela presidência brasileira do G20, o
encontro foi feito com antecedência considerável da reunião de cúpula de
novembro, o que permite que as demandas da sociedade civil sejam mais bem
apreciadas pelos ministros, até chegar aos líderes mundiais.
A embaixadora
classificou a experiência “como muito positiva”. “Algumas reivindicações são
ambiciosas, mas convergem muito. A discussão foi muito rica, muito apreciada
pelos nossos pares”, relatou.
<><> G20
O G20 é composto por
19 países: África do Sul, Alemanha, Arábia Saudita, Argentina, Austrália,
Brasil, Canadá, China, Coreia do Sul, Estados Unidos, França, Índia, Indonésia,
Itália, Japão, México, Reino Unido, Rússia e Turquia, e dois órgãos regionais: a
União Africana e a União Europeia.
Os integrantes do
grupo representam cerca de 85% da economia mundial, mais de 75% do comércio
global e cerca de dois terços da população do planeta.
A presidência
brasileira do G20 vai até a reunião de cúpula em novembro. A próxima
presidência caberá à África do Sul.
¨ Diplomacia brasileira em destaque no G20: Mauro Vieira anuncia
avanços na agenda da cúpula
Durante a recente
reunião do G20, realizada nesta terça-feira (23), no Rio de Janeiro, o ministro
das Relações Exteriores do Brasil, Mauro Vieira, anunciou a conclusão bem-sucedida
da segunda sessão das reuniões ministeriais.
Na coletiva, Vieira
destacou o progresso significativo alcançado, especialmente na emissão de dois
documentos conjuntos pelo G20: uma declaração ministerial para a reduzir as
desigualdades e um chamado à ação para fortalecer os serviços de água potável, saneamento
básico e higiene.
O ministro destacou a
relevância da declaração sobre desigualdades, que reconhece a importância de
políticas de inclusão social e combate a diversos tipos de desigualdade.
"O primeiro
documento sobre desigualdades merece destaque pelo reconhecimento da
importância das políticas de inclusão social e de enfrentamento a todo tipo de
desigualdade. Não apenas por razões de justiça social, mas também pelo fato de
que essas políticas públicas geram crescimento econômico sustentável",
destacou Vieira.
O segundo documento
visa mobilizar recursos internacionais para ampliar o acesso à água potável e
ao saneamento básico, um desafio especialmente crítico em regiões mais pobres.
"O segundo
documento, por sua vez, tem o objetivo de mobilizar o grupo e as instituições
internacionais parceiras a respeito da necessidade de aumentar a
disponibilidade de recursos de acesso à água potável e ao saneamento básico,
sobretudo por paredes", complementou.
Vieira também elogiou
os esforços do governo brasileiro em viabilizar esses resultados, ressaltando a
vitória diplomática que representa a emissão desses documentos consensuais após
um período de estagnação nas negociações do G20.
Segundo reforçou o
ministro, desde o início do conflito na Europa, em fevereiro de 2022, o grupo
enfrentava dificuldades para aprovar documentos de nível ministerial, mas a
presidência brasileira conseguiu destravar essas negociações.
"O Brasil
trabalhou para destravar o grupo. Na reunião ministerial de desenvolvimento que
agora se realiza, o G20 voltou a emitir duas decisões ministeriais plenamente
consensuais […]. É uma vitória da diplomacia brasileira e da presidência
brasileira do G20 que dá dimensão da importância de uma política externa
equilibrada e que tem credibilidade junto aos seus pares", vaticinou
Vieira.
Além das reuniões
ministeriais, ele ressaltou a importância da Aliança Global contra a Fome e a
Pobreza, que será lançada sob a presidência do presidente Luiz Inácio Lula da
Silva. Essa iniciativa, segundo Vieira, é prioridade da presidência brasileira
do G20 e visa erradicar a fome e a pobreza, promovendo o desenvolvimento
sustentável e a reforma da governança.
"Ao assumir a
presidência do grupo, o Brasil definiu o combate à fome e à pobreza como
prioridade máxima, juntamente com a promoção do desenvolvimento sustentável e
da reforma da governança", arguiu.
Fonte: Sputnik Brasil/Agencia
Brasil
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