quinta-feira, 25 de julho de 2024


'Não é a 2ª Guerra Fria': economista questiona coragem dos EUA de se desprender da economia chinesa

O segundo dia do States of the Future, evento paralelo do G20, recebeu grandes nomes da economia mundial, a fim de debater as medidas necessárias para desenvolver as economias do Sul Global, como a taxação de grandes fortunas ao redor do mundo e a necessidade de realizar novas políticas industriais.

Realizado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) — em parceria com os ministérios da Gestão e Inovação, Relações Exteriores e do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços —, o encontro reuniu nomes de peso da economia nacional e internacional.

Estiveram presentes Tereza Campello, diretora socioambiental do BNDES; Miriam Belchior, secretária executiva da Casa Civil, ex-presidente da Caixa Econômica Federal e ex-ministra do Planejamento (2011–2014); Nelson Barbosa, diretor do BNDES e ex-ministro da Fazenda (2015–2016); e Marco Aurélio Crocco, professor de economia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Após Campello abrir o evento destacando o projeto do Arco da Restauração do BNDES, que planeja restaurar a Floresta Amazônica perdida pelo desmatamento, Belchior afirmou que, na luta pela criação de melhores políticas de desenvolvimento, é preciso "superar as pressões do mercado financeiro especulativo".

"Superar as pressões do mercado financeiro especulativo, rentista e apátrida, com natureza 'curto prazista', que impõe limites para a gente pensar o desenvolvimento de uma nação a médio e longo prazo."

Ainda estiveram presentes Jose Antonio Ocampo, ex-ministro das Finanças da Colômbia; Fiona Tregenna, economista da Universidade de Joanesburgo; e Giovanni Dosi, professor e diretor do Instituto de Economia da Scuola Superiore Sant'Anna, em Pisa.

O grande destaque da manhã, no entanto, foi o economista sul-coreno Ha-Joon Chang, professor na Faculdade de Estudos Orientais e Africanos da Universidade de Londres, que ficou mundialmente famoso por afirmar que os países desenvolvidos estão tentando "chutar a escada" que usaram para chegar ao seu estágio de desenvolvimento.

Em sua fala, Chang ressaltou que o debate mundial sobre o futuro do planeta está sendo prejudicado por uma "compreensão superficial da realidade e por falta de desafiar o status quo".

"Precisamos ultrapassar essa situação se quisermos encontrar formas de cooperação global, intervenção estatal a nível nacional e ações coletivas da sociedade civil que abordem genuinamente os nossos desafios de uma forma mais equilibrada e progressiva."

Para ele, um dos exemplos dessa compreensão superficial é o discurso que atualmente gira em torno da relação China-Estados Unidos.

"Para ser franco, esse confronto não é a segunda Guerra Fria. Nem os EUA nem a China podem se dar ao luxo de se desligar seriamente um do outro", afirmou. "Não se esqueçam de que na Guerra Fria original os EUA e o bloco soviético não tinham nenhuma relação econômica séria."

"Hoje a China possui 13% da dívida americana. Você pode realmente prejudicar muito um país que possui um sétimo de sua dívida nacional?"

Mais importante do que isso, sublinhou Chang, a China forneceu uma enorme quantidade de bens de consumo baratos aos EUA nas últimas décadas, "tornando possível às empresas norte-americanas suprimirem os salários".

<><> Taxação de grandes fortunas

Em seu discurso, Nelson Barbosa destacou que desde a crise do modelo neoliberal, que começou com a crise econômica de 2008 e a resposta insuficiente dos governos — subsequentemente prejudicada ainda mais pela pandemia da COVID-19, "que gerou outra necessidade de atuação do Estado" —, houve uma necessidade de os países recomporem suas receitas.

Uma resposta óbvia para esse problema, diz Barbosa, é a taxação de pessoas e corporações. "Só que no mundo globalizado isso exige coordenação internacional."

"Um país tentando fazer isso sozinho provavelmente vai sofrer evasão de capital, vai sofrer uma realocação de recursos."

Por isso, afirma o ex-ministro da Fazenda, foi de grande importância o Brasil ter levado esse tema para o encontro do G20 deste ano.

¨      Taxação de super-ricos, uma das prioridades do Brasil, avança no G20

A taxação internacional das grandes fortunas, os chamados super-ricos, uma das prioridades da presidência brasileira no G20 (Grupo dos 20, que reúne as principais economias do mundo), avança nas negociações para que seja tema exclusivo de declaração que será aprovada pelos ministros de finanças e presidentes de bancos centrais, que se reunirão na quinta (25) e na sexta-feira (26), no Rio de Janeiro.

A informação é da secretária de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda, embaixadora Tatiana Rosito. Ela coordena a Trilha de Finanças do G20, que conduz uma pré-negociação com representantes dos ministérios e bancos centrais. O encontro começou na segunda-feira (22) e está no segundo dia, podendo “avançar por horas excedentes”.

As delegações buscam um consenso para que uma declaração seja encaminhada às autoridades que farão o encontro do fim da semana.

Tatiana Rosito fez um balanço sobre o segundo dia de conversas na noite desta terça-feira (23). Ela conversou com jornalistas por pouco mais de 20 minutos e justificou que teria que voltar para a mesa de negociação.

A secretária adiantou que o grupo deve fazer três declarações formais. Uma exclusiva sobre cooperação tributária internacional, que inclui a taxação de grandes fortunas. A segunda reunirá mais assuntos, como atuação de bancos multilaterais, arquitetura financeira internacional, fluxo de capitais e clima. Um terceiro comunicado terá uma “linguagem geopolítica”.

A negociadora brasileira destacou que são necessárias mais horas para encontrar consensos em todos os temas, mas afirmou que as conversas “estão indo bem”. A embaixadora não sinalizou quais são os pontos em que ainda não há consonância de ideias. “Temos que zelar por construir consensos”, justificou.

No entanto, a representante do ministério da Fazenda destacou a proposta de taxação dos super-ricos, lembrando que é uma das prioridades da presidência brasileira no G20, tendo sido assunto de discursos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

“Será uma declaração inédita”, afirmou. “Todos os termos levantados pela presidência brasileira estão dentro do documento [de cooperação internacional], incluindo tributação de super-ricos. Os pontos estão bem avançados”, detalhou.

A embaixadora ressaltou que o fato de estar sendo elaborada uma declaração separada para o tema “tem a intenção de dar a devida projeção à centralidade que isso tem para a presidência brasileira”.

“É a primeira vez que haverá uma declaração dessa natureza na área de tributação. Achamos que essa iniciativa merecia uma declaração específica”, disse.

Cálculos do economista francês Gabriel Zucman apontam que a taxação dos super-ricos afetaria apenas 3 mil indivíduos em todo o planeta, dos quais cerca de 100 na América Latina. Em contrapartida, teria potencial de arrecadar cerca de US$ 250 bilhões por ano. 

Rosito manifestou estar confiante de que as declarações serão emitidas, diferentemente do que aconteceu em encontro da Trilha de Finanças do G20 em fevereiro, quando não houve consenso sobre determinadas questões.

<><> Solução diplomática

A negociadora contextualizou que nas reuniões deste mês de julho, como a que acontece em paralelo na Trilha de Sherpas (lado mais político do G20), a presidência brasileira adotou a postura de emitir uma declaração separada chamada “Comunicado”, que trata de temas geopolíticos. É uma forma de fazer com que posicionamentos que causam divergências não impeçam que uma declaração seja emitida em consonância.

Mais cedo, na Trilha de Sherpas, que também acontece no Rio, o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, comentou que desde o início do conflito entre a Rússia e a Ucrânia, em fevereiro de 2022, o G20 não conseguia aprovar documentos de nível ministerial, por causa de divergências entre os países acerca desse tema.

No braço político do G20, um comunicado indicou que questões geopolíticas como as guerras em Gaza e entre a Rússia e a Ucrânia deverão ser discutidas pelos líderes na reunião, que ocorrerá em 18 e 19 de novembro no Rio de Janeiro. “É uma vitória da diplomacia brasileira e da presidência brasileira do G20”, avalia Vieira.

“A única razão para não ter tido declaração em fevereiro foi a forma geopolítica. Agora os sherpas encontraram um caminho”, assinalou Rosito. Sherpas são líderes que conduzem negociações, em nome de chefes de Estado e de governo.

<><> Grupos de engajamentos

A coordenadora da Trilha de Finanças do G20 destacou ainda que, pela primeira vez, grupos de engajamento e organizações da sociedade civil, que formam o G20 Social, puderam levar reinvindicações diretamente aos representantes de ministérios e bancos centrais. Eles participaram de sessão de conversa na segunda-feira (22).

Tatiana Rosito ressaltou que além do ineditismo proposto pela presidência brasileira do G20, o encontro foi feito com antecedência considerável da reunião de cúpula de novembro, o que permite que as demandas da sociedade civil sejam mais bem apreciadas pelos ministros, até chegar aos líderes mundiais.

A embaixadora classificou a experiência “como muito positiva”. “Algumas reivindicações são ambiciosas, mas convergem muito. A discussão foi muito rica, muito apreciada pelos nossos pares”, relatou.

<><> G20

O G20 é composto por 19 países: África do Sul, Alemanha, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Brasil, Canadá, China, Coreia do Sul, Estados Unidos, França, Índia, Indonésia, Itália, Japão, México, Reino Unido, Rússia e Turquia, e dois órgãos regionais: a União Africana e a União Europeia.

Os integrantes do grupo representam cerca de 85% da economia mundial, mais de 75% do comércio global e cerca de dois terços da população do planeta.

A presidência brasileira do G20 vai até a reunião de cúpula em novembro. A próxima presidência caberá à África do Sul.

¨      Diplomacia brasileira em destaque no G20: Mauro Vieira anuncia avanços na agenda da cúpula

Durante a recente reunião do G20, realizada nesta terça-feira (23), no Rio de Janeiro, o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Mauro Vieira, anunciou a conclusão bem-sucedida da segunda sessão das reuniões ministeriais.

Na coletiva, Vieira destacou o progresso significativo alcançado, especialmente na emissão de dois documentos conjuntos pelo G20: uma declaração ministerial para a reduzir as desigualdades e um chamado à ação para fortalecer os serviços de água potável, saneamento básico e higiene.

O ministro destacou a relevância da declaração sobre desigualdades, que reconhece a importância de políticas de inclusão social e combate a diversos tipos de desigualdade.

"O primeiro documento sobre desigualdades merece destaque pelo reconhecimento da importância das políticas de inclusão social e de enfrentamento a todo tipo de desigualdade. Não apenas por razões de justiça social, mas também pelo fato de que essas políticas públicas geram crescimento econômico sustentável", destacou Vieira.

O segundo documento visa mobilizar recursos internacionais para ampliar o acesso à água potável e ao saneamento básico, um desafio especialmente crítico em regiões mais pobres.

"O segundo documento, por sua vez, tem o objetivo de mobilizar o grupo e as instituições internacionais parceiras a respeito da necessidade de aumentar a disponibilidade de recursos de acesso à água potável e ao saneamento básico, sobretudo por paredes", complementou.

Vieira também elogiou os esforços do governo brasileiro em viabilizar esses resultados, ressaltando a vitória diplomática que representa a emissão desses documentos consensuais após um período de estagnação nas negociações do G20.

Segundo reforçou o ministro, desde o início do conflito na Europa, em fevereiro de 2022, o grupo enfrentava dificuldades para aprovar documentos de nível ministerial, mas a presidência brasileira conseguiu destravar essas negociações.

"O Brasil trabalhou para destravar o grupo. Na reunião ministerial de desenvolvimento que agora se realiza, o G20 voltou a emitir duas decisões ministeriais plenamente consensuais […]. É uma vitória da diplomacia brasileira e da presidência brasileira do G20 que dá dimensão da importância de uma política externa equilibrada e que tem credibilidade junto aos seus pares", vaticinou Vieira.

Além das reuniões ministeriais, ele ressaltou a importância da Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, que será lançada sob a presidência do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Essa iniciativa, segundo Vieira, é prioridade da presidência brasileira do G20 e visa erradicar a fome e a pobreza, promovendo o desenvolvimento sustentável e a reforma da governança.

"Ao assumir a presidência do grupo, o Brasil definiu o combate à fome e à pobreza como prioridade máxima, juntamente com a promoção do desenvolvimento sustentável e da reforma da governança", arguiu.

 

Fonte: Sputnik Brasil/Agencia Brasil

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