PEC das
Praias: 5 pontos para entender o projeto relatado por Flávio Bolsonaro que
privatiza terrenos à beira-mar
O
Senado iniciou a discussão de uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que
gerou polêmica. A PEC das Praias, como vem sendo chamada, passou a ser
considerada como um mecanismo para privatizar as áreas à beira-mar, que
pertencem à União.
Também
foi dito que a PEC regularizaria todo o Complexo da Maré, conjunto de
comunidades no Rio de Janeiro.
A
polêmica cresceu ainda mais depois que a atriz Luana Piovani e o jogador Neymar
trocaram farpas nas redes sociais por causa da PEC. O jogador de futebol
anunciou parceria com uma construtora para um condomínio na beira do mar.
O
texto no Senado foi discutido numa audiência pública. Ainda está longe de ser
analisado por comissões e pelo plenário. Depois da repercussão ruim do debate,
o próprio presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), indicou que a matéria
não está entre as prioridades de votação.
Nesta
reportagem, você vai ver:
• Como é hoje?
• Como ficaria
com a PEC?
• Isso
significa privatização?
• Quem defende?
• Quem
critica?
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Como é hoje?
As
áreas à beira-mar de que trata a PEC são chamadas de terrenos de marinha.
Correspondem a uma faixa que começa 33 metros depois do ponto mais alto que a
maré atinge. Ou seja, esses terrenos não abrangem a praia e o mar, região
geralmente frequentada pelos banhistas. Essa parte continuaria pública. Os
terrenos de marinha correspondem a uma camada mais atrás da praia, onde ficam
geralmente hotéis e bares.
São
uma faixa de terra contada a partir do ponto mais alto da marés- delimitada
ainda no Brasil Colônia, em 1831. Rios e lagos que sofrem influência das marés
são também considerados.
Os
lotes correspondem a 48 mil km em linha reta e representam 70% de todas as
áreas em nome do governo federal.
Pela
legislação atual, a União, dona dos terrenos de marinha, pode permitir que
pessoas e empresas usem e até transmitam as terras aos seus herdeiros. Mas,
para isso, esses empreendimentos têm que pagar impostos específicos.
• Como ficaria
com a PEC?
O
texto discutido no Senado prevê a autorização para a venda dos terrenos de
marinha a empresas e pessoas que já estejam ocupando a área.
Pelo
projeto, os lotes deixariam de ser compartilhados, entre o governo e quem os
ocupa, e teriam apenas um dono, como um hotel ou resort.
Conforme
o texto, só permaneceriam com o governo áreas ainda não ocupadas e locais onde
são prestados serviços públicos, como portos e aeroportos, por exemplo.
• Isso
significa privatização?
A
diretora de Oceano e Gestão Costeira do Ministério do Meio Ambiente (MMA), Ana
Paula Prates, explica que o projeto abre brecha para "privatizar o acesso
à praia, e não a praia em si", já que a parte frequentada pelos banhistas
continuaria com a União.
Para
a especialista, a proposta não prevê a "privatização direta" das
praias, mas possibilita que uma empresa cerque o terreno e impeça a passagem de
banhistas na faixa de areia, como já é visto hoje em alguns resorts.
"São
áreas de restinga, mangues, dunas, pedaços de praia mais para cima, entradas de
rios. São locais que vivem sob a influência da maré e têm ligação direta com o
aumento do nível do mar. Esses terrenos são a salvaguarda para a adaptação da
mudança do clima", disse Prates ao g1.
O
relator da proposta no Senado, Flávio Bolsonaro (PL-RJ), diz que o texto vai
permitir a transferência de 8,3 mil casas para moradores do Complexo da Maré e
para quilombolas da Restinga de Marambaia -- ilha também localizada no estado
do Rio.
O
senador pontua que haverá um aumento da arrecadação de impostos pelo governo e
da geração de empregos nas regiões.
"Olhem
só o mundo de arrecadação que tem para a União. Nas utilizações dos imóveis,
tem aqui os valores discriminados. Pessoa física: R$ 42 bilhões; pessoa
jurídica: R$ 67 bilhões; setor hoteleiro: R$1,7 bilhão; ramo imobiliário: quase
R$24 bilhões. Imaginem, se houvesse a cessão onerosa dessas propriedades, o
quanto que a União não arrecadaria com isso, muito mais", afirmou o
parlamentar na audiência pública.
• Quem
critica?
Quem
é contra, a exemplo do Painel Mar, plataforma que reúne sociedade civil e
entidades governamentais, argumenta não fazer sentido vender lotes que podem
"deixar de existir no futuro" por causa do aumento do nível do mar.
Dados da Universidade de São Paulo (USP) mostram que a elevação é de cerca de 4
milímetros por ano.
Além
disso, segundo o grupo de estudos, a proteção dos mangues e restingas ajuda a
enfrentar as mudanças climáticas, pois essas áreas funcionam como uma barreira
natural, que ameniza a gravidade de situações como a vivida no Rio Grande do
Sul, assolado pelas enchentes.
Se
essas áreas, responsáveis pela absorção de carbono, forem vendidas
empreendimentos privados, a tendência é aumentar a degradação ambiental. E
isso, de acordo com a plataforma, vai fragilizar ainda mais comunidades
tradicionais que dependem do ecossistema marinho para sobreviver -- populações
caiçaras, quilombolas, ribeirinhas e povos indígenas.
Estudo
do MMA, de 2018, revela que há "avançado processo erosivo em 40% da costa
brasileira". De acordo com o Painel Mar, a erosão será intensificada,
causando o chamado "estreitamento da costa" "até o colapso do
turismo com a supressão das praias".
O
cientista Carlos Nobre, especializado em aquecimento global, afirma que
"se não controlarmos o efeito estufa, até o final do século, o mar vai
subir de 80 cm a 1 metro". Para ele, ao invés da proposta, é necessário um
plano, a longo prazo, para retirada das comunidades ribeirinhas dos terrenos de
marinha, já que o aumento das marés e ressacas mais fortes são inevitáveis.
"Completamente
sem sentido tornar propriedade privada quando, no final desse século, essas
áreas serão mar", disse.
O
Ministério dos Povos Indígenas (MPI) sustenta que "a gestão tradicional
promovida pelas comunidades indígenas, fundamentada em conhecimento
sócio-tecno-ecológico profundo, resulta em práticas de conservação sustentável
que impedem a degradação ambiental, a extinção de espécies e contribuem com a
desaceleração das mudanças climáticas".
• Quem
defende?
Além
de Flávio Bolsonaro, quem também defende o texto é o deputado Alceu Moreira
(MDB-RS), que relatou o texto na Câmara, onde a matéria já foi aprovada.
Segundo
ele, o projeto vai fomentar investimento em praias que se tornaram
"verdadeiros cortiços no litoral do Brasil" e criar empregos para
milhares de pessoas.
"Não
estamos oportunizando nenhum negócio imobiliário a quem quer que seja, não
estamos autorizando a privatização de praia alguma. Absolutamente nada.",
afirmou o deputado.
"Agora,
pegue aí uma ilha como a de Florianópolis, pegue as áreas portuárias que nós
temos abandonadas, verdadeiros cortiços no litoral do Brasil, sem nenhuma
conservação, sem nada, pontos absolutamente apodrecidos, destruídos, que
poderiam ser áreas nobres das cidades, agregar ao patrimônio das cidades, mas
que estão fora, porque são áreas de marinha. A SPU [Secretaria do Patrimônio da
União] não tem dinheiro para cuidar, não faz absolutamente nada, e elas ficam
como verdadeiras cicatrizes nas nossas cidades", argumentou o parlamentar.
• Terrenos à
beira-mar
O
Ministério da Gestão e Inovação (MGI) informou que há 564 mil imóveis
registrados em terreno de marinha. O governo arrecadou, em 2023, R$ 1,1 bilhão
com as taxas de foro e de ocupação.
A
pasta estima que o valor poderia ser cinco vezes maior, com um total de quase 3
milhões de construções nas áreas próximas ao mar, mas que não foram
oficializadas.20% dos valores apurados são repassados para os municípios.
A
Secretaria do Patrimônio da União (SPU) é responsável por gerir os terrenos. O
órgão promove a regularização fundiária urbana de assentamentos irregulares.
"No
ano de 2022 foram repassados para municípios cerca de 120 milhões de reais.
Embora a PEC em análise determine que as áreas desocupadas permanecem na gestão
da União, a possibilidade de municípios poderem acessar mais áreas a partir da
expansão de perímetros urbanos, sem dúvida irá reduzir áreas disponíveis ao
desenvolvimento nacional. Isso demandará futuras desapropriações trazendo altos
custos indenizatórios para a União", explica o MGI.
• Famosos se
manifestam contra privatização das praias e fazem críticas a Neymar
Elisa
Lucinda, Vera Fischer, MariMoon, Leandro Lima e mais famosos usaram as redes
sociais para se manifestar contra a privatização das praias após a Câmara dos
Deputados aprovar a proposta de Emenda à Constituição (PEC), que retira da
União a propriedade exclusiva sobre os chamados terrenos de marinha — áreas
localizadas na faixa de terra de 33 metros ao longo de toda a costa brasileira.
As
postagens também foram feitas após a troca de farpas entre Luana Piovani e
Neymar sobre o assunto. Neymar entrou na história porque anunciou a parceria
com uma construtora para um condomínio beira-mar. Com isso, passou a ser
acusado pela atriz de se beneficiar com o projeto – o que o jogador e a empresa
responsável pelo condomínio negam.
Com
isso, boa parte das postagens de famosos contra a privatização também fazem
críticas ao jogador.
• '-Ney, +Mar'
Vera
Fischer, Otavio Muller e Anderson Muller usaram um post que dizia "-Ney,
+Mar" para falar sobre o assunto.
Vera
completou a postagem de manifesto escrevendo: "quando meia palavra basta.
Não caia nessa, seja contra à privatização das praias! Cuide bem do mundo que o
mundo cuidará de você!".
"O
Ney é a feiúra fabricada no Brasil e o Mar nossa beleza natural… Me poupe,
Neymar. E com todo respeito vai te catar", escreveu Anderson, completando
o post com as hashtags "bobão", "ridículo",
"prepotente" e "babaca".
Embora
não tenha postado nada diretamente em suas redes, Ingrid Guimarães comentou o
post de Otavio Muller, escrevendo "amei" nos comentários.
• "O que
vocês acham?"
Nascido
na Paraíba, o ator Leandro Lima perguntou aos seguidores o que eles achavam da
privatização, mas deixou, também, seu posicionamento:
"Eu
sou nordestino e sou contra a privatização das praias".
A
apresentadora MariMoon também se posicionou sobre o tema: "Esse perfil diz
'não' à privatização das praias".
• "Ney,
pra mim, só o Matogrosso"
A
atriz Leticia Colin repostou algumas mensagens de outras personalidades no
Instagram. Em uma delas, postada pelo apresentador Fernando Oliveira, estava
escrito: "Ney, pra mim, só o Matogrosso".
Letícia
ainda compartilhou uma segunda mensagem que dizia: "É inacreditável que
tenha gente no Brasil realmente propondo privatização de praias nesse momento e
ainda, supostamente, com apoio de uma pessoa tida como a maior representação
atual do futebol brasileiro. Parece tudo uma grande piada de péssimo
gosto."
A
atriz Elisa Lucinda se juntou aos críticos da privatização e de Neymar,
escrevendo:
"Querem
por o mar no bolso, Odoyá, e lucrar. Aquele que privatizar as praias de Yemanjá
terá infortúnio público e particular. Aquele que aprovar vender o direito ao
mar, está longe da grandeza de Vini Jr. e tragicamente perto do anti-Brasil
saudável, que se tornou Neymar."
Fonte:
g1
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