Modelo de Lira para regulamentar reforma
tributária gera apreensão de parlamentares e empresários
Parlamentares e
representantes dos setores produtivos estão apreensivos com o modelo escolhido
pelo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), para a tramitação
dos textos que irão regulamentar a reforma tributária.
Nesta semana, Lira
oficializou a criação de dois grupos com sete deputados cada e descartou a
possibilidade de um único parlamentar ser o relator das propostas, como foi
feito durante a tramitação da PEC (proposta de emenda à Constituição) da
reforma.
A avaliação de
parlamentares ouvidos pela Folha de S.Paulo é que isso aumenta o poder de Lira,
uma vez que concentra nas mãos do alagoano as decisões que serão tomadas. Eles
dizem que sem um relator para acompanhar as discussões e elaboração do texto,
eventuais impasses em pontos da matéria acabarão sendo deliberados por Lira.
Desde o começo da
tramitação da matéria na Casa, Lira tem se colocado como uma espécie de fiador
da reforma, em busca de uma marca emblemática para sua gestão à frente da
Câmara.
Já na visão de Lira,
esse modelo torna o debate mais "democrático" e que se dará de forma
transparente e aberta, com audiências públicas e participação dos setores.
"Todos serão
relatores, todos serão membros. Na hora de cumprir os ritos regimentais, a
gente escolhe um deles para assinar o que todos vão fazer conjuntamente",
disse. "A participação de todos os partidos, com cada um indicando um
membro para o GT, já dará uma amplitude de debate, uma participação, como já
foi na PEC", disse nesta semana.
Um dos insatisfeitos
foi o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), que mostrou
preocupação com o fato de nenhum deputado de São Paulo estar no grupo que
analisará o primeiro texto enviado pelo governo ao Congresso.
A preocupação chegou
ao presidente da Câmara por intermédio do presidente do MDB, deputado Baleia
Rossi (SP), e autor da PEC da reforma. Na conversa entre os dois, Lira
argumentou que Baleia, como presidente de partido, poderia ter indicado um
paulista para o grupo.
Baleia acabou
escolhendo um deputado do Nordeste, Hildo Rocha (MDB-MA), que, no entendimento
do dirigente, é quem mais entende de tributação na bancada.
Lira também ligou para
Tarcísio e buscou tranquilizar o governador, dizendo que o estado não seria
prejudicado na regulamentação. Ponderou, ainda, que o segundo projeto --ainda
não enviado pelo governo Lula-- é que vai tratar de assuntos mais ligados aos
estados.
O presidente da Câmara
também ligou para o governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL). Ele
pretende ainda falar com todos os governadores.
O governo federal, por
sua vez, espera para avaliar se esse modelo pode facilitar ou prejudicar a
tramitação.
A interlocutores Lira
tem reforçado que não quer e nem será um super-relator. Ele também disse que o
nome do relator sairá do próprio grupo de trabalho, que já fez uma primeira
reunião e vai divulgar na próxima semana um plano de voo.
Ele tem argumentado
que os críticos querem criar um ambiente de especulação para atrapalhar a
reforma, mas que ela será aprovada na Câmara até o início do recesso
parlamentar, que começa oficialmente em 18 de julho.
Esse risco de
transtorno, no entanto, tem sido citado nos bastidores por negociadores da
reforma e empresários do setor produtivo, ouvidos pela Folha na condição de
anonimato.
Ninguém faz críticas
públicas para não bater de frente com o presidente da Câmara justamente nesse
momento delicado, quando pontos específicos do texto podem prejudicar ou ajudar
os setores após a implementação da reforma.
O próprio Lira já
recebeu 43 pedidos de audiência de representantes de categorias, mas preferiu
não atender nenhum deles. O argumento foi o de não ser influenciado em pontos
que serão decididos pelos deputados do grupo de trabalho. A estratégia foi
repassar os pedidos ao colegiado.
O presidente da Casa,
porém, já avisou a interlocutores que o texto do governo que chegou à Câmara
"não veio muito quadrado" e, portanto, ajustes pontuais serão feitos
na Câmara.
Na tramitação da PEC,
o relator foi o deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), que ficou de fora dos
grupos desta vez.
O nome do parlamentar
tinha apoio do Ministério da Fazenda, de integrantes de frentes parlamentares e
de representantes do setor produtivo para seguir no posto.
A Folha mostrou em
abril que, em meio às disputas antecipadas pela sucessão na Mesa Diretora da
Câmara, circulava nos bastidores a possibilidade de Ribeiro ter sua posição de
protagonismo ameaçada.
O modelo de tramitação
é considerado heterodoxo pelos grupos que participam das negociações da
reforma, principalmente porque o sistema não conta com nenhuma liderança para
coordenar os trabalhos de mudanças no texto proposto pelo Ministério da
Fazenda.
Com o afastamento de
Ribeiro, que tinha relação próxima com a equipe do ministro Fernando Haddad
(Fazenda), o comando das negociações pelo presidente da Câmara ficará mais
fácil, na avaliação dos críticos. À frente da relatoria desde o início da
tramitação, antes mesmo do início do governo Lula, Ribeiro poderia ser um
contraponto técnico mais forte.
Aliados de Lira
relatam que o presidente da Câmara se irritava a cada apoio público à
permanência de Ribeiro na relatoria. Além do apoio de Haddad, do secretário
extraordinário de Reforma Tributária, Bernard Appy, e de setores empresariais,
o presidente Lula defendeu publicamente Ribeiro.
Lira tem dito que o
deputado do PP já teve muito protagonismo na reforma e que, mesmo fora do grupo
de trabalho, vai ajudá-lo na tramitação da regulamentação.
Cada grupo analisará
um dos textos enviados pelo Executivo. Eles terão 60 dias para concluir seus
trabalhos, contados a partir desta terça (21), mas, se necessário, o prazo pode
ser prorrogado, segundo Lira publicou nas redes sociais.
O primeiro projeto de
lei complementar trata das regras gerais de operação dos novos tributos, a CBS
(Contribuição sobre Bens e Serviços) federal, o IBS (Imposto sobre Bens e
Serviços) de estados e municípios e o IS (Imposto Seletivo).
O grupo para analisar
esse texto será formado pelos seguintes deputados: Claudio Cajado (PP-BA),
Reginaldo Lopes (PT-MG), Hildo Rocha (MDB-MA), Joaquim Passarinho (PL-PA),
Augusto Coutinho (Republicanos-PE), Moses Rodrigues (União Brasil-CE) e Luiz
Gastão (PSD-CE).
Lopes tem trabalhado
intensamente nos bastidores para ser o relator ao final dos trabalhos do grupo
de trabalho. O nome de Mauro Benevides Filho (PDT-CE), que se tornou
recentemente um dos vice-líderes do governo na Casa, também aparece na bolsa de
apostas.
O outro texto, que
deverá ser enviado ao Congresso pela equipe de Haddad na próxima semana,
tratará da regulamentação do comitê gestor do IBS e das novas regras sobre como
lidar com disputas administrativas e judiciais dos novos tributos.
Ele será analisado por
grupo que tem Vitor Lippi (PSDB-SP), Pedro Campos (PSB-PE), Mauro Benevides
Filho, Luiz Carlos Hauly (Podemos-PR), Ivan Valente (PSOL-SP), Aureo Ribeiro
(Solidariedade-RJ) e Bruno Farias (Avante-MG).
Aliados de Lira
minimizam as críticas sobre os integrantes dos grupos e dizem que foram os
próprios partidos que indicaram os nomes --coube ao alagoano escolher quais.
Inicialmente, foi
aventada a possibilidade de que um partido poderia ter mais de um
representante, por isso as siglas indicaram mais de um nome para compor os
grupos.
Além disso, aliados do
presidente da Câmara dizem que sempre haverá reclamações por parte dos
parlamentares que acabaram preteridos, seja para ocupar uma cadeira no grupo ou
para ser o próprio relator.
Integrantes dos grupos
de trabalho
- GRUPO 1
<< Claudio
Cajado (PP-BA)
Deputado em seu sétimo
mandato, é advogado. Foi filiado ao PFL e ao DEM e hoje é do Progressistas. Foi
relator na Câmara dos Deputados do novo arcabouço fiscal no ano passado
<< Reginaldo
Lopes (PT-MG)
Foi coordenador do
grupo de trabalho da reforma tributária na Câmara e líder do PT na Casa em
2022. Foi cotado para ocupar um ministério de Lula durante a transição do
governo. Em seu sexto mandato, é economista
<< Hildo Rocha
(MDB-MA)
Ex-secretário-executivo
do Ministério das Cidades do governo Lula, não conseguiu se reeleger em 2022.
Assumiu mandato em maio deste ano, como suplente, na vaga de Roseana Sarney,
que está em licença. Foi prefeito de Cantanhede, no Maranhão, e é administrador
<< Joaquim
Passarinho (PL-PA)
Arquiteto, é
presidente da FPE (Frente Parlamentar do Empreendedorismo) e está em seu
terceiro mandato. Foi suplente na CPI do MST na Câmara no ano passado e é
sobrinho do ex-governador e ex-ministro da ditadura militar Jarbas Passarinho
<< Augusto
Coutinho (Republicanos-PE)
Deputado em seu quarto
mandato, é engenheiro. Atua como terceiro vice-presidente da comissão de
Indústria, Comércio e Serviços da Câmara
<< Moses
Rodrigues (União Brasil-CE)
Deputado em seu
terceiro mandato, é administrador e professor. Foi presidente da comissão de
Educação da Câmara em 2023
<< Luiz Gastão
(PSD-CE)
Empresário, foi eleito
para seu primeiro mandato em 2022. É presidente da Federação do Comércio de
Bens, Serviços e Turismo do Ceará e um dos vice-líderes do bloco que reúne MDB,
PSD, Republicanos e Podemos
- GRUPO 2
<< Vitor Lippi
(PSDB-SP)
Integrou o grupo de
trabalho da reforma tributária na Câmara. Médico, está em seu terceiro mandato
de deputado federal. Foi prefeito de Sorocaba, no interior de São Paulo
<< Pedro Campos
(PSB-PE)
Eleito para seu
primeiro mandato em 2022, é engenheiro e um dos vice-líderes do PSB na Câmara.
É irmão do prefeito do Recife, João Campos (PSB)
<< Mauro
Benevides Filho (PDT-CE)
Em seu segundo
mandato, é um dos vice-líderes do governo na Câmara dos Deputados e integrou o
grupo de trabalho da reforma tributária na Casa. É professor e foi secretário
do Planejamento e Gestão do Ceará
<< Luiz Carlos
Hauly (Podemos-PR)
Um dos idealizadores
da reforma tributária aprovada na Câmara no ano passado, assumiu mandato com a
cassação de Deltan Dallagnol (Novo-PR) em junho de 2023. Economista e
professor, está em seu oitavo mandato. Foi secretário da Fazenda do Paraná
<< Ivan Valente
(PSOL-SP)
Professor e
engenheiro, está em seu oitavo mandato. Fez parte do grupo de trabalho da
reforma tributária na Casa
<< Aureo Ribeiro
(Solidariedade-RJ)
Líder do Solidariedade
na Câmara, é empresário e está em seu quarto mandato. Foi presidente da CPI das
Pirâmides Financeiras na Casa no ano passado
<< Bruno Farias
(Avante-MG)
Eleito pela primeira
vez em 2022, é enfermeiro e presidente do Coren (Conselho Regional de
Enfermagem) de Minas Gerais. É o primeiro vice-presidente da comissão de
Administração e Serviço Pública da Câmara. Atuou nas CPIs da Americanas e das
Pirâmides Financeiras no ano passado
Fonte: FolhaPress
Nenhum comentário:
Postar um comentário