terça-feira, 26 de março de 2024

Guarda-costas de Brazão recolhia dinheiro da milícia em igreja de Malafaia

Novas revelações surgem no caso Marielle Franco a partir de registros do “disque-denúncia” do Rio de Janeiro, apontando o envolvimento de Robson Calixto, assessor de Domingos Brazão na Alerj e no TCE-RJ, com atividades de milicianos.

De acordo com informações anônimas fornecidas à Polícia do Rio, Robson Calixto, conhecido como “Peixe”, era intermediário entre os Brazão e Ronnie Lessa, o assassino da vereadora Marielle Franco.

Relatos indicam que Robson era avistado regularmente em uma igreja evangélica do pastor Silas Malafaia próxima à UPP da Taquara, recebendo dinheiro arrecadado na região para a milícia, nos dias 15 e 30 de cada mês. Além disso, denúncias sugerem que Robson atuava como “segurança informal” de Domingos Brazão, estando frequentemente armado.

Informações constantes no inquérito final da Polícia Federal sobre os assassinatos da vereadora Marielle Franco e de seu motorista, Anderson Gomes, apontam que o segurança de um dos mandantes, o conselheiro do TCE-RJ Domingos Brazão, identificado como Robson Calixto, o “Peixe”, recebia duas vezes por mês quantias originárias da arrecadação criminosa das milícias que operam na Zona Oeste do Rio numa igreja evangélica que é de propriedade do pastor bolsonarista Silas Malafaia.

De acordo com o documento policial, a informação apareceu na investigação após ligações anônimas para o serviço de “disque-denúncia” do estado, conforme consta em imagem reproduzida na página 170 do relatório, que teve seu sigilo levantado neste domingo (24) pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF.

“Na estrada citada, próxima da UPP da Taquara, localiza-se uma igreja evangélica do Silas Malafaia, onde pode ser encontrado o miliciano ‘Robson Calixto Fonseca”, de vulgo “Peixe”, nos dias 15 e 30 de todo mês, para receber a quantia que é arrecadada na região. Ele anda armado, é policial e segurança particular do deputado Domingos Brazão”, diz a denúncia anexada ao inquérito da PF, que data de 18 de junho de 2018.

A versão usada nesta reportagem do texto com a denúncia foi corrigida em seus vários erros de ortografia. No entanto, a expressão “UPP” está equivocada e se refere, na verdade, à “UPA” da Taquara, que de fato fica a cerca de 70 metros de distância da ADVEC, a “Assembleia de Deus Vitória em Cristo”, igreja da qual Silas Malafaia é dono. Não há Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) na região mencionada.

“Peixe”, conforme mostram as investigações, seria um policial militar atuante na milícia de Rio das Pedras há muitos anos, além de homem de confiança de Domingos Brazão, de quem realizava uma espécie de segurança improvisada, o acompanhando constantemente. O nome dele aparece em inúmeros outros inquéritos abertos pelo Gaeco (Grupo de Atuação Especial contra o Crime Organizado), do Ministério Público do Rio de Janeiro.

 

       Braga Netto demitiu delegado que avisou que Rivaldo tinha ligação com milícias

 

O general Walter Braga Netto, um dos mais amedalhados integrantes da cúpula do bolsonarismo, que foi candidato a vice-presidente da República na chapa de Jair Bolsonaro (PL) em 2022, vê sua situação se complicar cada vez mais com a Justiça. Ele, que já é uma das figuras centrais no inquérito que apura a tentativa de golpe de Estado ocorrida no final do último governo, agora, está às voltas com a elucidação do caso do assassinato da vereadora Marielle Franco e de seu motorista, Anderson Gomes, ocorrido em março de 2018.

Interventor federal no Rio de Janeiro à época do crime, Braga Netto já tinha sido apontado no relatório da PF sobre o caso, divulgado neste domingo (24), como o responsável em última instância pela nomeação do delegado Rivaldo Barbosa para o cargo de chefe da Polícia Civil fluminense. Rivaldo é acusado de ser um dos três mandantes, junto com os irmãos Chiquinho e Domingos Brazão, do duplo homicídio de repercussão mundial.

Não bastasse a revelação de que seu subordinado direto, o general Richard Nunes, então secretário de Segurança Pública na intervenção, contrariou todos os alertas da Subsecretaria de Inteligência para não nomear Rivaldo para o posto máximo da Polícia Civil, por ter notórias relações com as milícias do estado, surge então uma nova e perturbadora informação: Braga Netto teria demitido de forma direta o delegado federal que deu o aviso sobre a conduta criminosa de Rivaldo, insistindo ao máximo para que o general não permitisse sua nomeação.

Fábio Galvão, então no cargo de subsecretário de Inteligência da Secretaria de Segurança Pública do Rio de Janeiro, alertou à cúpula da intervenção federal, chefiada por Braga Netto e que tinha Richard Nunes como secretário de Segurança, e mostrou informes sobre Rivaldo, que desde o período em que comandou a Delegacia de Homicídios da Capital (DHC) seria um policial corrupto e dos intestinos das milícias que operam na Zona Norte da metrópole.

Diante do aviso, Braga Netto não só ignorou Galvão, autorizando o insistente Richard Nunes a dar o cargo de chefe da Polícia Civil ao agora acusado de mandar matar Marielle, como também o demitiu do cargo de subsecretário de Inteligência da Secretaria de Segurança Pública do Rio cinco meses depois, o devolvendo aos quadros da Polícia Federal, o que, portanto, colocava o delegado longe das atribuições nessa área no Rio de Janeiro.

Galvão era, àquela altura, um prestigiado delegado que havia coordenado operações que colocaram na cadeia 1.288 criminosos, sendo 375 deles eram do setor da Segurança, todos acusados de corrupção.

•        General ligado a Braga Netto “bancou” nomeação de delegado acusado de matar Marielle

O relatório final da Polícia Federal sobre as investigações dos assassinatos da vereadora Marielle Franco e de seu motorista, Anderson Gomes, enviado à Justiça e à Procuradoria-Geral da República mostra que o delegado acusado de ser um dos três mandantes do crime, Rivaldo Barbosa, foi “bancado” para o cargo de Chefe da Polícia Civil do Rio de Janeiro por um general do Exército ligado ao também general Walter Braga Netto, que à época do crime, no início de 2018, era o interventor federal no Rio. Braga Netto é uma das figuras mais ilustres e poderosas da extrema direita brasileira e foi o candidato a vice-presidente da República na chapa de Jair Bolsonaro (PL) em 2022.

O general Richard Nunes, então secretário de Segurança Pública nomeado pelo interventor Braga Netto, insistiu muito para a nomeação de Barbosa para comandar a Polícia Civil fluminense, mesmo existindo contra o delegado uma série de contraindicações apontadas em relatórios da Subsecretaria de Inteligência da Secretaria de Segurança Pública, que mostrava, com base em documentos do Gaeco (Grupo de Atuação Especial contra o Crime Organizado), do Ministério Público do Rio de Janeiro, que Rivaldo era apontado como recebedor de vantagens indevidas durante o período em que foi o responsável pela Delegacia de Homicídios da Capital (DHC). Na prática, os autos manifestavam que o policial era corrupto e mantinha ligações com o crime organizado.

Como “argumento” para insistir na nomeação de Rivaldo para a chefia da Polícia Civil, o general Nunes advogou defendendo o delegado ao dizer que “tais contraindicações não eram pautadas em dados objetivos”. De fato, Rivaldo foi nomeado para o cargo em 13 de março de 2018, um dia antes da morte de Marielle, que agora é atribuída a ele e aos irmãos Chiquinho e Domingos Brazão, o primeiro deputado federal e o segundo conselheiro do TCE-RJ.

As informações que levantam o nome dos generais Braga Netto e Richard Nunes como agentes relacionados à nomeação de Rivaldo como delegado-geral da Polícia Civil no estado constam a partir da página 277 do relatório final da PF, que teve seu sigilo levantado, junto com outros vários documentos da investigação do crime sofrido por Marielle Franco, neste domingo (24) pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal.

 

       Mulher de Rivaldo Barbosa movimentou mais de R$7 milhões com empresas de fachada

 

Segundo a Polícia Federal, Erika Andrade de Almeida Araújo, advogada e empresária, esposa do ex-líder da Polícia Civil Rivaldo Barbosa, detido neste domingo (24), é identificada como “laranja” do marido em empresas fictícias utilizadas pelo delegado para lavar dinheiro adquirido de forma ilegal durante seu comando na Delegacia de Homicídios da capital.

Erika colaborou na lavagem de dinheiro, co-fundando, junto com o marido, empresas de consultoria como a Mais I Consultoria Empresarial LTDA e Armis Consultoria Empresarial Eireli. Ela é alvo de investigações da PF por suspeita de lavagem de dinheiro.

A advogada aparece como a pessoa responsável por retirar valores das contas das empresas e uma análise bancária mostrou que, entre janeiro de 2015 e dezembro de 2019, ela movimentou mais de R$ 7 milhões.

Conforme a PF, há evidências de que Barbosa era o verdadeiro administrador das empresas e o responsável pela comunicação com os clientes e apresentação dos serviços oferecidos.

Durante o período em que ele liderou a DH da capital, de janeiro de 2012 a outubro de 2015, e posteriormente, de outubro de 2015 a março de 2018, quando assumiu a Divisão de Homicídios, a PF alega que ele recebeu propina para evitar investigações sobre homicídios cometidos por organizações criminosas, decorrentes de disputas territoriais pelo “jogo do bicho”.

Isso foi evidenciado pela declaração de bens do delegado, que apresentou um aumento significativo de seu patrimônio, incluindo múltiplos imóveis adquiridos no período.

O delegado e sua esposa ingressaram no setor privado em 2014, quando estabeleceram a Mais I Consultoria Empresarial. Erika Araújo, formada em administração e direito, atuou como advogada na Fragata Antunes e Advogados Associados por menos de dois anos, entre 2007 e 2009.

Conforme dados do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF), Erika declarou ser sócia de duas empresas e desempenhar a função de “Inspetora de Qualidade”, com uma remuneração de R$ 28.920,56.

No entanto, houve um aumento significativo na renda de Erika em poucos meses após a criação das empresas, considerando que antes disso seu maior salário havia sido em torno de R$ 4.830,00, quando estava na prefeitura do Rio de Janeiro.

A investigação da PF destaca que, poucos meses após a constituição das empresas, elas já estavam recebendo grandes aportes de capital de empresas consolidadas no mercado.

Um desses aportes foi mencionado em uma denúncia do Ministério Público do Rio, em 2018, na qual o delegado e outros sete investigados foram acusados de crimes contra a Lei de Licitações. Na ocasião, a empresa da família de Rivaldo Barbosa recebeu R$ 160 mil por consultoria à Light Distribuidora de Energia. O MP solicitou à Justiça o afastamento de Rivaldo da chefia da polícia.

De acordo com o relatório contábil (DRE – Demonstração do Resultado do Exercício) de uma das empresas (Armis), foi declarado um lucro líquido de R$ 558.886,09, somente no período de 01 de maio de 2017 a 31 de dezembro de 2017, o que representa, em média, um lucro líquido de quase R$ 70.000,00 mensais.

O COAF informou que a empresa Mais I Consultoria declarou um faturamento de R$ 20.000,00 por mês. Entretanto, ao verificar as movimentações nas contas da empresa no período de 01 de junho de 2016 a 18 de junho de 2018, constatou-se uma movimentação de R$ 1.072.598,00 a crédito e R$ 1.141.159,00 a débito. Ou seja, um valor mais de duas vezes superior ao faturamento declarado.

O relatório do COAF também apontou que a empresa preferia saques em dinheiro, uma estratégia pouco comum, em vez de usar métodos mais seguros como transferências bancárias. Destacou-se uma retirada de alta quantia feita por Erika das contas da empresa, no valor de R$ 880.019,46.

Além das movimentações financeiras incompatíveis com a renda e o faturamento declarados, a PF também aponta uma alta frequência de operações financeiras em dinheiro e o aumento considerável do patrimônio do casal, principalmente pela aquisição de imóveis.

 

       Witzel já disse que foi perseguido por Bolsonaro por investigar a fundo caso Marielle

 

Após as prisões dos três acusados de mandarem matar a vereadora Marielle Franco e seu motorista, Anderson Gomes, o deputado federal Chiquinho Brazão (UB-RJ), seu irmão e conselheiro do TCE-RJ Domingos Brazão e o ex-delegado-geral da Polícia Civil fluminense Rivaldo Barbosa, ocorridas neste domingo (24), uma declaração do ex-governador do Rio Wilson Witzel, contextualizada e analisada sob a ótica das informações do inquérito agora divulgadas, voltou a ser repercutida nas redes sociais.

Alvo de um processo de impeachment relâmpago após ter caído em desgraça com o então presidente Jair Bolsonaro (PL), a quem se dedicou e apoiou na campanha de 2018, na qual ambos saíram vitoriosos, Witzel declarou em 2021, já fora do cargo, que havia sido perseguido e massacrado por Bolsonaro por investigar a fundo o assassinato da vereadora do PSOL. O então governador foi quem afastou da chefia da Polícia Civil o delegado Rivaldo Barbosa, agora acusado de ser um dos mandantes do assassinato político.

“Tudo isso começou porque eu mandei investigar sem parcialidade o caso Marielle. Quando foram presos os dois executores da Marielle, o meu calvário e a perseguição contra mim foram inexoráveis”, afirmou Witzel na CPI da Covid, em junho de 2021.

De fato, foi ainda sob a gestão de Witzel que os nomes de Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz surgiram como executores do crime, levando os dois para a cadeia. Apenas agora, anos depois, uma delação premiada do primeiro é que revelou finalmente os mandantes do duplo homicídio. O ex-governador, ao prestar depoimento na Comissão Parlamentar de Inquérito, lembrou também que após a descoberta da identidade dos dois executores, Bolsonaro correu para as redes sociais, ainda de madrugada nos Emirados Árabes Unidos, onde estava, para atacá-lo e desacreditar as investigações.

“Ver um presidente da República em uma live lá em Dubai acordar na madrugada para me atacar e dizer que eu estava manipulando a polícia do meu estado… Ou seja: quantos crimes de responsabilidade esse homem vai ter que cometer até que alguém pare ele?”, declarou na CPI, em 2021.

Neste domingo, após as detenções dos irmãos Brazão e do delegado Barbosa, Witzel voltou às redes para falar sobre o episódio em que afastou o policial da então direção da Polícia Civil e das represálias que sofreu por conta disso, aproveitando ainda para atacar a esquerda.

“Fui massacrado pela República quando determinei a prisão dos executores e sugeri delação. Fui massacrado pela esquerda após trocar o delegado por acreditar que era preciso fazer muito mais pra desvendar o caso. Sensação de dever cumprido, ainda que tenha custado meu mandato”, postou em seu perfil oficial o ex-governador.

 

Fonte: Fórum

 

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