Arquivos Epstein: o que documentos altamente esperados revelaram sobre o
escândalo nos EUA?
O Tribunal Distrital dos EUA para o Distrito Sul de
Nova York abriu centenas de documentos ligados ao acusado de tráfico sexual
Jeffrey Epstein, identificando vários indivíduos, alguns dos quais incluem políticos
proeminentes e figuras públicas notáveis.
O tribunal começou a enviar os registros para
sistemas de registros públicos na noite de quarta-feira (3), embora o intenso
tráfego on-line inicialmente tenha impedido o acesso à liberação.
No mês passado, um juiz federal ordenou a
divulgação de quase 200 nomes ligados ao caso Epstein, embora duas pessoas
tenham solicitado que os seus nomes permanecessem confidenciais por enquanto,
devido à possibilidade de danos físicos. Os nomes incluem acusadores e
testemunhas do caso.
Epstein, um criminoso sexual condenado, morreu em
2019 enquanto aguardava julgamento por novas acusações de tráfico sexual. Os
laços da figura desgraçada com uma série de celebridades e políticos devido ao
seu trabalho no setor financeiro alimentaram especulações contínuas sobre
potenciais novos laços com a sua alegada atividade criminosa.
Os últimos registros incluem trechos de depoimentos
da ex-socialite britânica Ghislaine Maxwell e Virginia Giuffre, que
anteriormente acusou Maxwell de facilitar seu abuso sexual após ser apresentada
a Epstein, entre outras testemunhas. Maxwell foi condenada em 2022 a cumprir 20
anos de prisão por diversas acusações, incluindo tráfico sexual por seu
envolvimento com os crimes de Epstein.
Os documentos não desclassificados não incluem
especificamente uma lista de clientes de Epstein. Também não equipara
diretamente indivíduos nomeados à prática de crimes. Nomes adicionais devem ser
divulgados nesta quinta-feira (4).
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Bill Clinton e Donald Trump
Os documentos judiciais revelaram que uma
testemunha alegou que Epstein certa vez indicou que o antigo presidente dos
EUA, Bill Clinton, que foi citado mais de 50 vezes nos documentos legais,
gostava de mulheres "jovens", se referindo a meninas.
A testemunha foi identificada como Johanna Sjoberg,
que teria sido recrutada por Maxwell e corroborou as alegações feitas por
Giuffre sobre o abuso sexual que sofreu sob Epstein e seus associados. O
depoimento de Sjoberg foi realizado em maio de 2016.
"Jeffrey [Epstein] alguma vez falou com você
sobre Bill Clinton?", Sjoberg foi questionada durante o depoimento.
"Ele disse uma vez que Clinton gosta delas jovens, referindo-se às
meninas", respondeu ela.
Em outra seção dos documentos, Sjoberg observou que
era sabido que Clinton "tinha relações" com Epstein, mas que não
tinha sido visto na infame ilha de Epstein, nas ilhas Virgens dos EUA, onde se
alega que muitas meninas menores de idade foram abusadas. O depoimento de
Maxwell relatou que ela não sabia quantas vezes Clinton havia voado no avião de
Epstein.
Clinton disse anteriormente que desconhecia
totalmente os "crimes terríveis" de Epstein.
Também foi detalhado que o ex-presidente dos EUA,
Donald Trump, nunca foi visto na casa ou na ilha particular de Epstein. Em
interrogatório separado, Sjoberg disse que nunca deu quaisquer favores sexuais
ou massagens ao ex-presidente.
No entanto, ela observou em seu depoimento que
Epstein parecia se gabar de seus laços com o ex-comandante-chefe, sugerindo que
ele poderia ligar para Trump e "ir ao cassino" que a dupla havia
visitado uma vez.
Não muito depois dos muros terem sido fechados em
torno das operações de Epstein e as acusações terem sido apresentadas sobre o
assunto, Trump transmitiu ao público que nunca foi um "fã" de Epstein
e que não falava com ele há anos.
·
Celebridades e figuras notáveis
Entre as dezenas de figuras citadas estavam o
músico Michael Jackson, que foi visto na casa de Epstein em Palm Beach, e o
mágico David Copperfield, que participou de uma das festas do investidor.
Embora tenha sido apontado que Jackson não parecia
ter nenhum comportamento ilegal, Sjoberg testemunhou que Copperfield apareceu
para perguntar sobre a operação de Epstein durante uma festa. Na verdade,
Sjoberg lembrou que o mágico "me questionou se eu sabia que as meninas
estavam sendo pagas para encontrar outras meninas".
Questionada se Copperfield mencionou
especificamente "adolescentes" ou aludiu a quaisquer
"especificidades" da atividade criminosa de Epstein, Sjoberg disse
que não.
Em resposta a uma pergunta complementar, a
testemunha detalhou que Frederic Fekkai, conhecido como cabeleireiro de
celebridades, foi verificado por Epstein. "Eu ouvi ele [Epstein] ligar
para alguém e dizer: Fekkai está no Havaí. Podemos encontrar algumas garotas
para ele?", lembrou ela.
Quando questionada sobre sua própria reação à
menção de Fekkai na época, Sjoberg respondeu: "Bem, eu estava massageando
e não tive reação. Tentei permanecer sem reação durante os cinco anos
inteiros".
Em outras partes dos documentos de depoimento,
atores como Leonardo DiCaprio, Cate Blanchett, Kevin Spacey, Cameron Diaz e
Naomi Campbell foram mencionados de passagem durante interrogatórios sobre
pessoas notáveis que podem ter entrado em contato com as operações de Epstein.
No entanto, a testemunha em cada instância disse
que nunca conheceu nenhum dos personagens. "Espero me lembrar", foi
uma resposta quando questionada sobre Blanchett ou DiCaprio.
Em outra parte do depoimento, a notável figura
científica Stephen Hawking foi identificada em um e-mail de Epstein, onde ele
parecia pedir a Maxwell que subornasse qualquer associado de Giuffre para
refutar suas afirmações — uma que ele alegou sugerir que Hawking desempenhou um
papel em uma "orgia de menores".
Embora o novo comunicado ofereça alguns novos
detalhes das operações de Epstein, ele também relembra os laços anteriormente
conhecidos entre o nova-iorquino e seus associados, como o príncipe Andrew e o
advogado Alan Dershowitz.
O príncipe Andrew, que já resolveu um processo com
Giuffre em 2022, mas se recusou a admitir qualquer irregularidade, foi descrito
em uma aparição em que a realeza do Reino Unido colocou a mão no peito de uma
testemunha durante uma foto com Giuffre e Maxwell.
Quanto a Dershowitz, que está ligado a Epstein há
anos e parecia ter saudado anteriormente a libertação, o testemunho mostrou que
ele tinha o nome verificado por Jane Doe e alegado ter tido relações sexuais
com o indivíduo quando ela ainda era menor. Giuffre entrou com uma ação contra
Dershowitz, mas a retirou em 2022 após admitir que se tratava de um erro de
identidade.
Outra figura anteriormente citada é Jean Luc
Brunel, um ex-agente de modelos com longos laços com Epstein e que foi
encontrado morto dentro de uma cela na prisão em 2022 enquanto aguardava
acusações de tráfico sexual.
POLÊMICAS
A divulgação dos nomes vem causando polêmica no
país norte-americano, não só por se tratarem de políticos e artistas famosos
como porque o informe admite que nem todos os nomes citados eram de clientes do
serviço de acompanhantes sexuais adolescentes oferecido por Epstein, mas não
distingue quem estava ou não envolvido com a atividade ilícita.
Entre os famosos envolvidos
com Epstein – que faleceu em 2019, enquanto cumpria pena de prisão – estão
dois ex-presidentes norte-americanos, e de diferentes partidos: Donald Trump
(2017-2021) e Bill Clinton (1995-2001).
O caso de Trump já era conhecido, já que existem
fotos em que ele aparece ao lado de Epstein, ou visitando sua mansão em Palm
Beach, onde funcionava a rede de prostituição, segundo as investigações. Ainda
assim, não haveria provas materiais de que o ex-mandatário teria utilizado o
serviço de acompanhantes menores de idade.
Outro nome que chamou a atenção foi o do papa João
Paulo II. Neste caso, porém, não há qualquer registro de foto dele com Epstein
nem de visita do sumo pontífice da Igreja Católica à mansão do megaespeculador
em Palm Beach, na Flórida.
O príncipe Andrew, irmão mais novo do atual rei da
Inglaterra, Charles III, também aparece na lista. Outra figura famosa é a do
físico britânico Stephen Hawking.
Contudo, a maioria das celebridades que aparecem na
lista são artistas ligados ao mundo do cinema e da música. Entre eles estão
nomes como Tom Hanks, Leonardo di Caprio, Kevin Spacey, George Lucas e Michael
Jackson.
Também há diversos nomes de mulheres famosas na
lista, especialmente modelos, como Naomi Campbell, Claudia Schiffer e Heidi
Klum, além da apresentadora de televisão Oprah Winfrey.
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Príncipe Andrew nega acusação
Os documentos recém-divulgados incluem referências
a Johanna Sjoberg.
Ela afirmou que o príncipe Andrew apalpou seu seio
enquanto estava sentado em um sofá no apartamento de Epstein em Manhattan, nos
EUA, em 2001.
O Palácio de Buckingham já havia afirmado que as
acusações são "categoricamente falsas".
Em depoimento já divulgado anteriormente, Sjoberg
alegou que o príncipe Andrew colocou a mão em seu seio ao posar para uma foto
com outra acusadora, Virginia Giuffre, e um fantoche com os dizeres
"Príncipe Andrew".
Em 2022, a realeza britânica pagou milhões a
Giuffre para encerrar um processo movido por Giuffre. Ela acusou Andrew de
abuso sexual quando ela tinha 17 anos.
O príncipe disse que nunca conheceu Giuffre e negou
todas as acusações.
Apesar disso, uma foto que retrata os dois juntos a
Maxwell circula amplamente nas redes sociais.
·
As viagens de Bill Clinton
O ex-presidente dos EUA Bill Clinton, também é
citado nos documentos judiciais, embora não exista qualquer ilegalidade ligada
a seu nome.
Os representantes do ex-presidente americano
disseram que a menção ao nome dele aconteceu devido a uma declaração que ele
emitiu em 2019, alegando que "não sabia nada" sobre os crimes de
Epstein.
Segundo os documentos judiciais, Sjoberg afirmou
que certa vez Epstein lhe disse que Clinton "gosta delas jovens,
referindo-se às meninas".
Clinton teve um caso com uma estagiária da Casa
Branca de 22 anos, Monica Lewinsky, enquanto era presidente dos EUA.
Os documentos também incluem depoimentos de Maxwell
confirmando que Clinton viajou a bordo do jato particular de Epstein, mas ela
não soube precisar quantas vezes isso ocorreu.
Clinton viajou no avião de Epstein no que foi
descrito como "viagens humanitárias à África" no início dos anos
2000.
À época, ele elogiou Epstein como um
"filantropo empenhado", embora tenha dito que mais tarde cortou
relações com ele.
Em sua declaração de 2019, o ex-presidente
americano disse ter sido acompanhado em suas viagens a bordo do jato de Epstein
por funcionários e apoiadores de sua instituição de caridade, a Fundação
Clinton.
"Os funcionários do Serviço Secreto estavam no
mesmo voo, em todos os trechos de cada viagem", detalha o comunicado
divulgado por representantes de Clinton.
Os documentos judiciais incluem um trecho no qual o
advogado de Maxwell tenta desmentir uma reportagem segundo a qual, pouco depois
de ter deixado o cargo, em janeiro de 2001, Clinton teria viajado para uma ilha
privada que pertencia a Epstein.
Um advogado de Maxwell disse que o ex-presidente
dos EUA "de fato não viajou nem esteve presente na Ilha Little St James
entre 1º de janeiro de 2001 e 1º de janeiro de 2003".
O advogado acrescentou que, se a afirmação fosse
verdadeira, os agentes do Serviço Secreto teriam sido obrigados a apresentar os
registros de viagem da época.
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Por que Trump é mencionado?
O documento também inclui um depoimento de Sjoberg
alegando que Epstein disse a ela que entraria em contato com Donald Trump a
caminho de um cassino em Nova Jersey, no ano de 2001.
"Jeffrey disse: 'Ótimo, vamos ligar para
Trump'", disse ela em juízo, depois que os pilotos afirmaram que seu avião
não poderia pousar em Nova York e precisaria parar em Atlantic City, em Nova
Jersey.
Os documentos não mencionam nenhuma irregularidade
cometida por Trump.
Em determinado momento do depoimento, Sjoberg é
questionada se ela alguma vez fez uma massagem em Trump. Ela responde que não.
Ø Quem era
Jeffrey Epstein, bilionário americano acusado de tráfico sexual de menores
encontrado morto na prisão
"Não sou um predador sexual, sou um
infrator", declarou Jeffrey Epstein ao New York Post em 2011. Esse
bilionário americano teve seu rosto estampado em capas de jornais depois de ter
sido oficialmente denunciado no Estado de Nova York por tráfico sexual
envolvendo meninas menores de idade. Já havia sido condenado por solicitar
prostituição a uma menor de idade, mas conseguiu escapar de grandes
condenações.
Dessa vez, Epstein estava preso em uma prisão em
Manhattan aguardando seu julgamento. No entanto, foi encontrado morto na
prisão, segundo noticiou o jornal americano The New York Times. De acordo com o
diário, autoridades informaram que ele cometeu suicídio se enforcando na cela,
e seu corpo foi encontrado às 7:30 do horário local. Ele estava no Metropolitan
Correctional Center, um centro de detenções em Nova York. O empresário de 66
anos havia se declarado inocente.
Na denúncia, procuradores afirmaram que Epstein e
seus funcionários tinham sido responsáveis por um grande esquema de tráfico
sexual, levando meninas jovens —algumas de 14 anos— para sua mansão em Nova
York e sua casa na Flórida entre 2002 e 2005.
No mês passado, uma semana depois de ter tido um
pedido de fiança recusado, ele foi encontrado inconsciente em sua cela com
marcas no pescoço. Autoridades estavam investigando se aquilo teria sido uma
tentativa de suicídio.
Epstein havia sido preso no dia 6 de julho depois
de voar de Paris, onde tinha uma casa, e pousar no Estado de New Jersey em seu
avião privado.
Ele era conhecido por circular entre a elite, com
poderosos como o presidente americano Donald Trump, o ex-presidente americano
Bill Clinton e o príncipe Andrew, do Reino Unido.
Quem era ele, afinal?
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'Cara ótimo'
Epstein nasceu e cresceu em Nova York. Estudou
física e matemática na universidade, mas nunca se formou. Deu aulas dessas
matérias em uma escola privada nos anos 1970.
O pai de um de seus alunos teria se impressionado
tanto que colocou Epstein em contato com um sócio do banco de investimentos
Bear Stearns, em Wall Street.
Ele se tornou sócio em quatro anos. Em 1982, já
tinha criado sua própria empresa - J Epstein and Co.
A empresa administrava recursos de clientes que
valiam mais de US$1 bilhão. Foi um sucesso instantâneo. Nessa época, Epstein
começou a gastar sua fortuna —adquiriu uma mansão na Flórida, uma fazenda no
Estado de New Mexico e uma gigantesca casa em Nova York— e a socializar com
celebridades, artistas e políticos.
"Conheço Jeff há 15 anos. Um cara ótimo",
afirmou o presidente americano Donald Trump à revista New York em um perfil
sobre Epstein em 2002. "É divertido estar com ele. Dizem que ele gosta de
mulheres bonitas tanto quanto eu, mas muitas delas são mais jovens. Não há
dúvidas - Jeffrey aproveita sua vida social."
Em 2002, Epstein levou o ex-presidente americano
Bill Clinton e os atores Kevin Spacey e Chris Tucker para a África em seu avião
privado. Tentou comprar a revista New York com o produtor de filmes Harvey
Weinstein, hoje acusado de assédio sexual por diversas mulheres, em 2003.
Naquele ano, fez uma doação de US$ 30 de milhões para a Universidade Harvard.
Mas ele também tentava manter uma vida privada,
deixando de ir a eventos e jantares.
Ele se relacionou com mulheres como Eva Andersson
Dubin, a Miss Suécia, e Ghislaine Maxwell, filha do publisher Robert Maxwell.
Rosa Monckton, ex-CEO da joalheria Tiffany &
Co, disse à revista Vanity Fair, em 2003, que Epstein era "muito
enigmático" e um "iceberg".
"Você acha que o conhece, mas vai descascando
suas camadas e encontra algo extraordinário por baixo", ela disse.
·
Condenação
Em 2005, os pais de uma menina de 14 anos disseram
à polícia da Flórida que Epstein havia abusado de sua filha em sua casa em Palm
Beach. A polícia conduziu uma busca pela casa e encontrou fotos da menina.
"Não era uma situação de 'ela disse, ele
disse'", disse um policial que conduzia as investigações na época.
"Havia 50 'ela disse' e um 'ele disse' - e tudo ligado a 'ela' contava a
mesma história."
Procuradores, no entanto, ofereceram um acordo para
ele.
Ele conseguiu escapar de denúncias federais —que
poderiam ter feito com que ele encarasse prisão perpétua— e em vez disso
recebeu uma sentença de 18 meses de prisão, durante a qual ele pode sair para o
trabalho por 12 horas por dia, seis dias por semana. Depois de 13 meses, foi
solto em liberdade vigiada.
O Miami Herald publicou uma investigação sobre o
caso em novembro de 2018. Segundo o jornal americano, o então procurador
federal Alexander Acosta propôs o acordo escondendo a extensão dos crimes e
colocando fim a uma investigação do FBI cujo objetivo era avaliar se havia mais
vítimas e buscar saber se outras pessoas poderosas haviam participado do
esquema. O jornal descreveu a resolução como "o acordo do século', e
trouxe depoimentos de mulheres que teriam sido abusadas por Epstein. Acosta,
que era secretário de Trabalho do governo Trump, renunciou no mês passado,
depois que Epstein foi preso.
Desde 2008, ele estava listado como um infrator
sexual em Nova York. Nos Estados Unidos, essa designação vale para a vida.
Mas ele manteve suas propriedades e bens depois da
condenação.
Dessa vez, procuradores estavam tentando confiscar
sua mansão de Nova York, onde supostos crimes teriam ocorrido. Se tivesse sido
condenado, ele poderia ter tido que enfrentar 45 anos de prisão.
Fonte: Sputnik Brasil/Página 12/BBC News Mundo
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