sexta-feira, 5 de janeiro de 2024

Arquivos Epstein: o que documentos altamente esperados revelaram sobre o escândalo nos EUA?

O Tribunal Distrital dos EUA para o Distrito Sul de Nova York abriu centenas de documentos ligados ao acusado de tráfico sexual Jeffrey Epstein, identificando vários indivíduos, alguns dos quais incluem políticos proeminentes e figuras públicas notáveis.

O tribunal começou a enviar os registros para sistemas de registros públicos na noite de quarta-feira (3), embora o intenso tráfego on-line inicialmente tenha impedido o acesso à liberação.

No mês passado, um juiz federal ordenou a divulgação de quase 200 nomes ligados ao caso Epstein, embora duas pessoas tenham solicitado que os seus nomes permanecessem confidenciais por enquanto, devido à possibilidade de danos físicos. Os nomes incluem acusadores e testemunhas do caso.

Epstein, um criminoso sexual condenado, morreu em 2019 enquanto aguardava julgamento por novas acusações de tráfico sexual. Os laços da figura desgraçada com uma série de celebridades e políticos devido ao seu trabalho no setor financeiro alimentaram especulações contínuas sobre potenciais novos laços com a sua alegada atividade criminosa.

Os últimos registros incluem trechos de depoimentos da ex-socialite britânica Ghislaine Maxwell e Virginia Giuffre, que anteriormente acusou Maxwell de facilitar seu abuso sexual após ser apresentada a Epstein, entre outras testemunhas. Maxwell foi condenada em 2022 a cumprir 20 anos de prisão por diversas acusações, incluindo tráfico sexual por seu envolvimento com os crimes de Epstein.

Os documentos não desclassificados não incluem especificamente uma lista de clientes de Epstein. Também não equipara diretamente indivíduos nomeados à prática de crimes. Nomes adicionais devem ser divulgados nesta quinta-feira (4).

·        Bill Clinton e Donald Trump

Os documentos judiciais revelaram que uma testemunha alegou que Epstein certa vez indicou que o antigo presidente dos EUA, Bill Clinton, que foi citado mais de 50 vezes nos documentos legais, gostava de mulheres "jovens", se referindo a meninas.

A testemunha foi identificada como Johanna Sjoberg, que teria sido recrutada por Maxwell e corroborou as alegações feitas por Giuffre sobre o abuso sexual que sofreu sob Epstein e seus associados. O depoimento de Sjoberg foi realizado em maio de 2016.

"Jeffrey [Epstein] alguma vez falou com você sobre Bill Clinton?", Sjoberg foi questionada durante o depoimento. "Ele disse uma vez que Clinton gosta delas jovens, referindo-se às meninas", respondeu ela.

Em outra seção dos documentos, Sjoberg observou que era sabido que Clinton "tinha relações" com Epstein, mas que não tinha sido visto na infame ilha de Epstein, nas ilhas Virgens dos EUA, onde se alega que muitas meninas menores de idade foram abusadas. O depoimento de Maxwell relatou que ela não sabia quantas vezes Clinton havia voado no avião de Epstein.

Clinton disse anteriormente que desconhecia totalmente os "crimes terríveis" de Epstein.

Também foi detalhado que o ex-presidente dos EUA, Donald Trump, nunca foi visto na casa ou na ilha particular de Epstein. Em interrogatório separado, Sjoberg disse que nunca deu quaisquer favores sexuais ou massagens ao ex-presidente.

No entanto, ela observou em seu depoimento que Epstein parecia se gabar de seus laços com o ex-comandante-chefe, sugerindo que ele poderia ligar para Trump e "ir ao cassino" que a dupla havia visitado uma vez.

Não muito depois dos muros terem sido fechados em torno das operações de Epstein e as acusações terem sido apresentadas sobre o assunto, Trump transmitiu ao público que nunca foi um "fã" de Epstein e que não falava com ele há anos.

·        Celebridades e figuras notáveis

Entre as dezenas de figuras citadas estavam o músico Michael Jackson, que foi visto na casa de Epstein em Palm Beach, e o mágico David Copperfield, que participou de uma das festas do investidor.

Embora tenha sido apontado que Jackson não parecia ter nenhum comportamento ilegal, Sjoberg testemunhou que Copperfield apareceu para perguntar sobre a operação de Epstein durante uma festa. Na verdade, Sjoberg lembrou que o mágico "me questionou se eu sabia que as meninas estavam sendo pagas para encontrar outras meninas".

Questionada se Copperfield mencionou especificamente "adolescentes" ou aludiu a quaisquer "especificidades" da atividade criminosa de Epstein, Sjoberg disse que não.

Em resposta a uma pergunta complementar, a testemunha detalhou que Frederic Fekkai, conhecido como cabeleireiro de celebridades, foi verificado por Epstein. "Eu ouvi ele [Epstein] ligar para alguém e dizer: Fekkai está no Havaí. Podemos encontrar algumas garotas para ele?", lembrou ela.

Quando questionada sobre sua própria reação à menção de Fekkai na época, Sjoberg respondeu: "Bem, eu estava massageando e não tive reação. Tentei permanecer sem reação durante os cinco anos inteiros".

Em outras partes dos documentos de depoimento, atores como Leonardo DiCaprio, Cate Blanchett, Kevin Spacey, Cameron Diaz e Naomi Campbell foram mencionados de passagem durante interrogatórios sobre pessoas notáveis que podem ter entrado em contato com as operações de Epstein.

No entanto, a testemunha em cada instância disse que nunca conheceu nenhum dos personagens. "Espero me lembrar", foi uma resposta quando questionada sobre Blanchett ou DiCaprio.

Em outra parte do depoimento, a notável figura científica Stephen Hawking foi identificada em um e-mail de Epstein, onde ele parecia pedir a Maxwell que subornasse qualquer associado de Giuffre para refutar suas afirmações — uma que ele alegou sugerir que Hawking desempenhou um papel em uma "orgia de menores".

Embora o novo comunicado ofereça alguns novos detalhes das operações de Epstein, ele também relembra os laços anteriormente conhecidos entre o nova-iorquino e seus associados, como o príncipe Andrew e o advogado Alan Dershowitz.

O príncipe Andrew, que já resolveu um processo com Giuffre em 2022, mas se recusou a admitir qualquer irregularidade, foi descrito em uma aparição em que a realeza do Reino Unido colocou a mão no peito de uma testemunha durante uma foto com Giuffre e Maxwell.

Quanto a Dershowitz, que está ligado a Epstein há anos e parecia ter saudado anteriormente a libertação, o testemunho mostrou que ele tinha o nome verificado por Jane Doe e alegado ter tido relações sexuais com o indivíduo quando ela ainda era menor. Giuffre entrou com uma ação contra Dershowitz, mas a retirou em 2022 após admitir que se tratava de um erro de identidade.

Outra figura anteriormente citada é Jean Luc Brunel, um ex-agente de modelos com longos laços com Epstein e que foi encontrado morto dentro de uma cela na prisão em 2022 enquanto aguardava acusações de tráfico sexual.

POLÊMICAS

A divulgação dos nomes vem causando polêmica no país norte-americano, não só por se tratarem de políticos e artistas famosos como porque o informe admite que nem todos os nomes citados eram de clientes do serviço de acompanhantes sexuais adolescentes oferecido por Epstein, mas não distingue quem estava ou não envolvido com a atividade ilícita.

Entre os famosos envolvidos com Epstein – que faleceu em 2019, enquanto cumpria pena de prisão – estão dois ex-presidentes norte-americanos, e de diferentes partidos: Donald Trump (2017-2021) e Bill Clinton (1995-2001).

O caso de Trump já era conhecido, já que existem fotos em que ele aparece ao lado de Epstein, ou visitando sua mansão em Palm Beach, onde funcionava a rede de prostituição, segundo as investigações. Ainda assim, não haveria provas materiais de que o ex-mandatário teria utilizado o serviço de acompanhantes menores de idade.

Outro nome que chamou a atenção foi o do papa João Paulo II. Neste caso, porém, não há qualquer registro de foto dele com Epstein nem de visita do sumo pontífice da Igreja Católica à mansão do megaespeculador em Palm Beach, na Flórida.

O príncipe Andrew, irmão mais novo do atual rei da Inglaterra, Charles III, também aparece na lista. Outra figura famosa é a do físico britânico Stephen Hawking.

Contudo, a maioria das celebridades que aparecem na lista são artistas ligados ao mundo do cinema e da música. Entre eles estão nomes como Tom Hanks, Leonardo di Caprio, Kevin Spacey, George Lucas e Michael Jackson.

Também há diversos nomes de mulheres famosas na lista, especialmente modelos, como Naomi Campbell, Claudia Schiffer e Heidi Klum, além da apresentadora de televisão Oprah Winfrey.

·        Príncipe Andrew nega acusação

Os documentos recém-divulgados incluem referências a Johanna Sjoberg.

Ela afirmou que o príncipe Andrew apalpou seu seio enquanto estava sentado em um sofá no apartamento de Epstein em Manhattan, nos EUA, em 2001.

O Palácio de Buckingham já havia afirmado que as acusações são "categoricamente falsas".

Em depoimento já divulgado anteriormente, Sjoberg alegou que o príncipe Andrew colocou a mão em seu seio ao posar para uma foto com outra acusadora, Virginia Giuffre, e um fantoche com os dizeres "Príncipe Andrew".

Em 2022, a realeza britânica pagou milhões a Giuffre para encerrar um processo movido por Giuffre. Ela acusou Andrew de abuso sexual quando ela tinha 17 anos.

O príncipe disse que nunca conheceu Giuffre e negou todas as acusações.

Apesar disso, uma foto que retrata os dois juntos a Maxwell circula amplamente nas redes sociais.

·        As viagens de Bill Clinton

O ex-presidente dos EUA Bill Clinton, também é citado nos documentos judiciais, embora não exista qualquer ilegalidade ligada a seu nome.

Os representantes do ex-presidente americano disseram que a menção ao nome dele aconteceu devido a uma declaração que ele emitiu em 2019, alegando que "não sabia nada" sobre os crimes de Epstein.

Segundo os documentos judiciais, Sjoberg afirmou que certa vez Epstein lhe disse que Clinton "gosta delas jovens, referindo-se às meninas".

Clinton teve um caso com uma estagiária da Casa Branca de 22 anos, Monica Lewinsky, enquanto era presidente dos EUA.

Os documentos também incluem depoimentos de Maxwell confirmando que Clinton viajou a bordo do jato particular de Epstein, mas ela não soube precisar quantas vezes isso ocorreu.

Clinton viajou no avião de Epstein no que foi descrito como "viagens humanitárias à África" no início dos anos 2000.

À época, ele elogiou Epstein como um "filantropo empenhado", embora tenha dito que mais tarde cortou relações com ele.

Em sua declaração de 2019, o ex-presidente americano disse ter sido acompanhado em suas viagens a bordo do jato de Epstein por funcionários e apoiadores de sua instituição de caridade, a Fundação Clinton.

"Os funcionários do Serviço Secreto estavam no mesmo voo, em todos os trechos de cada viagem", detalha o comunicado divulgado por representantes de Clinton.

Os documentos judiciais incluem um trecho no qual o advogado de Maxwell tenta desmentir uma reportagem segundo a qual, pouco depois de ter deixado o cargo, em janeiro de 2001, Clinton teria viajado para uma ilha privada que pertencia a Epstein.

Um advogado de Maxwell disse que o ex-presidente dos EUA "de fato não viajou nem esteve presente na Ilha Little St James entre 1º de janeiro de 2001 e 1º de janeiro de 2003".

O advogado acrescentou que, se a afirmação fosse verdadeira, os agentes do Serviço Secreto teriam sido obrigados a apresentar os registros de viagem da época.

·        Por que Trump é mencionado?

O documento também inclui um depoimento de Sjoberg alegando que Epstein disse a ela que entraria em contato com Donald Trump a caminho de um cassino em Nova Jersey, no ano de 2001.

"Jeffrey disse: 'Ótimo, vamos ligar para Trump'", disse ela em juízo, depois que os pilotos afirmaram que seu avião não poderia pousar em Nova York e precisaria parar em Atlantic City, em Nova Jersey.

Os documentos não mencionam nenhuma irregularidade cometida por Trump.

Em determinado momento do depoimento, Sjoberg é questionada se ela alguma vez fez uma massagem em Trump. Ela responde que não.

 

Ø  Quem era Jeffrey Epstein, bilionário americano acusado de tráfico sexual de menores encontrado morto na prisão

 

"Não sou um predador sexual, sou um infrator", declarou Jeffrey Epstein ao New York Post em 2011. Esse bilionário americano teve seu rosto estampado em capas de jornais depois de ter sido oficialmente denunciado no Estado de Nova York por tráfico sexual envolvendo meninas menores de idade. Já havia sido condenado por solicitar prostituição a uma menor de idade, mas conseguiu escapar de grandes condenações.

Dessa vez, Epstein estava preso em uma prisão em Manhattan aguardando seu julgamento. No entanto, foi encontrado morto na prisão, segundo noticiou o jornal americano The New York Times. De acordo com o diário, autoridades informaram que ele cometeu suicídio se enforcando na cela, e seu corpo foi encontrado às 7:30 do horário local. Ele estava no Metropolitan Correctional Center, um centro de detenções em Nova York. O empresário de 66 anos havia se declarado inocente.

Na denúncia, procuradores afirmaram que Epstein e seus funcionários tinham sido responsáveis por um grande esquema de tráfico sexual, levando meninas jovens —algumas de 14 anos— para sua mansão em Nova York e sua casa na Flórida entre 2002 e 2005.

No mês passado, uma semana depois de ter tido um pedido de fiança recusado, ele foi encontrado inconsciente em sua cela com marcas no pescoço. Autoridades estavam investigando se aquilo teria sido uma tentativa de suicídio.

Epstein havia sido preso no dia 6 de julho depois de voar de Paris, onde tinha uma casa, e pousar no Estado de New Jersey em seu avião privado.

Ele era conhecido por circular entre a elite, com poderosos como o presidente americano Donald Trump, o ex-presidente americano Bill Clinton e o príncipe Andrew, do Reino Unido.

Quem era ele, afinal?

·        'Cara ótimo'

Epstein nasceu e cresceu em Nova York. Estudou física e matemática na universidade, mas nunca se formou. Deu aulas dessas matérias em uma escola privada nos anos 1970.

O pai de um de seus alunos teria se impressionado tanto que colocou Epstein em contato com um sócio do banco de investimentos Bear Stearns, em Wall Street.

Ele se tornou sócio em quatro anos. Em 1982, já tinha criado sua própria empresa - J Epstein and Co.

A empresa administrava recursos de clientes que valiam mais de US$1 bilhão. Foi um sucesso instantâneo. Nessa época, Epstein começou a gastar sua fortuna —adquiriu uma mansão na Flórida, uma fazenda no Estado de New Mexico e uma gigantesca casa em Nova York— e a socializar com celebridades, artistas e políticos.

"Conheço Jeff há 15 anos. Um cara ótimo", afirmou o presidente americano Donald Trump à revista New York em um perfil sobre Epstein em 2002. "É divertido estar com ele. Dizem que ele gosta de mulheres bonitas tanto quanto eu, mas muitas delas são mais jovens. Não há dúvidas - Jeffrey aproveita sua vida social."

Em 2002, Epstein levou o ex-presidente americano Bill Clinton e os atores Kevin Spacey e Chris Tucker para a África em seu avião privado. Tentou comprar a revista New York com o produtor de filmes Harvey Weinstein, hoje acusado de assédio sexual por diversas mulheres, em 2003. Naquele ano, fez uma doação de US$ 30 de milhões para a Universidade Harvard.

Mas ele também tentava manter uma vida privada, deixando de ir a eventos e jantares.

Ele se relacionou com mulheres como Eva Andersson Dubin, a Miss Suécia, e Ghislaine Maxwell, filha do publisher Robert Maxwell.

Rosa Monckton, ex-CEO da joalheria Tiffany & Co, disse à revista Vanity Fair, em 2003, que Epstein era "muito enigmático" e um "iceberg".

"Você acha que o conhece, mas vai descascando suas camadas e encontra algo extraordinário por baixo", ela disse.

·        Condenação

Em 2005, os pais de uma menina de 14 anos disseram à polícia da Flórida que Epstein havia abusado de sua filha em sua casa em Palm Beach. A polícia conduziu uma busca pela casa e encontrou fotos da menina.

"Não era uma situação de 'ela disse, ele disse'", disse um policial que conduzia as investigações na época. "Havia 50 'ela disse' e um 'ele disse' - e tudo ligado a 'ela' contava a mesma história."

Procuradores, no entanto, ofereceram um acordo para ele.

Ele conseguiu escapar de denúncias federais —que poderiam ter feito com que ele encarasse prisão perpétua— e em vez disso recebeu uma sentença de 18 meses de prisão, durante a qual ele pode sair para o trabalho por 12 horas por dia, seis dias por semana. Depois de 13 meses, foi solto em liberdade vigiada.

O Miami Herald publicou uma investigação sobre o caso em novembro de 2018. Segundo o jornal americano, o então procurador federal Alexander Acosta propôs o acordo escondendo a extensão dos crimes e colocando fim a uma investigação do FBI cujo objetivo era avaliar se havia mais vítimas e buscar saber se outras pessoas poderosas haviam participado do esquema. O jornal descreveu a resolução como "o acordo do século', e trouxe depoimentos de mulheres que teriam sido abusadas por Epstein. Acosta, que era secretário de Trabalho do governo Trump, renunciou no mês passado, depois que Epstein foi preso.

Desde 2008, ele estava listado como um infrator sexual em Nova York. Nos Estados Unidos, essa designação vale para a vida.

Mas ele manteve suas propriedades e bens depois da condenação.

Dessa vez, procuradores estavam tentando confiscar sua mansão de Nova York, onde supostos crimes teriam ocorrido. Se tivesse sido condenado, ele poderia ter tido que enfrentar 45 anos de prisão.

 

Fonte: Sputnik Brasil/Página 12/BBC News Mundo

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário