sexta-feira, 5 de janeiro de 2024

3 incidentes podem tornar guerra em Gaza um conflito regional no Oriente Médio

Três graves episódios sugerem a propagação da guerra Israel-Hamas para um conflito regional no Oriente Médio.

assassinato de Saleh al-Arouri, alto dirigente do Hamas, num reduto do Hezbollah em Beirute, atribuído a Israel. As duas misteriosas explosões no Irã, com 84 mortos durante as homenagens do quarto aniversário da morte de Qassem Soleimani, o poderoso comandante da Guarda Revolucionária. E, por fim, o alerta de 12 países, liderados pelos EUA, aos rebeldes houthis do Iêmen, apoiados pelo Irã, sobre os sucessivos ataques marítimos no Mar Vermelho e no Golfo de Áden.

Os incidentes parecem conectados. Número dois do Hamas, Arouri atuava como um importante interlocutor e articulador do grupo palestino com o Hezbollah e o Irã e exercia, mesmo de longe, influência na Cisjordânia.

Seu assassinato pode institucionalizar a expansão da guerra para os países que hospedam dirigentes do Hamas, como Líbano, Catar e Turquia.

O governo israelense não assumiu a responsabilidade pelo ataque em Beirute, mas o aspecto cirúrgico reflete um modus operandi já aplicado pelo país em outros assassinatos preventivos de seus inimigos.

Desde o massacre do Hamas em solo israelense, em outubro, seguido da invasão da Faixa de Gaza, o Hezbollah, com o patrocínio do Irã, vem dando suporte ao grupo palestino, por meio de ataques diários na fronteira norte de Israel.

Estima-se que o Hezbollah disponha de um arsenal de 150 mil mísseis escondidos no sul do Líbano, com capacidade infinitamente maior do que a do Hamas.

Mas, até agora, o grupo vem calibrando a extensão de seus ataques, limitando-se à fronteira, de forma a não arrastar o Líbano para uma guerra. Da última vez que isso aconteceu, em 2006, as consequências foram desastrosas para o país.

O assassinato de Arouri em território libanês tem potencial para mudar essa estratégia do Hezbollah. As primeiras declarações do chefe do grupo, Hassan Nasrallah, contudo, afastaram os temores de uma retaliação imediata, dando a entender que tanto o grupo libanês quanto o Irã não pretendem se envolver em uma guerra aberta com Israel.

O regime iraniano se apressou a apontar o dedo para seus inimigos americanos e israelenses após as duas explosões no memorial de Soleimani, morto há quatro anos num ataque de drones dos EUA. A contar pelas reações em Israel, essas especulações não são levadas a sério, mais uma vez pelo modus operandi do ataque, que teve como objetivo uma multidão e não um alvo específico.

Conforme atestou o analista de defesa Amos Harel, do jornal “Haaretz”, as explosões no Irã não são obra israelense: “Os sinais indicam um ataque do movimento Estado Islâmico ou de uma das facções radicais da oposição muçulmana sunita. Isto não impediu as autoridades iranianas de culpar Israel, mas as suas palavras não pareciam ter muita convicção.”

De todas as formas, o assassinato de Arouri, no Líbano, e o ataque terrorista no Irã agravam as tensões no Oriente Médio e elevam as chances de extensão do conflito. O remanejamento de forças israelenses da Faixa de Gaza sinaliza que o foco da guerra se deslocou para o Norte do país e está mais centrado em atingir a rede do Hamas fora do território palestino e, por consequência, seus apoiadores do Hezbollah e do Irã.

 

Ø  Morte do número 2 do Hamas no Líbano eleva temores de guerra ampliada no Oriente Médio

 

O período sombrio que se estende por todo o Oriente Médio desde o início da guerra entre Israel e o Hamas ficou ainda mais profundo com o assassinato do líder do grupo islâmico, Saleh al-Arouri, no Líbano.

Arouri, vice-líder político do Hamas, foi morto em um ataque de drone no sul de Beirute.

Ele era uma figura-chave nas Brigadas Izzedine al-Qassam, braço armado do Hamas, e um aliado próximo de Ismail Haniyeh, líder máximo do grupo.

Arouri esteve no Líbano atuando como ponto de ligação entre o Hamas e o Hezbollah.

Mesmo antes do início da guerra, após os ataques do Hamas a Israel em 7 de outubro do ano passado, o líder do Hezbollah libanês, Hassan Nasrallah, tinha alertado que qualquer ataque direcionado ao solo do Líbano iria desencadear uma "resposta poderosa".

Mas o Hezbollah e seus aliados no Irã sabem que a forma dessa resposta poderá mudar os rumos da guerra neste momento de acirramento das hostilidades.

Não era segredo que era apenas uma questão de tempo até que os líderes do Hamas fora de Gaza virassem alvo de Israel.

“Israel irá agir contra os líderes do Hamas onde quer que eles estejam”, disse o primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, em novembro.

Meses antes, ele mencionou explicitamente Arouri.

Desde 2018, o vice-líder do Hamas também estava na lista de terrorismo dos Estados Unidos com uma recompensa de U$ 5 milhões (cerca de R$ 24,4 milhões) por sua cabeça.

Israel não costuma confirmar ou negar assassinatos, mas este longo conflito é uma crônica de mortes seletivas. É também uma história de retaliação e vingança.

Israel está preparado para represálias. Há ameaças dos líderes do Hamas e de seus aliados, das ruas da Cisjordânia ocupada e de outros lugares.

·        Mudança nos cálculos

O Hezbollah e o Hamas podem querer realizar alguma ação para demonstrar força. A primeira declaração do Hezbollah levou tempo.

Antes deste momento, esse grupo militar e político, consideravelmente bem armado, tinha tentado limitar seu envolvimento a uma guerra de palavras, bem como a ataques limitados ao longo da sua fronteira sul com Israel.

O Hezbollah agira dessa forma para evitar arrastar o Líbano para outro conflito armado com Israel.

O assassinato de uma liderança do Hamas, que era uma ligação fundamental ao Hezbollah e ao Irã, em um dos seus redutos nos subúrbios do sul de Beirute, abalou os seus cálculos.

Mas o Hezbollah deve evitar grandes ataques em um curto prazo, em comparação com o seu jogo de longo prazo.

O apoio da população ao Hezbollah ao longo da fronteira sul do Líbano é forte. Mas, em Beirute e em outros pontos do país, as memórias da devastadora guerra entre Israel e Líbano, em 2006, ainda estão vivas em um país que agora se recupera de múltiplas crises internas.

Também não é segredo que importantes figuras israelenses há muito tempo pressionam o governo para maximizar a oportunidade de erradicar as ameaças do Hezbollah às suas comunidades do norte do país.

Mas Israel tem sido categórico desde o início: seu objetivo de guerra é "destruir o Hamas". Isso significa ir atrás da infra-estrutura do grupo, dos líderes militares e políticos, além de suas finanças.

Quase três meses depois do início da guerra, Israel admite que ainda há um longo caminho a percorrer.

Muitos inimigos do país, bem como aliados, questionam se o Hamas pode ser destruído por meio do poderio militar e de uma campanha que causou um número impressionante de mortes de civis e de uma terrível catástrofe humanitária em Gaza.

Acredita-se que os mentores das atrocidades cometidas pelo Hamas em 7 de outubro no sul de Israel, incluindo Yahya Sinwar, ainda se encontram escondidos em Gaza, apesar da caçada humana empreendida pelas forças de Israel.

A morte de Arouri no Líbano também pode causar preocupação na Turquia e no Qatar, onde líderes do Hamas também estão baseados, acreditando que nesses locais estão mais seguros.

A ação também pode preocupar famílias israelense com parentes que ainda são mantidos como reféns pelo Hamas em Gaza.

Uma das primeiras vítimas deste assassinato foi a interrupção do diálogo direto no Cairo, no Egito, sobre outra troca de reféns por palestinos detidos em prisões israelenses

O primeiro-ministro Netanyahu continua insistindo que "só a pressão funcionará".

 

Ø  Como assassinato de general do Irã está ligado a outras 300 mortes

 

No dia 4 de janeiro de 2020, o general Qassem Soleimani, então comandante da unidade de elite da Guarda Revolucionária do Irã, fazia uma visita ao Iraque quando foi morto em um ataque de drone executado pelas Forças Armadas dos Estados Unidos e ordenado pelo então presidente norte-americano, Donald Trump.

Soleimani era uma das figuras mais importantes no Irã. Além de liderar as Forças Al-Quds, a tropa de elite da Guarda Revolucionária do Irã, ele era o responsável pela política externa militar do Irã, que apoia e financia outros grupos no Oriente Médio, como o Hamas e o Hezbollah.

A morte de Soleimani gerou uma onda de revolta no Irã, onde ele era considerado um herói pelo governo e parte da população. O aiatolá Ali Khamenei, o líder máximo do Irã, chegou a decretar luto nacional de três dias na ocasião.

No entanto, três eventos ligados indiretamente à morte de Soleimani causaram a morte de mais de 300 pessoas.

  • Morreram 56 em um tumulto no velório de Soleimani
  • Morreram 176 na queda de um avião que havia acabado de decolar de Teerã.
  • Morreram 84 em um evento para lembrar quatro anos da morte de Soleimani.

>>>> Mortes em velório

O velório de Soleimani aconteceu na cidade de Kerman. Centenas de milhares de pessoas foram ao evento.

No começo da procissão, a multidão começou a se acotovelar e empurrar. Pelo menos 84 morreram e 211 foram feridas, segundo serviços de emergência do Irã.

A procissão acontecia em uma via estreita, e as ruas paralelas estavam fechadas. As pessoas não tinham para onde fugir quando começou a confusão.

·        Queda de avião

No dia 8 de janeiro de 2020, quatro dias após a morte de Soleimani, um avião Boeing 737-800 de uma companhia aérea ucraniana caiu pouco depois de decolar do aeroporto de Teerã, capital do Irã, com 176 pessoas a bordo. Ninguém sobreviveu.

Inicialmente, o governo do Irã afirmou que o Boeing tinha caído por problemas da aeronave.

Nos dias após a morte de Soleimani, o Irã atacou bases militares dos EUA no Iraque. Os iranianos então estavam esperando um ataque das forças americanas e estavam monitorando o espaço aéreo para derrubar mísseis.

O Irã acabou confessando, dias depois, que seus próprios militares haviam derrubado o avião em Teerã.

No comunicado em que assumiam a culpa, os militares iranianos disseram que o avião "estava na posição e altitude de um alvo inimigo" e que estava perto de uma base da Guarda Revolucionária. "Nessas condições, por causa de um erro humano", o avião "acabou virando alvo".

Na época, os militares afirmaram que iriam fazer mudanças na corporação para evitar um erro como esse novamente.

·        Explosões em evento de quatro anos da morte de Soleimani

No Irã, duas explosões matam pelo menos 95 pessoas e deixam mais de 200 feridos

Na quarta-feira (3) houve um evento na cidade de Kerman, onde Soleimani está enterrado, para lembrar os quatro anos da morte do general.

Em uma rua a caminho do cemitério onde o corpo de Soleimani houve duas explosões. Juntas, elas mataram mais de 95 pessoas que estavam em uma procissão. Outras 211 ficaram feridas, segundo serviços de emergência do Irã.

As explosões ocorreram com um intervalo de 20 minutos entre elas.

O governo iraniano chamou a explosão de "atentado terrorista" e disse se tratar de um ataque suicida cometido por pessoas que estavam no meio da multidão.

 

Ø  Estado Islâmico assume responsabilidade sobre ataque que matou 84 no Irã

 

O grupo terrorista Estado Islâmico assumiu nesta quinta-feira (4) a autoria do ataque que levou à morte de 84 pessoas durante uma caminhada na cidade de Kerman, no Irã.

A mensagem foi transmitida em um canal dos terroristas no Telegram.

O ataque, na quarta-feira (3), se deu por meio de duas explosões contra um grupo de pessoas que faziam uma procissão para o túmulo de Qassem Soleimani, o general iraniano morto por um ataque com drone dos Estados Unidos em 2020. Além das 84 mortes, houve 211 feridos, segundo serviços de emergência do Irã.

Kerman fica a cerca de 820 quilômetros da capital Teerã.

A primeira explosão, segundo o serviço de emergência de Kerman, aconteceu a cerca de 700 metros do túmulo do general iraniano. Já a segunda explosão ocorreu minutos depois, em um ponto mais afastado e perto das primeiras equipes de emergência que já haviam chegado, ainda de acordo com as autoridades locais.

Ainda na quarta, logo após o ataque, o líder supremo do Irã, o aiatolá Ali Khamenei, não nomeou culpados, mas afirmou que o ataque foi feito por "inimigos malignos e criminosos da nação iraniana".

"Os inimigos malignos e criminosos da nação iraniana criaram mais uma vez uma tragédia e martirizaram um grande número do nosso querido povo em Kerman, na atmosfera perfumada dos túmulos dos mártires em Kerman", declarou, em comunicado.

Não foi o primeiro ataque reivindicado pelo Estado Islâmico no Irã. Em 2022, o grupo terrorista assumiu um ataque que matou 15 pessoas num santuário xiita.

 

Fonte: g1/BBC News Brasil

 

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