sexta-feira, 29 de dezembro de 2023

O próximo passo do Hezbollah

Desde o ataque do Hamas no dia 7 de outubro, a retaliação israelense desencadeou um nível de destruição impressionante - com o número de mortos palestinos já ultrapassando os 10 mil [atualmente mais de 20 mil]. Os EUA enviaram para a região dois porta-aviões e vários destróieres, bem como equipes militares especiais, para oferecer reforço ao seu aliado e evitar qualquer possível intervenção do Irã ou do Hezbollah. O Hezbollah está envolvido em escaramuças com Israel na sua fronteira norte, que se estende por uma centena de quilômetros desde Naqoura, a oeste, até às fazendas de Shebaa, no leste. Esta situação obrigou o exército israelense a manter um elevado número de unidades profissionais estacionadas na área, bem como a manter a força aérea e as defesas antimísseis em prontidão. A escalada deste conflito local é atualmente uma das principais questões que se colocam à região e ao resto do mundo.

Longe de ser um fantoche de Teerã, o Hezbollah deve ser entendido como um poderoso partido político com uma forte milícia armada e uma influência significativa em vários países para além do seu Líbano de origem – Síria, Iraque, Palestina e Iêmen. Sua liderança e a maioria de suas tropas consideram-se parte da constelação transnacional que deve obediência religiosa ao Líder Supremo iraniano. Mas o Hezbollah não opera de acordo com ordens e determinações, sendo ele próprio um tomador de decisões na estratégia iraniana no Oriente Médio. A última palavra sobre as suas políticas vem do secretário-geral Hasan Nasrallah e do seu gabinete. Sua relação com o Irã é de parceiros, e não de auxiliares.

O Hamas também tem um elevado grau de autonomia e lançou seu ataque com base nos seus próprios cálculos políticos e não nos do Irã ou do Hezbollah. Decidiu que as políticas seguidas pelo governo israelense e pela sua população de colonos – ocupação indefinida e anexação gradual – tinham atingido um ponto crítico em que a inação se revelaria fatal. Esta decisão estava enraizada numa avaliação mais ampla das transformações geopolíticas em curso no Oriente Médio. A normalização entre a Arábia Saudita e Israel estava prevista para o final do ano. Estava em pauta também um acordo entre o Irã e os norte-americanos. O proposto Corredor Econômico Índia-Oriente Médio-Europa, que promete reforçar a centralidade dos Estados do Golfo na economia global, estava rapidamente se tornando uma realidade. À luz de tudo isto, a "comunidade internacional" estava pronta para marginalizar ainda mais a causa palestina e reviver a AP (Autoridade Palestina) como uma alternativa mais confortável em relação ao Hamas. As dinâmicas interna e externa convenceram a organização de que era preciso agir ou aceitar uma morte lenta.

É quase certo que o Hezbollah não tinha conhecimento prévio do ataque. O partido libanês concorda com o Hamas em muitas questões e passou anos apoiando-o com dinheiro, armas e aconselhamento tático, mas as suas posições geopolíticas nem sempre estão alinhadas (estiveram em lados opostos na guerra civil síria, por exemplo). Parece que o ato de desespero do Hamas – engendrar um conflito com o objetivo de reativar a luta anticolonial palestina e manter a sua relevância política – não terá um efeito dominó direto no Hezbollah. Pelo menos não por enquanto. Ao lançar ataques limitados do outro lado da fronteira, o Hezbollah está mostrando a sua disposição de abrir uma segunda frente, caso a pulverização de Gaza chegue a um ponto que o partido não possa mais tolerar. No entanto, esta forma contida de envolvimento também lhe dá espaço para reavaliar continuamente a situação, considerar suas opções e determinar os seus próximos passos.

Atualmente, as questões que se colocam às forças de Nasrallah são as seguintes. Se entrassem numa guerra total com Israel (e possivelmente com os EUA), seriam capazes de impedir a invasão israelense de Gaza e o massacre de dezenas de milhares de palestinos? Correriam o risco de ver o Líbano dizimado e danos tremendos à base de apoio do Hezbollah? Perderiam milhares de combatentes e a maior parte das suas armas? Colocariam em risco as realizações do eixo da resistência na Síria, no Iraque e no Iêmen? O que ganhariam com esse perigoso curso de ação? As respostas são suscetíveis à mudança a qualquer momento. A melhor estratégia de hoje pode estar fora de moda amanhã. Mas, até o momento, parece que esta é uma guerra do Hamas, não do Hezbollah.

As opções do Hezbollah – manter as hostilidades com Israel no seu nível atual, intensificá-las ou reduzi-las – são regidas por três variáveis importantes. A primeira é a situação em Gaza. Israel quer destruir totalmente o Hamas e recebeu permissão para cometer um genocídio na tentativa de atingir esse objetivo, embora as hipóteses de sua realização sejam muito incertas. Se o Hamas conseguir prolongar a luta, infligir danos significativos ao inimigo e impedir uma vitória total israelense, então o Hezbollah marcará pontos políticos importantes com sacrifícios mínimos, simplesmente mantendo Israel distraído na sua frente norte. O partido poderia assim evitar os perigos de uma escalada e viver para lutar outra guerra num momento mais propício.

A segunda variável é a base de poder do Hezbollah no Líbano, que, junto da maioria da sociedade libanesa, apoia os palestinos, mas hesita em travar uma guerra com Israel. Eles sabem muito bem que, para além de terem perdido as suas economias na crise bancária libanesa de 2019-20, um ataque israelense ameaçaria as suas casas e o que resta das sua infraestrutura nacional vital. O Hezbollah está, compreensivelmente, relutante em pôr em risco e alienar este eleitorado. A última variável é o Irã e os seus interesses, incluindo a aproximação diplomática com a Arábia Saudita e as delicadas negociações com o governo Biden sobre sua tecnologia nuclear e a extensão das sanções dos EUA. A liderança iraniana sabe que ambas seriam abaladas por um conflito regional de grandes proporções – daí a posição cautelosa do presidente Raisi e as suas contínuas linhas de contato com o príncipe herdeiro saudita.

No entanto, à medida que a máquina assassina de Israel abate palestinos aos milhares, cada um destes fatores pode mudar. Se o Hamas parecer estar em perigo existencial, o cálculo para o Hezbollah pode ser diferente – já que a perda deste aliado poderia encorajar Israel a atacar o seu adversário libanês em seguida. Quanto ao povo libanês, não é claro se continuará a dar prioridade às suas casas e bens no meio da proliferação de imagens de sacos de cadáveres palestinos. Será que, em vez disso, estarão dispostos a sofrer junto dos palestinos? Também os iranianos poderão ter de voltar a analisar o equilíbrio entre os seus interesses materiais imediatos e os seus compromissos nominais com a libertação da Palestina. Poderão sentar-se frente a frente com as autoridades norte-americanas enquanto estes aplaudem a imolação de Gaza? Isso não enviaria o sinal errado aos seus outros aliados na região, de que o apoio iraniano é inconstante e pouco confiável?

Se a situação em Gaza se deteriorar ao ponto de o Irã engavetar as suas negociações com os EUA, os países do Golfo azedarem sua relação com Israel e a base do Hezbollah ficar convencida de que o partido não está fazendo o suficiente, isso pode ser um gatilho para o Hezbollah aumentar a escalada. Do mesmo modo, se Israel decidir atacar civis no Líbano e causar grandes baixas, não se pode esperar que Nasrallah fique de braços cruzados. Para o Hezbollah, a intervenção militar é sempre uma estratégia política baseada na aritmética dos ganhos e das perdas e no complexo campo de aliados e dos interesses. O seu próximo passo não será decidido pela influência iraniana ou pela ideologia islâmica, mas pelas exigências do pragmatismo.

 

Ø  Palestinos choram a morte de uma criança a cada dez minutos. Por Luiz Carlos Azedo

 

A comemoração mais importante do Ocidente é o Natal, que celebra o nascimento de Jesus Cristo e, com isso, a renovação da esperança que explode na passagem de ano-novo. Para os cristãos ortodoxos e coptas, que ainda seguem o calendário decretado pelo imperador romano Júlio Cezar, em 46 a.C., a festa natalina ocorre em 7 de janeiro. Entretanto, quase não houve nem haverá celebração em Belém, a cidade mais católica da Palestina, onde Cristo nasceu. Resume-se a um presépio montado sobre pedras e um menino Jesus envolto num lenço palestino.

Simbolizam a destruição de Gaza e a morte de uma criança a cada dez minutos pelos bombardeios israelenses, segundo os números divulgados pelo porta-voz do Fundo da ONU para Infância (Unicef), James Élder.

A música, a árvore de Natal, a procissão e a grande missa deram lugar a um protesto quase silencioso da Igreja Católica, verbalizado pelo papa Francisco, em Roma, na Missa do Galo. Na Praça da Manjedoura não há turistas nem fiéis.

Os líderes das diversas representações cristãs em Jerusalém emitiram uma carta pedindo a seus congregados que renunciassem a quaisquer “atividades festivas desnecessárias”. Em protesto, no domingo, o cardeal Pierbattista Pizzaballa, o Patriarca Latino, a maior autoridade católica da região, caminhou em silêncio de Jerusalém a Belém, onde celebrou a missa, à meia-noite, na Igreja da Natividade, sem peregrinos.

Apesar da resolução das Nações Unidas (ONU) que pede uma trégua para a entrada de ajuda humanitária, Israel prossegue seus bombardeios no sul de Gaza, inclusive contra os campos de refugiados.

Diante das críticas do secretário-geral da ONU, Antônio Guterres, o primeiro-ministro, Benjamin Netanyahu, suspendeu a emissão e a renovação de vistos diplomáticos para funcionários da ONU, entre os quais, o secretário-geral adjunto para Assuntos Humanitários, Martin Griffiths. Um gesto sem precedentes, mas coerente para quem é responsável pela morte de mais de 140 funcionários da ONU nos ataques israelenses.

O secretário-geral da ONU irritou Netanyahu ao criticar o Hamas pelos “ataques horrendos”, mas também Israel, pelo “castigo coletivo do povo palestino”. Guterres acusa Netanyahu de “graves e claras” violações do direito humanitário internacional em Gaza.

Disse que “os ataques do Hamas não se produziram em um vazio. O povo palestino está submetido há 56 anos a uma ocupação sufocante, e tem visto sua terra devorada pouco a pouco por assentamentos”, o que foi interpretado como uma justificativa para o ataque terrorista do Hamas de 7 de outubro, o que Guterres nega com veemência.

A retaliação implacável de Israel, de certa forma, faz o jogo de seus adversários, sobretudo o Irã, pois aumenta seu isolamento internacional. Aprofunda a crise política do país, mesmo que sob o manto de unidade nacional, tecido por uma ação terrorista que é tratada como uma ameaça existencial na dimensão do Holocausto.

A esquerda israelense perdeu a ideia-força da coexistência com os palestinos; a direita, a confiança da população conservadora e sionista.

A estratégia de ocupação militar da Cisjordânia e bloqueio de Gaza fracassou. A escolha de Netanyahu, agora, é a ocupação definitiva do enclave e uma limpeza étnica, insustentável internacionalmente, até mesmo para Estados Unidos. A mudança de rumo em direção à solução de dois Estados, mesmo com a queda do governo após a guerra, parece cada vez mais difícil, embora tenha amplo apoio internacional.

A guerra unificou um país dividido entre a preservação da sua democracia e a adoção de um regime “iliberal”, com a tentativa de Netanyahu de reduzir o poder dos tribunais. Também reduziu as diferenças entre os judeus ultraortodoxos, que se recusam a prestar serviço militar, e sionistas, sempre dispostos a pegar em armas para defender seu território.

De certa forma, reforça o caráter étnico-religioso do Estado de Israel e legitima o regime de apartheid imposto aos palestinos. Enquanto houver a guerra, Netanyahu estará firme no poder, com apoio dos militares linha-dura que comandam a carnificina em Gaza.

Uma pesquisa recente mostrou que 70% da população árabe se sente parte do Estado de Israel. É uma realidade multiétnica que somente tem sentido numa ordem democrática.

Para a minoria árabe, que representa um quinto dos mais de 9 milhões de residentes de Israel, a situação é complexa: dezenas de árabes morreram em 7 de outubro, o que fortalece esse pertencimento, porém, não são indiferentes à morte dos palestinos civis de Gaza, sobretudo crianças em mulheres, vítimas dos bombardeios israelenses.

Mais da metade dos israelenses judeus se opõe à retomada das negociações para criar um Estado palestino e apoiam os assentamentos na Cisjordânia. Além disso, há o senso comum de que os ataques do Hamas não teriam ocorrido se a ocupação de Gaza por Israel tivesse permanecido após a Intifada.

Entretanto, com a ocupação de territórios palestinos, no espaço de duas ou três gerações, os árabes serão a maioria da população do que seria a “Grande Israel”.

 

Ø  Fim de Netanyahu está próximo, diz conselheiro de Erdogan

 

O conselheiro-chefe do presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, Akif Cagatay Kilic, declarou nesta quarta-feira (27) que vários países ocidentais afirmam que o "fim" do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, está próximo, citando a suposta "brutalidade" do Estado judeu, especialmente em suas ações na Faixa de Gaza.

Em uma entrevista à emissora turca TRT Haber, Kilic afirmou que "muitos países ocidentais dizem que este é o fim do caminho para Netanyahu", referindo-se às críticas internacionais em relação às ações israelenses na região.

As tensões entre Erdogan e Netanyahu aumentaram ainda mais quando, na manhã de quarta-feira, o presidente turco comparou mais uma vez o primeiro-ministro israelense ao líder alemão nazista Adolf Hitler.

Em resposta, Netanyahu acusou Erdogan de genocídio contra os curdos e detenção de jornalistas que se opõem ao seu regime, afirmando que Erdogan é a última pessoa capaz de pregar a moralidade.

O chefe do departamento de comunicações da administração presidencial turca, Fahrettin Altun, endossou as críticas, afirmando que ele é "a última pessoa a falar sobre genocídio" e que a história irá julgá-lo como criminoso de guerra.

Altun também alegou que Netanyahu busca expulsar os palestinos de suas terras há décadas, intensificando a retórica contra o líder israelense.

A disputa verbal entre Erdogan e Netanyahu não é novidade, com o presidente turco acusando repetidamente o líder israelense de conduzir um genocídio na Faixa de Gaza para prolongar sua carreira política e evitar processos judiciais em Israel.

A situação na região continua delicada, com o presidente turco pedindo à comunidade internacional que se una em torno dos esforços para alcançar um cessar-fogo imediato e negociações para uma paz duradoura

Erdogan também reiterou o apoio ao movimento palestino Hamas, recusando-se a reconhecê-lo como uma organização terrorista, em contraste com a posição de Israel.

O início do conflito entre o Estado judaico e a Palestina se intensificou em outubro, com morte de 1,2 mil israelenses por ataque do Hamas. Desde então, o cerco aos insumos se intensificou e mais de 20 mil palestinos foram mortos pelas Forças de Defesa de Israel (FDI).

 

Fonte: Por Suleiman A. Mourad, em Opera Mundi/Correio Braziliense/Sputnik Brasil

 

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