domingo, 31 de dezembro de 2023

Milei tem primeiro revés no mercado financeiro ao tentar vender US$ 750 milhões em títulos

A primeira oferta de uma nova modalidade de títulos do Banco Central da Argentina, criada para quitar dívidas de importadores do país com fornecedores no exterior, foi um fiasco.

No primeiro revés no mercado financeiro para o recém-empossado presidente do país, o ultraliberal Javier Milei, o BC argentino conseguiu vender apenas US$ 68 milhões de um total de US$ 750 milhões oferecidos. Somente 34 importadores fizeram lances pelos bônus.

O fracasso neste leilão mostra as dificuldades que a Argentina terá para reorganizar seu mercado de importações e ocorre após Milei ter conseguido fazer uma desvalorização relativamente bem-sucedida do peso, emitido um volume recorde de títulos em moeda local e aumentado as reservas internacionais do país.

A primeira derrota do novo presidente argentino nos mercados pode dificultar ainda seus planos para segurar a inflação. A emissão desses títulos ajudaria a absorver o excesso de pesos em circulação no país e, assim, ajudar a controlar a alta de preços, que já supera os 160% em termos anuais.

Os importadores argentinos devem nada menos do que US$ 30 bilhões no exterior e quitar essa dívida é um passo importante para que o país consiga remover os complexos controles sobre o comércio exterior herdados do governo anterior. Liberar a economia foi a principal promessa de campanha de Milei.

Em um comunicado, o BC afirmou confiar que, nos próximos leilões deste tipo, "o volume de participação aumentará", à medida que o banco "continua esclarecendo os processos operacionais e a documentação necessária".

As autoridades monetárias planejam realizar dois leilões por semana até o fim de janeiro de 2024.

·        Javier Milei vai conseguir aprovar suas medidas no congresso argentino?

Depende. Há duas partes. Está o mega DNU — Decreto de Necessidade e Urgência — e a "Lei Ônibus".

Os DNU foram utilizados por todos os presidentes desde 1994, ano em que a forma foi habilitada pela reforma constitucional; o uso foi maiormente cesarista. Consiste em leis criadas pelo Presidente sem necessidade da aprovação do Legislativo; legisladores podem omitir o tratamento, de modo que a aprovação é tácita, ou pode acontecer que uma câmara das duas aprove o DNU e com isso baste — reforma criada por Cristina Fernández —, ou que as duas câmaras rejeitem o DNU. O que se está vendo é uma aprovação tácita, pois há silencio e lentitude no avanço do tratamento. Se fosse tratado, minha impressão é que seria mais fácil aprová-lo no Senado que na câmara de deputados.

Lamentavelmente, os legisladores, como diria Milei, têm um sentimento de "casta" importante, e até poderia ser que deixem passar o DNU escrito por empresários poderosos e dado a Milei. Depois, qualquer cidadão ou instituição pode solicitar a proteção de um juiz, coisa que pode deixar sem efeito artigos pontuais por um período até que a Corte Suprema — o Supremo Tribunal — decida a legalidade. Isso já está acontecendo.

Uma característica peculiar do DNU de Milei e seu tamanho e ecleticismo. Usualmente um DNU e só sobre uns poucos artigos, o de Milei é de mais de 300. O ecleticismo é produto das fontes empresariais de onde se origina.

Sobre a Lei Ônibus, contem 664 artigos. Isso sim deve passar em forma obrigatória pelas duas câmaras e se pode rejeitar em parte. Milei vai procurar desgastar a sociedade para poder someter mais facilmente na negociação, de modo que se possa aprovar suas leis mais extremas.

Se a parte mais danosa fosse aprovada, aquela que dá ao Presidente poderes legislativos em todas as áreas por dois anos e até quatro, sem nenhuma intervenção do Legislativo, se haverá mudado o governo de república a autocracia, sendo seguro que todas suas leis futuras seriam funcionais. Os cidadãos dependeriam da independência do Judiciário, na qual eu não confio.

 

Ø  Milei não rompe vínculos, mas relações China-Argentina começam a mostrar fissuras nas primeiras semanas de governo

 

Quando candidato, o agora presidente argentino, Javier Milei, afirmou que não promoveria a relação com países comunistas, como a China.

Embora tenha moderado o tom nos primeiros dias sobre o gigante asiático, a relação entre os dois países parece ter entrado em terreno movediço.

O governo chinês não confirmou, mas a imprensa argentina repercutiu informações do site REDD sobre uma possível suspensão do acordo de swap cambial no valor de USD 6.5 bilhões (mais de R$ 30 bi) com o banco central chinês. Parte do valor seria destinado ao pagamento da dívida com o Fundo Monetário Internacional (FMI).

No dia 21 de dezembro, o governo argentino pagou a última parcela deste ano, no valor US$ 920 milhões, com um empréstimo extraordinário recentemente concedido pelo Banco de Desenvolvimento da América Latina.

O mecanismo de swap cambial é um acordo firmado entre duas partes (neste caso, os bancos centrais dos dois países), para troca de moedas, utilizado principalmente para ter acesso a moedas estrangeiras a uma melhor taxa de juros.

A economista argentina e integrante do coletivo Dongsheng Gisela Cernadas explica que, para a Argentina, o swap com a China tem um custo de 4,5% a 6,5% ao ano. Já a taxa de juros que a Argentina paga ao FMI é de 8,2%.

Antes das eleições, a agência Reuters divulgou que em uma reunião interna em outubro, o conselho de diretores executivos do FMI teria criticado como o governo de Alberto Fernández geriu o programa de crédito com a Argentina. A informação foi divulgada a dez dias do segundo turno das eleições presidenciais.

Esse é o 22° programa do FMI com o país sul-americano. Trata-se de um refinanciamento de uma dívida de US$ 44 bilhões contraída pelo governo de Mauricio Macri em 2018. O empréstimo original era no valor de US$ 57 bi, mas a instituição financeira decidiu suspender uma parte desse montante, após o dólar disparar no dia seguinte às eleições primárias de 2019. Nessa votação, Alberto Fernández havia superado Macri com 15 pontos de vantagem, o que teria gerado uma reação do “mercado” à eminente volta do kirchnerismo ao governo.

Mesmo com a redução, essa se tornou a maior dívida da história do FMI, e também tornou a Argentina o maior devedor da instituição.

Agora em dezembro, a porta-voz do FMI, Julie Kozack, disse que a instituição apoia o primeiro pacote de medidas econômicas do governo de Javier Milei, anunciadas pelo ministro de Economia, Luis Caputo. As medidas de austeridade, que geraram protestos no país, incluem a terceira maior desvalorização do peso argentino na história, de 54% frente ao dólar e a eliminação dos investimentos públicos em cerca de 5% do PIB, o equivalente a R$ 100 bilhões.

Cernadas afirma que o Fundo Monetário Internacional “tem uma longa história de imposição de políticas monetárias e fiscais aos nossos países”.

O crescimento destas economias, sob essas políticas condicionadas, acaba sendo orientado ao pagamento dos juros da dívida, afirma a economista.

“Quando estas economias não conseguem pagá-los, contraem mais dívida com o FMI para pagar os juros da dívida com a instituição. Essa é uma armadilha da dívida, e essa armadilha da dívida vem acompanhada por uma armadilha do subdesenvolvimento porque todas estas políticas de austeridade que o fundo impõe são políticas que acabam por desindustrializar os países”, diz Cernadas.

Em comparação, ele diz, as vantagens do swap com a China para a Argentina estão, não só no menor custo de financiamento (mencionado anteriormente), mas no fato de a China “não impor políticas de austeridade, nem condicionar o desenvolvimento das políticas fiscais e monetárias da Argentina”.

·        O posicionamento da China

Entre os motivos da possível suspensão do instrumento financeiro, estão as incertezas que o governo chinês tem em relação à política econômica de Milei e o que será feito com o Banco Central argentino, instituição com a qual o acordo é feito.

Durante a campanha, Javier Milei chegou a afirmar: “o fechamento do Banco Central não é uma questão negociável”.

Para o professor catedrático da Universidade Soochow, Victor Gao, o swap precisa estar baseado em vários pré-requisitos. “Um deles é a estabilidade geral das moedas envolvidas. Se estamos falando de uma moeda que pode oscilar e flutuar enormemente, isso não é bom, não vai funcionar para o swap de moedas porque destrói a premissa do swap de moedas já logo no começo”, explica Gao, um dos intelectuais chineses muito respeitado dentro e fora de seu país.

“Quando vemos a moeda argentina flutuar em mais de 50%, por exemplo, não só é muito ruim para o governo, a economia e o povo argentino, mas também para os países que precisam negociar com a Argentina e ter acordos de swap cambial com ela”, diz Gao, que também é vice-presidente do laboratório de ideias (think tank) chinês Centro para a China e a Globalização.

Além das incertezas econômicas, a questão de Taiwan também entrou em cena. Durante uma reunião na Casa Rosada justamente para falar sobre o swap, com o enviado especial chinês, Wu Weihua, a chanceler do governo Milei, Diana Mondino, teria feito comentários sobre “direitos soberanos” de Taiwan, segundo o jornal La Nación.

Mondino, economista especializada em “classificação de risco”, não possui experiência diplomática. Se de fato, ela fez um comentário nesse sentido, a delegação chinesa deve ter ficado, no mínimo, perplexa. A mídia argentina especula com que Mondino teria dito que gostaria de comercializar com Taiwan, mas isso de fato já ocorre.

A questão de Taiwan vem sendo reiterada, principalmente aos EUA, como a “primeira linha vermelha” a não ser atravessada. Na recente reunião na Califórnia, Xi Jinping teria dito a Biden que a China se reunificará com Taiwan, mas que não há data definida, ao contrário do que afirmam as agências de inteligência dos EUA, que colocam 2027 como data limite.

·        O futuro das relações China-Argentina

Victor Gao afirma que a eleição no país sul-americano é “completamente um assunto interno da Argentina e a China não tem nada a ver com isso”, mas que algumas ideias “muito extraordinárias” do novo presidente podem ser prejudiciais para as relações entre os dois países. “Isso é altamente lamentável, mas será uma questão que deverá ser abordada”, diz Gao.

Sobre um possível congelamento permanente do swap, Cernadas afirma que isso significaria uma redução no fluxo de moedas estrangeiras para a Argentina, “que o país poderia posteriormente usar, como mencionei anteriormente, para financiar importações da China usando o yuan, ou fazer novos pagamentos ao FMI”.

A questão é especialmente sensível, afirma, levando em conta dois fatores: que o novo governo acaba de liberalizar o comércio internacional e este ano a Argentina passou por uma seca que deve reduzir as exportações do país.

Em relação ao primeiro ponto, a Argentina tinha até o momento uma política de regular as importações para controlar os preços dos produtos locais. A liberalização das importações pode intensificar ainda mais a saída de moedas estrangeiras. Em segundo lugar, com a possível queda de exportações, a entrada de moedas será menor. “A pressão no mercado de câmbio, portanto, será ainda maior”, conclui a economista.

O professor Gao diz que tem esperança em que o país sul-americano se recomponha e possa “se relacionar com o resto do mundo com dignidade, decência e respeito mútuo”. mas que “ninguém terá paciência suficiente para esperar que milagres aconteçam na Argentina”.

 

Ø  Demissões, nota de 50 mil, ensino pago: as primeiras medidas de Milei

 

Desde que tomou posse, no dia 10 de dezembro, o novo presidente da Argentina, Javier Milei, tem buscado implementar propostas polêmicas e é alvo de protestos. Na quarta-feira (27), ele enviou ao Congresso um projeto com mais de 600 artigos que faz profundas mudanças no Estado.

<<<< Veja quais medidas o novo presidente já implementou ou está tentando implementar nas primeiras semanas de mandato:

·        *Fim do home office e dispensa de funcionários públicos*

Milei editou um decreto dispensando funcionários públicos que foram contratados em 2023. Os acordos de trabalho, que vencem no dia 31 de dezembro, não serão renovados.

A imprensa argentina afirma que 7 mil pessoas devem ser atingidas. Funcionários que têm deficiência ou são trans não serão dispensados.

O governo promete fazer uma avaliação para possíveis novos cortes e redução de salários. Há em torno de 45 mil funcionários públicos com mais de um ano de trabalho.

Diante da medida, sindicatos ameaçam uma greve geral.

Milei também exigiu que os funcionários públicos trabalhem presencialmente em 100% da jornada.

·        *Corte de ministérios e cargo para irmã*

Uma das primeiras medidas de Milei foi cortar o número de ministérios de 18 para 9. As pastas que permaneceram foram as seguintes: Interior, Relações Exteriores e Comércio Internacional, Defesa, Economia, Infraestrutura, Justiça, Segurança, Saúde e Capital Humano.

O presidente argentino também revogou uma lei que não permitia a indicação de familiares para cargos no governo. Com isso, ele nomeou a irmã, Karina Milei, como secretária de governo.

·        *Privatizações e lei trabalhista*

No dia 20 de dezembro, Milei anunciou, em um pronunciamento na TV, um decreto que tem 366 artigos. O texto revoga leis e promove a desregulação da economia.

Entre as medidas está o fim da lei que impede privatizações. Isso abre caminho, por exemplo, para a venda da Aerolíneas Argentinas.

O texto também desregulamenta os serviços de internet via satélite e o setor do turismo. Pelo decreto, clubes de futebol poderão se tornar sociedades anônimas.

Ainda há alterações na lei trabalhista. O decreto reduz a base de remuneração e aumenta o período de experiência dos trabalhadores de três para oito meses.

O decreto revogou o observatório de preços do Ministério da Economia, retirando as restrições dos valores. Como resultado, deve haver uma aceleração da inflação.

As medidas precisam passar pela apreciação do Congresso. Milei não tem maioria, e já ameaçou convocar um plebiscito caso o texto não seja aprovado.

·        *Emissão de notas*

O próprio Milei admitiu que suas primeiras medidas devem gerar estagflação na economia argentina. Ou seja, o país deve passar por uma combinação entre estagnação econômica e alta de preços.

Ele confirmou que o Banco Central vai emitir notas de 20 mil e 50 mil pesos, por causa da alta dos preços. Nos últimos 12 meses, a Argentina teve inflação de 142,7%. A pobreza atinge mais de 40% da população.

·        *Novo pacote*

Em complemento ao megadecreto, Milei enviou ao Congresso mais um pacote, com 664 artigos e 183 páginas. O texto foi batizado de "Lei de Bases e Pontos de Partida para a Liberdade dos Argentinos".

Reforma política, privatizações e o endurecimento de penas contra protestos estão incluídos no texto. Segundo o jornal Página 12, há uma mudança no Código Penal da Argentina para prever pena de dois a cinco anos de prisão para quem liderar protesto que impeça a "circulação de transporte público e privado".

Entre os artigos há um trecho prevendo a possibilidade de cobrança de mensalidades de estrangeiros que estudam em universidades argentinas. Isso pode afetar os mais de 10 mil estudantes brasileiros que vivem no país a maioria estuda medicina de forma gratuita em Buenos Aires.

O pacote também precisará passar pelo Congresso. O texto estabelece que o presidente teria uma "carta branca" em várias áreas, que poderia valer por até quatro anos.

 

Fonte: Bloomberg/Quora/DCM/FolhaPress

 

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