quarta-feira, 8 de novembro de 2023

A ROTA DO CRIME QUE LIGA O PCC ÀS FARC

O Vaupés, também conhecido como Uaupés, é um rio de águas escuras e caudalosas que nasce na Colômbia, serpenteia a Amazônia e deságua no Rio Negro, em território brasileiro. Ao longo de suas margens, 24 etnias indígenas, entre elas os karapanãs e os makunas, convivem com traficantes de cocaína, em sua maioria dissidentes das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc). A fronteira com o Brasil faz parte de uma rota lucrativa do tráfico internacional de drogas. O esquema foi objeto de uma investigação sigilosa do governo dos Estados Unidos e do Exército da Colômbia que detalhou, pela primeira vez, como um desses grupos criminosos trabalha para abastecer o PCC (Primeiro Comando da Capital) com toneladas de cocaína por via aérea e pelo Vaupés.

A piauí e o UOL tiveram acesso com exclusividade a relatórios de inteligência repassados ao Ministério Público da Colômbia e obtidos pelo consórcio de jornalismo investigativo OCCRP (Organized Crime and Corruption Reporting Project). Os documentos mostram o caminho percorrido pela cocaína que sai da Colômbia, passa por Manaus, pelo Caribe e termina nas mãos de consumidores na Europa.

A investigação teve início em 2020, a partir de informações repassadas ao Exército colombiano e à Polícia Federal brasileira pela Drugs Enforcement Administration (DEA), polícia norte-americana especializada no combate ao narcotráfico. Os americanos chamaram atenção para um esquema de compra e venda de cocaína na região conhecida como “cabeça do cachorro”, no extremo noroeste do Brasil, onde o país faz fronteira com Colômbia e Venezuela (o lugar ganhou esse apelido porque, nos mapas, seu formato se assemelha a um cachorro de boca aberta).

Segundo as informações preliminares repassadas pelos americanos, quem fazia a ponte entre os dissidentes das Farc e os criminosos do PCC era um colombiano chamado Nelson Jaramillo Quiceño, mais conhecido como Calidad (qualidade, em espanhol). Cabia a ele garantir que os criminosos colombianos, estabelecidos nos departamentos de Guaviare e Vaupés, conseguissem repassar os lotes de cocaína para os criminosos brasileiros, radicados em Manaus e São Gabriel da Cachoeira.

Nascido em San Jose del Guaviare, distante 400 km da capital Bogotá, Calidad fez parte de um grupo de paramilitares conhecido como “autodefesas de Yarí”, que atuava no Sul da Colômbia no começo dos anos 2000. Eram milícias que combatiam os guerrilheiros das Farc na selva. Em 2003, Calidad foi investigado por envolvimento no assassinato de quatro pessoas, entre elas um adolescente, mas acabou inocentado por falta de provas. Seis anos mais tarde, foi preso em flagrante pelo Exército brasileiro enquanto levava 4 toneladas de cimento a bordo de um barco no Rio Vaupés, na altura de Iauaretê, povoado amazonense próximo à fronteira com a Colômbia. A venda de cimento é controlada no Brasil, já que o produto pode ser usado na transformação de folha de coca em pasta base. Por isso, é preciso autorização da PF para exportá-lo. Calidad não tinha a papelada e foi detido pelos militares. Dias depois, deixou a prisão graças a um habeas corpus.

Por causa das toneladas de cimento, Calidad foi denunciado pelo Ministério Público Federal por contrabando. O processo tramita na Justiça brasileira e ainda não resultou em sentença. Em janeiro de 2015, o colombiano foi preso novamente em flagrante, dessa vez por crime contra a ordem tributária no estado do Amazonas. A reportagem não obteve detalhes do caso, que tramita em segredo de Justiça.

Desde aquela época, Calidad ora vivia em São Gabriel, onde possui uma barbearia e um restaurante, ora em Yavaraté, vilarejo colombiano na fronteira com o Brasil. Segundo os investigadores, ele se aproximou do principal grupo de dissidentes das Farc. Depois do acordo de paz entre o governo colombiano e os guerrilheiros, em 2016, as Farc viraram um partido político, mas alguns de seus integrantes optaram por continuar na selva, praticando sequestros e tráfico de drogas e armas.

Essas dissidências, chamadas pelo Exército da Colômbia de “grupos armados organizados residuais”, se dividem em várias frentes, classificadas por números. A de número 1, com a qual Calidad se amigou, é composta por cerca de quatrocentos homens, que por muito tempo foram liderados por Miguel Botache Santillana, o Gentil Duarte, e Géner García Molina, conhecido como Jhon 40.

Gentil Duarte foi morto na Venezuela em maio de 2022. Seu comparsa, Jhon 40, é um criminoso de renome. Seguindo a moda dos “corridos”, como são chamadas as canções populares que exaltam narcotraficantes, Jhon gravou duas músicas contando a própria trajetória. Chamam-se Bandido gringo e Maldito gobierno. Essa história foi contada em uma reportagem do The New York Times que se debruçou sobre o gênero musical, já bem estabelecido na Colômbia e no México.

A frente número 1 controla a produção e o tráfico de cocaína nos departamentos de Meta, Guaviare e Vaupés, território que abarca 6,7 mil hectares plantados de folha de coca, segundo o relatório mais recente do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crimes (Unodc). De acordo com os informes de inteligência do Exército colombiano, a cocaína produzida pelo grupo era transportada em barcos por 520 km entre as cidades de Miraflores e Mitú, na Colômbia. De lá, a droga era enviada a Manaus por meio de aviões da Aerovías Regional del Oriente (ARO), uma empresa de táxi aéreo que tem uma frota de nove aeronaves. Os militares suspeitam que lotes menores eram levados por embarcações que percorriam os rios Vaupés e Negro até Manaus, ocultos em carregamentos de farinha, carne ou peixe.

Em Manaus, ainda de acordo com o Exército da Colômbia, Calidad negociava a venda da cocaína com integrantes do PCC, que, por sua vez, despachavam a droga – possivelmente embarcada em aviões – para a República Dominicana e Porto Rico. De lá, a cocaína era traficada para portos europeus. Os documentos de inteligência não informam quais países recebiam a cocaína colombiana. Também não identificam os integrantes do PCC envolvidos nessa logística criminosa.

O Rio Solimões é a principal porta de entrada da cocaína que chega ao Brasil pela Amazônia, segundo a Polícia Federal. Nos últimos anos, essa rota tem sido dominada pelo Comando Vermelho, o que obrigou a facção rival PCC a buscar caminhos alternativos, como o Rio Negro. Esse trajeto traz algumas vantagens para os criminosos, como a menor presença policial (enquanto no Solimões existem ao menos cinco postos de fiscalização das polícias Civil e Federal, no Negro há somente dois), o baixo povoamento da região e a grande quantidade de ilhas, com destaque para o arquipélago de Anavilhanas, que dificulta o trabalho policial. Mesmo assim, em pouco mais de um ano, entre 2020 e 2021, foram apreendidas 3 toneladas de droga ao longo do rio, segundo os registros da PF.

Equipes do 30º Batalhão de Infantaria do Exército colombiano, com sede em Mitú, interceptaram conversas em espanhol de integrantes não identificados do esquema. “Tem 22 pacotes mas não consegui mover isso por aqui. Está complicado”, disse um interlocutor, em 17 de janeiro de 2021. Quatro dias depois, novo diálogo suspeito: “Ontem chegou o pessoal do chapéu e já estava tudo pronto, esses caras eles estão pedindo mais.” A última conversa transcrita pela inteligência militar é de 24 de janeiro daquele ano: “A comida foi enviada, mas não enviaram o dinheiro.”

Em paralelo, o esquema também foi investigado pelas autoridades brasileiras. Em julho de 2021, agentes da Delegacia de Repressão a Entorpecentes (DRE) da PF de Manaus foram enviados a São Gabriel para seguir Calidad. O colombiano, porém, estava passando uma temporada no país vizinho, e por isso a investigação não andou. O Exército da Colômbia, ao que tudo indica, foi mais bem-sucedido.

Em setembro de 2021, os militares colombianos constataram que Calidad transportou combustível em um barco de São Gabriel até Yavaraté. Segundo os investigadores, ele pretendia abastecer o gerador do vilarejo na Colômbia e, com isso, possibilitar a comunicação, via WhatsApp, com ex-guerrilheiros das Farc e integrantes do PCC. O Exército colombiano também constatou que alguns aviões da ARO, a empresa de táxi aéreo, decolaram do aeroporto de Mitú sem levar passageiros nem carga. A suspeita é de que essas aeronaves pousassem em pistas clandestinas às margens do Rio Vaupés, onde eram carregadas com cocaína.

Meses depois das interceptações telefônicas, em agosto de 2021, Calidad se reuniu com o gerente da ARO, Camilo Esteban Avila Morales, e o então prefeito de Mitú, Carlos Enriques Peñagos Celis, sócio da mesma empresa. Os investigadores afirmam que o motivo do encontro era discutir um aporte de 130 milhões de pesos – cerca de 156 mil reais – do grupo criminoso na campanha de Morales a deputado federal. Ele foi eleito em março de 2022.

Outros indícios se somaram à investigação. Um informante afirmou aos militares que Morales e Celis, visivelmente embriagados em um bar, comemoraram o envio de um carregamento de cocaína ao Brasil. Na conversa, eles teriam falado do plano de comprar um novo avião com os lucros da viagem. “Às vezes, sob o estado de embriaguez, [Celis] diz que envia muitos carregamentos de cloridrato de cocaína para Manaus, Brasil, e que atualmente controla voos em parceria com Camilo Esteban Ávila Morales”, afirma um relatório do 30° Batalhão de Infantaria do Exército da Colômbia.

Segundo os militares, Calidad, Morales e Celis vinham adquirindo propriedades rurais na região de Mitú em nome de parentes, o que levantou a suspeita de que estivessem lavando dinheiro por meio de transações fundiárias. Em novembro de 2021, dizem os relatórios da investigação, Calidad se reuniu em Manaus com integrantes do PCC para negociar novos carregamentos de cocaína. Três meses depois, o Exército da Colômbia constatou que o grupo se articulava para transportar 560 kg de cocaína de Mitú até a fronteira com o Brasil, percorrendo o Vaupés.

Diante dessas evidências, o Ministério Público da Colômbia obteve, em janeiro de 2022, autorização judicial para monitorar um dos telefones de Calidad. O aparelho, no entanto, já não era mais usado pelo investigado, conforme constataram os promotores um mês depois. A apuração continua nas mãos do Ministério Público. A reportagem solicitou informações repetidas vezes sobre o andamento do processo, mas não houve resposta nem dos promotores nem do Exército colombiano. Como a investigação corre em sigilo, não se sabe se os suspeitos foram denunciados à Justiça nem se houve novas descobertas no caso. Não constam ações penais públicas contra Calidad, Morales e Celis por tráfico de drogas na Justiça da Colômbia.

A reportagem fez contatos por WhatsApp com Calidad desde o dia 12 de outubro, mas não obteve resposta até o fechamento desta reportagem. Não foi possível contatá-lo por outros meios. O prefeito Celis e o deputado Morales foram procurados por e-mail, mas também não responderam aos questionamentos, enviados repetidas vezes. O espaço segue aberto para eventuais manifestações.

 

       Como PCC fez Paraguai virar um dos países com maior presença de crime organizado no mundo

 

A última vez que o Índice Global de Crime Organizado foi publicado, em 2021, o Paraguai não aparecia sequer entre os 15 primeiros países do ranking. No entanto, com uma pontuação de 6,70, já exibia indícios sólidos de que havia se tornado um centro de criminalidade e delinquência organizada. No ranking de 2023, a nação saltou para a 4ª posição entre os 193 membros da ONU incluídos no estudo, atrás apenas de Colômbia, México e Mianmar, o atual líder. A pontuação do Paraguai é agora de 7,52. A classificação é obtida por meio da média de notas atribuídas em diferentes categorias.

A BBC Mundo, serviço em espanhol da BBC, entrou em contato com diversos órgãos públicos e ministérios do Paraguai, assim como com o gabinete da Presidência de Santagio Peña, para analisar este resultado, mas não obteve respostas. Para os especialistas consultados, a ascensão do país no ranking é reflexo de uma realidade que já se estende há anos – e está mais relacionada a uma questão de visibilidade do que de mudança na realidade.

A operação contra o narcotráfico e a lavagem de dinheiro chamada "A Ultranza PY", a maior da história do país, realizada em 2019, deixou claro que as coisas mudaram nos últimos anos na nação sul-americana. Esta operação levou à destituição de ministros e à prisão de 24 pessoas por supostos vínculos com organizações de narcotraficantes.

Para Carolina Sampó, doutora e pesquisadora do Conselho Nacional de Pesquisas Científicas e Técnicas (Conicet), os criminosos no Paraguai se aproveitaram durante anos da “falta de reputação do país como exportador de drogas para reenviar cocaína sem serem detectados e dirigi-la a portos de saída não tradicionais e rotas contraintuitivas como aquelas que se iniciam no porto de Buenos Aires, de San Antonio, ou de Montevidéu”. Foi o homicídio do promotor paraguaio Marcelo Pecci, em maio de 2022, que deu dimensão internacional ao que acontecia no Paraguai.

Pecci investigava casos de corrupção e lavagem de dinheiro de alto perfil quando foi assassinado em sua lua de mel na Colômbia.

As autoridades encontraram muitos indícios sobre a autoria intelectual do assassinato, que apontaram para o Primeiro Comando da Capital (PCC), grupo criminoso do Brasil com ramificações criminosas em muitos países vizinhos. “Todos os mercados e atores criminosos que se encontram nas Américas estão presentes em vários países. Esses mercados criminosos interconectados e transnacionais aproveitam situações de liderança e governança deficitárias”, afirmam os autores do Índice Global de Crime Organizado. “Os pontos de 2023 mostram que a região das Américas continua dominando o comércio mundial de cocaína como principal mercado de origem da droga”, acrescentam.

O Brasil está na posição 22 no ranking de 193 países e é o sétimo com maior criminalidade organizada das Américas, segundo a lista.

•        O que aconteceu no Paraguai?

Para começar, especialistas apontam que o país está situado no coração da América Latina, fazendo fronteira com mercados enormes como Brasil, Argentina e Bolívia. Só isso já torna o Paraguai geograficamente atraente. Além disso, pelo menos outros 8 fatores ajudam a explicar como o país sul-americano se transformou em um centro criminoso internacional:

•        1. Pressão nos portos da Argentina e do Brasil

A maior vigilância nos portos da Argentina e do Brasil fez com que o Paraguai se tornasse um centro internacional de distribuição de cocaína andina graças à sua proximidade geográfica com dois dos principais produtores desta droga, Peru e Bolívia. “Isso é algo novo. A cocaína que vem do Peru, da Colômbia ou do Equador chega ao Paraguai em pequenos aviões e é transportada até os portos de Buenos Aires e Montevidéu, que ficam no Atlântico, ou passa pelos portos do próprio país. A partir daqui, a cocaína começa a ser enviada para países da Europa, da África ou mesmo do Oriente Médio”, afirma Juan A. Martens, pesquisador da Universidade Nacional de Pilar e do Inecip (Instituto de Estudos Comparados em Ciências Penais e Sociais) do Paraguai. “Os movimentos aéreos são movimentos curtos, o que os torna muito fáceis. Em muitos casos nem é necessário que os pequenos aviões pousem, eles só jogam a cocaína do ar em um campo e voltam”, diz Sampó.

•        2. Utilização da hidrovia Paraná-Paraguai

Nesta chegada aos portos atlânticos, desempenha um papel fundamental um dos maiores sistemas navegáveis do mundo, no qual, mais uma vez, o Paraguai está geograficamente localizado no centro. É a hidrovia Paraná-Paraguai. Com extensão de 3.442 quilômetros, atravessa ou tem ramificações na Argentina, Bolívia, Brasil, Paraguai e Uruguai. “O Brasil é um mercado de 200 milhões de pessoas. Por água, apenas uma hora nos separa do maior estado brasileiro. De Saltos del Guaira, no norte do Paraguai, é uma hora de barco até o estado de São Paulo, que tem 45 milhões de habitantes.” “É muito fácil traficar por essa via”, diz o pesquisador paraguaio.

•        3. De maconha a cocaína

O Paraguai cultiva cerca de 7 mil hectares de maconha por ano. “Sempre foi um espaço territorial complexo no que diz respeito à criminalidade. A primeira questão é a quantidade e a qualidade da produção de maconha na região de Pedro Juan Caballero e como essa produção de maconha deu origem a graves conflitos entre diferentes organizações criminosas brasileiras e clãs locais”, diz Sampó. “Os níveis de consumo de maconha no Brasil são muito elevados e a qualidade da maconha de Pedro Juan é a mais alta da região. Ao unir produtores a clientes, o negócio vale milhões no Brasil”, afirma a pesquisadora argentina.

É pela necessidade de controlar a circulação dessa droga que ocorre a expansão do tráfico de drogas. O Paraguai passou de primeiro produtor de maconha da América do Sul a um dos principais distribuidores de cocaína, apesar de não produzi-la.

•        4. A chegada do PCC

Desde meados da década de 2010, o Primeiro Comando da Capital, a maior organização criminosa do Brasil e talvez da América do Sul, exerceu influência significativa através da fronteira com o Paraguai, onde domina os mercados de tráfico de drogas e armas. “A presença do cartel se estende por todo o Paraguai. A expansão do PCC para países vizinhos e suas conexões com redes internacionais sublinham a crescente influência do grupo na América do Sul”, afirmam os autores do Índice Global de Crime Organizado.

Sampó explica que o PCC escolhe o Paraguai para sua expansão devido à proximidade com os centros de distribuição de maconha e cocaína. “Sua chegada tem a ver com um primeiro desembarque para controlar a maconha e depois se expande para diversos espaços do Paraguai, rurais e urbanos, onde recriam suas rígidas estruturas de organização criminosa”. A partir daí, a organização expande seus negócios e começa a transportar cocaína do Peru e da Bolívia para o Paraguai e de lá para o porto de Santos.

O porto de Santos é o principal porto do Brasil e da América Latina.

Posteriormente, viria a expansão de outras rotas, principalmente aquelas que têm a ver com o uso da hidrovia e a saída pelos portos de Buenos Aires e Montevidéu.

“O cartel nasce nas prisões. É uma organização criminosa enorme e muito complexa. Para ingressar, é preciso ser batizado, é preciso passar por um processo de admissão”, afirma a pesquisadora. “O que começamos a ver entre 2018 e 2019 é que começam a haver batismos dentro das prisões paraguaias de paraguaios, não de brasileiros. Dos paraguaios que começam a pertencer ao PCC. E assim a organização amplia sua base dentro do território paraguaio”, afirma.

•        5. Narcopolítica

Diferentes organizações internacionais afirmam que o Paraguai tem um problema de corrupção generalizado, que afeta todos os níveis de governo e da sociedade, tanto na esfera pública como na privada. “As pontuações do Paraguai, Venezuela e Nicarágua sugerem que os criminosos têm um nível preocupante de influência na sociedade e nas estruturas estatais”, diz o relatório produzido junto do índice.

A chegada da cocaína do Paraguai aos portos da Bélgica, Holanda e Alemanha atraiu a atenção da Europol, da DEA (Administração de Fiscalização de Drogas, dos EUA) e de outras agências internacionais, o que tornou visível o vínculo institucional que existe entre o crime organizado e o poder público.

Martens lembra os casos do ex-deputado Juan Carlos Ozorio, acusado de lavagem de dinheiro, tráfico de drogas e associação criminosa, ou do senador Erico Galeano, que atualmente é processado por lavagem de dinheiro e associação criminosa. “Há uma impunidade sistemática”, diz ele.

Sampó concorda com isso: “As condições de fragilidade do Estado, a fragilidade institucional, os altos níveis de corrupção, os altos níveis de impunidade, viabilizam que o PCC desembarque como organização criminosa, se estabeleça e combine com os clãs locais a distribuição do negócio.”

•        6. Sem controles e fronteiras porosas

Estima-se que entre Argentina e Paraguai existam mais ou menos 200 travessias ilícitas. Em algumas partes, a distância entre os dois países é tão curta que, com uma lancha rápida, a fronteira pode ser atravessada em dois minutos.

Mas outro dos fatores que torna a fronteira paraguaia porosa é a falta de recursos para controlar o espaço aéreo do país. “Até o momento, o Paraguai não possui radar para monitorar o céu. É claramente uma decisão política e um convite aos grupos criminosos transnacionais. Tornou este território um ímã de atração para grupos do México, da Europa Oriental ou da máfia italiana”, diz Martens.

•        7. Tráfico de armas

O Paraguai possui uma legislação muito favorável à compra e venda de armas e os requisitos para adquiri-las não são muito complicados. “Setenta e três grupos criminosos atuam no Brasil e as armas que esses grupos geralmente utilizam passam pelo Paraguai. Especificamente, são destinados às favelas do Rio. Estamos falando deles chegando ao Rio de Janeiro, ao Espírito Santo, a Minas Gerais e ao Nordeste brasileiro”, diz Martens.

E não só armas de pequeno e médio calibre, mas também munições são distribuídas do Paraguai. “As armas abastecem organizações criminosas brasileiras como o PCC ou o Comando Vermelho”, diz Sampó.

•        8. Tabaco e produtos falsificados financiam atividades criminosas

As rotas da droga são utilizadas para o tráfico de armas, mas também para o contrabando de cigarros e produtos falsificados. “O Paraguai é um centro importante para o comércio ilícito de tabaco, tanto a nível nacional como regional. A área da tríplice fronteira entre Paraguai, Brasil e Argentina é um corredor movimentado para o tráfico de tabaco, que financia outras atividades criminosas. O Paraguai ocupava a posição mais elevada da América neste mercado ilícito”, diz o relatório. “Os cigarros paraguaios inundam grande parte dos países vizinhos, impactando diretamente nas receitas dos Estados. E uma das características básicas das organizações criminosas é estarem envolvidas em tudo ao mesmo tempo. Muitas vezes até são utilizadas as mesmas rotas”, diz Sampó. E de mãos dadas com o contrabando também vem o comércio de produtos falsificados, que é outro mercado criminoso nas Américas.

A pontuação média da América do Sul de 6,25 coloca a região em segundo lugar globalmente no ranking de crime organizado. O Peru e o Paraguai têm as pontuações individuais mais altas da região e ambos os países são avaliados como importantes focos de produtos falsificados.

Ciudad del Este, no Paraguai, é um importante centro de produtos falsificados, incluindo roupas, calçados, relógios, eletrodomésticos e perfumes. “Grupos criminosos no Paraguai se destacam por facilitar esse comércio ilícito”, acrescenta o documento.

 

Fonte: Revista Piauí/BBC News Mundo

 

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