sábado, 28 de outubro de 2023

TAC da Carne: Governos estaduais são entrave na análise da regularidade da cadeia

O Ministério Público Federal divulgou, na tarde desta quinta-feira (26), os resultados do primeiro ciclo unificado de auditorias na cadeia da pecuária na Amazônia Legal. Ao contrário das análises anteriores, que consideravam somente os frigoríficos do Pará, desta vez também foram analisadas empresas do Amazonas, Acre, Mato Grosso e Rondônia. A falta de colaboração dos governos estaduais, no entanto, prejudicou a realização de uma análise mais efetiva da legalidade do setor.

Dos cinco estados da Amazônia Legal signatários do acordo com o Ministério Público Federal que proíbe a compra de gado de fazendas com desmatamento ilegal, apenas três disponibilizaram os dados necessários para a auditoria realizada pelo órgão.

Para checar a origem do gado que vai parar nos frigoríficos da Amazônia Legal, o MPF precisava de dois documentos essenciais dos órgãos sanitário e ambiental dos estados: a Guia de Trânsito Animal (GTA) e o Cadastro Ambiental Rural (CAR), respectivamente.

Durante o processo de auditoria, apenas Pará, Amazonas e Acre disponibilizaram tais informações. Em Mato Grosso, estado com o maior rebanho bovino do país (34 milhões de cabeças), e em Rondônia (17 milhões de cabeças), os órgãos públicos decidiram por não abrir os seus dados.

Segundo Lisandro Inakake, gerente de projetos do Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora), organização parceira do MPF na realização das auditorias, isso impossibilitou uma análise mais acurada da origem do gado.

“Nesses estados, as auditorias foram feitas com base apenas nas compras das empresas, o que perde um pouco a qualidade. Esse é um ponto de fragilidade desse ciclo unificado”, explica Inakake.

De acordo com ele, a negativa dos estados que não abriram os dados foi justificada por um alegado enfraquecimento do mecanismo de controle sanitário.

Segundo apurou ((o))eco, ao longo do processo de auditoria, também apareceram como justificativa o cumprimento da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais – argumento rechaçado por juristas – e uma alegada quebra na lógica da livre concorrência.

“Acho que tem um aspecto aí que é a insegurança por parte dos responsáveis pelas agências [ambiental e sanitária] em disponibilizar tais informações e, digamos assim, assumir o risco. Acredito até que eles preferiam que tivesse alguém para compartilhar essa responsabilidade, como o próprio Ministério Público em uma ação, por exemplo”, diz Inakake.

•        Ciclo unificado

O Termo de Ajustamento de Conduta da Carne – TAC da Carne, como é conhecido – foi lançado em 2009 e, desde então, apenas os frigoríficos do Pará passaram por auditorias.

“Nos outros ciclos, uma questão que era sempre levantada pelo setor produtivo, com muita propriedade, era: por que só as empresas do Pará que se submetiam a esse processo de transparência, de abrir os seus arquivos, de mostrar para a  sociedade brasileira como um todo se comprava ou não de área desmatada, terras indígenas ou unidades de conservação”, disse o Procurador da República, Daniel Azeredo, durante apresentação dos resultados.

Azeredo, que é um dos precursores dos acordos da carne na Amazônia, disse que o ciclo unificado é uma forma de corrigir uma assimetria nos resultados das análises e trazer, por meio do engajamento e participação, todas as grandes e médias empresas instaladas na floresta tropical.

“Ainda há muito o que fazer, há muito o que se avançar, não está ainda no nível que a gente gostaria que estivesse o processo como um todo, mas ele precisa começar, né, e ele está começando”, complementou.

No ciclo unificado, as empresas estão divididas em dois grandes grupos: o primeiro é o dos frigoríficos que voluntariamente assinaram o TAC da Carne, abriram seus dados e contrataram uma auditoria para analisá-los.

O segundo grupo é o das empresas que não assinaram o acordo e tiveram as auditorias realizadas à “revelia” pelo MPF, utilizando dados de GTA e CAR – nos casos de Pará, Amazonas e Acre – ou a lista de compras – no caso do MT e RO, cujos governos não abriram os dados, como explicado acima.

“A ideia é que ninguém se esconda. E essa é uma demanda das próprias empresas que participam desse processo, senão a gente tem um caso típico de concorrência desleal”, disse Azeredo.

•        Resultados do 1º Ciclo Unificado

O primeiro ciclo unificado considerou as transações realizadas entre julho de 2020 e dezembro de 2021. No total, 66 frigoríficos nos cinco estados analisados foram convocados a participar das auditorias.

Trinta em uma plantas frigoríficas realizaram suas próprias auditorias. Grandes frigoríficos, como JBS, Marfrig e Minerva, possuem plantas em mais de um estado. Nesses casos, as plantas foram auditadas separadamente.

Das empresas que se comprometeram a participar, no entanto, 12 ainda não apresentaram os dados a tempo da divulgação.  A elas, foi dado o prazo de janeiro de 2024 para assim o fazer.

Outros 35 frigoríficos não realizaram suas próprias auditorias e foram analisadas automaticamente pelo Ministério Público Federal.

# Acre

No Acre, três empresas foram convocadas a participar, entre elas a JBS. A gigante da carne foi a única a fazer sua própria auditoria e apresentou 10% de inconformidade. Isto é, cerca de 4 mil cabeças de gado estavam inconformes – em área de desmatamento ilegal, Terra Indígena, Unidade de Conservação ou com trabalho análogo à escravidão.

As outras duas empresas – Fricarnes e Modelo – foram auditadas pelo MPF e apresentaram, juntas, 5,5% de irregularidades (2.165 cabeças de gado inconformes).

# Amazonas

No Amazonas, 10 empresas foram convocadas. Destas, quatro contrataram auditoria, mas até o momento não apresentaram resultados. As outras seis foram auditadas pelo MPF e apresentaram, juntas, 7,4% de inconformidade (16.339 cabeças de gado inconformes).

# Mato Grosso

Em Mato Grosso, 17 frigoríficos foram convocados, sendo que 13 se comprometeram a apresentar suas auditorias. Desses 13, no entanto, apenas três – JBS, Marfrig e Minerva – apresentaram seus resultados. Outros quatro frigoríficos foram auditados pelo MFP.

Neste estado, a planta da JBS apresentou 2% de inconformidade (5.142 cabeças de gado). Marfrig e Minerva não apresentaram inconformidades.

# Rondônia

Em Rondônia, dois frigoríficos foram convocados – JBS e Minerva – e os dois fizeram suas auditorias. A JBS neste estado comprou quase 21 mil cabeças de gado de áreas irregulares, o que representou 12% das transações. Minerva não apresentou inconformidade.

# Pará

O Pará sempre recebeu uma atenção especial no âmbito da TAC da Carne, tanto pelo número de frigoríficos instalados quanto pelo volume de gado abatido. Antes do ciclo unificado, o estado passou por outros quatro ciclos de auditorias.

De julho de julho de 2020 a dezembro de 2021 – período considerado neste último ciclo – o estado abateu 3,5 milhões de cabeças de gado. A amostra analisada nas auditorias deste ano englobaram cerca de 330 mil cabeças. O total de inconformidade ficou em 4,81% (16 mil cabeças).

Este foi considerado um bom resultado, já que o índice de irregularidade veio caindo desde que o primeiro ciclo foi realizado (10,4% de inconformidade na ocasião).

Considerando os resultados de todos os estados, o procurador Daniel Azeredo admite que o resultado ideal ainda está longe de ser alcançado, mas que este é um começo.

“Quando o MPF vai poder gastar nossa energia com outro tema e deixar a pecuária na questão ambiental caminhar livremente? Quando a gente tiver uma certeza próxima de 100 % de que o gado que entra em uma empresa frigorífica não venha de desmatamento legal. Nós estamos perto de alcançar isso? Infelizmente, não. Mas é para isso que estamos trabalhando”, disse.

O TAC da Carne foi lançado em 2009 e já tem 14 anos de vigência.

 

Ø  Conselho recomenda que STF rejeite proposições pela redução ou isenção fiscal a agrotóxicos

 

O Conselho Nacional de Saúde (CNS) aprovou, nesta quinta (26/10) uma recomendação para que os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitem qualquer proposição que permita a redução ou isenção fiscal e tributárias a agrotóxicos no Brasil. O julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5553 está previsto para se encerrar na sexta (27/10).

A recomendação foi proposta pela Comissão Intersetorial de Alimentação e Nutrição (Cian) do CNS que destaca os altos riscos à saúde pública e ao meio ambiente que a ampliação do uso de agrotóxicos pode representar, entre eles o potencial de causarem câncer e desregulação endócrina, interferindo na produção, secreção, transporte, ligação, ação ou eliminação de hormônios, substâncias responsáveis por funções como desenvolvimento, reprodução, funcionamento do metabolismo e comportamento dos organismos.

O documento do CNS ainda destaca que “os grandes latifúndios não cultivam comida, mas commodities, ou seja, que a maior dependência do uso de agrotóxicos está nas culturas destinadas aos insumos industriais, produção de ração animal, biocombustíveis e outras finalidades, que não dizem respeito à alimentação da sociedade”. A soja, commodity mais cultivada no país, é a que mais emprega agrotóxicos, 63% do total utilizado no país, ao qual se segue o milho (13%) e a cana-de-açúcar (5%).

 

Fonte: ((o))eco/CNS

 

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