Sul Global versus o resto: como o conflito Israel-Palestina escancarou
a impotência do Ocidente?
Com a eclosão do conflito Israel-Palestina, o
Ocidente mais uma vez sofreu um choque com a reação dos países do Sul Global,
ao não embarcarem em uma defesa incondicional das ações israelenses na Faixa de
Gaza. A situação demonstrou mais uma vez – e de forma escancarada – a impotência
do Ocidente em controlar a narrativa global.
Vale lembrar que, contrariando também as
expectativas ocidentais, os países do Sul Global – em sua maioria –
permaneceram neutros diante das ações da Rússia no âmbito de sua operação
militar especial iniciada em 2022, evidenciando a incapacidade do Ocidente de
arregimentar a opinião pública internacional.
Isso porque o Sul Global por repetidas vezes expôs
a hipocrisia dos países ocidentais quando dizem defender os princípios do
direito internacional, quando eles mesmos são os principais violadores desse
direito.
Afinal, alguém poderia dizer quais foram os países
europeus que aplicaram sanções aos Estados Unidos após a invasão do Iraque em
2003? Ou então, quais empresas europeias e americanas deixaram a França ou o
Reino Unido após suas operações agressivas em países como Síria e Líbia após a
Primavera Árabe? Ou qual dos países ocidentais demonstrou consternação com a
aplicação de sanções econômicas unilaterais sem a aprovação do Conselho de
Segurança da ONU?
Pois então, em vista de todas essas hipocrisias,
acreditar nas boas intenções do Ocidente, que se diz guiado por
"princípios e valores" seria tão ingênuo quanto acreditar na letra da
canção "Imagine" de John Lennon. Mas voltando à crise no Oriente
Médio, é notório que o principal patrono de Israel durante a atual crise
trata-se justamente dos Estados Unidos, cujo apoio financeiro e político a Tel
Aviv assegura ao governo de Benjamin Netanyahu uma poderosa retaguarda
psicológica.
Tal retaguarda, por sua vez, foi reforçada por uma
declaração conjunta emitida pelos próprios americanos, juntamente da França,
Alemanha, Reino Unido e Itália, logo após o dia 7, em que demonstraram apoio
irrestrito a Israel. Na ocasião, o Ocidente foi inequívoco em sua condenação às
ações extremadas do Hamas, ao mesmo tempo em que deram carta branca às
autoridades israelenses para que executassem o que, aos olhos do mundo, tem
sido uma resposta altamente desproporcional e destrutiva do ponto de vista
humanitário.
Enquanto isso, a Rússia, apoiada pelo Mundo Árabe,
pela própria Palestina e pelo Sul Global, buscou no âmbito do Conselho de
Segurança da ONU uma solução negociada para a crise no Oriente Médio, através
de propostas de resolução pedindo a imediata implementação de um cessar-fogo
humanitário entre Israel e as forças atuantes na Palestina.
Contudo, desde o dia 16 essas propostas foram
vetadas por potências ocidentais como Japão, França, Reino Unido e sobretudo
pelos Estados Unidos, o que tem causado o prolongamento do conflito e do
derramamento de sangue na Faixa de Gaza. Também com relação ao conflito na
Ucrânia, o Ocidente tem inviabilizado um fim das hostilidades pela via
diplomática.
Pelo contrário, as elites políticas em Bruxelas e
em Washington têm apostado suas fichas em uma ilusória possibilidade das forças
ucranianas vencerem a Rússia no campo de batalha, o que já se mostrou inviável,
dado o fracasso da contraofensiva de Kiev iniciada em junho desse ano. Aqui
também o Sul Global se separou em definitivo do Ocidente, ao pedir por uma
solução de paz no Leste Europeu, o que não parece estar nos planos de lobbies
poderosos como o do complexo militar industrial americano.
Seja como for, após as tentativas frustradas no
âmbito do Conselho de Segurança em se chegar a uma solução pacífica para o
atual conflito Israel-Palestina, o mundo passou a testemunhar uma sequência de
tragédias na região, como foi o caso do ataque ao Hospital al-Ahli (na Faixa de
Gaza) do dia 17, vitimando centenas de civis e inocentes.
Desde então, Israel tem tentado atribuir a culpa
pelo ataque ao grupo Hamas, entretanto essas afirmações gozam de pouca
credibilidade perante o Sul Global, e sobretudo no Mundo Árabe por conta da
flagrante disparidade no número de mortes entre civis israelenses e palestinos
após o início da resposta do governo de Tel Aviv aos ataques do dia 7.
Não sem razão, protestos eclodiram no Mundo Árabe
(a exemplo de países como Jordânia, Líbano, Tunísia, Líbia e Iêmen), no Sul
Global e em diversas partes da Europa em favor da Palestina e desfavoráveis às
ações desproporcionais tomadas por Israel no âmbito do conflito.
Por certo, se a crise na Ucrânia já havia exposto
divisões bastante claras na comunidade internacional, a mais recente crise no
Oriente Médio culminou por consolidá-las. Hoje, podemos dizer que o mundo se
encontra verdadeiramente dividido entre o Sul Global e o resto.
Potências emergentes na Ásia, África e América
Latina não mais compartilham das narrativas ocidentais a respeito dos
principais problemas internacionais vigentes e não mais estão dispostas a
seguir a cartilha europeia e norte-americana sobre como devem se conduzir
perante esse ou aquele acontecimento específico.
Não estamos vivendo mais na década de 1990. Mesmo
na Europa, a simpatia da sociedade aos apelos de diversas lideranças políticas
locais em favor de Israel tem se mostrado cambaleante, como pode ser visto
pelos protestos populares em apoio à causa palestina.
Focado em defender seus interesses geopolíticos a
quaisquer custas, o Ocidente jogou por terra sua credibilidade e agora é
incapaz de conduzir a opinião pública global, ainda que detenha o controle das
principais redes sociais e dos principais conglomerados de mídia.
A razão desse fracasso se deve ao senso de
superioridade do Ocidente e à frequente imposição pela força de suas agendas ao
restante do mundo, fórmula essa que esgotou sua eficácia há muito tempo. Hoje,
a situação é outra. Hoje, é preciso lidar com uma multiplicidade de novos
atores emergentes, oriundos das mais diversas partes do globo, e levar em
consideração suas opiniões sobre os principais problemas internacionais da
atualidade.
Em outras palavras, como o conflito
Israel-Palestina terminou por demonstrar, o século XXI será marcado não mais
pelo famigerado West versus Rest (Ocidente versus o resto), mas sim pelo Sul
Global versus o resto.
Ø EUA usam conflito em Israel para se expandir militarmente rumo ao mar
Negro, alerta analista
EUA expandem sua presença militar no Mediterrâneo
Oriental, sob pretexto de evitar escalada regional do conflito entre Israel e
Palestina. Para analista ouvido pela Sputnik Brasil, movimento de Washington
também visa patrulhar o mar Negro, região sobre domínio das Marinhas de Rússia
e Turquia.
Nas últimas semanas, os EUA têm mobilizado suas
forças navais e reativado bases aéreas na região do Mediterrâneo Oriental.
O porta-aviões USS Gerald R. Ford foi estacionado
na região com outros navios de guerra dos EUA, em movimento justificado por
Washington como de contenção ao Irã. De acordo com a narrativa oficial do
Pentágono, os Estados Unidos aumentam sua presença militar no Mediterrâneo
Oriental para impedir que forças aliadas do Irã, como o Hezbollah, interfiram
no conflito entre Israel e Palestina.
Apesar do alarme, o pesquisador em Economia e
Relações Internacionais da Universidade Federal Fluminense (UFF), Jonuel
Gonçalves, lembra que a presença naval dos EUA e da Organização do Tratado do
Atlântico Norte (OTAN) no Mediterrâneo sempre foi significativa.
"Embora a OTAN seja, em tese, voltada para o
Atlântico Norte, suas capacidades no Mediterrâneo são tão ou mais
relevantes", declarou Gonçalves à Sputnik Brasil. "O que vemos agora
é uma força de pressão dos EUA em direção ao Mediterrâneo Oriental."
O pesquisador ainda nota a presença regional
significativa da Marinha da França, seguida pela atuação do Reino Unido.
"Todas as partes estão tomando precauções,
afinal a situação no Oriente Médio está delicada em função do conflito. Agora
ficou claro que forças que se consideravam infalíveis, como a de Israel, também
podem sofrer revezes", notou Gonçalves.
·
Risco para o mar Negro
Para o analista político turco Umit Nazmi Hazir, a
expansão da presença dos Estados Unidos no Mediterrâneo Oriental não está
somente vinculada ao conflito entre Israel e Palestina.
"A primeira razão é, sim, a tensão crescente
[...] devido ao conflito em curso entre Israel e o Hamas. Os EUA, que se têm
concentrado na Ucrânia, estão agora aumentando a sua atenção para o Oriente
Médio", disse Hazir à Sputnik Brasil.
No entanto, a segunda motivação para as movimentações
militares dos Estados Unidos seria se aproximar do mar Negro, região que conta
com ampla presença das Marinhas de Rússia e Turquia.
"A situação no mar Negro é frágil devido ao
conflito entre Rússia e Ucrânia", apontou Hazir. "Ao expandirem sua
presença para bases na Grécia, os EUA também podem monitorar a situação no mar
Negro."
Atento às intenções dos EUA na região, o presidente
russo Vladimir Putin anunciou que o mar Negro passará a ser patrulhado por
caças MiG-31, armados com mísseis hipersônicos Kinzhal.
"Isto não é uma ameaça. Com base nas minhas
instruções, a Força Aeroespacial russa começará patrulhas permanentes na zona
neutra do espaço aéreo sobre o mar Negro, e as aeronaves MiG-31 serão armadas
com sistemas Kinzhal", declarou o presidente da Rússia.
·
Risco para Turquia
As forças russas não são as únicas preocupadas com
o aumento da atividade militar norte-americana no Mediterrâneo Oriental. A
Turquia também tem mostrado apreensão devido à expansão do uso do território da
Grécia, sua rival regional, pelas Forças Armadas dos Estados Unidos.
Nesta segunda-feira (24), os EUA começaram a
utilizar a base aérea de Elefsina, perto da capital grega Atenas, para realizar
operações voltadas ao Oriente Médio. Outras bases do país, como a da ilha de Cárpato,
também poderão ser engajadas pelos norte-americanos, reportou a mídia local.
Além disso, o orçamento de defesa dos EUA para
2024, recentemente aprovado no Congresso, prevê a expansão da presença militar
de Washington na Grécia, em particular em suas ilhas no mar Egeu.
De acordo com o analista político turco Umit Nazmi
Hazir, a rivalidade entre Grécia e Turquia no Mediterrâneo Oriental pode se
agravar devido a uma maior presença militar de Washington.
"Anteriormente, os EUA adotavam uma política
de equilíbrio entre a Grécia e a Turquia [...] para impedir que um país tivesse
supremacia em relação ao outro no Mediterrâneo Oriental", disse Hazir.
"Contudo, nos últimos anos, os Estados Unidos alteraram esta política de
equilíbrio a favor da Grécia."
Segundo ele, os EUA passaram a considerar a Grécia
uma aliada mais leal, após divergências com a Turquia, que adota uma política
externa independente.
"Isso fica claro no caso da Ucrânia, por
exemplo, no qual a Turquia tenta manter boas relações tanto com Moscou, quanto
com Kiev, enquanto a Grécia providencia apoio incondicional à Ucrânia",
notou Hazir.
A Turquia já protestou contra o aumento da presença
militar dos EUA no mar Egeu, região na qual existem territórios contestados
entre as partes.
"Na minha opinião, o conflito em Israel é uma
das razões, mas não a única, pela qual os EUA aumentam a sua presença militar
no Mediterrâneo Oriental", concluiu o especialista turco.
Ø China promete 'laços mais estreitos com Irã' em 1ª reunião bilateral
após conflito Israel-Palestina
As interações Pequim-Teerã atraíram a atenção
internacional em meio a especulações sobre se a China — que no início deste ano
mediou a reaproximação entre Irã e Arábia Saudita — poderá ser capaz de ajudar
a evitar as repercussões desta última grande escalada no conflito
israelo-palestino.
Na quinta-feira (26), o primeiro-ministro chinês,
Li Qiang, se encontrou com o vice-presidente iraniano, Mohammad Mokhber, à
margem das reuniões da Organização para Cooperação de Xangai (OCX) e discutiram
diversos assuntos, neste que foi o primeiro encontro entre duas autoridades de
ambos os países após o conflito em Israel estourar.
Li e Mokhber abordaram o conflito em Gaza em suas
negociações, e o premiê chinês expressou o interesse de Pequim em "mais
coordenação com Teerã", ao mesmo tempo em que apelou aos países islâmicos
para "trabalharem juntos para diminuir as tensões", de acordo com o
South China Morning Post.
"As tragédias em Gaza aumentaram a
instabilidade no Oriente Médio, entretanto, a posição de Pequim é bastante
clara. Quer um cessar-fogo rápido e a proteção dos civis de todos os lados e
não propagação da tensão", disse Li.
O primeiro-ministro chinês prometeu o apoio
contínuo da China para o Irã com objetivo de assegurar sua soberania nacional, dizendo
que se oporia "fortemente a qualquer força externa que interfira nos
assuntos internos de Teerã".
O chanceler chinês, Wang Yi, condenou a
"punição coletiva" dos civis de Gaza e manteve diálogos sobre o
assunto com vários homólogos internacionais nas últimas semanas, incluindo os
do Irã, Brasil, Estados Unidos e Arábia Saudita.
Ainda sobre o encontro de Li e Mokhber, que
aconteceu na capital do Quirguistão, Bishkek, o premiê chinês disse à
autoridade iraniana que a China estava pronta para praticar "o verdadeiro
multilateralismo e assegurar os interesses comuns dos países em
desenvolvimento", ao prometer maior comunicação com o Irã no âmbito de
mecanismos multilaterais como as Nações Unidas, a OCX e os BRICS.
"A China está pronta para trabalhar com o Irã
para implementar os importantes consensos alcançados pelos dois chefes de
Estado, enriquecer a conotação da parceria estratégica abrangente China-Irã e
trazer mais benefícios para os dois povos", complementou Li.
Ø Coreia do Sul e EUA preparam-se para possível ataque norte-coreano 'no
estilo Hamas', diz mídia
A Coreia do Sul e os EUA estão realizando
exercícios de contra-ataque em larga escala com artilharia pesada, incluindo na
região de fronteira com a República Popular Democrática da Coreia, relata a
revista Time.
Esta semana, os exércitos sul-coreano e americano
realizaram exercícios conjuntos de fogo real para aprimorar suas habilidades no
combate às ameaças do vizinho "perigoso", a Coreia do Norte.
O exercício de três dias envolveu 5.400 soldados
sul-coreanos e americanos, 300 sistemas de artilharia, 1.000 veículos e
aviação.
Por sua vez, o portal Yonhap informa que estiveram
envolvidos também veículos aéreos não tripulados, radares de guerra
contrabateria, um lançador múltiplo de foguetes, caças F-15K sul-coreanos e
caças A-10 dos EUA.
Esses exercícios ocorrem depois que o ataque do
Hamas a Israel em 7 de outubro aumentou o nervosismo entre os militares na
Coreia do Sul.
Assim, os especialistas consideram que a artilharia
de longo alcance da Coreia do Norte, localizada perto da fronteira e capaz de
disparar cerca de 16.000 tiros por hora, representa uma ameaça significativa
para Seul.
Enfatiza-se que durante manobras, foram praticados
ataques destinados a "neutralizar as origens das provocações de artilharia
de longo alcance do inimigo em uma data precoce".
O treinamento atual faz parte do exercício Hoguk,
que começou em 16 de outubro e continuará até 22 de novembro.
Fonte: Sputnik Brasil
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