Câncer: cientistas encontram célula de defesa chave para imunoterapia
O sistema imunológico do ser humano é complexo e
conta com diferentes agentes destinados a nos proteger de doenças. Quando
tumores e infecções crônicas virais levam os linfócitos T à exaustão, células
de defesa “reservistas” entram em ação.
Um grupo de pesquisadores internacionais, incluindo
brasileiros, conseguiu dar um passo importante no entendimento dessas células.
Eles descobriram onde elas se agrupam para combater o tumor e suas
características. Essas células apresentam fenótipo, perfil transcricional (de expressão
gênica) e funções semelhantes no combate a tumores e vírus.
A descoberta, publicada na revista PNAS nessa
segunda-feira (2/10), abre caminhos para aperfeiçoar a imunoterapia, técnica
que utiliza as células de defesa do próprio paciente para combater o câncer.
“O nosso
estudo mostrou que, em um ambiente tumoral, onde maioria das células T está
exausta, é interessante a presença de uma população de células que pode ser
reativada para combater o tumor de forma mais eficaz”, afirma o pesquisador do
Hospital Israelita Albert Einstein Helder Nakaya à Agência Fapesp.
Nakaya é professor da Faculdade de Ciências
Farmacêuticas da Universidade de São Paulo (FCF-USP) e integrante do Centro de
Pesquisa em Doenças Inflamatórias (CRID) da Fapesp.
Testes com roedores e com células humanas mostraram
que os linfócitos “reservistas” (PD-1+ TCF1+ stem-like CD8 T) estão localizados
nas estruturas linfoides terciárias (TLS, na sigla em inglês). O TLS é uma
espécie de nódulo que se aloja ao redor dos tumores. A sua presença indica uma
boa resposta à imunoterapia.
Segundo Nakaya, as células CD8 T são consideradas
soldados da linha de frente do sistema imunológico humano. Uma das estratégias
do tumor para levar essas células à exaustão é o envio de uma sinalização pelo
receptor PD-1.
De acordo com o pesquisador, essas células
apresentam duas características conhecidas que interessam muito aos cientistas
por serem importantes para o tratamento com imunoterapia. “Primeiro, elas
exibem características de células-tronco, o que significa a capacidade de se
autorrenovar. O segundo aspecto é que são essas células que vão se proliferar
mais após a imunoterapia”, considera o cientista.
Em um ambiente tumoral onde a maioria das células T
está exausta, é interessante a presença de uma população de células que pode
ser “reativada” para combater o tumor de forma mais eficaz. “Portanto, é como
se as células PD-1+ TCF1+ stem-like CD8 T fossem soldados ‘reservistas’,
prontos para serem treinados para entrar na linha de frente no combate ao tumor.
Isso abre portas para terapias que visam especificamente reativar essas células
CD8 T exaustas, potencializando assim a resposta imunológica contra o câncer”,
afirma.
Câncer:
insumos para terapia CAR-T passarão a ser feitos no Brasil
O Brasil está mais perto de produzir os insumos
necessários para a realização de terapias CAR-T, técnica que treina as células
de defesa do próprio paciente para combater o câncer.
Na última quarta-feira (27/9), a Anvisa aprovou uma
nova rodada de pesquisas com a CAR-T no Brasil. Os ensaios clínicos serão
feitos com 81 voluntários nos próximos meses.
Além disso, a medida autorizou que parte dos
insumos necessários para a realização da nova terapia sejam desenvolvidos no
país.
A autorização permite ao Hemocentro de Ribeirão
Preto, à USP e ao Instituto Butantan — que atuam em conjunto na pesquisa de
CAR-T no Brasil — a criarem os insumos necessários para a realização dos
procedimentos. Atualmente, a terapia depende que as células dos pacientes sejam
levadas ao exterior para que as infusões sejam preparadas.
O Núcleo de Terapia Avançada (Nutera), localizado
em Ribeirão Preto, atuará como fornecedor de insumos para as terapias celulares
avançadas, como as células CAR-T.
“A fábrica é uma plataforma que permite manipular
células geneticamente modificadas, como é o caso das células CAR-T. A fábrica
foi construída em uma área pública, em um hospital que atende quase
inteiramente pacientes do SUS. Começamos com o CAR-T19, mas há muitas pesquisas
em curso e um futuro promissor pela frente”, afirma Dimas Covas, diretor do
Hemocentro de Ribeirão Preto e coordenador da pesquisa, à Agência Fapesp.
Atualmente, a fábrica tem capacidade de produzir os
insumos necessários para atender 13 pacientes a cada 34 dias. “Ainda não dá
conta de toda a demanda do SUS. Mas a nossa expectativa é que, em um ano, seja
possível fazer 150 casos e ir escalonando esse número com o tempo”, afirma
Diego Clé, diretor médico do Hemocentro de Ribeirão Preto e um dos
pesquisadores envolvidos.
O que é a CAR-T?
A terapia CAR-T modifica as células de desfesa do
paciente em laboratório, de maneira a treiná-las para que combatam o câncer de
forma personalizada. Nos testes realizados no Brasil, um paciente com câncer em
fase terminal alcançou a remissão em apenas um mês.
Hoje as células dos pacientes precisam ser enviadas
aos Estados Unidos ou à Europa para que essas modificações sejam feitas, o que
encarece muito o custo do tratamento. Com a produção no Brasil, os custos vão
cair e o acesso, aumentar.
<><> Anvisa aprova nova pesquisa do
CAR-T e prevê inclusão no SUS
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa)
autorizou uma nova rodada de pesquisas sobre os tratamentos CAR-T no Brasil.
Esse tipo de terapia usa células do próprio paciente para combater o câncer.
A técnica CAR-T ficou famosa em maio deste ano ao
levar o paciente Paulo Peregrino, que tinha um câncer em estágio terminal, à
remissão em apenas um mês.
• Como
será a nova pesquisa?
A nova autorização da Anvisa permite que a Fundação
Hemocentro de Ribeirão Preto (FUNDHERP), em parceria com o Instituto Butantan,
façam um ensaio clínico mais amplo da terapia celular. O grupo é o mesmo que
cuidou do paciente Paulo Peregrino.
Os estudos estão em fase clínica inicial (fase
1/2). O objetivo é avaliar a segurança e a eficácia no tratamento de pacientes
com leucemia linfoide aguda B e linfoma não Hodgkin B. Os voluntários da
pesquisa são pacientes que já passaram pelos tratamentos disponíveis, inclusive
transplante de medula, e não obtiveram resposta satisfatória.
• Plano
é disponibilizar tratamento o antes possível
A Anvisa também criou um plano de acompanhamento
dos resultados deste estudo com o CAR-T para colher informações diretamente.
Com isso, se os resultados encontrados até dezembro de 2024 forem bons, o
objetivo é autorizar a técnica para que as pessoas tenham acesso a uma opção de
tratamento segura, eficaz e de alta qualidade disponível no SUS.
“A ciência global está avançando rapidamente para
melhorar a qualidade de vida das pessoas em todo o mundo. A experiência recente
no Brasil e no mundo tem mostrado que quando os pesquisadores e a Anvisa
trabalham juntos desde o começo, isso pode resultar em dados científicos
melhores em termos de segurança, eficácia e qualidade. Isso, por sua vez, pode
acelerar o acesso a novas tecnologias para as pessoas”, afirmou a Anvisa em
comunicado à imprensa.
Rafaela Felicciano/MetrópolesFuturo do tratamento
CAR-T
Por hora, apenas pesquisas com CAR-T para cânceres
no sangue estão autorizadas no Brasil. No resto do mundo, estão sendo
conduzidos estudos para aplicar a técnica em outros tipos de tumor.
“Em um
futuro muito breve este tipo de tratamento vai estar disponível para outros
tipos de câncer. Já há estudos semelhantes para câncer de mama, de estômago e
de intestino. Não tenho dúvidas de que a terapia celular é a nova fronteira do
tratamento do câncer: é específica, age rapidamente, com força, e sem causar os
efeitos colaterais dos tratamentos convencionais”, explica o hematologista
Dimas Covas.
Fonte: Metrópoles
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