sábado, 30 de setembro de 2023

A Amazônia se prepara para a guerra

O governo Lula lança nesta segunda-feira, 2, o Plano Amazônia: Segurança e Soberania, com o objetivo de ampliar as ações de repressão ao narcotráfico, garimpo ilegal e crimes ambientais, como o desmatamento e a poluição de rios, que dominam o cenário da região amazônica. A iniciativa, que prevê investimentos de R$ 2 bilhões em equipamentos e infraestrutura para melhorar o alcance das forças de segurança brasileiras, deverá transformar a área numa verdadeira praça de guerra contra o crime organizado.

O governo brasileiro pretende trabalhar, também, em parceria com países vizinhos, já que todos eles vivem problemas semelhantes com o aumento da criminalidade nos limites da floresta.

O trabalho será coordenado pelo ministro Flávio Dino (Justiça e Segurança Pública) e contará com recursos do BNDES. O Ministério da Defesa, por meio das Forças Armadas, também participará das ações.

Nos próximos meses, serão construídas 34 novas bases de segurança integrada, onde agentes das polícias Federal, Rodoviária Federal e dos estados envolvidos trabalharão juntos. Os espaços serão abertos em terra e nos rios que cortam a região. Dessas, seis serão fluviais.

As ações serão realizadas nos estados que compõem a Amazônia Legal:

• Acre,

• Amapá,

• Amazonas,

• Maranhão,

• Mato Grosso,

• Pará,

• Roraima,

• Rondônia,

• Tocantins.

Parte desses estados também possui extensas áreas de fronteira com países produtores de entorpecentes, como Colômbia, Venezuela e Bolívia. O objetivo é reduzir os índices de criminalidade, considerados proporcionalmente os maiores do País.

Para isso, o governo deve investir em ações diplomáticas com os governos amazônicos, para que o combate realizado no Brasil se estenda também ao outro lado das respectivas fronteiras.

Dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública mostram que a taxa de homicídios na região é de 30,9 por 100 mil habitantes, bem acima da registrada no restante do Brasil, com 22,3 por 100 mil.

Os números também mostram que um terço das cidades mais violentas do País está na Amazônia. Para o governo, o aumento do garimpo ilegal, do desmatamento e do narcotráfico são os principais fatores que influenciam o inchaço dos números.

As bases prometidas pelo governo devem receber helicópteros, carros e barcos blindados. A ideia é intensificar a fiscalização nessas áreas, mapeando a atuação de grupos criminosos.

Serão criados cinco órgãos, responsáveis pela coordenação dos trabalhos, Comitê Gestor, Comissão Técnica, Centro de Cooperação Policial Internacional da Amazônia e Comitês Estratégicos Estaduais.

O Ministério da Justiça e Segurança Pública afirma que o trabalho também tem como objetivo proteger o Meio Ambiente. Nesta semana, o secretário executivo da pasta, Ricardo Capelli, participou de um evento com integrantes do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), em que falou sobre o Plano Amazônia.

“Temos os desafios de fazer as políticas dos estados atuarem de forma articulada para enfrentar o crime que está cada vez mais organizado. Esse tipo de banditismo não reconhece fronteiras geopolíticas. A gente enfrenta o crime na Amazônia no lado brasileiro e ele espraia para o país vizinho”, disse.

Para garantir a efetividade das ações na região vizinha, o governo estuda ampliar a faixa de atuação das Forças Armadas em 100 quilômetros mais próxima das fronteiras. A ideia é sufocar as atividades ilegais na região, com o auxílio das forças de segurança dos países vizinhos.

A questão ambiental é uma das principais vitrines da política externa do governo Lula. O petista tenta de todas as formas encontrar um modo de agir para reduzir os índices de desmatamento na região, que subiram de forma vertiginosa na última década.

A eficácia dessa ação poderia ajudar o Brasil a receber mais investimentos externos não só na Amazônia, mas em outras partes do País. Dessa forma, o Plano Amazônia poderia contribuir para o sucesso da política petista, caso o trabalho demonstre resultados práticos.

Esses recursos são necessários para financiar a continuidade do plano do governo. Isso porque Lula pretende usar os recursos do Fundo Amazônia, que conta com recursos da Noruega e Alemanha, para captar doações ainda maiores para a preservação ambiental, de forma a fomentar as ações de fiscalização da floresta. Além da polícia, outros órgãos ligados à área ambiental, como o Ibama, devem participar do trabalho nos próximos anos.

>>>> COMO O DINHEIRO SERÁ INVESTIDO

Plano de combate a crimes nos estados da Amazônia Legal terá construção de bases e compra de lanchas e carros blindados

• 7 estados beneficiados

• Construção de 34 bases integradas para forças de segurança

• Compra de carros blindados

• Compra de lanchas blindadas

• Compra de helicópteros

• Compra de armamentos

• Auxílio das polícias locais

• Atuação conjunta da PF, PRF e Forças Armadas

<<<< Apoio dos estados

Para que o plano saia do papel e seja eficiente, será necessário que os estados da região se comprometam com o combate ao crime e com as ações propostas pelo governo federal.

Embora tenha a maioria de governadores favoráveis ao seu governo, Lula precisará lidar com alguns que lhe fazem oposição aberta e que apoiavam Jair Bolsonaro, além de trabalhar com os interesses de grupos que atuam em práticas ilegais, mas possuem forte influência sobre a política regional, como grileiros e desmatadores, por exemplo.

Na avaliação do ministro Flávio Dino, o trabalho na Amazônia é um desafio nacional. ”Combater o narcogarimpo e o narcotráfico é proteger o Brasil. É fazer com que o País combata o desmatamento. Para isso, estamos implementando, em Manaus, 34 novas bases na Amazônia brasileira e dois centros, um de cooperação policial internacional e o outro de operações ambientais”, disse Dino.

“São projetos importantes do Governo e que reforçam a política que está sendo implantada pelo governador Wilson Lima (AM) que, desde 2021, vem valorizando ainda mais as forças de segurança”, defendeu o vice-governador do Amazonas, Tadeu de Souza, em entrevista no dia do lançamento do programa aos governos estaduais, em julho deste ano.

Apesar do plano ambicioso, porém, Dino ainda precisa resolver a própria situação, já que é um dos cotados para assumir a vaga aberta no Supremo Tribunal Federal com a aposentadoria de Rosa Weber.

 

       Com seca extrema, rio Amazonas deve baixar históricos 8 metros em setembro

 

Enquanto o sul ainda sofre com intensas chuvas e alagamentos, o norte do país enfrenta seca cada vez mais severa. Até esta quarta-feira (27), o rio Amazonas já havia baixado 7,35 metros. Nos últimos 20 anos, a média de vazão foi de 4,38 metros. Em alguns tributários, como o lago e o rio Tefé, a água praticamente secou. Em outros pontos, o que resta está tão quente que peixes e mamíferos estão morrendo.

A medição do nível do rio Amazonas é realizada há décadas pelo Porto de Manaus, na região de confluência do Rio Negro com o Solimões. Ao longo dos últimos 15 dias, o rio tem baixado cerca de 30 cm diariamente. “A gente tem alguns dias até o final do mês. Com mais alguns dias a 30 cm por dia, a gente vai bater 8 metros de descida do rio no mesmo mês, o que é absurdamente alto”, diz o professor do Programa de Pós-graduação em Biologia de Água Doce e Pesca Interior do Instituto de Pesquisas da Amazônia (INPA), Jansen Zuanon.

Segundo ele, uma seca tão intensa desafia qualquer capacidade de planejamento, tanto do ponto de vista das pessoas, quanto da flora e fauna, que não têm tempo para se adaptar.

“O rio descer tanto e tão rápido coloca em xeque não só a biologia do sistema, mas também as pessoas, os sistemas sociais ao longo dos rios da amazônia”, diz ele.

•        Impactos múltiplos

Na região de Tefé, o lago de mesmo nome que serve de via de transporte e fonte de alimento para as populações ribeirinhas e extrativistas está praticamente seco.

“Tenho 30 anos e nunca tinha visto uma seca nesta proporção. A gente estava acostumado, no final de setembro, início de outubro, as águas do rio subirem, mas vemos hoje um verão mais intenso, uma seca mais intensa, e isso tem mudado toda a dinâmica das comunidades”, diz o extrativista Huéferson Falcão do Santos, morador de uma comunidade tradicional da Floresta Nacional de Tefé.

Segundo ele, além da falta de acesso ao centro urbano e comunidades maiores, onde os serviços de saúde, educação e supermercados estão situados, a seca também tem afetado os modos de vida das comunidades, que têm na pesca uma das principais fontes de alimentação.

“Uma viagem que durava 3 horas, agora dura o dia inteiro, isso arrastando a canoa na lama, tendo em vista que o lago secou. Estamos navegando praticamente em lama. A seca atinge a comunidade diretamente, porque estamos sem ter onde pescar. A pouca água que tem, está barrenta, lamacenta, quente e com falta de oxigênio”, explicou o extrativista. Na região, já foram registradas a morte de um peixe-boi, alguns botos e centenas de peixes.

Muitos quilômetros abaixo do rio Tefé, já no município de Manacapuru, o aumento da temperatura da água também já matou ao menos dois botos e centenas de peixes, como mostra um vídeo compartilhado na plataforma X (ex-twitter), nesta quarta-feira (27).

•        Pedido de socorro

Na região amazônica, um conjunto de fatores faz com que os rios naturalmente subam e desçam a cada ano em um determinado ritmo. Em anos de El Niño – fenômeno que chegou no país a partir do início do segundo semestre e deve se estender ao longo de todo próximo ano – os períodos de seca tendem a ser mais severos.

Mas somente o El Niño não explica a situação atual no norte do país, diz o professor do INPA Jansen Zuanon. Segundo ele, o aquecimento das águas dos oceanos Atlântico e Pacífico também tem contribuído. Elas são diretamente responsáveis por parte da precipitação sobre a Amazônia.

“O El Niño está ocorrendo simultaneamente ao aquecimento dos oceanos Pacífico e Atlântico tropical e isso está fazendo com que a seca seja especialmente forte. Olhando em retrospectiva, nos últimos 30 anos a gente teve 8 ou 9 dos maiores recordes de cheia e seca nos rios amazônicos, o que indica que essa tendência de eventos extremos tem se acentuado muito e muito rapidamente. O que a gente esperava de resultado de mudanças climáticas para 20, 30 anos já ocorrendo agora. É inegável que o padrão mudou”, explica.

Segundo dados do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), a estação de controle de Tefé registrou apenas 47,7 mm de chuva durante todo mês de setembro (até dia 27). A média histórica para o mês nesta região é de 115,7 mm de precipitação.

Diante deste quadro, na última semana, um grupo de cerca de 70 pesquisadores em meio ambiente, sociedade, recursos hídricos e mudanças climáticas enviou uma carta ao Legislativo do estado do Amazonas pedindo providências para prevenir e mitigar os iminentes impactos climáticos deste ano sobre as populações locais.

“Ressaltamos a real necessidade de afrontar o problema a partir de agora, através da mobilização de recursos financeiros, equipes técnicas e equipamentos para atender, especialmente, as populações rurais remotas da Amazônia (indígenas e não-indígenas), as quais estão sob maior risco de padecer de doenças, desnutrição e perdas em seus meios de vida”, diz a carta, endereçada à Comissão da Amazônia e dos Povos Originários e Tradicionais Câmara dos Deputados.

Para Huéferson Falcão do Santos, a adoção de tais medidas é urgente. “Estamos na maior bacia hidrográfica do mundo e passando por uma escassez de água. Nós dependemos do rio para navegar, para sobreviver, para manter as relações sociais, mas estamos com tudo parado. Nosso principal lago secou”, diz.

 

Fonte: IstoÉ/((o))eco

 

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