Mineração, extração vegetal e especulação imobiliária ameaçam Serra da
Chapadinha, na Bahia
Com grande importância ambiental e hídrica para a
população baiana, a Serra da Chapadinha, localizada no município de Itaetê
(BA), está correndo perigo. A região tem sido ameaçada principalmente pela
mineração, mas também pela extração vegetal e especulação imobiliária. Sem
regulação e controle, os danos causados por essas atividades podem ser
irreversíveis.
Por isso, movimentos sociais e ambientalistas
locais, bem como órgãos públicos, como prefeituras dos municípios localizados
na Bacia do Paraguaçu, a Assembleia Legislativa da Bahia (ALBA), o Instituto
Chico Mendes de Conservação do Meio Ambiente (ICMBio) e o próprio Ministério do
Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), têm cobrado do Governo da Bahia
urgência na criação da Unidade de Conservação (UC) da Serra da Chapadinha.
A criação de UCs é de responsabilidade da
Secretaria de Estado do Meio Ambiente (SEMA). Após toda essa mobilização,
organizações e órgãos municipais aguardam a manifestação da SEMA. De acordo com
o deputado estadual Hilton Coelho (PSOL), que tem acompanhado as mobilizações
populares, a secretaria afirma que está em conversa com o governador do estado,
Jerônimo Rodrigues (PT), mas que esse não é um processo rápido.
“Mas, [a
SEMA] não informou sobre abertura do procedimento administrativo em que esses
atos estariam inseridos. É uma escolha política do governo do estado da
abertura do procedimento e o governador promulgar o decreto”, provocou o
parlamentar. Ele reforçou, ainda, a importância de a sociedade se envolver cada
vez mais nessa luta. “A preservação da Serra da Chapadinha precisa ganhar a
Bahia, o Brasil e também a sintonia e solidariedade internacional”, acredita.
A assessoria de comunicação da SEMA, bem como o
gabinete do governador foram contatados por e-mail pelo Brasil de Fato Bahia,
porém, não se manifestaram até o fechamento da matéria.
Apesar de pouco conhecida pelos turistas, a Serra
da Chapadinha é uma área natural de grande relevância. É um dos últimos
Corredores Verdes do estado, localizado entre o Parque Natural do Espalhado, no
município de Ibicoara; o Parque Natural Municipal Rota das Cachoeiras, em
Andaraí; e o próprio Parque Nacional da Chapada Diamantina, que abrange nove
municípios do território.
Ambientalistas do Movimento Salve a Serra da Chapadinha
destacam que por ser uma área de floresta bem preservada, a região também tem
um grande número de primatas. São espécies que estão apenas um nível antes da
extinção total na natureza e, por isso, a região já estava cadastrada no Plano
de Ação Nacional de Preservação dos Primatas no Nordeste, com indicação de
criação de Unidade de Conservação de Proteção Integral.
A Serra da Chapadinha também é uma das áreas mais
importantes de recarga hídrica do estado da Bahia. Abriga os chamados brejos de
altitude, importantes ecossistemas para a recarga dos aquíferos do Alto do
Paraguaçu. Rafael Augusto Nunes, da direção estadual do Movimento pela
Soberania Nacional popular na Mineração (MAM), explica que “é crucial que a
Serra da Chapadinha seja preservada, por estar dentro da sub-bacia do Rio Una,
que é um dos principais afluentes do Rio Paraguaçu, que abastece Salvador e
toda a Região Metropolitana”. Cerca de 80 municípios baianos, incluindo
Salvador, são abastecidos pela Bacia do Paraguaçu, o que representa aproximadamente
1,7 milhão de pessoas.
• Insegurança
hídrica
A importância hídrica da região foi o destaque em
despacho do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) envido à
Secretaria do Meio Ambiente (SEMA) no início deste mês, recomendando a criação
da Unidade de Preservação Ambiental. No documento, destaca-se que a Bacia do
Rio Paraguaçu é apontada como prioritária pelo Programa Nacional de
Revitalização de Bacias Hidrográficas.
Assinado pelo coordenador geral e pela diretora do
Departamento de Revitalização de Bacias Hidrográficas e Acesso à Água e Uso
Múltiplo dos Recursos Hídricos, Alexandre Resende Tofeti e Iara Bueno
Giacomini, respectivamente, o despacho recomenda: “é salutar a criação da UC
sob a ótica da gestão de recursos hídricos”.
O documento é desdobramento da Nota Informativa 470
encaminhada pelo Departamento de Áreas Protegidas da Secretaria Nacional de
Biodiversidade, Florestas e Direitos Animais ao gabinete da ministra do Meio
Ambiente, Marina Silva. A nota é fruto de um trabalho minucioso de análise, com
foco na biodiversidade da região e no potencial hídrico da Serra da Chapadinha.
Rinaldo de Castilho Rossi, secretário de Meio
Ambiente de Ibicoara, explica que a Serra da Chapadinha é como se fosse uma
grande caixa d’água que auxilia o abastecimento de vários rios importantes da
região, como o Jiboia, o Espalhado e o Una. “Estes rios que são abastecidos
pelas águas que vêm da Serra da Chapadinha se juntam e chegam até o Rio
Paraguaçu, que é um dos rios mais importantes do estado e que abastece uma
grande população. Então, a Serra da Chapadinha é fundamental para a segurança
hídrica do estado da Bahia”, diz. O secretário explica que a área está ameaçada
porque não faz parte do Parque Nacional da Chapada Diamantina, portanto não
possui uma legislação própria que garanta sua preservação.
Ibicoara foi uma das prefeituras que enviou à SEMA
moção de apoio à criação da UC. Além de Ibicoara, fizeram coro às mobilizações
de apoio as prefeituras de Palmeiras, Itaberaba, Barra Grande e Santo Estevão,
todos municípios inseridos na Bacia do Paraguaçu. Também enviaram à Secretaria
moções favoráveis à criação da UC, o ICMBio, através da Coordenação do Centro
Nacional de Pesquisa e Conservação de Primatas Brasileiros (CPB) e a Assembleia
Legislativa da Bahia (ALBA) que, em parecer aprovado por unanimidade, destacou
que, uma vez implementada, a UC formará um importante corredor ecológico de
áreas protegidas.
Se aprovada, a UC da Serra da Chapadinha vai formar
um corredor que une o Parque Nacional da Chapada Diamantina e os Parques
Naturais Municipais do Espalhado (Ibicoara) e das Cachoeiras (Andaraí).
Somadas, representam cerca de 162 mil hectares de proteção integral que, com a
criação da UC proposta, chegariam a 180 mil.
A área específica da UC Serra da Chapadinha
contemplaria um território de cerca de 19 mil hectares distribuídos em três
municípios, sendo a maior parte em Itaetê e duas porções menores em Mucugê e
Ibicoara.
O deputado estadual Hilton Coelho (PSOL), que
também tem feito parte dessa mobilização, encaminhou uma indicação ao
governador Jerônimo Rodrigues (PT) e enfatiza ainda que a área em questão está
situada na Mata Atlântica. “Uma vez criada a UC, ela vai contribuir para o
alcance de 30% da preservação desse bioma. Segundo dados do Cadastro Nacional
de Unidade de Conservação, hoje o bioma tem apenas 10,28% da área protegida”,
destaca Coelho.
• Mineração
Uma das principais ameaças à Serra da Chapadinha
são os projetos minerários. Apesar de ainda não haver exploração mineral na
área, já existe autorização para pesquisa de mineração. De acordo com o
deputado Hilton Coelho, há um grande número de pedidos de exploração para
minério de ferro, quartzo e diamante.
“Muitas dessas pesquisas já estão em andamento e
apenas uma delas abrange 149 hectares localizados na borda da Serra, próximo à
Cachoeira da Encantada. Essa área é uma nascente que abastece o Assentamento de
Paixão, onde vivem 120 famílias”, contou o parlamentar.
Segundo ele, apesar de o Ministério do Meio
Ambiente ter se pronunciado favorável à preservação da área, não respondeu
sobre a possibilidade de cancelamento da autorização de pesquisa emitida pela
Agência Nacional de Mineração (ANM). Para Coelho, é urgente a preservação da
área. “Esse tipo de atividade de exploração mineral gera um impacto
irreversível. Já na autorização para o estudo, máquinas desmatam diariamente a
própria serra. Estamos correndo contra as máquinas, essa que é a realidade”,
afirma.
Rafael Nunes, do MAM, reforça que, caso o projeto
minerário seja implementado no território, pode afetar diretamente a bacia do
Paraguaçu justamente em um dos seus pontos mais bem conservados, que é a bacia
do seu afluente, o rio Una. Segundo Nunes, os impactos econômicos, estruturais
e ambientais no território são irreversíveis. “Os danos causados pelo modelo
minerário brasileiro são irreparáveis, seja pelos fatores de contaminação do
solo, ar e águas, seja pela grande concentração fundiária existente, ou seja, o
controle dos territórios exercidos pelas empresas”, diz Nunes.
O MAM avalia que a Chapada Diamantina, como um
todo, deveria ser considerada um Território Livre de Mineração, ou seja, um
território onde se potencializariam outras atividades econômicas e
socioculturais, como o Turismo de Base Comunitária e a agricultura familiar de base
agroecológica.
Vale lembrar que, de acordo com dados da Companhia
Baiana de Pesquisa Mineral (CBPM), a Bahia é hoje o terceiro mais minerado do
país, ficando atrás do Pará e de Minas Gerais. “De fato, a mineração ela é
fundamental para o desenvolvimento das forças produtivas e nossa sociedade é
amplamente dependente dos recursos minerários, mas o modo que é aplicado, é que
é a grande questão, o modelo mineral brasileiro, não garante soberania para o
país. Ainda continuamos dentro da lógica colonial de exploração”, reitera
Rafael Nunes.
O secretário de Meio Ambiente de Ibicoara, Rinaldo
Rossi, sinaliza que além das ameaças da mineração, os riscos da extração
vegetal e da especulação imobiliária são grandes. “Existem hoje áreas no
entorno da Serra da Chapadinha que estão sendo cada vez mais exploradas. Além
da exploração das madeiras, há também a criação de estradas e outros
equipamentos de infraestrutura que servem como base para essa exploração. Toda
essa atividade econômica vem sendo realizada sem licenciamento ambiental”,
alerta Rossi.
E acrescenta: “a especulação imobiliária ou mesmo a
expansão de loteamentos e outros empreendimentos voltados a recepção de
turistas e visitantes vem gerando risco a esse ecossistema. Esses
empreendimentos são responsáveis pelo parcelamento do solo e têm causado
supressão de vegetação e contaminação das águas”.
• Unidade
de Conservação
A Unidade de Conservação é uma categoria criada
pela Lei Federal 9.985 de 2000 e que garante uma série de regramentos para a
gestão e uso de determinadas áreas verdes. Existem opções de unidades de
conservação de uso muito restrito e aquelas com uso sustentável.
Segundo o Movimento Salve a Serra da Chapadinha, a
solicitação é para que seja criada uma Unidade de Proteção integral, um refúgio
de vida silvestre, com posse e domínio público e privado para evitar custos com
indenizações. Com a criação desta UC estariam proibidas, por exemplo,
atividades de mineração tanto na área da serra como na zona de amortecimento.
Para Rinaldo Rossi, a criação da UC garante que a
preservação não dependa exclusivamente dos municípios do território, mas que
passe a ser responsabilidade do estado também. Ele explica que atualmente cada
município deve licenciar e aprovar as atividades econômicas na região da Serra
da Chapadinha.
“Sem corpo técnico ou mesmo sem conhecimento,
infraestrutura e logística para acompanhar essas atividades econômicas, os
municípios podem acabar tomando atitudes equivocadas no sentido de autorizar
determinadas atividades que podem gerar impactos irreversíveis. Muitas vezes
sob o discurso da criação de empregos ou do desenvolvimento econômico, os
gestores públicos podem acabar abraçando ideias que no médio e longo prazo
serão de grande transtorno para a população e para o meio ambiente da região”,
afirma Rossi.
Fonte: Brasil de Fato
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