domingo, 9 de julho de 2023

REFORMA TRIBUTÁRIA: Sistema de cashback devolverá imposto aos mais pobres

Dois benefícios foram criados na reforma tributária com o objetivo de promover a justiça fiscal diretamente com o cidadão. Um deles é o cashback, um mecanismo que possibilitará a devolução de parte do valor do imposto pago pelo consumidor de baixa renda em produtos essenciais.

Esse mecanismo substituirá as atuais desonerações tributárias, em que a redução de impostos beneficia a todos, independente da classe social. Com o cashback, no entender do relator da reforma na Câmara, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), promove-se a destinação direta de recursos a quem realmente precisa.

A outra medida, que não constava anteriormente do relatório, mas foi inserida durante o processo de negociação, foi a isenção dos produtos da cesta básica. O texto final estabelece a criação da Cesta Básica Nacional de Alimentos, cujos produtos terão alíquota zerada. A relação de todos os produtos que comporão a cesta será definida posteriormente, por meio de um projeto de lei complementar.

Atualmente, cada estado define a sua cesta básica e decide sobre a isenção do ICMS. "Nós estamos criando a cesta básica nacional de alimentos. Essa cesta básica tem alíquota zero. É o que estamos colocando no texto para que ninguém fique inventando alíquota e dizendo que a gente vai pesar a mão sobre o pobre. Não posso crer que tenha um parlamentar nesta Casa que vote contra os mais pobres", afirmou Ribeiro, ao explicar a inclusão deste dispositivo no relatório.

•        Transição em sete anos

O relatório prevê que a transição para o novo sistema ocorra em sete anos, começando em 2026, com uma "fase teste" tanto para o IVA nacional (CBS) e quanto para o subnacional (IBS).

Em 2027, PIS e Cofins serão extintos, e a alíquota do IPI será reduzida a zero, com exceção de produtos que também tenham industrialização na Zona Franca de Manaus (ZFM). A partir de 2029 e até 2032 haverá a redução escalonada do ICMS e do ISS. Ao mesmo tempo, O IBS será elevado gradualmente, até alcançar o mesmo valor dos impostos que serão extintos totalmente em 2033. Neste período também haverá a redução gradual dos incentivos fiscais promovidos pelos governos estaduais.

O texto ainda será apreciado pelo Senado, após o recesso parlamentar. Mas o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, acredita que não haverá muitas dificuldades para aprovação. "Já recebi telefonema de senadores elogiando o texto, dizendo que o relator da Câmara já atendeu a uma boa parte do pleito dos senadores e, portanto, estão otimistas em relação a tramitação no Senado," disse Haddad ao lembrar que o relator da proposta, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), contemplou, em seu parecer, a PEC 110/2019, que vinha sendo debatida no Senado.

 

       Efeitos da reforma tributária virão a longo prazo, segundo analistas

 

Celebrada como um acontecimento histórico para o país, a reforma tributária, cuja votação no plenário da Câmara dos Deputados teve início na quinta-feira e só terminou na madrugada desta sexta-feira (7/7), ainda é incógnita quanto a seus efeitos imediatos no bolso do cidadão. Importantes pontos do relatório apresentado pelo deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) só serão plenamente entendidos quando forem regulamentados por meio de lei complementar.

É o caso, por exemplo, da alíquota a ser cobrada nos tributos que estão sendo criados e do chamado cashback, que prevê a devolução parcial de imposto, de acordo com a renda do contribuinte.

A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 45/2019, aprovada na Câmara, não diminui o percentual que o consumidor paga em impostos cada vez que vai comprar um produto. Mas simplifica a maneira como é feita a cobrança das empresas e a distribuição dos recursos entre estados e municípios.

Segundo os defensores da reforma, que precisa passar por votação no Senado, os benefícios ao cidadão surgirão posteriormente, por dois caminhos. Primeiro, a partir do novo dinamismo que ela trará para a economia, podendo gerar mais emprego e renda para a população.

•        Tributação sobre renda e patrimônio ficou para depois

Depois, na segunda etapa da reforma, quando for discutida a taxação sobre renda e patrimônio. Nessa fase, estarão em pauta temas como como tributação de grandes fortunas, taxação de dividendos e correção da tabela de Imposto de Renda (IR). O relatório aprovado ontem prevê que a reforma do IR seja enviada ao Congresso Nacional em até 180 dias da promulgação do texto em discussão atualmente.

Neste primeiro momento, a reforma mexe apenas na tributação sobre o consumo, que envolve a relação entre empresa e governos, num emaranhado sistema de pagamento de impostos e contribuições federais, estaduais e municipais, com cobranças em diversas etapas da cadeia produtiva, além de 27 diferentes legislações a reger o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), imposto estadual.

O sistema é considerado obsoleto e inseguro do ponto de vista jurídico, o que obriga empresas a gastar fortunas com contadores para dar conta do pagamento de impostos e resgates posteriores.

Ao comentar ontem a vitória expressiva, com quase 400 votos dos deputados, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad disse que o atual sistema é um gargalo que impede o desenvolvimento econômico do país. "A reforma trará aumento da produtividade do trabalho e segurança jurídica para investimentos nacionais e estrangeiros", observou Haddad.

•        Simplificação facilita vida de empresas

A principal conquista da atual fase da reforma é a criação de um Imposto sobre Valor Agregado (IVA) dual. Houve resistência de vários governos estaduais que se sentiam prejudicados por não poderem mais legislar sobre o ICMS. Atualmente, cada governador decide a alíquota que vai incidir sobre os produtos fabricados em seu estado e pode criar incentivos para atrair investidores, provocando a chamada "guerra fiscal" entre estados.

Pela proposta, o ICMS, imposto estadual, e o ISS, municipal serão unificados no Imposto sobre Bens e Serviços (IBS). Já os tributos federais IPI, PIS e Cofins serão substituídos pela Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS). O relatório também prevê que o imposto será cobrado no destino, ou seja, no estado consumidor do bem ou serviço, e não na origem, onde é produzido.

Haverá uma alíquota padrão, a ser definida por lei complementar e outra diferenciada, que poderá ter redução de 60% para bens e serviços de alguns setores, como transporte público e escolas. A proposta traz ainda a figura do Imposto Seletivo, que incidirá sobre itens nocivos à saúde e ao meio ambiente.

Para administrar o IBS, decidindo sobre a divisão dos recursos recolhidos entre estados e municípios, será criado o Conselho Federativo, integrado por 27 representantes dos estados e o Distrito Federal, um para cada ente federado.

Os municípios também serão representados por 27 membros, sendo que 14 votarão como representantes do município, independentemente do seu tamanho, e outros 13 representando as cidades mais populosas.

•        Fundos vão compensar estados

Com o objetivo de reduzir as desigualdades regionais e sociais entre os entes da Federação, o substitutivo criou o Fundo Nacional de Desenvolvimento Regional (FNDR), que deve chegar a R$ 40 bilhões até 2033. Os aportes serão feitos pela União em valores que começam com R$ 8 bilhões em 2029.

Outro fundo, o Fundo de Compensação, garante que os estados honrem os benefícios fiscais de programas de incentivos feitos com o ICMS em anos passados, convalidados até 2032. Os aportes de recursos também serão feitos pela União e começam em R$ 8 bilhões em 2025, aumentam até R$ 32 bilhões em 2028 e, depois, se reduzem progressivamente, até R$ 8 bilhões em 2032.

 

       Reforma irá "revolucionar" sistema tributário, diz especialista

 

Aprovada em dois turnos entre a noite de quinta (6) e a madrugada desta sexta-feira (7), a reforma tributária é bem avaliada por especialistas. O relatório do deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), enviado ao Senado Federal, propõe a junção de cinco tributos em dois impostos sobre Valor Agregado (IVAs). Um deles será gerenciado pela União, outro terá a gestão compartilhada entre estados e municípios (IBS) — a ideia é o chamado "IVA dual".

Na avaliação de Pedro Abdo, advogado especialista em Direito Tributário do escritório Lucas Terto Advocacia, a reforma vai “revolucionar” o sistema tributário brasileiro.

“Na minha opinião é uma proposta que vai revolucionar o sistema tributário do nosso país porque hoje nosso sistema é complexo, ele é burocrático, ele é caro e ineficiente então isso atrapalha as nossas indústrias e as nossas empresas e o desenvolvimento do nosso país como um todo, é o sistema mais complexo do mundo. A proposta é boa e fruto de várias anos de estudo para promover uma melhora substancial na no nosso ordenamento jurídico no que tange ao direito tributário como um todo”, avaliou.

Abdo destaca ainda que a reforma pode ser um potencializador da economia brasileira e pode diminuir desigualdades e gerar crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) do país.

“São muitos estudos que indicam um crescimento exponencial do PIB em relação só só em decorrência da aprovação dessa reforma uma diminuição da desigualdade, né? O índice Gini, que mede a desigualdade, espera-se que haja um melhoramento na casa de 20% né? Sobretudo nas pessoas que ganham até um salário mínimo. Aumento consequentemente do número de empregos, redução da desigualdade regional entre os estados. Vai haver simplificação do nosso sistema. Hoje nosso sistema é caótico ninguém entende. Ninguém sabe quanto paga de imposto. Então essa questão vai ser mais transparente as empresas vão diminuir os custos para entender, né os custos com a operacionalização do nosso sistema tributário atual”, explicou.

O especialista ainda definiu que a reforma, além de trazer uma ideia de progressividade ao sistema tributário brasileiro, onde os que ganham mais dinheiro pagam impostos e os mais pobres pagam menos. Ele ainda desmentiu os argumentos de parlamentares contrários à aprovação do texto de Aguinaldo, que diziam que a PEC iria aumentar o preço dos alimentos.

“O nosso sistema vai ficando cada vez mais progressivo, onde os ricos pagam proporcionalmente mais impostos que os mais pobres e mais simples então isso acarreta no aumento da economia como um todo no aumento da nossa competitividade na exportação. Então são inúmeros benefícios, vários, e ainda tem muitos outros que eu poderia listar. Então, no geral, é uma reforma bastante positiva para o nosso país e que não vai acarretar um aumento da carga tributária para praticamente nenhuma área da economia”, disse

“Quanto as críticas ao suposto aumento dos itens da cesta básica, é uma crítica infundada, até mesmo antes da mudança proposta ontem, quando a ideia inicial era ser uma alíquota reduzida de 50%. Mesmo durante essa ideia, os itens não ficariam mais caros. Estudos mostram que na verdade o preço até diminuiria um pouquinho, cerca de 2%”, concluiu Pedro Abdo, que ainda afirmou que devido à inclusão de alíquota zero aos itens da cesta básica, haverá redução no preço desses alimentos.

 

       Mercado reage com otimismo à aprovação da reforma tributária

 

O mercado financeiro demonstrou mais otimismo, ontem, ao amanhecer com a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Reforma Tributária, a PEC 45/2019, aprovada em dois turnos pela Câmara dos Deputados, após mais de 30 anos de discussões em torno do tema no Congresso, com poucos avanços. Após fechar com queda de 1,78%, na véspera — em meio à indecisão se haveria ou não votação e à sinalização do Federal Reserve (Fed, o banco central dos Estados Unidos) de que vai retomar a alta de juros nas próximas reuniões —, a Bolsa de Valores de São Paulo (B3) encerrou o pregão de com alta de 1,25%, a 118.897 pontos. O dólar comercial, por sua vez, recuou 1,3% frente ao real e finalizou o dia cotado a R$ 4,866 para a venda.

De acordo com analistas, a reação positiva reflete que, apesar dos vários problemas na redação da PEC aprovada pelos deputados, principalmente os jabutis que deixam o texto muito complexo, o atual sistema tributário ainda é muito pior, com excesso de regras e de alíquotas, além de ser cumulativo na cadeia total. Eles destacam que o processo de transição é bastante lento e o impacto ainda é incerto, por conta da indefinição do valor da nova alíquota, mas elogiam o fato de que haverá uma simplificação para os contribuintes com a unificação dos regimes de 27 unidades da Federação.

"Acho que é um divisor de águas, se a reforma aprovada ficasse só na unificação do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) já teria valido a pena. Imagina ir de carro de São Paulo ao Rio e não ter que ficar calculando a quantidade de gasolina para não precisar encher o tanque no Rio porque lá o ICMS é muito maior do que em São Paulo?", exemplificou Luis Otávio de Souza Leal, economista-chefe da G5 Partner, empresa especializada em serviços financeiros. "Agora, postos da fronteira vão perder clientes, uma prova de que não é uma reforma que vai agradar a todos em um primeiro momento", acrescentou.

"A reforma tributária, comparada com o que a gente tem hoje, um sistema completamente caótico e irracional, melhora de forma significativa, diminui contenciosos fiscais e tributários, diminui dramaticamente a quantidade de alíquotas, vai acabar essa história de cada produto praticamente ter uma alíquota diferente, provocando uma briga infinita no Judiciário", avaliou Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados.

•        Muitas isenções

Os analistas demonstraram preocupação com o excesso de isenções tributárias e reduções de alíquota, que ainda não estão definidas e podem ser bem altas. Questionado sobre o assunto, o secretário extraordinário da Reforma Tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, não deu sinal do valor dessa alíquota. Informou apenas que ela ainda será fixada durante o período de transição, até 2027, para a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), e entre 2029 e 2033, para o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços). "Na verdade, o texto deixa a possibilidade de fazer ajustes finos nas alíquotas (para manter a carga tributária) até 2033", disse.

Na avaliação de Leal, da G5, a reforma ainda vai continuar confusa porque ela precisará ser regulamentada por lei complementar, mas ele não tem dúvida de que a alíquota, que ainda não está definida, deverá ficar acima de 25%, por conta do excesso de isenções tributárias incluídas durante a votação. "Como dizia Margaret Thatcher (ex-primeira-ministra britânica), se tem alguém recebendo sem trabalhar é porque alguém está trabalhando sem receber", citou o gestor.

Vale, da MB, também demonstrou preocupação com o excesso de exceções incluídas no texto, principalmente, às vésperas da votação na Câmara. "Os problemas foram aparecendo desde o relatório inicial. Tem exceções demais. Setores demais estão colocados ou em regimes específicos ou com corte significativo de alíquota, que já era alta em 50%, e, agora, um corte de 60% na alíquota. Essas exceções preocupam um pouco, porque não são setores pequenos, são setores que, no final, eventualmente, a gente pode acabar tendo uma alíquota final maior do que se imaginava antes para contemplar esses cortes colocados agora", alertou. Ele torce para que esses jabutis sejam retirados pelo Senado Federal, onde também será preciso a aprovação de três quintos de parlamentares da Casa, em dois turnos.

•        Mudanças no futuro

"O ideal, obviamente, seria que o texto fosse mais parecido com o da PEC 45. A gente não vai conseguir esse nível neste momento, mas é uma reforma inicial, um momento inicial que pode, no futuro, ter ajustes na emenda constitucional que demandem menos recursos políticos do que essa reforma, que é muito mais ampla e muito mais desgastante", afirmou Vale. "A partir dessa base inicial que a gente tem agora e, eventualmente, reformas adicionais que precisam ser feitas no futuro sejam mais fáceis de acontecer. Isso é bastante positivo de se pensar. Quer dizer, a gente está fazendo essa primeira grande reforma no futuro, eventualmente precisa, vai precisar de ajustes. Mas, pelo menos, a gente está passando por esse grande teste", acrescentou.

Tiago Sbardelotto, economista da XP Investimentos, lembrou que os cinco tributos unificados pela reforma respondem por mais de 40% da arrecadação do setor público e também demonstrou preocupação com as alterações, porque elas reduziram o potencial da reforma. Ele lembrou que a alíquota de referência (padrão), varia entre 15%, em países em desenvolvimento, a 25%, em países mais desenvolvidos. "Do lado negativo, ressaltamos que a ampliação do rol de exceções pode contribuir para uma alíquota mais elevada. Do lado positivo, a redução dos benefícios tributários e o incentivo à formalização da economia pela adoção da não cumulatividade plena podem ajudar a se chegar a uma alíquota menor", destacou. "Vale ressaltar que, na proposta final, introduziu-se um artigo para assegurar que a carga tributária não será elevada. No entanto, é preciso destacar que isso depende também da referência a ser adotada", disse ele.

Basicamente, a reforma vai unificar cinco tributos em um Imposto sobre Valor Agregado (IVA) dual. São três impostos federais — Programa de Integração Social (PIS), Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) —; um estadual — ICMS —; e um municipal — Imposto Sobre Serviços (ISS). Dessa forma, serão criados a CBS, federal, e o IBS, regional.

 

Fonte: Correio Braziliense

 

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