Brasil deve
rejeitar ameaças da Europa e buscar novos parceiros para o Mercosul, diz
analista
Presidente
Lula considera os termos da União Europeia para um acordo com Mercosul
inaceitáveis e acena com possibilidade de negociar com outros países. A Sputnik
Brasil conversou com especialistas para saber como o Brasil pode liderar
negociações com China, Coreia do Sul e Cingapura.
Nesta
terça-feira (4), os chefes de Estado de Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai
se reuniram em Puerto Iguazú para a Cúpula de Líderes do Mercosul. Durante a
cúpula, o presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva prometeu
"resposta rápida e contundente" às exigências impostas pela Europa
para selar o acordo Mercosul-União Europeia.
"Parceiros
estratégicos não negociam com base em desconfiança e ameaça de sanções",
afirmou Lula. "É imperativo que o Mercosul apresente uma resposta rápida e
contundente."
O
presidente brasileiro combina o seu tom crítico com declarações mais otimistas
em relação ao acordo. Um pouco antes do discurso na Cúpula de Líderes do
Mercosul, Lula declarou durante o programa "Conversa com o
presidente" que pretende assinar o acordo até o fim de seu mandato como
presidente do Mercosul, em dezembro de 2023.
De
acordo com a professora de Relações Internacionais da Universidade Federal de
São Paulo (Unifesp) Regiane Nitsch Bressan, o governo brasileiro mantém postura
cética em relação à ratificação do acordo em seus termos atuais.
"O
presidente Lula entende [...] que o texto atual é inaceitável, dado que estão
colocadas algumas possibilidades de sanções, caso o Brasil não consiga seguir o
pacto verde de defesa ambiental", disse Bressan à Sputnik Brasil.
De
fato, documento apresentado pelos europeus no início deste ano prevê o bloqueio
do comércio com os membros do bloco, caso exigências ambientais sejam
descumpridas. Segundo especialistas, as exigências da União Europeia excedem
aquelas previstas pelos acordos internacionais vigentes.
"O
Brasil sob Lula tem muita vontade de retomar o seu arcabouço institucional
ambiental, mas isso leva tempo", considerou Bressan. "É difícil
assegurar que o Brasil vá conseguir atender a todas essas demandas."
Além
disso, os termos do acordo com a Europa não atenderiam às diretrizes do governo
brasileiro rumo à reindustrialização do país.
"Lula
defendeu que o acordo deve ser equilibrado e assegurar espaço para a adoção de
políticas públicas em prol da integração produtiva e reindustrialização do
Brasil", disse Bressan. "Não devemos nos condenar a ser países
exportadores de commodities e matérias-primas, logo o acordo não pode ter um
peso que iniba a nossa indústria."
Os
países do Mercosul estão divididos quanto às possibilidades de selar este e
demais acordos de livre comércio com parceiros extrarregionais. Segundo
Bressan, a Argentina também demonstra insatisfação com o acordo.
"A
Argentina teceu críticas ao acordo da forma que foi fechado em 2019,
considerando-o muito desigual", considerou a professora de Relações
Internacionais da Unifesp. "Fica claro que o Mercosul foi a parte que mais
cedeu [durante as negociações], o que não podemos aceitar."
Por
outro lado, países como o Uruguai demandam uma postura mais propensa ao livre
comércio e criticou a lentidão dos processos negociadores. Montevidéu não
assinou a declaração final da cúpula, como forma de protesto pela
impossibilidade de fechar acordos em separado com grandes potências, como a
China.
"Com
relação à China, vocês sabem a posição do Uruguai. Quando vemos que não
avançamos juntos, entendemos a visão de cada um de vocês. A nossa é que façamos
juntos. Se não podemos fazer assim, vamos fazer bilateralmente", disse o
presidente do Uruguai, Luiz Alberto Lacalle Pou, durante a cúpula.
Para
Bressan, o Brasil não está fechado a acordos internacionais e deve promover
negociações já em curso com outros parceiros.
"O
Mercosul está pronto para conversar e, caso o acordo com a Europa não sair,
podemos negociar com a China, Cingapura e Coreia do Sul", declarou
Bressan. "O Brasil deve retomar a negociação de acordos que sejam
interessantes para o bloco."
Além
desses países, o Mercosul também possui negociações abertas com Vietnã, América
Central e Indonésia, informou o presidente Lula durante a cúpula.
O
presidente brasileiro tem grandes chances de implementar a sua agenda, já que,
durante o evento, a Argentina transferiu a presidência temporária do bloco ao
Brasil, que deve liderar as atividades do grupo durante seis meses.
"A
presidência é rotativa e segue a ordem alfabética, então o Brasil sempre herda
a presidência da Argentina", explicou Bressan. "Temos grande
entusiasmo em ver Lula à frente do Mercosul, já que ele é um entusiasta da
integração regional."
O
entusiasmo do governo brasileiro será necessário, já que no segundo semestre de
2023 o país acumulará a presidência temporária do Mercosul, do Conselho de
Segurança da ONU e do G20, grupo que reúne as principais economias mundiais.
Nesta
quarta-feira (5), o presidente brasileiro deve debater os termos do acordo
Mercosul-União Europeia com o primeiro-ministro espanhol, Pedro Sánchez. A
Espanha ocupa a presidência rotativa do Conselho da União Europeia (UE) até
dezembro de 2023.
Ø
Confiamos
em Lula para que Bolívia entre no Mercosul de uma vez por todas, diz Luis Arce
La
Paz aguarda com grandes expectativas seu ingresso no maior bloco econômico
sul-americano, com o presidente do país declarando que Lula será vento
favorável para adesão boliviana.
Ontem
(4), em uma cerimônia em Buenos Aires, o Brasil recebeu a presidência rotativa
do Mercosul por seis meses. Atualmente, o bloco mercosulino conta com Paraguai,
Uruguai, Argentina e, claro, Brasília.
No
entanto, outros países querem entrar para o organismo, como a Bolívia. Em
entrevista à Sputnik, o presidente boliviano, Luis Arce, disse que conta com os
esforços de Luiz Inácio Lula da Silva para que La Paz seja um novo membro do
Mercado Comum do Sul.
"O
camarada Lula prometeu tomar medidas para atingir esse objetivo [da adesão],
por isso, confiamos que ele pode impulsionar isso o mais rápido possível e que
a Bolívia de uma vez por todas seja parte oficial e formal do Mercosul",
disse o presidente na LXII Cúpula de Chefes de Estado realizada no Parque
Nacional Iguazú, na província argentina de Misiones.
Arce
também afirmou que o mercado boliviano é "grande e temos muitas opções de
comércio, principalmente com os países com os quais já comercializamos", o
que pode trazer "oportunidades de investimentos entre os
países-membros" do bloco.
O
mandatário ressalta que o "Brasil é um mercado importante, uma população
bastante grande junto com a Argentina", e que com a entrada da Bolívia no
Mercosul "podemos realmente nos fortalecer em termos de expansão de
mercados e usufruir de tarifas e benefícios que não usufruímos
atualmente".
O
governo brasileiro já havia sinalizado a intenção de promover o ingresso
boliviano no bloco. Em janeiro, também em conversa com a Sputnik, o diretor do
Mercosul no Itamaraty, Francisco Cannabrava, comentou que o governo Lula da
Silva está "muito interessado" em que La Paz se torne um membro da aliança
sul-americana.
O
mesmo foi dito pelo chanceler brasileiro, Mauro Vieira, quando o mesmo afirmou
que a "ampliação do Mercosul" é importante, acrescentando que a nova
administração vai apoiar o retorno da Venezuela ao bloco e a entrada da
Bolívia.
Ø
Sair
do Mercosul? Brasil assume presidência do bloco e Uruguai põe dilema de volta à
mesa
"Permanecer
no Mercosul não é mais possível", disse à Sputnik o analista Ignacio
Bartesaghi, depois que o Uruguai abandonou a possibilidade de mudar de status
no bloco. Por sua vez, a internacionalista Nastasia Barceló alertou que a
posição de Montevidéu "não é muito consistente" e prejudicaria as
relações com a Argentina e o Brasil.
No
marco de uma nova cúpula de chefes de Estado do Mercosul, realizada na
província argentina de Misiones, o presidente uruguaio, Luis Lacalle Pou,
questionou a "inatividade" dentro do bloco e como isso afeta
negativamente o interesse do Uruguai "por conseguir mercados".
O
presidente fez questão de flexibilizar o Mercado Comum do Sul (Mercosul, que
inclui Assunção, Montevidéu, Buenos Aires e Brasília) para permitir que seus
membros assinassem acordos bilaterais fora do bloco, pedido que, garantiu,
"não é caprichoso". O uruguaio, que reconheceu que seu pedido teve
"pouco eco", admitiu que é fundamental que os países negociem juntos,
mas garantiu que Montevidéu vai seguir esse caminho por conta própria.
Na
véspera, na cúpula de chanceleres, o chanceler uruguaio, Francisco Bustillo,
assegurou que seu país deve em algum momento questionar "a classe de
pertencimento ao bloco" que pretende ter. O diplomata sustentou que o
Uruguai poderia apostar em "modificar o próprio tratado fundamental"
ou considerar "a possibilidade de sair do Mercosul como Estado fundador e
se tornar um Estado associado".
A
posição do Uruguai não é nova. O governo de Luis Lacalle Pou tem insistido na
necessidade de flexibilizar o Mercosul para poder negociar acordos bilaterais
extrabloco, iniciativa que gerou forte resistência entre seus membros.
O
menor país do bloco havia dedicado seus esforços para finalizar unilateralmente
um acordo de livre comércio com a China. No entanto, finalmente o andamento dos
acordos vai depender da aprovação dos membros do Mercosul por iniciativa do
gigante asiático.
Em
diálogo com a Sputnik, o analista uruguaio e doutor em relações internacionais,
Ignacio Bartesaghi, considerou que o Uruguai está enviando um recado aos sócios
do Mercosul de que "não pode mais continuar sustentando a imobilidade do
bloco".
"Ficar
fechado no Mercosul não é mais possível e continuar em um Mercosul estagnado
afeta a estratégia de desenvolvimento econômico do Uruguai", disse o
especialista.
Bartesaghi
concordou com o chanceler uruguaio que o país fica sem opções em sua
reivindicação e que, se a flexibilidade não for alcançada ou os tratados forem
reformados, "resta discutir a mudança da adesão do Uruguai ao
Mercosul".
·
Mais
problemas do que vantagens?
Em
contraste, a internacionalista uruguaia Nastasia Barceló considerou em um
diálogo com a Sputnik que a ideia de que o Uruguai deixe de ser um Estado
fundador do Mercosul para se tornar um país associado é extremamente complexa e
pode até prejudicar as relações bilaterais com Argentina e Brasil.
Barceló
explicou que, para modificar sua situação no bloco, o Uruguai deveria primeiro
denunciar o Tratado de Assunção de 1991, que constituiu o bloco, e depois, que
essa saída fosse tratada pelo Mercosul.
Outro
problema viria em seguida, já que caso o Uruguai queira se tornar um país
associado, deve solicitá-lo formalmente aos demais membros para que seja
aprovado nos parlamentos de cada país em um novo cenário em que as relações com
Argentina e Brasil "estariam bastante desgastadas".
Barceló
também considerou que, embora a demanda por maior flexibilidade por parte do
Uruguai seja anterior ao governo de Luis Lacalle Pou, o país tem ficado
"isolado" no pedido, principalmente após a saída de Jair Bolsonaro da
presidência do Brasil.
A
especialista lembrou que o gigante sul-americano deu algum apoio ao pedido
uruguaio em 2021, mas não voltou a apoiar Montevidéu nas cúpulas seguintes.
A
internacionalista também questionou a ideia de que uma saída do Mercosul
melhoraria a inserção internacional do Uruguai, quando Brasil e Argentina estão
historicamente entre os principais parceiros comerciais do país. De fato, em
setembro de 2022, o Brasil desbancou a China como principal destino das
exportações uruguaias pela primeira vez em nove anos.
"Todas
as exportações uruguaias de maior valor agregado vão para os países do Mercosul
e têm tratamento preferencial. Além da insistência, acredito que as bases da
reclamação não sejam muito consistentes", opinou Barceló.
Na
mesma linha, a especialista lembrou que o Uruguai não conseguiu avançar nas
negociações para um acordo de livre comércio com a China, principal argumento
uruguaio para exigir flexibilidade. É que o gigante asiático comunicou a
Montevidéu sua preferência por um acordo com todo o bloco e não apenas com um
país.
Barceló
também destacou que o Mercosul chegou a acordos comerciais com o Chile e o México,
enquanto avança nas negociações com a Índia e os Emirados Árabes Unidos, por
isso "existe uma agenda de relações externas que o Uruguai não teria
individualmente".
Ø
Uruguai
e Paraguai pedem 'posição clara' do Mercosul sobre Venezuela e deixam Lula em saia
justa
Em
cerimônia na Argentina nesta terça-feira (4), o Mercosul recebeu o Brasil na
presidência do bloco por seis meses. Lula já havia sido contestado na Cúpula do
Sul em Brasília por sua recepção a Nicolás Maduro, tanto pelo Uruguai e
Paraguai quanto pelo Chile.
No
evento, além dos países-membros Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai, também
estavam presentes os chamados Estados associados ao bloco, entre os quais
Colômbia, Bolívia e Chile. A Venezuela também compõe o Mercosul, mas o país
está suspenso do bloco desde 2017, e o governo brasileiro tem defendido que o
país volte a integrar o grupo.
Porém
hoje (4), as nações que fazem parte do bloco como o Uruguai e o Paraguai
cobraram uma posição clara do bloco em relação a Caracas.
"Todos
aqui sabemos o que pensamos sobre o regime venezuelano, todos temos opinião
clara. É preciso sermos objetivos. Está claro que a Venezuela não vai virar uma
democracia saudável, e quando há um indício de possibilidade de uma eleição,
uma candidata como María Corina Machado, que tem um enorme potencial, é
desqualificada por motivos políticos, não jurídicos. [...] Alguém pode dizer: o
que isso tem a ver com o Mercosul? Tem a ver porque os distintos blocos e
associações do mundo alçaram sua voz a favor da democracia. [...]", disse
o presidente uruguaio Luis Lacalle Pou na cerimônia segundo a Folha de São
Paulo.
Antes
de Lacalle Pou, o paraguaio Abdo Benítez – que está de saída da presidência e
colocou seu sucessor, Santiago Peña, ao seu lado na reunião – discursou na
mesma linha.
"Com
muita preocupação estamos vendo os últimos eventos na Venezuela. Sempre busquei
dar voz ao sofrido povo venezuelano e desta vez não será uma exceção. A
coerência não pode ser deixada de lado no último minuto. Quando surge um
caminho de saída, uma esperança, com a realização de eleições com a oposição,
vimos rapidamente apagada essa ilusão com a inabilitação de María Corina
Machado", afirmou.
Não
é a primeira vez neste ano que o Uruguai se manifesta sobre Caracas de forma
negativa. Na Cúpula do Sul, evento promovido pelo governo federal e o Itamaraty
em Brasília no final de maio, Luis Lacalle Pou rejeitou a menção à Venezuela no
rascunho do encontro de líderes sul-americanos.
O
presidente uruguaio se disse "surpreso" com a declaração que estava
sendo negociada no momento quando foi citado que o ambiente político no país
"é uma narrativa", conforme noticiado.
Já
Lula rebateu criticando a tentativa de "isolamento" do país de
Nicolás Maduro por parte do restante da América do Sul. Ele também pontuou não
conhecer os pormenores da inabilitação de María Corina Machado, segundo o
jornal O Globo.
"No
que a gente puder contribuir, quem tiver relação, dar palpite e puder
conversar, temos de conversar. O que não pode é a gente isolar e levar em conta
que apenas os defeitos estão de um lado, os defeitos são múltiplos. Então
precisamos conversar com todo mundo [...] sobre a Venezuela, não conheço
pormenores dos problemas da candidata, mas vou conhecer", afirmou Lula.
O
presidente também citou o caso da Nicarágua, país presidido por Daniel Ortega:
"Assumi o compromisso com o papa Francisco de conversar com o presidente
da Nicarágua e quem puder conversar, vamos conversar", emendou.
Ao
mesmo tempo, Lula falou sobre o acordo com a União Europeia e também citou
países com discussões já em andamento sobre acordos comerciais, além de novas
frentes de negociação.
"Partindo
dessas premissas, vamos revisar e avançar nos acordos em negociação com Canadá,
Coreia do Sul e Cingapura. Vamos explorar novas frentes de negociação com
parceiros como a China, a Indonésia, o Vietnã e com países da América Central e
Caribe", afirmou.
Fonte:
Sputnik Brasil
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