O que se sabe sobre
operação da PF que fez buscas na casa de Bolsonaro
A
Polícia Federal (PF) realizou buscas nesta quarta-feira (3/5) na casa de Jair
Bolsonaro e prendeu o tenente-coronel Mauro Cid Barbosa, ex-ajudante de ordens
do ex-presidente.
A
Operação Venire foi autorizada pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo
Tribunal Federal, no âmbito do inquérito que investiga as “milícias digitais”.
A
PF apura a inserção de dados falsos sobre vacinação contra a covid-19 no
sistema do Ministério da Saúde, para emissão de certificados que viabilizariam
uma viagem de Bolsonaro aos Estados Unidos.
Foram
cumpridos 16 mandados de busca e apreensão em Brasília e no Rio de Janeiro,
além de seis mandados de prisão. O celular de Bolsonaro teria sido apreendido,
mas não haveria ordem de prisão contra ele.
Inicialmente,
foi divulgado na imprensa que o celular da ex-primeira dama Michelle Bolsonaro
também teria sido apreendido, mas ela negou isso em sua conta no Instagram.
"Hoje
a PF fez uma busca e apreensão na nossa casa, não sabemos o motivo e nem o
nosso advogado não teve acesso aos autos. Apenas o celular do meu marido foi
apreendido. Ficamos sabendo, pela imprensa, que o motivo seria 'falsificação de
cartão de vacina' do meu marido e de nossa filha Laura. Na minha casa, apenas
EU fui vacinada", escreveu Michelle na rede social.
Procurada
pela BBC News Brasil, a PF se manifestou afirmando que "não
comenta/divulga nomes de eventuais investigados, nem se manifesta sobre
investigações em andamento".
Havia
a expectativa de que Bolsonaro prestaria depoimento ainda na quarta-feira (3/5)
sobre o caso.
Porém,
o advogado Paulo Cunha Bueno disse ao jornal Folha de S. Paulo em nome do ex-presidente
que Bolsonaro não irá até a PF nesta data e que um novo dia será marcado, mas
só após sua defesa ter acesso aos autos do processo.
"Bolsonaro
vai exercer, por enquanto, o direito de ficar calado", disse o advogado ao
jornal.
O
ex-presidente falou brevemente com jornalistas ao sair de sua casa em Brasília
e, ao ser perguntado sobre as suspeitas de adulteração nos cartões de vacina,
disse que "não tem nada disso".
"Havia
gente que me pressionava para tomar a vacina e eu não tomei. Não tomei porque
li a bula da Pfizer. Não tem nada disso. Se eu tivesse que entrar (nos EUA) e
apresentar o cartão vocês estariam sabendo", disse.
Ele
ainda confirmou que seu celular foi levado pelos policiais. "O meu foi
apreendido. O meu telefone não tem senha, não tenho nada a esconder."
Fábio
Wajngarten, ex-secretário de comunicação do governo Bolsonaro, foi questionado
por jornalistas se Bolsonaro teria entrado nos Estados Unidos no final do ano
passado apresentando um cartão de vacinação.
"Vou
apurar isso agora, estou indo encontrar com ele [Bolsonaro], acho que ele
entrou com um passaporte como sendo presidente da República, eu não tenho essa
informação, não conheço esse rito", disse Wajngarten.
Entre
as seis pessoas que foram presas na operação estão o secretário municipal de
Governo de Duque de Caxias (RJ), João Carlos de Sousa Brecha, o policial
militar Max Guilherme Machado de Moura, e o militar do Exército Sérgio Rocha
Cordeiro, estes dois ex-assessores e atuais seguranças de Bolsonaro.
Segundo
a TV Globo, teriam sido forjados os certificados de vacinação de Bolsonaro, da
filha dele de 12 anos, do ex-ajudante de ordens Mauro Cid Barbosa, da mulher e
da filha dele.
A
adulteração dos dados sobre vacinação ocorreu, de acordo com a PF, entre
novembro de 2021 e dezembro de 2022. O objetivo seria burlar restrições
sanitárias impostas pelos governos do Brasil e dos Estados Unidos.
Os
dados teriam sido inseridos no Sistema de Informações do Programa Nacional de
Imunizações (SI-PNI) e na Rede Nacional de Dados em Saúde (RNDS) do Ministério
da Saúde. A PF não divulgou quem, segundo as investigações, teria feito essa
inserção.
De
acordo com os investigadores, a finalidade do grupo seria “manter coeso o
elemento identitário em relação a suas pautas ideológicas” e “sustentar o
discurso voltado aos ataques à vacinação contra a covid-19”.
"As
inserções falsas, que ocorreram entre novembro de 2021 e dezembro de 2022,
tiveram como consequência a alteração da verdade sobre fato juridicamente
relevante, qual seja, a condição de imunizado contra a Covid-19 dos
beneficiários", diz a PF em nota.
"Com
isso, tais pessoas puderam emitir os respectivos certificados de vacinação e
utilizá-los para burlarem as restrições sanitárias vigentes imposta pelos
poderes públicos (Brasil e Estados Unidos) destinadas a impedir a propagação de
doença contagiosa, no caso, a pandemia de covid-19."
·
Crimes investigados
Entre
as condutas investigadas e que podem configurar crimes estão: infração de
medida sanitária preventiva; associação criminosa; inserção de dados falsos em
sistemas de informação; e corrupção de menores.
Segundo
a PF, o nome da operação deriva do princípio “Venire contra factum proprium”,
que significa "vir contra seus próprios atos" ou "ninguém pode
comportar-se contra seus próprios atos".
É
um princípio base do Direito Civil e do Direito Internacional, que veda
comportamentos contraditórios de uma pessoa.
Durante
seu governo, Bolsonaro colocou em sigilo o seu cartão de vacinação, sob o
argumento de que se tratava de informação pessoal. Em várias ocasiões, ele
disse que não se vacinou contra a covid-19.
Depois
que tomou posse, o presidente Lula determinou uma revisão dos sigilos impostos
por Bolsonaro durante seus quatro anos na Presidência.
Mas,
em fevereiro, a Controladoria-Geral da União informou que o órgão havia
iniciado, nos últimos dias de mandato do ex-presidente, uma investigação
preliminar sigilosa para apurar "adulteração do cartão de vacinação"
de Bolsonaro.
"Considerando
que a investigação é sigilosa e não está concluída, a CGU submeteu a matéria à
avaliação de sua Consultoria Jurídica para emitir parecer quanto à viabilidade
de divulgação da decisão sobre o sigilo relacionado a esse tema, por estar em
curso a apuração correcional", informou a CGU na época, ao justificar o fato
de não ter derrubado o sigilo sobre o cartão de vacinação.
Ø
Bolsonaro
não precisou de registro de vacina para ir aos EUA
Alvo
de uma operação da Polícia Federal na manhã desta quarta (3/5), por suspeita de
fraude de registro de vacina, o ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro (PL)
não foi obrigado a comprovar que havia sido imunizado contra a covid-19 para
ingressar nos Estados Unidos no fim do ano passado, quando ainda era chefe de
Estado.
Conhecido
por defender a não obrigatoriedade da vacina e por repetir que ele próprio
jamais se vacinou, Bolsonaro viajou à Flórida antes do fim de seu mandato, no
dia 30 de dezembro, quando ainda possuía um visto diplomático A1 emitido pelas
autoridades americanas.
Embora,
desde 2021, todos os viajantes aos EUA por via aérea tivessem que comprovar ter
tomado ao menos duas doses de imunizantes contra o novo coronavírus, no mínimo
15 dias antes do embarque, o Center for Disease Control and Prevention (CDC)
prevê uma lista de exceções à regra.
A
primeira delas se aplica a "pessoas em viagens diplomáticas ou oficiais de
governos estrangeiros", caso de Bolsonaro. Por ser menor de 18 anos, a
filha do ex-presidente, Laura, também se incluiria em uma exceção prevista pelo
CDC.
·
Passaporte diplomático
Questionado
diretamente sobre o assunto, o Departamento de Estado ainda não respondeu.
Fontes
no Itamaraty com conhecimento dos procedimentos aos quais Bolsonaro foi
submetido nas viagens internacionais informaram à BBC News Brasil que, de posse
de passaporte e visto diplomático, Bolsonaro não foi obrigado a mostrar seu
comprovante de vacina nem em dezembro de 2022, nem em suas outras viagens
anteriores aos EUA, como em junho de 2022, quando ele se encontrou em Los
Angeles com o presidente americano Joe Biden, ou em 2021, quando foi a Nova York
para participar da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU).
Na
ocasião, inclusive, o então prefeito de Nova York, Bill de Blasio, chegou a
dizer ao presidente brasileiro que "se você não quer se vacinar, não se dê
ao trabalho de vir".
Bolsonaro,
porém, não foi barrado, nem na entrada do país, nem na Assembleia Geral da
ONU, mas
protagonizou um polêmico almoço em um "puxadinho" improvisado na
calçada pela churrascaria Fogo de Chão, proibida pela cidade de
NY de receber em seu salão pessoas não vacinadas.
Foi
nesta mesma viagem, em 2021, que a então primeira-dama Michelle Bolsonaro se
vacinou em Nova York.
Segundo
a Polícia Federal, tanto os registros de vacina de Bolsonaro quanto o de sua
filha Laura e de assessores do então presidente, como o ajudante de ordens
Mauro Cid, teriam sido adulterados poucos dias antes da partida de Bolsonaro
para os EUA, em dezembro passado, e uma das suspeitas dos investigadores seria
a de que a adulteração do documento teria por objetivo facilitar a entrada do
grupo em território americano.
Apresentar
documento falso no ingresso aos EUA é crime federal, passível de pena de multa
e de prisão.
Não
existe, porém, qualquer indício de que Bolsonaro jamais tenha apresentado
qualquer registro vacinal, legítimo ou forjado, às autoridades americanas.
Segundo
disse à BBC News Brasil, em fevereiro, o advogado de migração de Bolsonaro nos
EUA, Felipe Alexandre, quando o já ex-presidente pediu alteração de seu status
no país do visto diplomático A1 para o visto de turista (B1/ B2), as
autoridades americanas tampouco pediram comprovante de vacina.
"Não,
para mudança de status, eles não estão exigindo isso. (...)A pedidos (de visto)
fora do país, para você poder entrar aqui, eles estão exigindo isso. Mas se
você já conseguiu o visto e você conseguiu entrar aqui, (não precisa)",
afirmou Alexandre.
Nesta
quarta, em entrevista à rede Jovem Pan, Bolsonaro afirmou que "o
tratamento dispensado a chefe de Estado (nos EUA) é diferente do cidadão comum.
Tudo é acertado antecipadamente e em minhas idas aos EUA em nenhum momento foi
exigido o cartão vacinal. Então, não existe fraude de minha parte no tocante a
isso".
A
BBC News Brasil tentou contato com o assessor de Bolsonaro, Fabio Wajngarten,
mas não recebeu retorno.
Bolsonaro
e mais seis auxiliares, entre eles o ex-ajudante de ordens Mauro Cid, foram
alvo da Operação Venire, deflagrada pela Polícia Federal no âmbito do inquérito
sobre milícias digitais.
A
BBC News Brasil não obteve informações sobre a existência de passaportes e
vistos diplomáticos de Cid e dos demais assessores. Se estivessem cobertos
pelos mesmos documentos que os de Bolsonaro, eles também fariam jus à exceção
na chegada ao território americano.
Caso
quisessem pedir visto de turismo aos EUA, estes auxiliares teriam que
apresentar ao consulado americano no Brasil seus comprovantes de vacinas.
·
Lula também não precisou apresentar registro de vacina
ao entrar nos EUA
A
exceção à regra de apresentar cartão de vacina não se aplicava apenas a
Bolsonaro, mas a autoridades em geral.
Perguntada
pela BBC News Brasil, a secretaria de imprensa do Palácio do Planalto informou
que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não teve que comprovar vacinação
para entrar nos EUA em fevereiro de 2023, quando veio a Washington D.C. para
encontro com o presidente Biden.
A
secretaria destaca, porém, que, antes de entrar na Casa Branca, Lula apresentou
seu registro vacinal às autoridades americanas e diz que não seria problema ao
atual presidente comprovar que está vacinado.
Sob
o governo do petista, o Programa Nacional de Imunização vem sendo reestruturado
e o personagem Zé Gotinha tem retomado protagonismo.
Fonte:
BBC News Brasil
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