sábado, 27 de maio de 2023

Jovens de 6 a 17 anos enfrentam preconceito com adoção tardia

A espera pela adoção já costuma ser longa. Não é do dia para noite que pais e filhos adotivos se encontram em um mesmo lar. Na Bahia, quando a criança ou adolescente tem entre 6 e 17 anos, esse processo pode ser ainda mais demorado e, às vezes, interminável. Em 2022, das 82 crianças adotadas em todo o estado, só 32 tinham pelo menos seis anos. Neste ano, a tendência se mantém. De 41 adoções, apenas 10 não eram de crianças com cinco anos ou menos. Por isso, o Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA)  lançou quinta-feira (25), Dia Nacional da Adoção, a campanha ‘Filhos são eternos bebês’.

A ação quer fazer com que a espera de adolescentes como Antônio dos Anjos, 17 anos, tenha fim. Ele vive no Lar Irmã Benedita Camurugi, em Simões Filho, e sonha em encontrar uma família mesmo estando a um mês de completar a maioridade.

 “Eu sonho em ter uma família porque, desde pequeno, via outras crianças com mães e pais. Dias das mães e dos pais mesmo são os dias que eu menos gosto e fico triste. Na escola, quando é essa época, todo mundo fala sobre a comemoração e eu não tenho mãe/pai. É sempre difícil”, conta.

Para fazer com que histórias como a de Antônio terminem com o encontro dos pais adotivos, o desembargador Salomão Resedá, titular da Coordenadoria da Infância e Juventude (CIJ) do TJ-BA, fala que a campanha quer mostrar os pontos positivos da adoção tardia, pois os pais preferem, em geral, crianças menores de 3 anos. “Não só a criança recém-nascida pode ser filha ou filho. Os mais velhos também estão aptos a construir essa relação”, inicia.

“Tem um aspecto que, quando a criança ou o adolescente tem uma pequena noção da vida, a tendência é ele dispensar um amor maior para aquela pessoa que o amparou. Ele já viveu o abandono, viveu a solidão de não ter uma família. A campanha quer dar visibilidade ao que está nesses lares e instituições”, completa Resedá, advogando pelo fato de que a adoção tardia é também uma experiência valiosa para quem quer se tornar pai ou mãe.

A professora Gicélia Cruz, 55, adotou uma menina de 7 anos e atesta o que o desembargador diz. Segundo ela, o processo com crianças mais velhas é enriquecedor. “A adoção tardia traz uma certa leveza por eles terem uma maturidade, mas também uma descoberta porque ser mãe é uma construção que independe da idade. Não há uma receita ou padrão. Tem sido uma construção para mim e para ela, no processo de nos reconhecermos enquanto mãe e filha”.

É esse o tipo de relação que Wesley Conceição, 12, espera construir com uma família que o adote. Ele vive no Lar Pérolas de Cristo e espera ainda ser adotado com os dois irmãos mais novos que foram com ele para o local. “Queria mesmo uma família, uma casa e um quarto que fosse meu e de meus irmãos que estão aqui comigo. É bom estar com eles no lar onde cuidam da gente, mas uma casa com pais seria mais legal”, fala o pequeno.

Juiz da 1º Vara da Infância e Juventude, Walter Ribeiro afirma que trabalha para que os pais não desenhem perfis de crianças. “Existe o perfil da criança desejada e é isso que estamos trabalhando para mudar. Essa criança não pode ser o que a sociedade quer, que no geral é uma menina branca com menos de três anos. Eu recomendo optar por perfil livre, porque filho é filho, independente de como eles sejam”, dá o recado.

<<< Como se candidatar para a adoção:

# Internet

Quem quer dar entrada no processo e se tornar um candidato à adoção, pode acessar o site do TJ-BA (tjba.jus.br), onde há um espaço de orientação manual para entender passo a passo o que é preciso.

# Presencialmente 

Além disso, é possível também entrar em contato com a 1º Vara da Infância e Juventude ou ir até a sede do órgão. Nessas opções, a pessoa recebe orientação completa para ficar mais perto da possibilidade de adoção.

# Encontro Juiz da 1º Vara da Infância e Juventude, Walter Ribeiro detalha o processo:

 “O encontro entre quem quer adotar e uma criança não pode ser visto como uma ida ao Petshop ou boutique onde se escolhe uma roupa. A partir do momento em que você se cadastra, um sistema faz a busca de uma criança dentro do perfil que esses possíveis pais escolheram. Então, a combinação precisa bater seguindo uma série de critérios e o sistema faz a vinculação automática”, afirma.

 

       Número de crianças vulneráveis à exploração sexual resgatadas em rodovias é o maior em 7 anos

 

A Polícia Rodoviária Federal resgatou, em 2022, 181 crianças e adolescentes de situações vulneráveis à exploração sexual em estradas do país, o maior número desde 2015, quando houve 245 casos.

As operações são feitas em postos de gasolina, restaurantes, lanchonetes, boates, postos de parada de caminhoneiros e até barracas de frutas ao longo de rodovias federais. Elas acontecem anualmente, no âmbito do projeto Mapear, que divulga relatórios a cada dois anos com pontos vulneráveis à exploração sexual infantil.

Em 2021, foram 75 casos. Em um deles, em setembro, agentes passavam pelo km 174 da BR-153, na região da cidade de Guaiçara, no interior de São Paulo, quando resgataram uma adolescente de 16 anos que era explorada em uma lanchonete. Ela tentou se passar por maior de idade, segundo relato dos agentes.

A dona do estabelecimento, de 29 anos, disse aos policiais que no local funcionava uma lanchonete e um ponto de encontro de garotas de programa. A PRF encontrou quartos e banheiros para uso coletivo, além de acesso direto a um motel localizado ao lado do estabelecimento.

A mulher foi presa em flagrante pelo crime de favorecimento à exploração sexual, e a adolescente, encaminhada para abrigo municipal.

Após o resgate, as vítimas geralmente são levadas para unidades do Conselho Tutelar, que comunica o caso às famílias. Algumas crianças e adolescentes são encaminhadas para abrigos institucionais.

"A gente coloca na escola, insere em programas sociais, como menor aprendiz. O que não pode é cruzar as mãos diante desse tipo de violação, que tem crescido muito", diz a conselheira Socorro Arraes, do Piauí, estado com maior número de resgates (78) em 2022. Em seguida, vêm Amapá (29) e Acre (21) em registros.

Nos dois últimos anos, foram mapeados 9.745 pontos vulneráveis à exploração sexual nas rodovias, contra 3.651 no biênio 2019-2020.

Isso não quer dizer que houve um aumento do risco. Os pontos são registrados pela PRF independentemente de ocorrer ali exploração de fato. São lugares onde há fluxo de pessoas nas rodovias, como um posto de gasolina. Para auxiliar a fiscalização, eles são divididos em baixa, média, alta e crítica vulnerabilidade.

Entre os locais, 640 foram identificados como críticos (6,5% do total), que são priorizados pela fiscalização. Nesses, pode haver prostituição ou venda de bebida alcoólica na presença de crianças.

O Espírito Santo foi o estado com maior percentual (20%) de pontos críticos em 2021 e 2022, seguido pelo Distrito Federal (14%). Já a rodovia com maior índice foi a BR-116, que liga o estado da Bahia a Minas Gerais (12%). Os números estão no relatório do Projeto Mapear de 2021-2022.

De acordo com a PRF, o mapeamento está pronto desde 2022, mas teve a divulgação cancelada pela gestão anterior, do ex-diretor-geral Silvinei Vasques. Ele se aposentou em dezembro do último ano, investigado por atos nos quais teria excedido as atribuições da PRF para oferecer suposto favorecimento ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) nas eleições.

A nova gestão pretende divulgar o relatório nos próximos meses.

"Nos últimos quatro anos, a parte de direitos humanos foi reduzida na PRF, e a área técnica lutou para realizar o Mapear. Fomos muito atrapalhados no projeto, houve pressão pública para que não fosse efetivamente cancelado", diz Liamara Cararo Pires, coordenadora da área temática de direitos humanos da PRF.

O projeto tem parceria com organizações como a Childhood Brasil e a Asbrad (Associação Brasileira de Defesa da Mulher, Infância e Juventude), que prestam consultoria à PRF e ajudam em ações de prevenção.

"Essas pessoas são lançadas à sua própria sorte em programas sexuais em troca de um lanche, um banho quente, uma noite no motel", diz a presidente da Asbrad, Dalila Figueiredo.

De acordo com ela, a pandemia levou a um aumento no registro de exploração sexual tanto infantil quanto de adultos. "É inegável que a situação do Brasil piorou muito com a pandemia. Os pobres ficaram miseráveis, e a pobreza é um extremo complicador do ponto de vista da exploração sexual."

Diferente do abuso, a exploração é uma violência sexual que pressupõe uma relação de troca, seja financeira, de favores ou presentes.

Liamara, da PRF, explica que a exploração sexual infantil é multifatorial. "Geralmente, o que tem uma influência muito grande é a vulnerabilidade econômica. Onde há menor IDH [Índice de Desenvolvimento Humano], acesso a educação básica, equipamentos sociais de saúde, perspectiva de emprego, há mais casos", diz.

O coordenador de áreas especializadas de combate ao crime da PRF, João Dadalt, diz que a fiscalização tem afastado menores das margens das rodovias.

"Detectamos que hoje o aliciador deixa a criança ou adolescente em local mais afastado da rodovia e apenas 'a oferece' nos locais. As redes sociais e aplicativos de conversa também facilitaram esse modus operandi", diz.

Entre os desafios apontados pelo relatório de 2021-2022 para os próximos anos, está a revisão do que define um ponto como vulnerável nas rodovias, dado o cenário apontado por Dadalt.

Com a mudança das formas de exploração, as autoridades reforçam a importância dos canais de denúncia para a população.

Elas podem ser feitas pelo número específico para denúncia de crimes de violência sexual disponibilizado pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, o Disque 100, e pelo 191.

 

Fonte: Correio/FolhaPress

 

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