terça-feira, 30 de maio de 2023

Diretores de maiores entidades científicas da França pedem punição de Didier Raoult, o "Dr. Cloroquina"

A imprensa francesa desta segunda-feira (29) repercute a publicação de uma tribuna no jornal Le Monde que contesta a ausência de punição contra o médico francês Didier Raoult, especialista em doenças infecciosas, que virou celebridade no auge da pandemia de Covid-19. Na época, ele utilizou uma série de medicamentos sem eficácia científica comprovada em pacientes contaminados pelo vírus: "um enorme escândalo sanitário", sem nenhuma consequência até hoje, dizem os signatários do manifesto.

"Na ausência de reação das autoridades, falhas graves podem se tornar comuns", afirmam diretores de 16 grandes organizações francesas de pesquisas científicas, além do professor Alain Fischer, uma das maiores autoridades médicas da França, presidente da Academia das Ciências. Esses especialistas alertam que alguns testes clínicos realizados durante a pandemia pelo Instituto Hospitalar Universitário de Doenças Infecciosas de Marselha, no sul da França - dirigido por Raoult até 2022 - desrespeitaram protocolos científicos e normas jurídicas.

"A prescrição sistemática a pacientes com Covid-19, quaisquer que sejam sua idade e sintomas, de medicamentos tão variados como hidroxicloroquina, zinco, ivermectina ou azitromicina, foi realizada inicialmente sem bases farmacológicas sólidas e na ausência de qualquer prova de eficácia", diz o texto publicado pelo jornal Le Monde no domingo (28). Os autores do manifesto ressaltam que o mais grave é que esses testes continuaram durante mais de um ano, após a demonstração formal de sua ineficácia, "fora de qualquer autorização científica e de qualquer quadro ético ou jurídico".

Os signatários ainda apontam que o grande destaque que essas práticas tiveram na época ajudaram a contribuir a desconfiança de muitos cidadãos na ciência, na pesquisa, nas autoridades sanitárias e nos especialistas. "No contexto particularmente tóxico da crise sanitária, as declarações peremptórias proclamando a eficácia desses tratamentos, infelizmente, tiveram grande sucesso entre o público", com consequências graves até hoje, reiteram.

·         Nenhum indiciamento

Em sua edição desta segunda-feira, o jornal Le Parisien lembra que, em abril, a Agência Nacional de Segurança do Medicamento da França (ANSM) indicou que a utilização da hidroxicloroquina "expõe pacientes a potenciais efeitos colaterais que podem se tornar graves". Após a publicação de um relatório contundente da entidade sobre as más práticas realizadas por Raoult durante a pandemia, em julho de 2022, o Ministério Público de Marselha abriu uma investigação, mas até o momento sem nenhum indiciamento, afirma o diário.

Questionado durante um programa de rádio e TV no domingo, o ministro francês da Saúde, François Braun, indicou que sua pasta e o Ministério do Ensino e da Pesquisa notificaram a justiça sobre o modo de funcionamento do Instituto Hospitalar Universitário de Doenças Infecciosas Mediterranée de Marselha e que uma investigação está sendo realizada.

Aposentado desde 2021, Raoult foi substituído na direção da entidade por Pierre-Edouard Fournier. "Todos os testes clínicos em humanos foram suspensos desde então", conclui o jornal Le Parisien.

"Na ausência de medidas apropriadas, o que aconteceu continuará sendo visto pelos cidadãos como um comportamento aceitável, até mesmo desejável, podendo semear dúvidas com consequências dramáticas na participação de pacientes na pesquisa", dizem ainda os autores do manifesto. Por isso, para esses especialistas, "a inação não é mais uma opção".

 

Fonte: RFI

 

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