Sete
em cada dez vereadoras eleitas nas capitais brasileiras são cristãs
A
vereadora reeleita no Rio de Janeiro, Joyce Trindade (PSD), é evangélica e
frequenta a Igreja Batista. Ela diz que a religião teve influência na sua
reeleição, mas não somente isso. “Sou mulher, preta, vim da periferia e fui
estudante de universidade pública, não dá para me reduzir somente à minha
religião”, completa.
Trindade
está entre as vereadoras cristãs eleitas para assumir o mandato entre 2025 e
2028. Elas são maioria nas câmaras municipais das capitais brasileiras, segundo
pesquisa do Instituto de Estudos da Religião (Iser). Sete em cada dez
vereadoras eleitas nas capitais brasileiras são cristãs, de acordo com o
levantamento, que mapeou a identidade religiosa das eleitas, ao qual a Agência
Pública teve acesso com exclusividade.
Dos 840
parlamentares eleitos nas capitais, 179 são mulheres. Dessas, quase 70%, 125 do
total, são cristãs, sendo 55 católicas, 47 evangélicas e 23 de identidade
cristã não determinada.
Há
ainda 16 afroreligiosas, três espíritas, uma judia – a vereadora de Porto
Alegre Fernanda Barth (PL) – e uma de espiritualidade indígena – a vereadora de
Florianopólis Ingrid Mawé (PSOL). Três vereadoras foram identificadas como
afrocatólicas, por se autodefinirem com duplo pertencimento religioso. A
metodologia leva em consideração a autoidentificação (nome de urna, redes
sociais) e a heteroidentificação, que se relaciona com o discurso ou fotos em
comunidades religiosas durante as campanhas.
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Por que isso importa?
• Levantamento inédito mostra que quase
70% das vereadoras eleitas em capitais brasileiras são cristãs;
• Entre as evangélicas, maioria é
vinculada a igrejas pentecostais e a partidos de direita
Entre
as evangélicas, 29 são de igrejas pentecostais (61,7%), sendo a maior parte das
Assembleias de Deus (10) e da Igreja Universal do Reino de Deus (7).
Quando
se cruza dados de religião com raça, as vereadoras cristãs são
predominantemente mais brancas, 55,86% frente a 43% negras. As católicas são as
mais brancas (33), e as evangélicas se distribuem entre brancas (27) e negras
(22). Das 16 afrorreligiosas, dez são negras, assim como as três afrocatólicas.
Todas as espíritas são brancas.
Quanto
à vinculação partidária, de acordo com o Iser, o PT e o PSOL são os partidos
com maior número de mulheres eleitas no país, 23 e 22, respectivamente. Mesmo
assim, a pesquisa mostra um predomínio dos partidos de direita nas vinculações:
45,13% vereadoras são de partidos de direita, 37,43% da esquerda e 15,64% do
centro. “As evangélicas estão mais vinculadas a partidos de direita, as
católicas se dividem entre direita e esquerda, e as afrorreligiosas são
predominantemente de esquerda, com menor participação ao centro e nenhuma de
partidos de direita”, diz o estudo.
De
acordo com a pesquisadora do Iser Magali Cunha, o cenário acompanha as
tendências observadas em candidaturas com identidade religiosa nas eleições
anteriores de 2020 e 2022. “Houve um crescimento dessa categoria cristã não
especificada, que nem se diz católica ou evangélica. Ao que nos parece, é uma
estratégia que avança a cada eleição, numa tentativa clara de alargar o apoio
do eleitorado, sem polarizar para nenhum dos lados”, explica.
O
estudo do Iser mostra que a Câmara Municipal de São Paulo é a com maior
quantidade de mulheres eleitas entre as capitais brasileiras, são 20
parlamentares dos 55 vereadores. Destas, 11 são cristãs, sendo sete evangélicas
e quatro católicas. Ainda há uma afrorreligiosa, uma espírita e sete não
identificadas.
Curitiba,
Belo Horizonte e Rio de Janeiro dividem o segundo lugar com 12 vereadoras em
cada. No Rio, destas, sete vereadoras são cristãs, duas afrorreligiosas, uma
espírita e duas não identificadas.
• Intolerância religiosa
Joyce
Trindade foi eleita para a Câmara de Vereadores do Rio, assim como Thais
Ferreira (PSOL). “Sou filha de Oxum com Xangô, e isso atravessa não só a minha
vida, mas também o meu mandato”, disse Thais, que é candomblecista.
Por
assumir uma posição religiosa mais explícita no seu mandato, em defesa das
casas de matriz africana como espaços de cuidado e promoção da saúde, ela tem
vivido episódios de intimidação dentro da Câmara por outros vereadores.
Atualmente,
a vereadora protocolou um Projeto de Lei que institui a política municipal de
combate ao racismo ambiental, em que cita as comunidades de terreiro como
vítimas desse tipo de violação. Além disso, ela tem articulado com lideranças
de terreiros, especialmente nas regiões mais afetadas pela intolerância
religiosa. De acordo com a central da Prefeitura do Rio de Janeiro que recebe
relatos e denúncias enviadas pela população, no ano passado, a Zona Norte teve
21 denúncias de ataques a terreiros. Em segundo lugar, a Zona Oeste do Rio
recebeu 15 denúncias.
Neste
ano, nas redes sociais, a vereadora Joyce Trindade, que é evangélica, também
recebeu diversas críticas por prestar homenagem à orixá feminina Iemanjá. “Eu
perdi muitos seguidores com essa foto, mas se eu perco de um lado, ganho de
outro, acabo sendo visto como uma evangélica mais aberta, me favorece”, disse à
reportagem.
• Mulheres evangélicas na política
Assembleiana
do Ministério Madureira e filha de pastores, a vereadora de Goiânia Aava
Santiago (PSDB) foi reeleita neste ano como a quarta parlamentar mais votada
entre os 37 vereadores empossados. Entre os parlamentares, apenas cinco são
mulheres. Somente Aava e a vereadora Léia Klebia (PODE) foram reeleitas. “É
como se internamente na política, as mulheres não pudessem avançar em relação
ao número de homens na Câmara. Então, para uma ser eleita, uma precisa sair”,
diz.
No ano
passado, a vereadora foi convidada pela primeira-dama Janja para uma reunião
com o presidente Lula (PT) no Palácio do Planalto sobre a rejeição do governo
pelo público evangélico. Ela participou da campanha do presidente durante as
eleições de 2022.
“Diferentemente
de vereadores da Câmara que saíram pedindo bênção de pastor às vésperas da
eleição, minha eleição não se deu em defesa exclusiva dos interesses que
atravessam minha fé. E isso é bom, me possibilita transitar por diversas pautas
com liberdade, Deus me livre ser cobaia de igreja, isso é ir de encontro ao
evangelho de Jesus”, disse à Pública.
Fonte:
Por Danilo Queiroz, da Agencia Pública

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