"Voltamos
a respirar", diz liderança Yanomami sobre crise
Junior Yanomami, presidente
do Conselho Distrital de Saúde Indígena Yanomami e Yek'wana (Condisi-YY) e da
Associação Yanomami Urihi, conta que voltou a dormir bem. Nos últimos anos, ao
lado de outras lideranças indígenas e organizações como a Hutukara, a grave situação enfrentada pelo seu povo o fazia perder o sono.
Foram anos tentando chamar a
atenção das autoridades para os impactos da invasão de garimpeiros, da falta de medicamentos para tratar a malária trazida pelos
invasores, da desnutrição infantil e para as mortes, destruição da floresta e dos rios. O cenário foi
agravado durante os quatro anos do mandato de Jair Bolsonaro (2019-2022).
Nos últimos meses, diz
Junior em entrevista à DW, os Yanomami passaram a respirar mais aliviados. Ele
confirma os números apresentados pelo Ministério dos Povos Indígenas, criado no
terceiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva, em janeiro de 2023. Dados
oficiais apontam uma redução de 68% nas mortes por desnutrição no primeiro
semestre de 2024 em comparação a 2023 e uma queda de 91% dos garimpos
consolidados.
Na Terra Indígena Yanomami,
situada nos estados de Roraima e Amazonas, mais de 20 mil garimpeiros se
instalaram ilegalmente atrás de ouro. O governo atual diz ter realizado mais de
3,5 mil operações de segurança para a expulsão dos invasores. Na área da saúde,
o território vai ganhar um hospital, em fase inicial de construção, para
atender a população indígena, estimada em 31 mil.
"Hoje eu estou dormindo
bem porque eu vejo o meu povo retornando, as crianças voltando a andar bem…
Porque a criança, quando está desnutrida, doente, não consegue nem chorar. Hoje
as crianças correm, brincam, ouvem bem o som que vem da floresta, o barulho dos
pássaros, os sons do ar”, diz o líder indígena em entrevista.
LEIA A ENTREVISTA:
·
Passados dois
anos desde que a crise humanitária enfrentada
pelos Yanomami foi exibida ao mundo depois de tantas denúncias feitas por
vocês, como está hoje a situação?
Junior Yanomami: Hoje estamos respirando e com uma nova energia. Com um novo ar na
floresta, de que estamos nos recuperando. O atual governo devolveu o nosso
direito que o governo Bolsonaro tirou. O atual governo devolveu o direito para
a população Yanomami, o bem-estar e a esperança.
Estamos agora nos
organizando para retornarmos os nossos rituais, fazer rituais fúnebres daqueles
que perdemos de 2020 até 2022. Queremos enterrar em paz aquelas crianças que
perdemos, sem adoecer, chorar tranquilo, fazer a despedida. Aquelas crianças
que se foram, que faleceram por falta de medicamento, por falta de cuidado do
governo.
·
Como está hoje o
controle da malária e a saúde das crianças?
A malária está diminuindo
bastante, a desnutrição diminuiu muito porque o governo Lula contratou muitos
profissionais de saúde e muitos médicos para nos atender. Isso aconteceu pela
força do grito dos Yanomami e também da imprensa.
O governo está construindo
um hospital com aquele dinheiro que foi doado pelos brasileiros, pela campanha
do iFood que arrecadou dinheiro nesses cantinhos do Brasil. É uma coisa que
nunca foi vista, um hospital sendo construído dentro da floresta. Isso é
respeito que o governo está mostrando para a população. Então, por isso,
estamos felizes.
·
E a presença dos
garimpeiros na Terra Indígena?
O governo expulsou 95% dos
garimpeiros e hoje estamos voltando a tomar água limpa, da natureza, que
oferece água potável. Ela é uma fábrica para nós. Estamos notando hoje que a
alimentação nas comunidades cresceu muito. Os Yanomami estão conseguindo
trabalhar porque não estão com malária. As lideranças estão cuidando da
família. Então estamos retornando, cuidando da família, então ficamos muito
felizes.
Nós mostramos para este
governo a emergência do povo Yanomami e ele reconheceu que, nós, brasileiros,
estávamos abandonados dentro da floresta. Então esse governo começou a fazer
operações e está continuando.
E hoje é o nosso sonho que
isso seja permanente, que o governo realmente faça o seu papel de Estado brasileiro
de proteger o povo da floresta, de garantir a permanência do atendimento de
saúde dos Yanomami dentro da floresta respeitando nossa cultura, nossos
costumes, nossa medicina tradicional.
Eu ainda tenho na cabeça
aquilo que vi, meu povo morrendo diante dos meus olhos e a gente tentando
salvar. Hoje eu estou dormindo bem porque eu vejo o meu povo retornando, as
crianças voltando a andar bem… A criança, quando está desnutrida, doente, não
consegue nem chorar. Hoje as crianças correm, brincam, ouvem bem o som que vem
da floresta, o barulho dos pássaros, os sons do ar.
·
Dois anos depois
deste momento tão crítico, vocês sentem então melhora e menor impacto do
garimpo ilegal na vida dos Yanomami?
Sim, acho que desde novembro
do ano passado a gente sente isso. Temos um sistema de alerta nas comunidades e
não temos registrado mais essas invasões. O governo está bloqueando [os
garimpeiros], fazendo o seu papel e dever. Não temos mais registros, e é por
isso que água está bem recuperada, a floresta está feliz.
·
E a situação
geral de saúde, é muito preocupante para vocês atualmente?
Ainda existem casos de
malária, mas diminuiu muito. Nos anos passados, tínhamos, por exemplo, numa
comunidade de 400 pessoas até 90% de contaminação. Se fosse uma comunidade de
200 pessoas, 190 estavam com malária.
Hoje, onde tem uma
comunidade de 200 pessoas, umas cinco estão com a doença. Então significa que
está acabando, que os profissionais estão acabando com a malária dentro da
floresta.
·
Em que fase está
a construção deste hospital na TI Yanomami?
Está sendo construído na
comunidade de Surucucu e estão levantando as paredes. Será um centro para
atender 200 pessoas e deve ser inaugurado em outubro.
¨ Dragas de garimpo voltam a operar no
rio Madeira, alerta Greenpeace
Quase 500 balsas que realizavam garimpo ilegal no rio
Madeira – 100 delas em Terras Indígenas – foram destruídas no ano passado
pela Operação Prensa, uma ação conjunta da FUNAI, Polícia Federal e IBAMA. Mas,
apenas cinco meses depois, os criminosos voltaram a operar na região. E esse
retorno não foi descoberto por órgãos do governo – como o Sistema de Vigilância
da Amazônia (SIVAM), criado para esse fim e controlado pelas Forças Armadas –,
mas pelo Greenpeace.
Entre 10 e 22 de janeiro foram emitidos 12 alertas de
mineração ilegal no rio Madeira. Desses, 7 correspondem a balsas agregadas em
operação; os outros 5 referem-se a balsas em deslocamento ou ancoradas. E nada
menos que 130 dragas foram detectadas entre os municípios de Novo Aripuanã e
Humaitá, no Amazonas, informam Folha e Amazonas Atual.
Os alertas foram captados por meio de uma nova
ferramenta desenvolvida pelo Greenpeace que funciona utilizando imagens de
radar Synthethic Aperture Radar (SAR), captadas pelo satélite Sentinel 1, e
processadas no Google Earth Engine. Imagens do satélite Planet, de alta
resolução, confirmaram a informação.
Há mais de 40 anos, o rio Madeira, um dos principais
afluentes do rio Amazonas, é alvo do garimpo ilegal que ameaça o equilíbrio
ambiental e social da região. São várias as consequências dos garimpos
embarcados: as balsas, equipadas com maquinário pesado, dragam o fundo do rio
em busca de ouro, destruindo o leito, contaminando a água com mercúrio, matando
peixes e causando doenças nos Povos que dependem do rio para sobreviver.
“A destruição causada pelo garimpo é sustentada por uma
cadeia criminosa que opera com total impunidade. É urgente que o governo
brasileiro adote políticas integradas que unam tecnologia, fiscalização
eficiente e alternativas econômicas sustentáveis para proteger nossos rios e
populações”, afirma o porta-voz da Frente de Povos Indígenas do Greenpeace
Brasil, Jorge Eduardo Dantas.
<><> Em tempo:
O presidente Lula assinou na 2ª feira (3/2) um decreto
que regulamenta o poder de polícia da FUNAI. Agora, os servidores da autarquia
poderão notificar infratores e apreender e destruir instrumentos usados para
violar os Direitos dos Povos Indígenas, informam UOL e Veja. O decreto atende
uma determinação do STF, atendendo reivindicação da Articulação dos Povos
Indígenas do Brasil (APIB). Apesar da lei que criou a FUNAI, de 1967, prever
poder de polícia para os agentes, isso nunca tinha sido posto em prática, já
que o texto era vago sobre as situações em que isso poderia ocorrer.
¨ Indígenas reocupam fazendas onde gado
ilegal era criado com trabalho escravo no PA
Um ano depois de recuperar a posse de seu território, o
Povo Parakanã está movendo parte de sua população das margens do rio Xingu para
o interior da Terra Indígena Apyterewa, no Pará. Oito novas aldeias estão sendo
abertas. No entanto, o ataque contra os indígenas continua.
Antes da reocupação pelos Parakanã, o Ministério
Público Federal (MPF) rastreou 177 propriedades rurais formalmente registradas
no Cadastro Ambiental Rural (CAR) dentro da TI, explica a Repórter Brasil. As fazendas eram
ilegais, já que os registros foram abertos posteriormente à homologação da
Terra Indígena, aponta um relatório do MPF sobre a ocupação dos invasores. “É
grave que a Agência de Defesa Sanitária do Pará [ADEPARÁ] tenha admitido a
abertura de registros na Terra Indígena, formalizando áreas que foram ocupadas
ilegalmente”, diz o órgão.
Uma estimativa do IBAMA e da ADEPARÁ indicou a presença
de 60 mil cabeças de gado na TI na época da invasão. Segundo o MPF, a pecuária
era o principal vetor de desmatamento e grilagem – o que não surpreende. Dos
773 mil hectares totais, uma área um pouco maior que o Distrito Federal, mais
de 100 mil ha já foram devastados, dos quais 91 mil hectares foram
transformados em pastagem.
Uma dessas propriedades era a antiga Fazenda Sol Nascente, de Antônio Borges
Belfort – recém-empossado vereador de São Felix do Xingu e réu na Justiça
Federal por criar gado ilegal na Terra Indígena e por usar trabalho escravo
nesta propriedade.
Para os Parakanã, a criação de novas aldeias é
necessária para manter longe os invasores e reflorestar a TI Apyterewa. “O
governo fez sua parte. Agora é preciso um esforço de vigilância para segurar
nosso território”, defendeu Tye Parakanã, uma das lideranças locais.
No entanto, a reocupação elevou o nível de tensão na
TI. Dois confrontos com invasores aconteceram desde dezembro, relata a Repórter Brasil. Três indígenas
Parakanã trocaram tiros com invasores na TI em 25 de janeiro. Um mês antes, em
18 de dezembro, a aldeia recém-construída Tekatawa havia sido alvo de um ataque
armado.
Desde a operação de desintrusão, que em 2023 retirou
centenas de invasores da Apyterewa, os indígenas dizem que se mantêm em estado
de guerra. Eles circulam pela área armados com espingardas, facas, arco e
flechas e escoltados pela Força Nacional e FUNAI. Com frequência, artefatos de
ferro pontiagudos enterrados por invasores nas estradas de terra precárias furam
os pneus das caminhonetes das equipes de monitoramento.
Na semana passada, a Polícia Federal deu início à
segunda fase da operação Abigeatus, que tem como alvos pessoas suspeitas de
roubar gado apreendido na Terra Apyterewa. Até o momento, os animais permanecem
dentro da TI, à espera de destinação pela Justiça. Um homem foi preso e
materiais foram apreendidos, informam g1 e Metrópoles.
<><> Em tempo:
Em Roraima, o Exército ativou o Destacamento Especial
de Fronteira (DEF) em Waikás, às margens do rio Uraricoera, para fortalecer a
vigilância e proteção da Terra Indígena Yanomami. A localidade foi escolhida
estrategicamente pela proximidade com áreas historicamente afetadas pelo
garimpo ilegal, explicam Folha BV e Revista Cenarium. A unidade
permitirá operações integradas aéreas e fluviais, facilitando o monitoramento
da TI e agilizando a resposta contra invasores.
¨ MPF reforça pedidos da DPU para
condenação do estado do PA por fake news contra indígenas
O Ministério Público Federal (MPF) entrou, nesta terça-feira
(4), com pedido na Justiça Federal para reforçar e complementar os pedidos da Defensoria
Pública da União (DPU) em ação pela condenação do estado do Pará por
publicar vídeo em que o governador do estado, Helder Barbalho, propaga
desinformação contra povos indígenas mobilizados pela manutenção da educação
presencial.
Além das duas inverdades já citadas pela DPU na ação –
de que jamais teria havido a possibilidade de ensino virtual indígena e de que,
nas tratativas de negociação, o governo do Pará teria atendido 100% das
demandas das comunidades indígenas –, o MPF aponta à Justiça estas outras três
fake news:
·
a
de que os manifestantes que ocupam a sede da Secretaria de Estado de Educação
(Seduc) representam apenas uma etnorregião do estado do Pará;
·
a
de que o movimento de ocupação causou danos ao prédio público da Seduc;
·
e
a desinformação de que os funcionários da Seduc estão impedidos de trabalhar
por causa da ocupação.
<><> Etnias diversas
Segundo o MPF, a alegação de que a ocupação da Seduc
representa apenas uma etnorregião é uma tentativa de desqualificar a
legitimidade das representações indígenas presentes. A manifestação, que teve
início em 14 de janeiro, conta com a participação de lideranças de diversas
etnias e regiões do estado, incluindo Arapyun, Jaraki, Tupinambá, Munduruku,
Munduruku Cara-Preta, Borari, Tupayú, Maytapú, Sateré-Maué, Tapuia, Kumaruara,
Wai-Wai, Katwena, Xerew, Hiskaryana, Mawayana, Paritwoto, Tikyana, Kaxuyana,
Tiriyó, Xikrim, Tembé e Warao.
O MPF destaca que os povos indígenas que ocupam a Seduc
manifestaram repúdio à proposta do governo estadual de criação de um grupo de
trabalho para discutir a nova lei, por meio de uma carta aberta. Lideranças da
etnia Tembé, localizada no nordeste do estado, também emitiram um manifesto de
repúdio à criação unilateral do grupo de trabalho, alegando falta de
legitimidade representativa em sua composição.
A pauta da ocupação é clara: a revogação da Lei
Estadual nº 10.820, de 19 de dezembro de 2024, promulgada sem consulta prévia,
livre e informada aos povos indígenas, quilombolas e demais povos e comunidades
tradicionais do Pará, e a exoneração do atual secretário de educação do Estado,
Rossieli Soares da Silva. O MPF ressalta que a ocupação da Seduc é um ato
legítimo de protesto contra medidas que afetam diretamente os povos indígenas.
“Ao Estado não é autorizada a intromissão na estrutura
de organização social e política dos povos indígenas – especialmente sob o
pretexto de pôr fim à mobilização por ampla e legítima reivindicação de
direitos à educação de qualidade, presencial e diferenciada etnicamente. Essa
incursão viola o princípio da autodeterminação dos povos, de base
constitucional expressa”, alertam procuradoras e procuradores da República de
todo o Pará.
<><> Nenhum dano
O MPF afirma que a ocupação é pacífica, organizada e
sem qualquer depredação patrimonial, atos de violência ou excesso no direito de
manifestação. As lideranças indígenas, com representações pluriétnicas de
diversos povos de diferentes regiões do Pará, estão nas dependências da Seduc
expressando sua legítima reivindicação por direitos, realizando reuniões entre
si e com instituições, assim como manifestações ritualísticas, com
indumentárias tradicionais ancestrais e uso de instrumentos de canto.
A inspeção judicial realizada na última sexta-feira
(31), na sede da Seduc, acompanhada pelo MPF, DPU, Procuradoria-Geral do Estado
e Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), demonstrou que a ocupação,
após 18 dias, não causou qualquer dano ao patrimônio público, cujos problemas
estruturais, como rachaduras e vazamentos, são decorrentes do próprio descaso
com o prédio. O MPF argumenta que a alegação de danos ao patrimônio serve ao
interesse de estigmatizar os ocupantes como pessoas violentas e inflexíveis ao
diálogo, devendo haver retratação.
<><> Sem obstáculos
O MPF contesta a alegação de que a ocupação impede
totalmente o funcionamento da Seduc, afirmando que a secretaria pode continuar
operando concomitantemente com a presença da manifestação pacífica. A alegação
de obstrução total visa unicamente criar um falso cenário de caos para mais uma
vez estigmatizar a manifestação indígena.
Segundo o MPF, a fala do governador de que a ocupação
do órgão impede totalmente a prestação de serviço na segunda maior secretaria
de Estado não é verdadeira. A ocupação não impede o funcionamento da secretaria
e a prestação do relevante serviço público educacional, devendo haver
retratação também nesse ponto, defende o MPF.
“O cenário posto, portanto, corrobora o contexto fático
diametralmente oposto àquele ofertado pelo pronunciamento do governador Helder
Barbalho, tornando falsas suas alegações, notadamente considerando os valores
constitucionais da liberdade de reunião, manifestação e controle social de
políticas públicas, por comunidades tradicionais diretamente afetadas por
elas”, conclui o MPF.
<><> Pedidos à Justiça
O MPF pede à Justiça que sejam consideradas todas as
cinco fake news e que o MPF seja incluído no processo como coautor da demanda
judicial.
Por fim, o MPF reforça os pedidos da DPU, para que:
·
o
estado do Pará e a empresa Meta Platforms, responsável pelo Facebook e
Instagram, sejam obrigados a excluir o vídeo;
·
Barbalho
seja obrigado a se retratar nas redes sociais;
·
as
comunidades indígenas possam apresentar direito de resposta nas redes sociais
do governador;
·
o
estado do Pará seja obrigado a excluir outros conteúdos falsos;
·
a
Funai seja obrigada a proteger a honra e a integridade das comunidades
indígenas vítimas de notícias falsas em relação ao movimento de ocupação da
Seduc;
·
o
estado do Pará seja obrigado a pagar R$ 10 milhões por dano moral coletivo,
valor a ser revertido para as comunidades indígenas que estão ocupando a Seduc.
Fonte: DW
Brasil/ClimaInfo/MPF-Pará
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