Pesquisas mostram
que, do grão à bebida, café faz bem
O café é a segunda
bebida mais consumida em todo o mundo, perdendo somente para a água. De acordo
com a Organização Internacional do Café (OIC), foram produzidas, entre outubro
de 2023 e setembro de 2024, cerca de 178 milhões de sacas de 60kg do grão. No entanto,
a bebida é alvo de elogios e polêmicas, e, agora, a dualidade sobre os efeitos
benéficos à saúde chegou à ciência. Pesquisas recentes associam o líquido tão
apreciado a um bom funcionamento do organismo, enquanto outras apontam que o
exagero no consumo acarreta problemas.
O consumo moderado
de café e cafeína tem sido associado a alguns benefícios para o corpo humano,
especialmente no que diz respeito à redução do risco de doenças
cardiometabólicas. Um estudo recente, publicado no Journal of Clinical
Endocrinology & Metabolism, revelou que a ingestão regular do produto,
sobretudo de forma moderada, pode proteger contra diabetes tipo 2, doenças
cardíacas coronárias e derrames.
A pesquisa,
liderada por cientistas de universidades chinesas e suecas, revelou que a
ingestão de três xícaras de café, algo entre 200 e 300 mg de cafeína, por dia,
ajuda a minimizar as chances de multimorbidade cardiometabólica (CM) — a
combinação de duas ou mais doenças crônicas, mais frequente em idosos. Segundo
a publicação, essa ingestão moderada está associada a uma redução de até 48% no
risco de CM.
O estudo foi feito
com dados de um banco de informações do Reino Unido, o UK Biobank, que incluiu
mais de 500 mil participantes entre 37 e 73 anos. Os voluntários que consumiram
café ou cafeína moderadamente tiveram menor risco de desenvolver doenças
cardiometabólicas, se comparados com aqueles que ingeriam pouca ou nenhuma
quantidade de cafeína. A pesquisa sugere que a ingestão regular da bebida pode
ter um efeito protetor em quase todas as fases do desenvolvimento de doenças
cardiometabólicas, contribuindo para qualidade de vida e longevidade.
Arthur Felipe
Giambona Rente, cardiologista e curador cardiol mobile, da Sociedade Brasileira
de Cardiologia, destaca que o café contém antioxidantes. "Como os
polifenóis, que possuem propriedades anti-inflamatórias e contribuem para a
redução do estresse oxidativo, fator associado ao desenvolvimento de doenças
cardíacas, essas substâncias podem ajudar a melhorar a saúde arterial, diminuindo
o risco de formação de placas ateroscleróticas. Além de aumentar a disposição e
cognição."
Outra pesquisa
global focou no impacto do consumo de bebidas como refrigerantes, sucos e café
sobre o risco de derrames. Realizada em colaboração com a Universidade de
Galway, na Irlanda, e a Universidade McMaster, no Canadá, o estudo concluiu que
a ingestão excessiva desses produtos está diretamente ligada a um aumento nas
chances de acidente vascular cerebral (AVC).
·
Resultados
Os resultados do
estudo, parte do projeto Interstroke, mostraram que o consumo de mais de quatro
xícaras de café por dia também está associado a um risco maior de derrame. O
trabalho, um dos maiores sobre fatores de risco para derrame, envolveu quase 27
mil pessoas de 27 países, com diferentes perfis de risco cardiovascular.
A análise do
consumo de cafeína e suas implicações para a saúde apontou para uma possível
proteção contra o desenvolvimento de doenças cardiometabólicas e derrames,
embora o excesso de café não traga benefícios e possa até ser prejudicial. Mais
de quatro xícaras de café por dia foram associadas a um risco aumentado de
derrame, mostrando que a moderação é crucial para aproveitar os benefícios da
cafeína sem os efeitos adversos.
Curiosamente, o
trabalho também destacou os benefícios do chá para a redução do risco de
derrame. O consumo de três ou quatro xícaras de chá preto ou verde por dia foi
associado a uma diminuição de até 29% no risco de derrame. No entanto, os
efeitos benéficos dos antioxidantes presentes no chá podem ser anulados quando
leite é adicionado. A pesquisa sugeriu que a bebida pode ter vantagens
específicas dependendo da região geográfica, com a redução do risco sendo mais
pronunciada na China e na América do Sul, enquanto em algumas áreas do Sul da
Ásia o chá foi ligado a maiores chances de AVC.
A pesquisa também
indica que, para as populações em geral, hábitos alimentares saudáveis, como
evitar o consumo excessivo de bebidas adoçadas e adotar um consumo moderado de
café, chá e cafeína, podem ser estratégias importantes para a prevenção de
doenças cardiometabólicas e derrames.
Firmino Haag,
cardiologista do Hospital Albert Sabin, de São Paulo, assinala que o abuso da
cafeína traz grandes malefícios. "Ela causa dependência em algumas
pessoas, levando à síndrome de abstinência se o consumo for reduzido
abruptamente."
Em seguida, o
médico acrescenta: "O café pode irritar o estômago de algumas pessoas,
causando azia ou refluxo. Além disso, altas doses de cafeína podem exacerbar
sintomas de ansiedade em indivíduos predispostos e algumas pesquisas indicam
que o consumo elevado pode temporariamente elevar a pressão arterial."
Para Haag, é possível viver bem ingerindo a bebida de forma adequada.
"Moderando o consumo de café e prestando atenção à resposta do seu corpo,
é possível desfrutar dos seus benefícios minimizando os malefícios."
·
Cultivo
em risco
Os apreciadores do
café bebem mais de 2,2 bilhões de xícaras diariamente no mundo. Os grãos
cultivados, colhidos, torrados, moídos e filtrados vêm de duas espécies —
Coffea arabica e Coffea canephora, também conhecido como café robusta, ou
conilon. No entanto, até 2050, cientistas preveem que cerca de 80% da produção
de arábica, o mais apreciado, diminuirá devido às mudanças climáticas. A
pesquisa, publicada na revista Crop Science revela a busca por alternativas
para suprir o futuro consumo da bebida.
Os pesquisadores
veem duas alternativas para contornar a situação. A primeira é adaptar o
cultivo a novos ambientes e a outra é focar em espécies que são mais
resilientes. "Se você considerar que hoje em dia, cerca de 60% dos grãos
de café comercializados ao redor do mundo são de Coffea arabica, a indústria do
café está buscando alternativas", frisou Felipe Ferrao, autor principal do
estudo e pesquisador em ciências hortícolas da Universidade da Flórida, nos
Estados Unidos. "O café robusta surge como um bom candidato."
Conforme a
pesquisa, realizada em parceria com pesquisadores do RD2 Vision, na França, e
do Incaper Institution, no Brasil, nas últimas décadas, a produção de café robusta
cresceu aproximadamente 30%. "No geral, a espécie produz mais café que o
arábica, usando menos insumos, como fertilizantes e água. Como o próprio nome
sugere, a planta é mais robusta", disse Ferrao.
Para o trabalho, a
equipe analisou o robusta e o arábica em três locais no Brasil, durante cinco
anos. Eles queriam descobrir se as cultivares —áreas de cultivo— de robusta
poderiam ter um bom rendimento quando produzidas em climas alternativos e se o
gosto seria agradável. Os resultados mostraram que a espécie é muito adaptável
e cresce em regiões de alta altitude.
"O robusta é
flexível porque tem uma grande diversidade e, portanto, diferentes plantas
podem ser selecionadas, dependendo das condições climáticas. Com isso dito,
podemos lançar alguma luz sobre a questão fundamental sobre o café do futuro —
café climaticamente inteligente", destacou o líder da pesquisa.
Os cientistas
sugerem que o robusta combina três elementos importantes: sustentabilidade,
pois produz mais com menos insumos; qualidade, mostrando bom sabor para atender
à demanda do consumidor e plasticidade, a capacidade de adaptação a novos
sistemas de produção. Com os bons resultados obtidos no Brasil, os cientistas
querem ver se a espécie terá um bom desempenho na Flórida.
Lucas Tadeu, chefe
adjunto de Transferência de Tecnologia da Embrapa Café, destacou que, apesar do
cenário ser preocupante frente às mudanças climáticas, o café é uma cultura
bastante resiliente. "Já tivemos intercorrências climáticas, como em
meados de 1970, quando o Paraná, que era o maior estado produtor de café,
sofreu com a geada negra. A partir daí, a produção se deslocou para outras
regiões."
"Além disso,
temos um amplo programa de pesquisa que atua nas principais regiões produtoras
de café do Brasil, desenvolvendo materiais e cultivares adaptados a essas
regiões. O café robusta é produzido fortemente no Espírito Santo e Rondônia e
tem tendência de se expandir para outras regiões produtoras", completou o
especialista.
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Três perguntas para Eline Soriano, nutróloga e diretora da Associação
Brasileira de Nutrologia (Abran)
·
Qual
o melhor horário para ingestão?
O café é mais
eficiente quando ingerido pela manhã ou no início da tarde. Tomar em jejum pode
causar desconforto estomacal em pessoas sensíveis. Deve-se evitar o consumo à
noite ou próximo ao horário de dormir, pois a cafeína pode atrapalhar o sono.
·
Qual
a quantidade adequada e por qual tipo de café optar?
A dose ideal varia
para cada pessoa, mas, de maneira geral, o consumo de até três xícaras por dia,
ou cerca de 300 mg de cafeína, é considerado seguro para a maioria dos adultos
saudáveis. Prefira café filtrado, pois ele contém menos substâncias que podem aumentar
o colesterol, como os diterpenos. Evite adicionar muito açúcar ou cremes para
não transformar uma bebida saudável em uma fonte de calorias vazias. Hidrate-se
adequadamente, pois a cafeína tem um leve efeito diurético.
·
O
consumo é contraindicado em alguma ocasião?
Para gestantes e
lactantes a ingestão exagerada de cafeína pode afetar o desenvolvimento do bebê
e aumentar o risco de complicações na gravidez. Pessoas com insônia ou
ansiedade podem ter piora no quadro devido ao efeito estimulante. O consumo de
café agrava a condição de indivíduos com gastrite ou refluxo. Hipertensos
descontrolados devem tomar cuidado, pois o café é capaz de aumentar a pressão
arterial, temporariamente.
Fonte: Correio
Braziliense
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