sexta-feira, 20 de dezembro de 2024

Eleição na Alemanha: o que cada partido propõe

"É a economia, estúpido!": o democrata Bill Clinton venceu a eleição americana em 1992 com esse slogan inoficial de campanha, que poderia muito bem se aplicar à breve campanha eleitoral, que agora se inicia, para a eleição antecipada do Bundestag (a câmara baixa do Parlamento alemão), em fevereiro de 2025, que definirá quem será o próximo chefe de governo da Alemanha.

Pois nada preocupa mais os eleitores alemães do que as dificuldades enfrentadas pela economia alemã, em parte como resultado da guerra na Ucrânia. Muitos têm medo da inflação, de perder o emprego ou de não conseguir pagar o aluguel.

O assunto está diariamente nos jornais, como mostra o caso emblemático da crise na Volkswagen, maior montadora da Alemanha e um símbolo da economia alemã.

Assim, não é nenhuma surpresa que renda, inflação e emprego ganhem destaque nos programas eleitorais dos partidos alemães neste início de campanha eleitoral.

<><> CDU/CSU: menos impostos e refugiados

O bloco de centro-direita, formado pela União Democrata Cristã (CDU), maior partido conservador alemão, e a União Social Cristã (CSU), o partido conservador que só existe na Baviera, apresenta um programa eleitoral que promete reduzir impostos e acabar com a imigração ilegal.

Os conservadores querem uma proibição imediata da entrada de imigrantes não autorizados. Qualquer pessoa que venha de um outro país da UE ou do espaço Schengen para solicitar refúgio deve ser rejeitada já na fronteira.

A União, como é conhecida a aliança entre CDU e CSU, quer reduzir gradualmente as alíquotas do imposto de renda e diminuir gradualmente os impostos das empresas para 25%.

A proposta é que a alíquota máxima do imposto de renda, de 42% (inclui as contribuições sociais), valha apenas para as rendas mais altas. Hoje essa alíquota é aplicável a quem tem renda anual superior a 66,7 mil euros, ou cerca de 5% dos alemães. Até os anos 1990, a alíquota era de 56%.

Em um país onde um em cada quatro habitantes são aposentados, os conservadores prometem não cortar as aposentadorias. Também defendem que as pessoas que quiserem continuar trabalhando além da idade de aposentadoria tenham isenção de impostos para até 2 mil euros que ganharem além do valor da aposentadoria.

O problema: as ideias ousadas do candidato a chanceler federal da CDU/CSU, Friedrich Merz, custariam muitos bilhões de euros e dificilmente seriam concretizadas se esses partidos insistirem em respeitar o freio da dívida, ancorado na Lei Fundamental (Constituição) durante o governo da ex-chanceler federal Angela Merkel e que limita o endividamento público anual a 0,35% do Produto Interno Bruto (PIB).

A União também é contra a legalização da maconha e planeja revogar a medida se chegar ao poder, argumentando que a lei introduzida pelo atual governo não reduz o mercado ilegal nem o consumo.

A aliança também quer reverter outras reformas do atual governo, como a que encurtou os prazos para aquisição de cidadania alemã por estrangeiros e facilitou a obtenção da dupla cidadania, além da lei que facilita a mudança legal de gênero. Quanto ao aborto, quer mantê-lo da forma como está hoje e é contrária à descriminalização.

Embora o próprio Merz não seja muito popular entre o eleitorado, a União lidera com larga vantagem as pesquisas de intenção de voto, com pouco mais de 30% das intenções de voto, e tem boas chances de eleger o próximo chanceler federal após a eleição antecipada de 23 de fevereiro.

<><> Social-democratas: renda e segurança social

SPD, liderado pelo chanceler federal Olaf Scholz, aposta em melhores salários e fortalecimento da seguridade social. O partido quer alívio fiscal para 95% dos contribuintes, mas não detalha como quer chegar a isso.

O valor das aposentadorias é um tema central na campanha do partido, que quer manter o patamar atual, no qual a aposentadoria equivale a 48% da renda líquida na ativa.

Os social-democratas querem reformar o freio da dívida para disponibilizar bilhões de euros para investimentos urgentemente necessários, por exemplo, na renovação da infraestrutura. O partido também está se concentrando em incentivos fiscais para empresas que pretendam elevar os investimentos.

Em linha com sua mensagem aos eleitores de baixa renda, o SPD quer que as pessoas com patrimônio superior a 100 milhões de euros paguem um imposto sobre fortunas.

Candidato à reeleição, Scholz anunciou que aumentaria mais uma vez o salário mínimo, que na Alemanha é por hora trabalhada: "Na campanha eleitoral anterior, prometi um salário mínimo de 12 euros e cumpri essa promessa. É por isso que estou lutando por um salário mínimo de 15 euros".

Com aproximadamente 16% das intenções de votos nas pesquisas, o SPD tem grandes chances de integrar a próxima coalizão de governo.

<><> Partido Verde: proteção climática socialmente responsável

Partido Verde, cuja campanha é liderada pelo vice-chanceler Robert Habeck, está se concentrando na proteção climática socialmente responsável. Durante os três anos da coalizão com o SPD e os liberais, os verdes foram frequentemente acusados de sobrecarregar a população com seus ambiciosos planos de proteção climática. Agora eles estão colocando bem menos ênfase na redução dos gases do efeito estufa do que na campanha eleitoral de 2021.

Os verdes também querem reformar o freio da dívida, elevar o salário mínimo para 15 euros, introduzir subsídios para carros elétricos e propor um novo "fundo dos cidadãos" para garantir as aposentadorias, que o partido, assim como o SPD, quer manter no atual patamar de 48% da renda na ativa. Esse fundo também deve ser alimentado com dinheiro do Estado.

Eles querem um imposto para bilionários, como disse Habeck numa entrevista ao tabloide Bild. De acordo com estimativas de especialistas, existem 249 bilionários na Alemanha: "Se você taxasse uma pequena parte da riqueza deles, teria cerca de 5 bilhões a 6 bilhões de euros", estimou Habeck. Esse dinheiro poderia ser usado para fortalecer as escolas, sugeriu.

<><> Liberais: uma nova política econômica

FDP, liderado pelo seu presidente, Christian Lindner, está se concentrando na economia e defende uma política econômica "fundamentalmente diferente".

Depois de deixarem a coalizão de governo, os liberais estão apresentando o que chamam de "FDP puro": entre outras coisas, demandas por menos impostos e redução no tamanho do Estado caracterizam o programa eleitoral.

O FDP também defende uma reforma nas aposentadorias, com a introdução de uma aposentadoria baseada na compra de ações e uma "idade de aposentadoria verdadeiramente flexível", ou seja, cada um pode decidir quando quer se aposentar, o que implicaria num valor maior ou menor de aposentadoria.

O FDP também defende o respeito ao freio da dívida, um dos pontos centrais de discordância com os dois parceiros de coalizão e que foi apresentado pelo partido como justificativa para o fim do governo atual.

As pesquisas eleitorais mostram que o FDP corre o risco de ficar de fora do Parlamento, já que pode não alcançar o mínimo necessário de 5% dos votos.

<><> A Esquerda: foco na justiça social

O partido A Esquerda quer introduzir impostos mais altos para os ricos, incluindo um imposto sobre herança de 60% para aqueles com uma herança de 3 milhões de euros ou mais.

O partido também quer aumentar o salário mínimo para 15 euros e o patamar das aposentadorias para 53% (dos atuais 48%) da renda líquida na ativa.

Outro ponto defendido é a melhoria do transporte público em áreas rurais e a proibição de voos para distâncias inferiores a 500 quilômetros ou que não levem mais do que cinco horas de trem.

Assim como o FDP, a Esquerda também corre risco de ficar de fora do Parlamento.

<><> BSW: conservadora no social, socialista na economia

Aliança Sahra Wagenknecht (BSW), sigla populista de esquerda que leva o nome de sua fundadora, ocupa na visão de analistas uma posição ímpar no cenário político alemão: esquerdista em assuntos econômicos, porém mais próxima da ultradireita em questões como imigração e diversidade de gênero. 

A BSW é contra a exportação de armas para a Ucrânia e as sanções contra a Rússia, quer desmilitarizar a União Europeia e remover as armas nucleares dos Estados Unidos do continente, e reivindica uma solução diplomática para o conflito na Ucrânia.

<><> AfD: a favor de gás da Rússia, contra imigrantes

Para a eleição de fevereiro de 20254, o partido de ultradireita AfD apresentou pela primeira vez uma candidata à chancelaria federal, a copresidente Alice Weidel.

A AfD já anunciou pretensões de "reformar" e até mesmo de abandonar o bloco e a zona do euro.

A sigla também quer deixar o acordo climático de Paris. Ela nega que a mudança climática seja causada pela atividade humana e defende a instalação de novas usinas de energia a carvão e usinas nucleares, além da retomada da importação de gás natural russo.

A AfD quer ainda controles de fronteira mais rígidos, que impeçam a entrada na Alemanha de refugiados que tenham passado por outros países da UE, e defende até mesmo a detenção na fronteira de solicitantes de refúgio enquanto seus pedidos estiverem sendo analisados.

Apesar de ser o segundo melhor colocado nas pesquisas, com 19% das intenções de voto, a AfD tem baixas chances de integrar uma coalizão de governo, já que, dada a experiência traumática da Alemanha com o extremismo de direita, é mantida isolada pelos demais partidos por um cordão sanitário.

¨      Veja quem são os candidatos a chanceler federal

O Bundestag, câmara baixa do Parlamento alemão, abriu caminho nesta segunda-feira (16/12) para a antecipação das eleições gerais na Alemanha após reprovar o voto de confiança apresentado pelo chanceler federal Olaf Scholz.

Agora, é esperado que Scholz encaminhe a dissolução do Parlamento e a realização de novas eleições, previstas para 23 de fevereiro. Ao menos quatro partidos já indicaram possíveis sucessores ao comando da maior economia da Europa: o conservador União Democrata Cristã (CDU), a ultradireitista Alternativa para a Alemanha (AfD), o centro-esquerda Partido Social Democrata da Alemanha (SPD), e Os Verdes.

A futura formação do Legislativo vai influenciar diretamente nessa escolha, já que o chanceler federal alemão é escolhido pelos parlamentares. Eles formam coalizões para obter maioria dos votos e, assim, eleger o novo representante.

Essas conversas normalmente são lideradas pela sigla que obtiver a votação mais expressiva, ou seja, o maior número de cadeiras.

Até o momento, a CDU aparece disparada na liderança nas pesquisas, com cerca de 30% das intenções de voto, seguida pela AfD, que oscila em cerca de 19%. As duas siglas devem expandir suas atuais bancadas e terão peso nas negociações para formação de alianças. O SPD, de Scholz, está na terceira posição, com 16% a 17%, seguido, respectivamente, pelos Verdes (11%) e pela sigla populista de esquerda Aliança Sahra Wagenknecht (8%).

Outras legendas, como o Partido Liberal Democrático (FDP, na sigla em alemão), que foi central para o fim da coalizão de Scholz, e A Esquerda não chegam a 5% das intenções de voto na maioria das pesquisas, não atingindo assim o mínimo de votos necessário para integrar o Parlamento.

Veja quem já foi indicado pelos partidos para disputar o cargo e o que cada um deles defende:

<><> Olaf Scholz (SPD)

O atual chanceler federal  foi escolhido por unanimidade pela direção do partido para tentar a reeleição. Apesar de perder o voto de confiança dos parlamentares, uma nova formação do Legislativo pode dar nova força de negociação à sigla. A expectativa, porém, é que a sigla não consiga votos suficientes para liderar uma nova coalizão.

Scholz assumiu a cadeira em 2021, após 16 anos de domínio da CDU sob a liderança da ex-chanceler federal Angela Merkel, mas, desde o início do governo, enfrentou dificuldades em conciliar o interesse dos partidos que compunham a coalizão.

Além da fratura interna, Scholz chegou a um recorde de impopularidade em seu governo, com apenas 14% de aprovação. Recessão e medidas econômicas contribuíram para a maioria da população dizer que quer novas eleições.

Internamente, Scholz desbancou seu colega de partido, o ministro da Defesa, Boris Pistorius, que há algum tempo é apontado como o político alemão mais popular do país. Ele prometeu, se eleito, manter o apoio à Ucrânia, assegurar empregos no país e melhorar a qualidade de vida da população mais idosa.

<><> Alice Weidel (AfD)

A AfD escolheu Alice Weidel, que é colíder da bancada do partido no Bundestag, Ela será a primeira mulher nos quase 12 anos de história da AfD a concorrer sozinha ao cargo de chanceler federal.

Até agora, o partido de retórica anti-imigração e crítico ao apoio militar à Ucrânia segue isolado por um "cordão sanitário" imposto pelos demais membros do Bundestag, que se recusam a costurar alianças com a sigla dada a experiência histórica traumática da Alemanha com o extremismo de direita – algumas alas da AfD são atualmente monitoradas pelo serviço secreto alemão por suspeita de extremismo. A legenda tem poucas chances reais de fazer parte de um governo dado o seu isolamento.

Weidel argumenta que os últimos governos acabaram com "a espinha dorsal da indústria alemã" e estragaram "tudo o que funcionava". Como solução, propõe "baixar os impostos e os preços da energia", a reativação de usinas nucleares e de carvão e a retomada da compra de gás natural – presumivelmente da Rússia. Recentemente, defendeu o retorno imediato de sírios refugiados ao seu país de origem, devido ao fim do regime de Bashar al-Assad.

Na economia, uma de suas inspirações é a ex-premiê britânica Margaret Thatcher, que defendeu redução de impostos, corte de subsídios estatais e privatizações.

<><> Friedrich Merz (CDU)

O presidente da União Democrata Cristã (CDU), Friedrich Merz, será o candidato conjunto de seu partido e da União Social Cristã (CSU) nas eleições gerais. Ele desponta como o principal favorito para o cargo. Se o domínio da CDU se confirmar no Bundestag, a ascensão de Merz a chanceler deve depender apenas de sua capacidade de negociar uma coalizão com as siglas menores.

Merz atuou em conselhos corporativos, incluindo a filial alemã da trilionária BlackRock, maior gestora de ativos do mundo. Ele ingressou na CDU aos 17 anos e por muito tempo foi visto como uma figura polarizadora no partido. Merz era rival ferrenho de Angela Merkel dentro da legenda, e sofreu diversas críticas ao longo de sua carreira política pela forma com que se refere a imigrantes.

Em 2009, ele deixou o Bundestag, retornando apenas em 2021, após a aposentadoria de Merkel. Merz nunca ocupou um cargo de gestão pública.

Considerado um "ultraconservador", Merz promete focar seu governo em cortes de impostos, desregulação da economia e incentivos para empregos. Também defende uma postura mais incisiva da Alemanha na defesa da Ucrânia.

<><> Robert Habeck (Partido Verde)

O atual vice-chanceler federal e ministro da Economia, Robert Habeck, é o candidato dos Verdes. Com a legenda em quarto lugar nas intenções de voto, é improvável que o político de 55 anos se torne o próximo chefe de governo alemão, e sua candidatura é vista como uma tentativa dos Verdes de assegurar espaço na próxima coalizão.

Em entrevista à DW, Habeck mostrou-se profundamente desiludido com a atual situação política da Alemanha, mas defendeu o papel de seu partido no governo. "Nesta legislatura, nós 'limpamos' a energia, ela está mais verde; na próxima legislatura vamos torná-la barata. Criamos precondições para a eletromobilidade, postos de abastecimento; na próxima legislatura automóveis elétricos com que se pode ganhar dinheiro passarão a ser parte do sistema energético", afirmou.

Ele também defendeu uma moradia mais acessível. "E vamos apresentar essa oferta, de A a Z, e aí tenho certeza de que alcançaremos um resultado eleitoral excelente."

 

Fonte: DW Brasil

 

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