sexta-feira, 1 de novembro de 2024

Cirurgias ambulatoriais podem ser alternativa para redução de custos e diminuição de filas de espera

Procedimentos cirúrgicos frequentemente necessitam de recuperação dentro do ambiente hospitalar. No entanto, existe um grande número de cirurgias que podem ser realizadas em modelo ambulatorial, sem necessidade de internação. As cirurgias ambulatoriais são amplamente adotadas em diversos países e de tempos em tempos surgem iniciativas no Brasil por serem uma alternativa mais custo-efetiva no setor hospitalar. Segundo estudo da Associação de Centros Cirúrgicos Ambulatoriais dos Estados Unidos, até 2028, 85% dos procedimentos poderão ser realizados em regime ambulatorial com o avanço da medicina.

Diferente de pequenas cirurgias que podem ser realizadas em consultórios médicos, as cirurgias ambulatoriais atendem diversas especialidades. Entre os procedimentos mais realizados destacam-se cirurgias oftalmológicas, otorrinolaringológicas, ressecção de tumores, biópsias e cirurgias pouco invasivas. Além disso, podem ser realizadas operações mais complexas como implantação de marcapassos cardíacos, válvulas e intervenções ortopédicas.

As cirurgias ambulatoriais podem ser feitas em hospitais gerais ou em Unidades de Cirurgia Ambulatorial (UCAs), também conhecidas como hospitais-dia. As UCAs requerem a permanência do paciente por um período máximo de 12 horas e são equipadas da mesma forma que um hospital convencional. Estes estabelecimentos também são projetados para oferecer um circuito de cuidados pré e pós operatórios que permitem que o paciente receba alta no mesmo dia.

Países como Estados Unidos, Canadá e Reino Unido lideram o mercado com modelos de cirurgia ambulatorial bem elaborados, com regras bem estabelecidas, protocolos rigorosos de segurança e integração tecnológica avançada. Esse tipo de procedimento também tem se espalhado em países em desenvolvimento como México, Índia e China.

No Brasil, algumas instituições já investem na área. Em abril deste ano, por exemplo, o Hospital Sírio-Libanês destinou R$ 150 milhões para a expansão das suas instalações ambulatoriais com a construção de uma nova unidade que vai funcionar como hospital-dia. De acordo com o diretor médico adjunto do Centro Cirúrgico do Hospital Sírio-Libanês, Sérgio Arap, a pandemia da Covid-19 acarretou uma mudança no comportamento hospitalar e muitos pacientes passaram a preferir centros ambulatoriais para evitar hospitais com alta ocupação e limitações no atendimento de consultas, exames e cirurgias.

“A migração de tratamentos mais invasivos, que antes exigiam internação, para procedimentos menos complexos que oferecem o mesmo resultado é uma tendência mundial. Entre os benefícios estão processos mais ágeis, sem desperdício de tempo e que proporcionam uma experiência mais agradável durante a jornada do paciente”, afirma o diretor.

•        Diminuição de gastos e aumento de procedimentos

De acordo com a Sociedade Brasileira de Cirurgia Ambulatorial (Sobracam), o modelo ambulatorial traz diversas vantagens para os pacientes como maior suporte familiar, menor risco de infecções hospitalares, redução do estresse e ansiedade e maior conveniência ao permitir um retorno mais rápido à rotina. Além disso, também podem ser uma alternativa para reduzir custos. Segundo dados obtidos através de consulta no DataSUS, entre janeiro e julho deste ano o SUS teve mais de dois milhões e 900 mil pacientes internados em clínicas cirúrgicas, o que gerou um gasto de mais de R$7 bilhões. Em contrapartida, foram cerca de 134 mil internações em clínicas cirúrgicas ambulatoriais (com média de menos de um dia de permanência) que custaram em torno de R$113 milhões.

“Há uma redução substancial de custos devido à eliminação de despesas como diárias hospitalares, UTI, alimentação e cuidados de enfermagem 24 horas. A menor taxa de complicações e infecções hospitalares associadas a este modelo resulta em menos readmissões e tratamentos adicionais, o que também se traduz em economia a longo prazo”, explica o presidente executivo da Sobracam, Fabrício Galvão.

A expansão do modelo ambulatorial também pode diminuir as filas de espera por cirurgias do SUS. Uma das estratégias adotadas pela Prefeitura de São Paulo para reduzir a espera pelos procedimentos cirúrgicos de baixa e média complexidade na cidade foi a ampliação dos hospitais-dia. Como parte do Programa “Avança Saúde – Cirurgias e Exames”, em 2021, a Secretaria Municipal de Saúde ampliou o horário de funcionamento de 12 dos 17 hospitais dia da cidade para funcionarem 24 horas. Isso gerou um crescimento de 85% nos procedimentos cirúrgicos realizados nesses estabelecimentos em relação a 2019.

Segundo a Prefeitura, somente em hospitais-dia já foram realizados mais de 330 mil procedimentos ambulatoriais e 50 mil cirurgias em 2024. Em nota, a Secretaria de Saúde da cidade afirmou que o investimento no modelo “aumentou a oferta de cirurgias nestas unidades e trouxe a possibilidade de realizar cirurgias de média complexidade que até então só eram realizadas em hospitais, como colecistectomias, laqueaduras, histerectomia, cálculo urinário, incontinência urinária, entre outras”.

Na visão de Arap, do Sírio-Libanês, o investimento em hospitais-dia também gera maior rapidez e eficácia nos atendimentos da rede privada: “Procedimentos ambulatoriais realizados dentro de um centro cirúrgico de grande porte competem por horários e salas. Separar esses procedimentos aumenta a disponibilidade de salas para os de maior complexidade.”

Todo centro cirúrgico ambulatorial é submetido às mesmas regras e fiscalizações que os hospitais gerais. Há inclusive obrigatoriedade de possuir uma estrutura de emergência e cuidados intensivos ao paciente, na eventualidade de uma intercorrência, incluindo equipamentos, equipe assistencial e uma estrutura própria ou terceirizada de Unidade de Terapia Intensiva (UTI) móvel.

Apesar das vantagens, o modelo possui algumas limitações. Para a realização de cirurgias ambulatoriais, é preciso levar em consideração as comorbidades e o estilo de vida do paciente, além da viabilidade de acesso entre o local onde o paciente está e o do procedimento, a rede de apoio e a necessidade de estrutura da residência do paciente – que pode variar conforme a operação.

Conforme o presidente da Sobracam, a pré-seleção e avaliação cuidadosa do paciente e suas condições biopsicossociais para admissão garantem as baixas taxas de complicações desse tipo de cirurgia. “Todo esse ambiente de recuperação em casa tem que ser pensado de acordo com o procedimento que foi realizado e de acordo com as melhores recomendações para que essa recuperação seja efetiva”, explica Galvão.

•        Política nacional de cirurgias ambulatoriais

Com o objetivo de expandir o modelo no Brasil, a Sobracam elaborou uma proposta de Política Nacional de Cirurgia Ambulatorial que já foi apresentada ao Congresso Nacional. Conforme a sociedade, o documento já foi enviado para a Comissão de Saúde da Câmara dos Deputados e uma audiência pública para discutir a sua implementação deve ser marcada passado o fim das eleições municipais.

A Política busca fornecer diretrizes para melhorar o acesso e a qualidade das cirurgias ambulatoriais no SUS de forma a reduzir as filas de cirurgias eletivas e permitir que os hospitais gerais concentrem esforços em pacientes que realmente necessitam de internação. De acordo com o documento, “um novo modelo estruturado e sustentável é necessário para substituir ações temporárias e inadequadas como os mutirões de cirurgias, que não solucionam de forma permanente os problemas existentes”.

A proposta sugere a integração de UCAs com Equipes de Saúde da Família e outros programas já existentes SUS, como o Serviço Móvel de Urgência (SAMU), as Unidades de Pronto-Atendimento (UPA) e atenção odontológica, assim como hospitais de referência. Além disso, a política também propõe criar plataformas de treinamento e educação para formação de equipes multidisciplinares e a estruturação de diferentes modelos e normas para as UCAs.

“Hoje vemos uma subutilização grande do sistema ambulatorial e esse material é uma provocação inicial aos entes públicos para que pensem no modelo como algo consistente. Essas propostas criam um ambiente propício para o crescimento sustentável, melhorando a eficiência do sistema de saúde e a experiência do paciente”, relata Galvão.

Em paralelo à discussão da política, a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) analisa a viabilidade de planos de saúde ambulatoriais sem cobertura de internações de emergência por até 24h. Atualmente, esse tipo de cobertura existe no mercado, mas é pouco ofertada devido ao alto risco de judicialização e possíveis complicações caso o paciente precise ficar no hospital mais tempo.

O presidente da Sobracam afirma que existem lados positivos na proposta para o setor de cirurgias ambulatoriais e acredita que seria um estímulo para o desenvolvimento de serviços ambulatoriais mais eficientes, incluindo procedimentos cirúrgicos: “Esse cenário é favorável para impulsionar o modelo cirúrgico ambulatorial, mas é fundamental que qualquer nova regulamentação busque equilibrar os interesses das operadoras, profissionais de saúde e, sobretudo, dos pacientes, visando criar um mercado de saúde mais competitivo, acessível e seguro.”

 

Fonte: Futuro da Saúde

 

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