quarta-feira, 6 de novembro de 2024

Caixa Asset: Presidente interino é sócio de ex-assessor de Arthur Lira que foi alvo da PF

Nomeado na última sexta-feira (1º/11) para assumir interinamente a presidência da Caixa Asset, braço de gestão de fundos de investimento da Caixa Econômica Federal, Heitor Souza Cunha é sócio, na LF Consultoria, de Luciano Ferreira Cavalcante, ex-assessor do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL). A empresa tem sede no Lago Sul, em Brasília.

Presidente do União Brasil de Alagoas, Luciano Cavalcante foi alvo da Operação Hefesto, da Polícia Federal, desencadeada em junho de 2023 para investigar um suposto esquema de desvio de dinheiro na compra de kits de robótica para a rede alagoana de ensino com recursos do Ministério da Educação. O inquérito foi trancado e arquivado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes em setembro de 2023, sob o argumento de que houve “usurpação de competência” do STF, após a Polícia Federal (PF) ter encontrado indícios de suposta participação do deputado Lira no esquema.

A Agência Pública esteve no endereço da LF Consultoria no Lago Sul, na manhã desta segunda-feira (4). Uma secretária recebeu a reportagem e confirmou que a empresa funciona no local. Disse também que Cavalcante e Cunha frequentam o escritório “esporadicamente”. No momento em que a reportagem visitou o local, ela informou que estaria sozinha na empresa.

Questionada sobre o site com a relação dos serviços prestados pela companhia, a funcionária indicou o site da empresa, mas o endereço exibia um nome diferente: FCC Relações Governamentais. Entre as atividades informadas, destaca-se a indicação de que faz “incidência política”. “Somos uma empresa de relações governamentais especializada na defesa de interesses em ambientes regulatórios complexos”, ressalta a empresa no portal ao indicar fazer lobby junto ao governo e Congresso. “Nos Poderes Legislativo e Executivo, identificamos tendências e desenvolvemos estratégias para a defesa de interesses”, resume.

No mesmo endereço, funciona também o escritório Maurício Carvalho Advogados, que pertence ao advogado do deputado federal Arthur Lira, Luiz Maurício Carvalho e Silva. Ele informou à Pública que apenas divide o imóvel com a LF Consultoria e que as empresas não têm relação. “Não tem nenhuma relação, é só um rateio de espaço físico”, afirmou Carvalho: “O Luciano é meu amigo de muitos anos já”.

Ex-assessor jurídico da Codevasf, Carvalho também informa no portal de sua empresa de advocacia que atua em relações governamentais e public affairs (assuntos públicos), “perante os tomadores de decisão do Congresso Nacional e Poder Executivo”.

O endereço divulgado pela FCC e pelo escritório Maurício Carvalho Advogados é o mesmo registrado na Junta Comercial do Distrito Federal como sendo a sede da LF Consultoria.

A reportagem deixou o contato com a recepcionista do local para que Luciano e Heitor retornassem. Enviamos os questionamentos para eles por meio de correio eletrônico, mas não obtivemos retorno até a publicação.

Procurada, a Caixa disse que “reforça o compromisso com as melhores práticas de governança e integridade. A instituição adota mecanismos de compliance, estabelecendo diretrizes que visam identificar e mitigar conflito de interesse de seus empregados, assegurando a conformidade com as normas e valores que regem a organização.”

¨      Ascensão na Caixa e parceria recente

Luciano Cavalcante fundou a LF Consultoria em 16 de junho de 2023, apenas 15 dias após deflagrada a operação da PF. Conforme dados da Junta Comercial, a empresa tem capital social de R$ 100 mil e atua com gestão empresarial, publicidade, atividades de intermediação e agenciamento de serviços e negócios.

Cavalcante, que possui 80% das cotas, administra a firma, de acordo com os registros públicos. Cunha detém 20% das cotas desde 10 de abril deste ano, quando ainda ocupava o cargo de consultor de dirigentes na Caixa Asset. Dois meses depois, em 4 de junho, ele tomou posse como diretor executivo da diretoria de Distribuição e Produto. Desde a sexta passada, responde interinamente pela presidência da Caixa Asset enquanto ocorre a seleção do novo dirigente.

A Caixa Asset foi criada em 2021 na gestão de Pedro Guimarães, durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). Cunha assumiu a vaga de Pablo Sarmento, destituído do cargo após uma série de denúncias de abuso de poder que estão sendo apuradas pela corregedoria interna, conforme revelou a coluna da jornalista Malu Gaspar no jornal O Globo.

Sarmento também terá de responder sobre a demissão de três servidores que se posicionaram contra uma operação de R$ 500 milhões com o Banco Master, que virou alvo do Tribunal de Contas da União (TCU).

No currículo publicado no site da Caixa Asset, Heitor Souza Cunha informa que atuou como diretor da rede de varejo da Caixa entre 2021 e 2022, foi superintendente nacional do crédito e atuou em diversas funções de gestão na rede de varejo. Ele diz que foi responsável pela liderança da rede durante o pagamento do auxílio emergencial e que criou o produto antecipação saque-aniversário, “tornando a segunda maior carteira de crédito comercial da Caixa”.

Desde novembro do ano passado, o banco é dirigido por Carlos Vieira, indicado à presidência da Caixa por Arthur Lira, após acordo do parlamentar com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

¨      Luciano Cavalcante e uma rede familiar de consultorias

Fora a LF Consultoria, Luciano Cavalcante possui outras duas empresas do mesmo ramo em seu nome: a LDL Serviços e Consultoria Ltda. e a L. F. Cavalcante Ltda. Além disso, as atividades da empresa mantida com Heitor Cunha coincidem com o ramo de atuação da empresa da filha de Luciano Cavalcante e do filho do deputado Arthur Lira, a Omnia 360, que faz representação de mídia e fatura uma porcentagem dos negócios firmados para seus clientes com as agências de publicidade contratadas pelo governo.

A LDL Serviços e Consultoria, fundada em março do ano passado, tem sede em Maceió e tem entre os sócios o vice-presidente do União Brasil de Alagoas, Luiz Antonio da Silva Ferreira Neto, e o empresário Davi Toledo Tenório de Amorim. O endereço da companhia foi alvo de busca e apreensão na Operação Hefesto, conforme mostrou o portal Metrópoles em junho de 2023.

Amorim tem sociedade também com o policial civil Murilo Sérgio Jucá Nogueira, apontado pela PF como dono do cofre em que foram apreendidos R$ 4 milhões durante a Operação Hefesto. O sócio de Cavalcante e o policial têm negócios juntos na Ancol Anjos Engenharia Indústria.

Já a L. F. Cavalcante Ltda. foi aberta em setembro de 2023, em São Paulo, em um apartamento na rua Serra de Jairé, bairro Quarta Parada. Além de atividades de consultoria em gestão empresarial, de intermediação e agenciamento de serviços e negócios em geral, a empresa também presta “atividades auxiliares dos seguros, da previdência complementar e dos planos de saúde”, conforme registro na Receita Federal.

A relação de Luciano Cavalcante com a Omnia 360 é mais indireta. A filha dele, Maria Luiza Ferreira Cavalcante, e Arthur Lira Filho, filho do presidente da Câmara, Arthur Lira, são sócios na companhia de “representação de veículos de mídia” que também tem entre suas atividades registradas na Junta Comercial a “consultoria em publicidade”.

Entre as firmas representadas pela Omnia estão a RZK Digital e a OPL Digital, que faturaram R$ 5 milhões, entre julho de 2021 e novembro de 2023, com campanhas da Caixa, mantida sob a influência de Arthur Lira após negociação com o governo petista, conforme revelou a Pública.

Maria, mais conhecida como Malu, ainda é sócia da Rocket Digital junto com Rodolfo Darakdjian – proprietário da OPL Digital –, que também presta serviços para a estatal, de acordo com os dados divulgados pela Pública.

Segundo reportagem da Folha de S.Paulo, a OPL Digital e a RZK Digital também atuaram em campanhas publicitárias da Secretaria de Comunicação Social (Secom), dos ministérios da Saúde e Educação e do Banco do Brasil.

 

¨      “Um escândalo jamais visto”, afirma Giannazi sobre os leilões de escolas estaduais em São Paulo

O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), realizou o  leilão do segundo lote da Parceria Público-Privada (PPP) Novas Escolas, que privatiza a construção e gestão de unidades de ensino no interior do estado na última segunda-feira (4).

Vencedor do leilão, o Consórcio SP + Escolas terá de construir e administrar 16 escolas públicas em sistema de Parcerias Público-Privadas e, para tanto, ofereceu a proposta mensal de R$ 11,5 milhões.  

“É um escândalo jamais visto um governador leiloar escolas públicas na Bolsa de Valores de São Paulo, na B3. Isso é um escândalo, é algo inaceitável, é revoltante você ver algo acontecendo,  porque nós estávamos acostumados aqui em São Paulo com a privataria tucana, que já era terrível. Agora, nós temos a privataria bolsotucana”, afirmou o deputado estadual e diretor de escola pública, Carlos Giannazi (PSOL). 

Convidado do programa TVGGN 20H, Giannazi chamou a atenção ainda para o fato de que o edital permitia a participação de empresas estrangeiras. “Olha só a gravidade da situação. Isso significa, na prática, que o dinheiro do orçamento público do povo do Estado de São Paulo seria direcionado também para empresas internacionais, dinheiro do orçamento da educação.”

Parte superior do formulário

Parte inferior do formulário

Para o deputado estadual, trata-se de um projeto nefasto que complementa o programa de privatizações de Tarcísio, que já entregou à iniciativa privada a Sabesp, linhas da CPTM e metrô, além da Fundação Casa. 

“Ele está privatizando também áreas de pesquisa do Estado de São Paulo, na Secretaria da Agricultura. Estou acompanhando o movimento lá em Campinas,  no Instituto Agronômico de Campinas. Ele está querendo vender uma fazenda, a Fazenda Elisa, que é uma área de pesquisa importantíssima da agricultura, do café. Então, ele vai vender uma, já em Pindamonhangaba”, ressalta o entrevistado. 

Giannazi lembra que as privatizações só foram possíveis graças a uma lei aprovada por João Doria, para permitir a venda de parques estaduais. 

“Está em curso no Estado de São Paulo a maior privataria de todos os tempos da história do Brasil, porque são muitos ativos, muitos equipamentos públicos que estão na lista. Inclusive, no semestre passado, nós tínhamos denunciado um site, não sei se vocês acompanharam, que ele estava vendendo várias áreas públicas do Estado de São Paulo. Aparecia até um prédio da rota, um prédio da Assembleia Legislativa, que tinha preço. Era como se fosse uma imobiliária. Nós o denunciamos e ele retirou do ar.”

<><> Reação

Para pôr fim ao projeto de venda do patrimônio e empresas públicas do Estado é necessária a mobilização popular. Porém, o paulista não parece engajado com a causa, que se torna mote apenas de movimentos sociais e sindicatos.   

“O sindicato APEOESP recorreu, na semana passada, contra o primeiro leilão. Ganhou, por um dia, uma liminar de um juiz. Imediatamente, o Tarcísio convenceu o presidente do Tribunal de Justiça (TJ) a caçar a liminar. Durou um dia a nossa vitória sindical”, lamenta o deputado estadual.

O que a população talvez não saiba ainda é que a venda de escolas nada mais é, segundo o entrevistado, que a entrega de dinheiro da educação para a iniciativa privada, especialmente porque empresas privadas se guiam pelo lucro, não pela qualidade do serviço prestado aos estudantes. 

“A empresa ganhadora vai receber do Estado, depois que ela construída a escola, R$ 11 milhões por mês. Para fazer a manutenção, pagar os funcionários que ela contratar. Todo mês ela vai ganhar R$ 11 milhões. O outro leilão foi um preço acima, acho que de R$ 14 ou R$ 15 milhões por mês. E é o dinheiro público que vai enriquecer essas empresas, que não vão oferecer qualidade, que vão reduzir o número de funcionários, porque elas precisam ter lucro, logicamente. Então, ela reduz o número de funcionários e compra material mais barato para a escola.” 

A precarização dos serviços nas escolas estaduais já é uma realidade, tendo em vista que as áreas de alimentação e limpeza das escolas estaduais já são de responsabilidade de terceirizadas. Como consequência, são frequentes as greves dos funcionários, que reivindicam os pagamentos atrasados. 

Existe, ainda, a participação do crime organizado na gestão das creches da Prefeitura, segundo o convidado. 

“O crime organizado controla algumas delas em algumas regiões. Inclusive, existe a marca das creches que é investigada pelo Ministério Público,  pela Polícia Federal, que envolve o [prefeito] Ricardo Nunes. Tem aí uma investigação também sobre o crime organizado controlando essas empresas.”

<><> Projeto pedagógico

Ainda que a proposta inicial do leilão seja conceder à iniciativa privada apenas a gestão das escolas públicas, para Giannazi a entrega também da área pedagógica é uma questão de tempo, especialmente porque o atual secretário da Educação paulista, Renato Feder, é dono da empresa Multi e já respondeu pelos colégios no Paraná. 

“A Multi vende produtos eletrônicos para o próprio Estado, tem um contrato de R$ 200 milhões com a Secretaria da Educação,  da qual ele é o secretário. Ele paga a própria empresa. É uma contradição enorme. É um conflito de interesse jamais visto”, aponta o convidado.

No Paraná, onde as escolas foram entregues para empresas, os professores são contratados sem concurso público. “Então, é a porta de entrada. A privatização desse setor já é a porta de entrada para a privatização em geral. Nós, que somos da educação, entendemos que não tem como dividir uma escola em parte administrativa, em parte pedagógica. A escola é uma só. Tudo que acontece na escola tem a ver com o projeto pedagógico. A merendeira, que vai ser especializada, ela é uma educadora, porque ela se relaciona com os alunos. Ela é incluída no projeto pedagógico da escola, o pessoal da alimentação, o vigia da escola, o pessoal da limpeza também interage.  Então, tudo é educação dentro de uma escola pública, uma escola particular”, conclui Giannazi. 

 

Fonte: Por Alice Maciel, da Agência Pública/Jornal GGN

 

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