sexta-feira, 29 de novembro de 2024

Arrocho do governo  Lula deverá chegar a R$ 70 bi em 2 anos, com limitação do abono e imposto para ricos

O pacote de contenção de gastos do governo Luiz Inácio Lula da Silva deverá prever uma economia de R$ 70 bilhões nas contas públicas em 2025 e 2026.

A proposta será anunciada na noite desta quarta-feira (27) em um pronunciamento em rede nacional do ministro da Fazenda, Fernando Haddad.

Na gravação, Haddad não deve entrar num detalhamento profundo das medidas, que serão esmiuçadas amanhã, em entrevista coletiva. O ministro, no entanto, deve apresentar uma ideia geral do pacote e antecipar alguns pontos fundamentais.

As duas medidas vista pelo governo como mais impopulares para os eleitores de Lula têm relação com o reajuste do salário mínimo e o abono salarial (veja mais abaixo). Por outro lado, alguns tópicos têm apelo popular, no entendimento do governo, como a ampliação da faixa de isenção do Imposto de Renda.

<><> Salário mínimo

O reajuste do salário mínimo estará limitado a 2,5% ao ano, além da inflação. Na regra de hoje de reajuste, o aumento é calculado considerando o INPC de 12 meses (dezembro do ano anterior a novembro do ano vigente) somado ao aumento do PIB do ano retrasado.

Isso quer dizer que, se o PIB neste e nos próximos anos crescer mais de 2,5%, o reajuste com as novas regras será menor do que o previsto atualmente.

Outra medida impopular será uma restrição maior ao benefício do abono salarial, uma espécie de 14° salário pago a trabalhadores que recebem até dois salários mínimos por mês - R$ 2.824. A proposta que o governo vai enviar ao Congresso autoriza o abono para quem recebe até R$ 2.640.

Além disso, o pacote prevê que, num prazo de alguns anos, o abono seja pago para quem receber até um salário mínimo e meio por mês.

<><> Faixa de isenção do IR

Temendo a reação da própria base e do seu eleitorado mais pobre, Lula determinou a Haddad a inclusão de medidas para compensar os pontos impopulares. O governo, portanto, vai encaminhar ao Congresso uma proposta para dar isenção no Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil.

A medida foi uma das principais promessas de campanha, mas a equipe econômica sempre encontrou dificuldades para viabilizá-la. O impacto nas contas públicas deve ficar entre R$ 35 bilhões a R$ 50 bilhões. Para compensar a perda de arrecadação, o governo irá propor o aumento de imposto para quem recebe mais de R$ 50 mil por mês.

Haddad não deve mencionar no pronunciamento como será feita essa taxação, mas, segundo fontes do Planalto, deverá ser em cima de lucros e dividendos.

O ministro vai reforçar ainda a necessidade de combater fraudes na concessão de benefícios sociais, como o Bolsa Família e o BPC (Benefício de Prestação Continuada). Segundo auxiliares de Lula, o governo fará um chamado para que os beneficiários atualizem os seus cadastros, caso não tenham feito nos últimos 24 meses.

<><> Aposentadoria de militares

Haddad também irá mencionar as medidas que alteram as regras da aposentadoria dos militares. O governo vai estabelecer uma idade mínima, que deve ser de 55 anos, com uma regra de transição, que prevê o escalonamento das aposentadorias. Outra medida é acabar com as pensões por morte ficta, quando a família de um militar expulso das corporações recebe uma pensão.

<><> Supersalários

O ministro vai abordar no pronunciamento o fim dos supersalários do funcionalismo público. Esse ponto estará no conjunto de propostas que o governo enviará ao Congresso. O pacote vai envolver ao menos uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC), um Projeto de Lei Complementar (PLP) e outros projetos de lei.

¨      Deputados de extrema direita  recolhem assinaturas para PEC de corte de gastos alternativa à do governo, com mais arrocho

Os deputados Pedro Paulo (PSD-RJ), Kim Kataguiri (União-SP) e Julio Lopes (PP-RJ) começaram nesta quarta-feira a recolher assinaturas para protocolar uma PEC “alternativa” ao corte de gastos do governo.

Para ser apresentada formalmente, são necessárias pelo menos 171 assinaturas dos 513 deputados.

A proposta prevê uma trava para os ganhos acima do teto do funcionalismo público, o que não existe atualmente, e propõe desvincular benefícios previdenciários do salário mínimo.

“Esta PEC da soberania e do equilíbrio fiscal será em algum momento do Brasil implementada. [...] Quanto mais tempo levarmos para implementar isso, mais grave serão as medidas necessárias para sanear o país”, afirmou Lopes.

Segundo os parlamentares, o texto foi construído após a apresentação de uma projeção feita por servidores da Câmara sobre o crescimento das despesas no Orçamento da União ao longo dos próximos anos.

“A gente precisa estabilizar a dívida pública, que cresceu desde dezembro de 2022 até agora, mais 7% por cento do PIB. Nós precisamos fazer com que a política monetária dialogue com a política fiscal”, disse Pedro Paulo.

<><> Supersalários

Hoje, servidores públicos não podem ter vencimentos acima do salário de um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), que é de R$ 44.008,52.

Na prática, no entanto, esse teto é extrapolado, porque não são computadas as parcelas de caráter indenizatório.

A PEC limita o somatório de todas as parcelas de caráter indenizatório a 30% do subsídio mensal de magistrados do STF e proíbe o pagamento retroativo dessas parcelas.

<><> Emendas parlamentares

O texto propõe uma correção do valor total previsto para emendas parlamentares correspondente ao percentual máximo das despesas primárias discricionárias (não obrigatórias) do Poder Executivo.

Esse percentual, pelo projeto, seria definido em lei complementar, que deve ser aprovada pelo Congresso.

Nesta terça-feira, no entanto, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sancionou uma lei que já prevê regras para a correção do valor anual das emendas parlamentares.

Em acordo costurado com o Supremo, a regra prevê que o limite das emendas individuais e de bancadas estaduais deve seguir as regras do Novo Arcabouço Fiscal a partir de 2026. As emendas de comissão serão corrigidas pela inflação.

<><> Piso da saúde, educação e Fundeb

A PEC revoga o dispositivo que obriga a União a aplicar, no mínimo, 15% da receita corrente líquida do respectivo exercício financeiro em ações e serviços públicos de saúde.

Conforme o texto, o mínimo que a União deverá aplicar em saúde deverá ser definido em lei complementar.

O texto retira ainda a obrigatoriedade da União de aplicar pelo menos 18% do arrecadado com impostos em educação e define que o patamar mínimo seja definido por projeto de lei complementar.

A complementação mínima da União para o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), atualmente em 23% do fundo, também deixa de existir e passa a ser definida por lei complementar.

<<<> Salário mínimo

O texto discutido pelos parlamentares prevê a criação de uma câmara setorial permanente para formular uma política de valorização do salário mínimo a fim de alcançar um "desenvolvimento socioeconômico de longo prazo".

Também estabelece que o mínimo será corrigido somente pela inflação entre 2026 e 2031. Após esse período, o presidente da República poderá enviar um projeto para revisar os mecanismos de correção, seguindo as regras do arcabouço fiscal.

A proposta diverge do que é atualmente discutido pela equipe econômica do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

O Planalto avalia vincular a correção do salário mínimo à inflação mais a variação fiscal do arcabouço – entre 0,6% e 2,5%.

Um dos autores, o deputado Kim Kataguiri afirma que, se levada à frente, a proposta do governo pode tornar inviável, até 2028, o pagamento da aposentadoria via Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e do Benefício de Prestação Continuada (BPC), atualmente vinculados ao salário mínimo.

<><> Previdência e BPC

O texto desvincula do salário mínimo benefícios previdenciários do Regime Geral de Previdência (RGPS), BPC e abono salarial.

Atualmente, a Constituição garante que nenhum benefício que substitua o salário de contribuição ou o rendimento do trabalho do segurado terá valor mensal inferior ao salário mínimo.

No caso do BPC, a Carta Magna determina o pagamento de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de se manter ou ser mantido por sua família.

 

¨      Corte de gastos na Defesa não afeta Lula, pois militares têm 'gordura' para queimar, diz analista

Em entrevista à Sputnik Brasil, especialistas analisam se a inclusão da Defesa nas medidas de corte de gastos pode afetar a relação dos militares com Lula, especialmente após vir à tona o plano de assassinato do presidente, envolvendo generais da reserva.

Em sua meta para zerar o déficit fiscal, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva solicitou ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, a inclusão do Ministério da Defesa nas medidas de corte de gastos.

Na mira do governo está a previdência dos militares, que no ano passado, segundo relatório do Tribunal de Contas da União (TCU), causou um déficit de R$ 49,7 bilhões aos cofres públicos.

As mudanças se dariam em quatro eixos: aumentar de 50 para 55 anos a idade mínima para um militar ser transferido para a reserva; banir a chamada morte ficta, quando um militar que, por algum motivo, foi expulso da corporação é equiparado a um militar morto, podendo assim manter o pagamento de pensão a seus familiares — nesses casos, a morte ficta seria substituída pelo auxílio reclusão; restringir a transferência de pensão, limitando o benefício a cônjuges e filhos, e proibindo a transferência aos pais ou irmãos; e levar os militares a contribuírem com 3,5% de suas remunerações para o Fundo de Saúde até janeiro de 2026.

Também estão sendo discutidas formas de alterar a pensão vitalícia concedida a filhas de militares. O benefício foi extinto em 2001, sendo mantido a militares que entraram na corporação até o ano 2000.

As medidas ainda estão sendo discutidas entre as pastas da Fazenda e da Defesa, mas os militares já sinalizaram que aceitariam mudanças em alguns benefícios.

Em entrevista à Sputnik Brasil, especialistas analisam como as mudanças propostas podem afetar a relação de Lula com militares, sobretudo após a descoberta do plano de assassinato, envolvendo militares, de Lula, seu vice, Geraldo Alckmin, e Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal.

Marcus Ianoni, chefe do Departamento de Ciência Política da Universidade Federal Fluminense (UFF), considera que as mudanças não vão acirrar a relação do governo com as Forças Armadas, pois são medidas que atingirão vários setores.

"E no caso dos militares, [as medidas de corte] estão sendo negociadas com eles pelo ministro da Defesa", avalia.

Por sua vez, Adriana Marques, professora do curso de defesa e gestão estratégica internacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e coordenadora do Observatório do Ministério da Defesa (OMD) e do Laboratório de Estudos de Segurança e Defesa (LESD), afirma que "as Forças Amadas foram muito eficientes no sentido de garantir o máximo de benesses financeiras que puderam acumular durante o governo [do ex-presidente Jair] Bolsonaro".

"Então eles têm bastante 'gordura' para queimar. Pelo que eu vi até agora das sugestões da contribuição, do sacrifício que eles dizem que vão dar para esse ajuste fiscal do governo, as coisas que eles concordaram em cortar, na verdade, são coisas que não deviam existir, que nenhuma outra profissão, nenhum outro tipo de servidor público tem esse tipo de benefício. Por exemplo, o fato de a pessoa ser expulsa da corporação e a sua família continuar recebendo um salário que é muito maior do que o da maioria da população brasileira", observa.

Nesse contexto, ela acrescenta que os militares vão manter muitos benefícios, abrindo mão daqueles "que chocam mais a opinião pública", por isso a relação com Lula não deve ser impactada.

"Isso não vai impactar em nada na relação com Lula. Muito pelo contrário, eles vão dizer que estão fazendo a parte deles, sem ter nenhuma perda salarial, nenhuma perda significativa, ao passo que os outros servidores públicos todos foram penalizados nos últimos anos com as reformas previdenciárias."

Além do corte de gastos, o governo Lula também mira cessar a politização ideológica nas Forças Armadas. Questionado sobre o fato, Ianoni afirma que a polarização política promovida pela direita radical "se caracterizou, entre outros elementos, pela demanda por uma maior participação militar na política". Nesse contexto, os militares ganharam espaço na política impulsionados pela retórica anticomunista, que "serviu de ideologia para esse apelo".

"Os militares ganharam espaço na política sobretudo desde 2018, quando chegaram a pressionar para que Lula não recebesse habeas corpus e, portanto, ficasse impedido de concorrer às eleições presidenciais daquele ano. Em seguida, a partir de 2019, muitos militares da reserva e até da ativa participaram no governo Bolsonaro."

Ele enfatiza que para frear a politização ideológica das Forças Armadas o governo Lula formulou um projeto propondo que o militar da ativa que quiser disputar eleições ou participar de algum cargo político, como ministro, por exemplo, terá que ir para a reserva ou se desligar das Forças Armadas. Mas esse projeto, acrescenta o especialista, "está parado, não foi para frente".

"Porém, não cabe apenas ao Executivo frear a politização ideológica das Forças Armadas, mas também ao Legislativo e ao Judiciário. Vejo que quem mais está tentando enfrentar o ativismo político antidemocrático de alguns militares é o STF, sobretudo agora com o relatório enviado a esse poder pela Polícia Federal, cujo sigilo foi retirado e o documento de mais de 800 páginas foi enviado à PGR, para que a denúncia dos indiciados seja ou não feita", afirma Ianoni.

Adriana Marques afirma que essa tendência é uma conjunção de fatores, que remete ao histórico de intervenções militares na política brasileira e à ascensão a direita radical no Brasil e no mundo. Ela cita como exemplo o caso dos EUA, onde militares, para assumir uma função pública, tinham que estar afastados da profissão, aposentados, por pelo menos dez anos.

"Aí você tem o governo [de Donald] Trump trazendo para o primeiro escalão do seu governo uma série de generais da reserva, obviamente o que fez com que os militares brasileiros se sentissem legitimados para também, com muita desenvoltura, assumir cargos no governo, inclusive cargos para os quais eles não tinham a menor qualificação. Talvez o exemplo mais lapidar seja o do General Pazuello, que nunca tinha ouvido falar do SUS, mas achou que não tinha problema nenhum, era competente para assumir o Ministério da Saúde. Ele e uma série de outros militares que estão aí no inquérito do golpe."

Em dezembro de 2022, antes da posse de Lula, mas já anunciado como futuro ministro da Defesa, José Múcio Monteiro apontou a necessidade de despolitizar as Forças Armadas. Para Marques, a tarefa que Lula passou para Múcio é de apaziguamento, de acomodação do governo com as Forças Armadas, não de despolitização.

"Pelo contrário, uma frase que ele [Múcio] já repetiu várias vezes, de que nós devemos a nossa democracia às Forças Armadas, vai na contramão da ideia de despolitização. Ele está apaziguando, acomodando. O que é uma estratégia que foi utilizada por presidentes durante toda a Nova República, não tem nada de novo nisso. O presidente Lula 3 está repetindo o Lula 1 e 2, que apaziguou também [a relação] com os militares. Nós já vimos no que isso deu. A gente tem 800 e tantas páginas de argumentos para mostrar que essa política de apaziguamento, de pacificação, de acomodacionismo, deu muito errado. Acho que vale uma reflexão para os próximos governos, porque a gente não pode manter esse mesmo padrão de relações civis-militares se a gente quiser ter uma democracia estabelecida de fato no Brasil."

 

Fonte: g1/Sputnik Brasil

 

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