quinta-feira, 31 de outubro de 2024

Diante da omissão do governo da Bahia, povo Pataxó vive sob o signo do medo

Capital imobiliário avança sobre terra ancestrais, últimas remanescentes da Mata Atlântica do litoral baiano. Indígenas lutam para protegê-las, mas são alvos de milícias. Diante da omissão do Estado, buscam apoio político para a autodemarcação, e olha que o atual governador baiano, Jerônimo Rodrigues se apresentou para o eleitorado, como descendente de índios. Imagine se não fosse.

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Na região de Prado, Bahia, a Terra Indígena (TI) Comexatibá enfrenta um cenário alarmante de ocupação ilegal, onde empresários do setor imobiliário, com apoio de políticos locais, avançam sobre o território com o objetivo de construir condomínios e loteamentos. Em meio a pressões pela especulação imobiliária e exploração do solo, a TI Comexatibá se torna alvo de interesses comerciais que visam transformar áreas originalmente destinadas a projetos de reforma agrária em empreendimentos privados. Essa ação não apenas desrespeita a destinação original das terras, mas também coloca em risco um dos últimos remanescentes de Mata Atlântica preservada do litoral baiano.

De acordo com relatos na comunidade, um dos principais nomes associados a essa invasão é o vereador Brenio Pires, que utiliza sua influência política para promover seus empreendimentos na área. A denúncia também aponta a presença de empresários influentes da região, como André Moreira Gama, acusado de ordenar o desmatamento de áreas indígenas, além da extração ilegal de areia, o que ameaça nascentes de água essenciais para o ecossistema local e para as comunidades indígenas.

<><> Ameaças ao Meio Ambiente e ao povo Pataxó

O território em questão serve como área de amortecimento para o Parque Nacional do Descobrimento – uma região reconhecida e nomeada de Maturembá pelo povo Pataxó. Essa área possui grande importância ambiental, protegendo espécies endêmicas da fauna e flora e contribuindo para a regulação climática de toda a região. A ocupação irregular e o desmatamento aumentam os riscos ambientais, intensificando a perda de biodiversidade e comprometendo os recursos naturais dos quais as comunidades indígenas dependem. Dessa forma, a necessidade de preservação ambiental vai além da comunidade local, sendo uma questão de interesse público para a manutenção do equilíbrio ecológico de toda a região.

O povo Pataxó tem lutado incansavelmente para proteger suas terras por meio de autodemarcações, em resposta à ausência de ações efetivas por parte das autoridades federais. A comunidade ressalta que o governo federal, através do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), precisa intervir com urgência para impedir a continuidade das invasões. Além disso, os indígenas reivindicam a celeridade na demarcação da TI Comexatibá para assegurar a integridade de seu território e evitar que as ações de especulação imobiliária continuem a avançar.

<><> Conflitos e histórico de violência

O histórico de conflitos na região é marcado por episódios de violência extrema contra os Pataxó, que resistem há décadas para preservar seu território e modo de vida. Em 2022, o jovem Gustavo Silva da Conceição, de apenas 14 anos, foi assassinado durante um ataque armado à TI Comexatibá, um crime que chocou a comunidade e evidenciou a gravidade das ameaças que os indígenas enfrentam. Os ataques aos Pataxó são frequentemente organizados por grupos locais que defendem a ocupação das terras e utilizam redes sociais para incitar violência contra a comunidade, em uma campanha de intimidação que inclui até membros da segurança pública.

De acordo com lideranças Pataxó, esses ataques são parte de uma campanha sistemática de expulsão dos indígenas de suas terras, executada por uma associação de fazendeiros e empresários que visam transformar o território em áreas de monocultura e condomínios de luxo. A Polícia Federal já classifica essas associações como milícias, que utilizam violência e intimidação para afastar os Pataxó da TI Comexatibá.

“É uma tristeza para nós. Um menino levou um tiro no braço, que saiu do outro lado, e não morreu. Mas o outro correu e levou um tiro na nuca, a uns cem metros de distância. É um serviço profissional, que parece miliciano mesmo”, comentou de uma liderança Pataxó na época do ocorrido, que pede para não ser nominalmente identificado.

<><> Urgência de apoio político para a autodemarcação

Para que o povo Pataxó continue a autodemarcação de suas terras e preserve seu território de invasões, é imprescindível o apoio político de toda a sociedade. A comunidade luta com recursos limitados para proteger suas terras e manter a vigilância constante contra as ameaças de invasores. Nesse contexto, o apoio da sociedade e das instituições é essencial para que a autodemarcação avance e para que os Pataxó consigam proteger a última área de Mata Atlântica preservada no litoral sul da Bahia.

É urgente que o governo federal agilize o processo de demarcação oficial da TI Comexatibá, reconhecendo formalmente o direito dos Pataxó sobre o território. Sem uma intervenção efetiva, a comunidade indígena permanecerá vulnerável, e o risco de destruição ambiental e conflitos violentos continuará a crescer, ameaçando tanto a vida dos Pataxó quanto a preservação de um bioma crucial para o equilíbrio ambiental da região e do país.

 

•        MPF recomenda realização de consulta prévia às comunidades que vivem na região da Resex Corumbau, na Bahia

O Ministério Público Federal (MPF) recomendou às prefeituras de Porto Seguro e Prado, bem como a diversos órgãos públicos, a adoção de todas as medidas necessárias para assegurar a consulta prévia, livre e informada às comunidades tradicionais que vivem na área da Reserva Extrativista (Resex) Marinha do Corumbau, no estado da Bahia. A medida se refere a quaisquer projetos, obras, atividades e empreendimentos que impactem ou tenham potencial para causar impactos às comunidades.

Na recomendação, foi concedido o prazo de 15 dias para que os municípios, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) da Bahia, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), a Superintendência do Patrimônio da União (SPU) e o Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema) informem as medidas adotadas.

O MPF pede, ainda, que os municípios suspendam, imediatamente, todas as licenças e autorizações relacionadas a loteamentos e empreendimentos em áreas da União, para que se adequem à recomendação. A suspensão é indicada para aqueles projetos com potencial de impactar as Unidades de Conservação federais, como a Resex do Corumbau e o Parque Nacional e Histórico do Monte Pascoal.

O documento também destaca a necessidade de se informar a todas as pessoas físicas e jurídicas sobre o risco de transações imobiliárias nessas áreas, que também possuem espaços com preferência legal e constitucional de destinação a povos e comunidades tradicionais locais.

De acordo com a recomendação, assinada pelo procurador da República Ramiro Rockenbach, os municípios devem consultar as comunidades tradicionais para quaisquer eventos de médio e grande porte na Resex, além de elaborar ou aprimorar os regulamentos existentes, observando critérios criados pelos gestores de Unidades de Conservação.

<><> Consulta prévia

O MPF ressalta que o planejamento e a realização do processo de consulta prévia, livre e informada às comunidades deve ser promovido diretamente pelo Poder Público e em momento prévio, renovado a cada geração de novas informações, sendo assegurado de forma livre e garantido de modo informado, ou seja, mediante diálogo. É necessária a implementação de plano de consulta e, ao final, deve ser acolhido o posicionamento da comunidade tradicional impactada.

O órgão acrescenta, ainda, que a consulta prévia, livre e informada é prevista na Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), internalizada pelo Brasil, e não se limita a reuniões pontuais ou audiências públicas. Esse é um procedimento que envolve diálogo intercultural, com diversas fases e reuniões com objetivos específicos, incluindo a própria pactuação do processo (plano de consulta), além de reuniões informativas e internas, sem participação do governo, bem como reuniões deliberativas, entre outras.

<><> Reserva

A Resex do Corumbau foi criada há mais de 20 anos, com o objetivo de garantir a exploração autossustentável e a conservação dos recursos naturais renováveis tradicionalmente utilizados pela população extrativista da área. A população tradicional beneficiária é marcada predominantemente pela etnia Pataxó. A comunidade, que tem no extrativismo pesqueiro sua principal fonte de vida, é composta de cerca de 650 famílias e está distribuída por nove localidades.

A reserva compreende o cinturão pesqueiro entre a Ponta do Espelho, Praia de Coruípe e a Barra do Rio das Ostras e foi classificada como de Extrema Importância Biológica para a conservação da biodiversidade costeira e marinha do Brasil (MMA), abrangendo também ecossistemas de manguezais.

O direito ao território é garantido pela Constituição às comunidades de pescadores artesanais e extrativistas a fim de proteger e preservar sua cultura. A trajetória dessas comunidades fazem parte do patrimônio cultural brasileiro, com suas formas de expressão, modos de criar, fazer e viver, obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais.

 

Fonte: Por Alex Hotz, em Outras Palavras/Ascom MPF-BA

 

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