segunda-feira, 2 de setembro de 2024

Luís Nassif: O que esperar de Galípolo no Banco Central

Gabriel Galípolo não é um mero economista de mercado – embora conheça tudo de mercado. Tem um pensamento multidisciplinar, um conhecimento da economia real, do funcionamento do sistema bancários e dos humores do mercado financeiro. Parte do seu multitalento pode ser conferido em uma série de programas da TV GGN Nova Economia.

O ponto de partida para entender como atuará no mercado está em um dos programas que gravou. O desafio é definir para o Real e para o dólar a mesma taxa de risco. Assim, não haverá volatilidade. Portanto, não se espere dele nenhum enfrentamento do mercado, nem mudanças radicais na política monetária.

Sua estratégia será eliminar, gradativamente, as maiores inconsistências do mercado.

Um dos pontos a ser trabalhado é eliminar o poder excessivo de influência do Boletim Focus. O boletim capta as expectativas de um único agente econômico: o mercado. E se baseia essencialmente em expectativas. Sua ideia será construir outras formas de medir expectativas de outros agentes econômicos. Com isso, diluir parte do poder de cartelização da Faria Lima.

Outra estratégia será acrescentar novas maneiras de previsão da inflação. Hoje em dia, o BC e o mercado se baseiam em um método estocástico de previsão da inflação, que tem a pretensão de analisar a incerteza e a variabilidade dos dados econômicos. É a tal planilha do Ilan Godljan – que me inspirou a criar o termo “cabeças de planilha”.

Essa método funciona como um gatilho para o mercado, independentemente do seu pequeno grau de acerto. Quando uma das variáveis se altera, dispara um sinal que faz com que o mercado inteiro siga a boiada. Porque para o mercado o objetivo não é errar ou acertar, mas tentar reeditar os erros ou acertos do BC. Quando mais métodos de projeção da inflação, haverá uma outra redução do poder de cartel da Faria Lima.

Finalmente, proporá para o governo Lula convencer o fundo soberano de algum país aliado a adquirir um bom volume de títulos pré-fixados do Tesouro para levar até o vencimento. Com isso, diluirá o poder da Faria Lima, que detém 90% da dívida do Tesouro, tornando o mercado de taxas longas uma presa fácil para manipulações.

No dia a dia, o BC se tornará muito mais ativo no mercado de derivativos – onde se formam, de fato, as taxas longas de juros. E é possivel que sejam reeditados instrumentos para atuar de forma mais direta sobre oferta e demanda, como reforçar estoques reguladores de alimentos.

Não há sinais, ainda, sobre como pretende atuar sobre os spreads bancários. Mas, sem grandes revoluções, colocará um mínimo de racionalidade no mercado. E terá nos grandes bancos comerciais um aliado relevante. Há enorme resistência dos bancões aos movimentos especulativos de Roberto Campos Neto, que visavam apenas beneficiar operadores de mercado.

 

•        Nova política monetária americana será maior desafio de Galípolo. Por Cesar Fonseca

O futuro presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, indicado hoje pelo presidente Lula, terá como principal desafio em seu cargo a nova política monetária americana, pautada em juros mais baixos para que os Estados Unidos reduzam os gastos com a dívida pública, que alcança a casa dos 35 trilhões de dólares.

O mercado se manteve reticente com o anúncio, apoiando, mas com o pé atrás, razão pela qual o dólar terminou o dia em alta, a R$ 5,55.

O fato é que o desafio externo domina o cenário em que Washington quer pagar menos juros para a dívida americana, que afeta a saúde do império e deixa o mercado financeiro mundial de mau humor, tornando-o propenso à especulação e às corridas financeiras, como aconteceu há cerca de um mês, em um semi-terremoto especulativo, originado no Japão.

Washington decidiu trabalhar com juros mais baixos não apenas para pagar menos juros aos credores e apaziguar os jogadores no mercado financeiro, mas também para reduzir o custo de produção do capitalismo produtivo americano e competir com a China.

Os chineses se tornaram os maiores adversários dos americanos porque trabalham com juros baixos oferecidos por bancos públicos de investimento, para impulsionar o capitalismo chinês em escala global.

Os juros americanos estavam crescendo por conta da inflação em alta, potencializando um efeito político capaz de derrotar o governo democrata de Biden, se os Estados Unidos perderem mercado para a China e forem obrigados a suportar o aumento do desemprego.

<><> Guerra econômica em cena

Uma guerra econômica, portanto, está por trás da estratégia do Banco Central dos Estados Unidos de trabalhar com juros mais baixos, ao mesmo tempo que obriga a periferia capitalista a trabalhar com juros mais altos, para garantir vantagens comparativas aos capitalistas financeiros americanos, a fim de se deslocarem para a periferia, onde os juros especulativos estão mais atrativos.

Ao mesmo tempo, o império cuida de estimular corporações econômicas e financeiras a aumentar investimentos no exterior com amplas vantagens fiscais garantidas pelo Tesouro americano.

Essa, por exemplo, foi a conversa recente entre Donald Trump e 20 representantes de corporações do petróleo, durante a qual expôs seu plano de ampliar a exploração de matérias-primas na periferia latino-americana rica em petróleo e minérios, necessários à manufatura americana.

Dessa forma, o império ganha competitividade internacional, ou seja, extraindo riqueza do capitalismo periférico, rico em matérias-primas baratas, enquanto são mantidas elevadas as taxas de juros para atrair investidores americanos que não terão mais o juro elevado americano mantido até agora.

A dívida pública americana de 35 trilhões passou a governar os interesses do império, pois ela é a âncora real da economia de guerra.

Se a dívida entra em default por conta dos juros altos, o império desaba.

<><> Exportação da especulação do centro para a periferia

Estrategicamente, do ponto de vista do império, manter o juro baixo quando a dívida está excessivamente alta representa estimular a exportação de capital especulativo do centro, onde o juro estará mais barato, para a periferia, onde o juro estará alto.

A leitura dos economistas da última ata do Banco Central é a de que a inflação está perto de ultrapassar o limite da meta de 4,5% e que, portanto, a taxa de juro poderá subir, até mesmo, na próxima reunião do Copom, em setembro.

Gabriel Galípolo teria força para mudar o curso dos acontecimentos, no cenário da financeirização econômica conduzida pela nova política monetária americana?

O mercado já espera um aumento de juros de 0,25% na reunião do Copom em setembro, que será a última presidida pelo bolsonarista Campos Neto.

Será, portanto, o maior desafio de Galípolo.

Contraditoriamente, enquanto o juro americano tende a cair, no Brasil, ele tende a subir por conta das previsões do BC, baseadas nas estimativas da pesquisa Focus, elaborada pelos próprios banqueiros.

O BC americano, ao qual o BC brasileiro se submete, trabalha sempre com o juro de longo prazo de 10 anos para balizar a taxa presente.

Essa seria a razão para se deduzir que a taxa presente cairá diante da tendência da taxa futura de dez anos, que conduz o comportamento do mercado global?

Não se tem certeza de nada, porque o prazo de 10 anos é longo no ambiente em que o capitalismo vive uma crise existencial, ameaçado pela especulação.

<><> Voz da direita financeira especulativa

Como destaca o banqueiro Luiz Cezar Fernandes, criador dos Bancos Pactual e Garantia, conhecido e respeitado pelos especuladores no mercado financeiro, quem conduz o Banco Central brasileiro é o Banco Central americano.

É de lá, diz ele, que vêm as determinações a partir das articulações elaboradas nos cálculos dos juros de dez anos fixados pelo FED.

O FED, portanto, é a fonte de poder que orienta o mercado financeiro global e, mais intensamente, o mercado financeiro na América Latina, cuja instabilidade é permanente.

Ao determinar que a taxa de juro nos Estados Unidos caminhará, nos próximos tempos, para uma queda mais acentuada, cuja duração é incerta, crescerão ou não os olhos para o Brasil, onde a taxa real está em quase 7% para uma inflação de 4,5%, no limite da meta?

Haverá maior oferta de capital especulativo na bolsa, como está acontecendo nas últimas semanas, até que as economias suportem ou não a oferta especulativa maior que a demanda à vista.

Pintaria ou não uma armadilha monetária para o novo presidente do BC, a partir de janeiro de 2025?

><> Ajuste fiscal imperialista impacta periferia

Esse poderá ser o resultado do ajuste da política monetária americana para diminuir o gasto de Washington, para pagar juros da dívida, transferindo o ônus para a periferia capitalista em forma de juros altos e terapia neoliberal que exige cortes crescentes em nome de ajuste fiscal.

O desafio, portanto, de Galípolo à frente do BC no próximo ano, será tentar resistir diante dos efeitos negativos de um desequilíbrio entre oferta e demanda de poupança especulativa estimulada pela política monetária americana.

Ela seria, portanto, o desdobramento da financeirização alterada pela mudança de Washington na política monetária do império.

A periferia está nas mãos do império, expresso no BC americano, responsável pela política monetária imperialista que condiciona toda a ação econômico-financeira do capitalismo periférico.

 

•        Lula elogia Galípolo, indicado para a presidência do BC, e critica Campos Neto: “age como político”

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) comentou a indicação de Gabriel Galípolo para a presidência do Banco Central em entrevista à rádio MaisPB, da Paraíba, nesta sexta-feira (30). Lula criticou o atual presidente da instituição monetária, Roberto Campos Neto, e disse que ele defende interesses políticos.

“O atual presidente do Banco Central age no Banco Central como político, não como economista. Ele se oferece em muitas reuniões políticas, coisa que não deveria acontecer. A taxa de juros no Brasil hoje não tem explicação. E eu vou me comportar no Banco Central… Eu já estive oito anos na Presidência da República. É importante lembrar que o Fernando Henrique Cardoso trocou quatro [presidentes do Banco Central]. Eu não troquei nenhum. O Henrique Meirelles entrou e ficou, e ele não era do meu partido. Ele era do PSDB [...] . Então eu sei lidar com o Banco Central. O problema é que no imaginário do mercado, o Banco Central tem que ser um representante do sistema financeiro, e eu não acho que tenha que ser”, criticou.

Lula defendeu que o presidente do Banco Central defenda a soberania nacional, e elogiou as características de Gabriel Galípolo. “Tem que ser uma pessoa que goste desse país, que pense na soberania nacional e que tome as atitudes corretas. Se um dia o Galípolo chegar para mim e falar ‘olha, tem que aumentar os juros’. Ótimo. Ele tem o perfil de uma pessoa competentíssima e de um brasileiro que gosta do Brasil. É um jovem extremamente competente. Ele vai trabalhar com a autonomia que teve o Meirelles”, disse.

Para o presidente, o BC não pode se esquecer que deve trabalhar também pelo crescimento econômico do país.“Você não precisa trocar o presidente do Banco Central se ele estiver fazendo as coisas corretas. Se tiver que baixar os juros, baixa. Se tiver que aumentar, aumenta. Mas tem que ter uma explicação. O papel do Banco Central não é só juros não. Ele tem que ter meta de crescimento também, se não a gente não vai a lugar nenhum. Se a gente não tiver combinada uma meta de crescimento, uma meta de inflação e de crescimento da população, do ponto de vista da melhoria de vida, esse país continuará estagnado”, explicou.

Em nova crítica a Campos Neto, Lula voltou a dizer que o presidente do Banco Central não pode pensar apenas nos interesses do mercado. “Esse país agora tem o Banco Central independente e com mandato. Se eu tivesse voto, eu seria contra. Mas se está aí, vai ficar. Eu, sinceramente, acho que o presidente da República tem o direito de indicar o presidente do Banco Central e de tirar se não gostar. Eu coloco o Galípolo com mandato. E se ele fizer uma coisa muito errada? O que eu faço? Não sei quem criou a ideia de que o cara [Campos Neto] é intocável, é um ser superior a tudo. O presidente do Banco Central, que fica mais em Miami do que aqui no Brasil, não quer ser criticado? Ele tem que pensar na indústria, no comércio. Ele não pode pensar só nos interesses do mercado. Então o Galípolo é uma indicação extraordinária, nós vamos indicar mais gente esse ano e até o ano que vem vai ter uma nova equipe. E como eu sou um cara de sorte, eu quero continuar tendo sorte, para que o Banco Central ajude esse país a se desenvolver, a crescer, gerar empregos e a distribuir riqueza nesse país”, afirmou.

<><> Lula critica 'nervosismo' do mercado sempre que o governo tenta ajudar os pobres

O presidente Lula criticou nesta sexta-feira (30) o "nervosismo" do mercado financeiro e de seus aliados políticos sempre que o governo federal apresenta propostas para combater a pobreza no país. No entanto, segundo Lula, o mercado financeiro não demonstra a mesma preocupação com as propostas de seus aliados que beneficiam os mais ricos.

"O mercado está nervoso, me disseram, o dólar aumentou... Toda vez que a gente faz algo para os pobres o mercado fica nervoso. Quando foi aprovada a desoneração, que custa 19 bilhões de reais e é para os mais ricos desse país, não vi o mercado ficar nervoso", disse Lula durante cerimônia de investimentos do governo federal para o estado da Paraíba. No discurso, o presidente citou uma série de benefícios sociais oferecidos pelo governo.

O presidente também criticou duramente os ricos, destacando que, na verdade, são os pobres os verdadeiros "bons pagadores".

 

•        Aumento dos juros pode aprofundar pedidos de recuperação judicial, afirmam especialistas

Os números de recuperações judiciais atingiram patamares recordes em julho, chegando a 228 pedidos no Brasil — um aumento de mais de 28% na comparação mensal, segundo dados do Indicador de Falências e Recuperação Judicial da Serasa Experian.

De acordo com especialistas consultados pela CNN, a expectativa é de que esse cenário se aprofunde com a possibilidade de aumento da taxa de juros na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom).

Atualmente, a Selic — a taxa básica de juros — se encontra em 10,5% ao ano após o Copom do Banco Central (BC) manter os juros inalterados na última decisão de forma unânime.

André Aroldo Freitas de Moura, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV) e consultor de Valuation, diz que o “aumento dos juros, sem dúvida, vai agravar ainda mais essa situação, portanto poderemos esperar novos recordes históricos de RJs nos próximos meses”.

O patamar atual de recuperação judicial pode ser ainda um efeito da pandemia, quando o endividamento aumentou e, “na sequência, tivemos as maiores altas de juros, saindo de perto de 2% para cerca de 14%”, afirma Moura.

Segundo o especialista, a situação de oferta de crédito e o aumento de taxas recentes após o caso da Americanas em janeiro de 2023 também podem ajudar a explicar a complicação que as empresas estão vivendo.

De acordo com Luiz Rabi, economista da Serasa Experian, as empresas que utilizam linhas de crédito, como no desconto de cheques, duplicatas, antecipação de crédito e capital de giro, sofrerão com o encarecimento decorrente de uma alta na Selic.

“Segmentos em que o crédito é uma alavanca importante para a comercialização, normalmente de produtos de maior valor unitário, acabam sendo o mais prejudicado quando há um aperto monetário”, explica o economista.

É o caso dos pequenos negócios, especialmente aqueles que já possuem dívidas altas, que não conseguirão negociar taxas mais baixas. Ou do setor do varejo, que pode enfrentar um arrefecimento nos chamados de bens duráveis — como carros, eletrodomésticos, eletrônicos e móveis — já que dependem de crédito para sua obtenção.

De acordo com Rabi, vale destacar que um novo ciclo de alta juros geraria um “efeito em cascata” na economia, visto que o consumidor também teria que enfrentar altas taxas ao contratar serviços de crédito, correndo assim o risco de ficar inadimplente.

“Isso é um fator que leva o consumidor à inadimplência, ele começa a não conseguir pagar parcelas do financiamento, do rotativo do cartão, do cheque especial”, afetando as empresas, pois “quem não recebe é quem está do outro lado do balcão”, elucida o economista.

 

Fonte: Jornal GGN/Brasil 247/CNN Brasil

 

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