Carlos Wagner: Troca de “tapas e beijos”
entre Bolsonaro e Marçal na campanha de São Paulo
O alvoroço causado nas
redações dos jornais com a ascensão nas pesquisas para prefeito de São Paulo do
ex-coach Pablo Marçal, 37 anos (PRTB), deixou muitas perguntas soltas no ar.
Uma delas é a seguinte: Marçal poderá simplesmente pegar na mão grande o prestígio
político do ex-presidente da República Jair Bolsonaro, 69 anos (PL), e deixá-lo
sentado à beira do caminho e seguir em frente como líder da extrema direita?
Este é o temor de um dos filhos parlamentares do ex-presidente, o senador
Flávio Bolsonaro, 43 anos (PL-RJ), que tem dito que Marçal é um ignorante em
assuntos políticos. O senador tem razão. Mas o currículo de Marçal mostra que
desde os seus 18 anos ele conseguiu transformar a sua ignorância em uma
bem-sucedida carreira de empresário, influenciador digital, escritor (35 livros
motivacionais publicados) e dono de um patrimônio calculado em R$ 160 milhões,
uma quantia modesta para incluí-lo entre as grandes fortunas do país, mas um
bom dinheiro para quem começou do nada. Nos últimos anos, o influencer vem
tentando entrar na política sem grande sucesso. Em 2018, contribuiu com R$ 100
mil e com trabalho nas redes sociais na campanha para presidente de Bolsonaro.
Em 2022, candidatou-se a presidente pelo Pros, mas como não chegou aos 0,5% das
intenções de votos, o partido cancelou a candidatura – há muitas matérias sobre
o assunto na internet.
É agora candidato à
prefeitura de São Paulo, Bolsonaro apoia a reeleição do atual prefeito, Ricardo
Nunes, 56 anos (MDB), que nas pesquisas vinha empatado com Guilherme Boulos, 42
anos (PSOL), com 23% das intenções de voto. Mas na pesquisa publicada na última
quinta-feira (22/08) foi Marçal quem apareceu empatado tecnicamente com Boulos,
enquanto Nunes caiu para 19%. Este crescimento pode ter sido devido a alguns
agrados que o ex-presidente andou fazendo para Marçal. Não foi por outro motivo
que ele começou a tratar Bolsonaro como padrinho da sua candidatura. Mas logo
depois o ex-presidente jogou um balde de água fria nesta história e Marçal
pediu de volta os R$ 100 mil que havia investido na campanha de Bolsonaro em
2018. Bolsonaro atirou o balde de água fria por pressão do seu círculo pessoal
de lideranças, do qual fazem parte os seus filhos parlamentares? Vamos examinar
a história como se estivéssemos fazendo uma autópsia do fato. O ex-presidente
tem uma intuição muito forte para escolher candidatos. Lembro o caso do atual
governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, 49 anos. Nem ele acreditava que
seria eleito. Bolsonaro insistiu, Tarcísio, que nunca havia concorrido a um
cargo eletivo, se candidatou e foi eleito. Intuitivamente, Bolsonaro acredita
que Marçal tem mais chances contra Boulos do que Nunes. Mas a situação mudou.
Bolsonaro ainda mantém o seu prestígio político. Mas politicamente está
fragilizado porque uma sentença do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) o tornou
inelegível até 2030. Há também o fato de que responde a mais de 300 inquéritos
policiais, processos e outros procedimentos na Justiça. O raciocínio do senador
é simples. Se Marçal se eleger prefeito de São Paulo com o apoio do seu pai,
irá sugar o prestígio político dele para se consolidar como líder do movimento
bolsonarista. E iniciará a sua caminhada rumo à disputa pela Presidência da
República em 2026. A carreira empresarial de Marçal mostra que a busca pelo
dinheiro e o poder é o seu objetivo permanente.
Andei ligando para
várias fontes e colegas repórteres para conversar sobre a história de Marçal.
Existe uma espécie de consenso de que ele não irá “para o pau”, uma gíria usada
nas redações para dizer que não insistirá na disputa com o ex-presidente, exigindo
o seu apoio. Porque o tempo está a seu favor. Ele é jovem, tem dinheiro,
prestígio na sua profissão e pode esperar a melhor oportunidade para fazer
carreira política. Nesta conversa que tive, um colega do Rio de Janeiro lembrou
um fato que considerei importante. Ele disse que a insistência de Marçal em
entrar na política não tem nada a ver com a busca pelo poder. Mas se proteger
contra as dezenas de processos que responde na Justiça por crimes como
estelionato e outros. Achei interessante o raciocínio. Creio ser uma hipótese a
se considerar. Não fiz uma pesquisa. Mas os jornais do fim de semana (24 e
25/08) esmiuçaram a vida de Marçal, em especial os seus problemas com a
Justiça. Lembro o seguinte aos meus jovens colegas das redações envolvidos com
a cobertura do dia a dia nos noticiários. Até há poucos anos, as escolas de
formação dos políticos eram os sindicatos (empregados e patrões), a vida
acadêmica e outras entidades sociais. Com as novas tecnologias da comunicação,
começaram a brotar em todos os cantos do mundo políticos surgidos nas redes
sociais que são capazes de fazer milhões de votos. Cito o caso do presidente da
Argentina, Javier Milei, 53 anos, nas eleições presidenciais de 2023. No
primeiro turno, em outubro, o candidato governista Sergio Massa ganhou, fazendo
36,98% dos votos. Milei ficou em segundo, com 23,98%, e outros três candidatos
somaram 33,3%. A derrota de Milei foi uma surpresa porque a campanha dele foi a
mais espalhafatosa na história política da América do Sul. Gritava aos quatro
ventos se identificando como anarcocapitalista e erguendo uma motosserra nos
comícios como símbolo dos cortes de verbas de subsídios que faria na confusa
economia argentina caso fosse eleito. Pretendia dolarizar a moeda, acabar com o
Banco Central e cometer outros desatinos. Para surpresa geral, Milei conseguiu
se recuperar da derrota no primeiro turno e venceu o segundo, fazendo 55% dos
votos e derrotando Massa.
Nos dias atuais, o
presidente Milei continua, vez ou outra, sendo manchete na imprensa
internacional. Enquando isso, os negócios do governo argentinho vinham sendo
geridos pelo ex-presidente da República Maurício Macri, 64 anos, que governou o
país de 2015 a 2019. Desde que Milei assumiu o seu mandato, a imprensa
argentina vinha batendo na tecla que o presidente era um fantoche de Macri.
Esta história mudou. No dia na sexta-feira (23/08), os jornais noticiaram que
os dois brigaram porque o partido de Macri botou uma bola nas costas do
presidente, ajudando a aprovar no Senado um reajuste para os aposentados que
vai detonar partes importantes do plano de controle de gastos do governo. Já na
história de Marçal, nós devemos ficarmos atentos. Se a troca de “tapas e
beijos”, como diz a música, com Bolsonaro resultar na eleição de Marçal, quem
vai estar nas sombras no seu governo?
• ‘Pablo Marçal nas eleições municipais’.
Por Rui Martins
A rápida ascensão
política de Pablo Marçal na campanha eleitoral para a Prefeitura de São Paulo
não é novidade. Ainda sem as facilidades criadas pelas redes sociais digitais,
houve um clima parecido de sensação eleitoral, em 1953, quando um deputado estadual,
ex-vereador, decidiu enfrentar as forças políticas da época com uma campanha
populista, na qual o símbolo era uma vassoura, para varrer a corrupção.
Outra coincidência:
Jânio Quadros, o fenômeno eleitoral eleito prefeito com o voto dos bairros
populares, não era paulistano, mas mato-grossense, quase da mesma região de
Pablo Marçal, que é goiano.
Agora uma diferença:
Jânio tinha sido vereador trabalhador e um tanto minucioso; como deputado
combatia a corrupção e fazia a fiscalização dos gastos públicos. Em síntese, um
populista de direita, com discurso conservador, preocupado com a pauta de
costumes: era contra os jogos de azar, contra a prostituição e chegou a proibir
o uso do biquini.
Apesar de Jânio ter
frustrado seus seguidores com sua renúncia e de ser considerado um dos
principais responsáveis pela instabilidade política brasileira que levou ao
golpe militar, Jânio manteve o rigor na defesa dos bens públicos e no combate à
corrupção.
O retorno do populismo
ao poder depois dos governos petistas de Lula e Dilma, foi com outra roupa, sem
as caspas de Jânio, e o combate à corrupção ficou só nas palavras. Deixou de
ser populismo de direita para se afirmar como populismo de extrema direita, sem
independência internacional, atrelado aos EUA e à política trumpista
republicana, visando o desmantelamento do Estado e o enfraquecimento das regras
republicanas, tudo consubstanciado na figura do ex-presidente Jair Bolsonaro.
Esse novo populismo,
mais extremo, veio acompanhado de um novo elemento também importado dos EUA,
destinado a assegurar mais coesão e fidelidade entre os seguidores pertencentes
às camadas mais pobres e menos instruídas: a presença religiosa invisível, mas
penetrante, do evangelismo e suas variantes neopentecostais, capazes de obter
controle e submissão sem um aparelho repressor visível.
É nesse quadro que
surge Pablo Marçal, justamente quando havia a impressão ou esperança de a
sociedade civil estar se desembaraçando do populismo bolsonarista. Bolsonaro
parece agora como um aprendiz de feiticeiro diante do esperto Marçal,
conhecedor do funcionamento das redes sociais, capaz de se transformar em
algumas semanas num dos prováveis eleitos para a Prefeitura de São Paulo.
Ao mesmo tempo, o
surgimento das redes sociais criou uma nova maneira de se fazer política com o
investimento dos candidatos e dos partidos na publicidade digital. A intensa
publicidade de Pablo nas redes levou-o à imprensa escrita e à televisão, onde o
candidato ganhou terreno e em pouco tempo, com promessas mirabolantes mas
difíceis de realizar, alcançou Boulos e Nunes. A vitória de um dos três
primeiros colocados dependerá, no segundo turno, da transferência de votos dos
candidatos derrotados.
Até que ponto a
Justiça Eleitoral pode intervir impedindo a participação de Pablo nas eleições
municipais da maior cidade brasileira? Nos EUA, sem justiça eleitoral, o
candidato Donald Trump prossegue candidato apesar de ser alvo de diversos
processos. Terão algum resultado as acusações claras e precisas da candidata
Tabata Amaral?
Provavelmente não. Em
todo caso, Pablo não cumpriu os quatro anos e cinco meses de prisão por furto
qualificado, porque a Justiça Federal reconheceu já ter prescrito o crime. Isso
lembra Paulo Roberto de Andrade, que deu o golpe do Boi Gordo, enganou mais de
30 mil investidores, mas saiu livre dos processos por prescrição do crime. Ou
seja, a prescrição acaba valendo como declaração de não culpabilidade.
Se tiver assegurada
sua impunidade, a presença de Pablo Marçal na campanha para a Prefeitura de São
Paulo muda o quadro político por enfraquecer a imagem do governador paulista
Tarcísio de Freitas e esvaziar a candidatura de Ricardo Nunes. Na hipótese de
Pablo ir para o segundo turno com Boulos, é quase certo que terá o voto dos
bolsonaristas e será eleito.
Se isso ocorrer, a
vitória de Pablo poderá significar o fim definitivo para Bolsonaro e família,
pois ficará difícil continuar a receber a totalidade dos votos dos evangélicos.
Diante disso, Pablo já começa a negociar a possibilidade de receber um apoio do
clã Bolsonaro, ofendendo e rejeitando o apoio de Joyce Hasselmann, chamando-a
de traíra ou traiçoeira, enquanto acena aos evangélicos, declarando seu apoio à
pauta de costumes por eles defendida.
• Pablo Marçal, bem no estilo Bolsonaro,
ataca o jornalismo
Pablo Marçal
incorporou o pior estilo do ex-presidente Jair Bolsonaro e aplicou os
ensinamentos da cartilha bolsonarista e da extrema direita em geral no trato
com jornalistas durante debate entre candidatos e candidata à Prefeitura de São
Paulo neste domingo (1).
O ex-coach, condenado
por integrar uma quadrilha de fraude bancária e enrolado com denúncias de
envolvimento entre pessoas do seu partido, o PRTB, e o PCC, Primeiro Comando da
Capital, maior organização criminosa do Brasil, atacou o jornalista Josias de Souza,
da TV Gazeta/UOL.
Ao ser questionado por
Souza sobre uma declaração de Marçal durante o podcast Flow, em que ele afirmou
a necessidade de ser "idiota" no processo eleitoral. Ao invés de
responder, Marçal fez crítica ao jornalismo e acusou a imprensa de parcialidade
e de agir com militância.
"O que a
militância poderosa do jornalismo tem feito é produzir, ao invés de uma
imprensa imparcial, esse nível de idiotice.[...] Quando os (oponentes) me
atacam, me xingam, dizem que mudaram a estratégia. Vocês tratam as pessoas como
idiotas. As pessoas na rua falam para mim: 'você falam que a gente pensa'”,
disse.
• Está na cartilha da extrema direita
atacar a imprensa
Políticos de extrema
direita como Pablo Marçal, Jair Bolsonaro, Javier Milei e Donald Trump vivem
atacando a imprensa porque isso faz parte da estratégia política deles para
difundir sua ideologia autoritária.
Atacar a imprensa é
uma tática para descredibilizar críticas e reportagens negativas. Ao criticar
jornalistas, os ultradireitistas promovem suas próprias narrativas por meio de
seus próprios canais nas redes sociais, mobilizando seus apoiadores, criando um
senso de "nós contra eles".
<><><>
Relembre alguns ataques de Bolsonaro contra jornalistas
Ao longo de seu
mandato, Bolsonaro atacou reiteradamente jornalistas. Além de críticas, o hoje
inelegível recebeu condenações judiciais. Em outubro de 2023, Bolsonaro foi
condenado em definitivo a pagar uma indenização coletiva por danos morais de R$
50 mil por uma série de ataques proferidos a jornalistas durante seu mandato.
Em abril de 2021, o
Sindicato dos Jornalistas do Estado de São Paulo entrou com ação contra
Bolsonaro, relacionando 175 ataques feitos pelo ex-presidente apenas em 2020. A
entidade avalia que a postura do então mandatário incentivou seus apoiadores a
hostilizarem a imprensa.
• "Casada com quem vota em mim"
Durante a campanha de
2022, em uma sabatina transmitida pela Jovem Pan em 6 de setembro daquele ano,
o então presidente, ao ser questionado pela jornalista Amanda Klein sobre
suspeitas envolvendo sua família. Referindo-se ao marido da jornalista, o presidente
disse: "Ô, Amanda, você é casada com uma pessoa que vota em mim. Eu não
sei como é teu convívio na tua casa com ele."
Klein prontamente
respondeu que sua vida particular não estava em discussão, ao que o presidente
retrucou questionando por que sua própria vida particular estava sendo
abordada. A interação ocorreu enquanto ele era questionado em sua capacidade
como chefe de Estado e candidato à reeleição.
• "Quadrúpede"
Em 1º de junho de
2021, ao falar com apoiadores nos jardins do Palácio da Alvorada, Bolsonaro
atacou a jornalista Daniela Lima, então na CNN, que teve uma declaração tirada
de contexto por apoiadores do presidente.
A apresentadora havia
dito, durante o jornal CNN360º, a seguinte frase: "Não saia daí porque
agora, infelizmente, a gente vai falar de notícia boa, mas com valores não tão
expressivos", em referência a números sobre o mercado de trabalho.
Bolsonaristas compartilharam então apenas o trecho "infelizmente, a gente
vai falar de notícia boa", sem a conclusão do raciocínio.
Sem citar nominalmente
a profissional, o presidente disparou: "'Infelizmente, somos obrigados a
dar uma boa notícia, mas não é tão boa assim não'. É uma quadrúpede."
• "Cala a boca"
Poucas semanas depois,
Bolsonaro atacou a jornalista Laurene Santos, da TV Vanguarda, afiliada da
Globo em São José dos Campos (SP), ao ser indagado por ter chegado a um evento
sem usar a máscara.
"Eu cuido da
minha vida", afirmou Bolsonaro. E após tirar a máscara, esbravejou:
"Essa Globo é uma merda de imprensa. Vocês são uma porcaria de
imprensa."
A jornalista tentou
interpelá-lo, mas foi cortada rispidamente pelo presidente, que disparou:
"Cala a boca!"
• Dar um furo
Em fevereiro de 2020,
Bolsonaro fez uma insinuação sexual ao se referir à jornalista Patricia Campos
Mello, autora de uma série de reportagens para o jornal Folha de S.Paulo que
revelaram disparos em massa de notícias falsas pelo WhatsApp em benefício do
então candidato durante as eleições de 2018. No final de junho deste ano, ele
foi condenado a indenizar a jornalista em R$ 35 mil.
Ao falar com
jornalistas em frente ao Palácio da Alvorada, Bolsonaro, cercado da sua
tradicional claque de apoiadores, disse, intercalando risadas, que a repórter
"queria dar o furo a qualquer preço contra mim". No jargão do
jornalismo, furo é um termo usado para designar a obtenção e divulgação de uma
notícia exclusiva. Mas, no contexto usado pelo presidente, o termo acabou sendo
instrumentalizado por Bolsonaro como um insulto sexual.
• O debate
O debate deste domingo
foi o quarto deste período eleitoral, teve cerca de duas horas de duração e foi
transmitido pela TV Gazeta, além dos canais do My News e do Jornal da Gazeta no
YouTube.
Participaram do debate
Ricardo Nunes (MDB), Guilherme Boulos (PSOL), Tabata Amaral (PSB), Pablo Marçal
(PRTB) e José Luiz Datena (PSDB).
Este foi o primeiro
debate na cidade desde o ocorrido em 19 de setembro, organizado pela revista
Veja, que contou com a participação de apenas três candidatos. A ausência de
Nunes, Boulos e Datena no último encontro foi atribuída ao desconforto gerado
pelas táticas de Pablo Marçal, que envolviam publicar vídeos editados com
ataques aos adversários nas redes sociais.
Fonte: Observatório da
Imprensa/Fórum
Nenhum comentário:
Postar um comentário