Agronegócio e o Estado capitalista são os
culpados pela fumaça tóxica e Brasil em chamas
Milhões de pessoas, de
Norte a Sul, sentem na pele os efeitos da catástrofe ambiental, respirando
fumaça tóxica, adoecendo e assistindo ao Brasil queimar em chamas. Mais da
metade do país está coberta pela fuligem das queimadas recordes. Segundo
pesquisadora do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), a fumaça
cobre uma área correspondente a 60% do território brasileiro, o que equivale a
5 milhões de km². No cenário mais pessimista, isso pode se manter até Novembro
deste ano e já atinge outros países da América do Sul, como Peru, Bolívia e
Paraguai, devendo nos próximos dias alcançar o Uruguai e parte da Argentina. As
imagens por satélite da América Latina comprovam a gravidade da atual ruptura
metabólica com a natureza, gerada pela irracionalidade capitalista.
A culpa é do
agronegócio, herdeiro do latifúndio escravista, que, em sua sanha por lucros,
ateia fogo nos principais biomas para avançar com as fronteiras agrícolas,
batendo recordes nas queimadas. A fumaça, advinda principalmente do Pará,
Amazonas, Rondônia e Acre nas últimas semanas, é empurrada pelos ventos alísios
para a região da barreira dos Andes e da Cordilheira e deslocada em direção ao
Sul do Brasil. Por isso, se as capitais Rio Branco e Porto Velho são as
capitais com a pior qualidade do ar do país (muito insalubre), São Paulo é a
metrópole com a maior concentração de poluentes em sua atmosfera no mundo.
Nesta terça-feira, o
Brasil registrou mais de 5 mil focos de incêndio (5.132), e, nas últimas 24
horas, o estado do Mato Grosso teve o maior número de queimadas (2.124),
seguido pelo Pará (901) e Goiás (639). Como comparativo, o Dia do Fogo, em
2019, sob o governo Bolsonaro, teve quase 1.500 focos de incêndio, o que é
menos do que a metade das últimas 24 horas. Agora, as queimadas atingem os
principais biomas do país, no Cerrado, na Amazônia, e há meses no Pantanal,
sendo 95% das queimadas desse bioma em propriedades privadas. Também as terras
indígenas da Amazônia mais invadidas pelo garimpo do ouro são foco das
queimadas.
Ao mesmo tempo, o
Brasil tem quase 200 cidades com umidade do ar igual ou pior à do deserto do
Saara. Assim, na crise em curso, estamos sentindo a nefasta combinação entre o
pior índice de queimadas em 14 anos e a pior seca histórica desde 1950, quando
começou a medição. São parte dos efeitos do aquecimento global. Na Amazônia,
por mais um ano, com a maior bacia hidrográfica do planeta, a intensidade do El
Niño, retroalimentada pelo aquecimento anormal das águas do Atlântico Tropical
Norte e temperaturas globais recordes, gera uma seca com contornos ainda mais
graves do que no resto do país. Já supera a seca histórica que tinha sido
registrada no ano passado.
Maior Plano Safra da
história: a conciliação de classes fortalece as bases da extrema direita
A crise ambiental é
necessariamente uma crise global, que desmonta qualquer ilusão na demagogia do
“capitalismo verde” das potências imperialistas que mais poluem o planeta e
agravam o aquecimento global. É por essas falácias que advogam meios como a Globo
e Folha de São Paulo, por um agronegócio mais sustentável, como se o Brasil
pudesse ser uma “fazenda do mundo” com preocupação ambiental. Nacionalmente, o
agronegócio é um dos principais responsáveis pela crise atual também ao ser o
principal emissor de gases de efeito estufa nacionalmente (74%). Isso tanto com
a pecuária (que emite metano, CH4), quanto com o mau uso e manejo do solo (que
aprofunda as emissões de CO2), além da fumaça das queimadas que utiliza como
método.
É certo que esse setor
é uma das bases da extrema direita no país, fortalecido pelos anos de
bolsonarismo. Tarcísio, aliado de Nunes e Bolsonaro, se orgulha de investir
mais de R$ 1,4 bilhão em São Paulo no agronegócio somente neste ano. Além
disso, a campanha do reacionário coach Pablo Marçal foi financiada por nomes
como o bilionário Helio Seibel, do agro, mostrando a busca por uma extrema
direita mais radicalizada após o 8 de Janeiro. Mas justamente o agronegócio foi
agraciado com o maior Plano Safra da história por parte do governo
Lula-Alckmin, que, em seu site, deixa claro que serão mais de R$ 400 bilhões
destinados somente “aos médios e grandes produtores”.
Com isso, mostra na
prática que a conciliação de classes fortalece as bases da extrema direita e a
devastação ambiental, inclusive abrindo espaço à demagogia bolsonarista - como
a declaração do senador do Acre, Márcio Bittar, do União Brasil, que disse cinicamente
que “não é possível que continuem culpando o governo Bolsonaro”, agora que o
Brasil bate recordes de queimadas sob o governo Lula, quando Bolsonaro e seus
ministros defendiam abertamente “passar a boiada”. Ao mesmo tempo, o governo
Lula também vem se subordinando aos interesses das potências imperialistas e de
empresas como a Shell, ao buscar avançar com a extração de petróleo na Margem
Equatorial, que afeta especialmente populações indígenas e ribeirinhas.
Inclusive, foi a
bancada ruralista no Congresso, que em grande parte hoje compõe a base do
governo federal, quem impôs um verdadeiro pacote anti-ambiental nos anos de
bolsonarismo, como o PL da Grilagem que legaliza o roubo de terras. Ao mesmo
tempo, vários desses ataques estão sendo aprovados no governo Lula-Alckmin,
como a votação do PL do Veneno, que flexibiliza a liberação de agrotóxicos, e o
Marco Temporal, ambos aprovados no Senado. Essa situação é uma expressão do
consenso extrativista que perpassa os regimes políticos latino-americanos,
inseridos nas disputas entre as potências imperialistas e a burguesia
reacionária da China, para roubar os bens naturais e subordinar esses países a
serviço do lucro.
Também em Julho deste
ano, os servidores dos órgãos ambientais federais denunciavam que seu quadro
havia perdido até 30% dos novos servidores concursados, com um déficit
acompanhado de arrocho salarial e condições de trabalho mais precárias. No
ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), o quadro de
brigadistas (que enfrentam os incêndios) caiu de 1.415 para 981. Esse é apenas
um aspecto do desmonte das políticas ambientais que se aprofundaram sob o
governo Bolsonaro, mas que têm sua continuidade no Arcabouço Fiscal de Lula e
Haddad, que significou, no início deste ano, uma redução em 24% no combate aos
incêndios no orçamento do Ibama, que o Ministério de Marina Silva alega ter
reposto depois com crédito extraordinário. O arcabouço fiscal do governo
federal é continuidade da agenda do golpe de 2016 e da extrema direita, e agora
demonstra mais uma vez que é um obstáculo para o combate às queimadas. O PSOL
de Boulos e Guajajara é parte desse governo, assumindo assim um compromisso com
essas políticas de ajuste e financiamento do agro.
Tudo isso também
demonstra que não é possível confiar que a saída virá do STF e do Judiciário.
Agora Flávio Dino declara que “não podemos normalizar o absurdo”, comparando as
queimadas ao período da Covid, e que atuará com coerção contra os incêndios criminosos.
Mas a realidade é que o STF garantiu impunidade aos responsáveis do agronegócio
pelo “Dia do Fogo” em 2019, ao mesmo tempo em que a justiça declarou a greve
dos servidores ambientais ilegal. O autoritarismo judiciário dos últimos anos
está a postos para enfrentar e reprimir trabalhadores, sempre a serviço dos
capitalistas. Por isso, a culpa do ar irrespirável é também do Estado.
Quem paga a conta da
seca e da fumaça tóxica?
Na capital paulista,
já são pelo menos 76 mortes, desde Agosto, por Síndrome Respiratória Grave.
Mas, para além dos efeitos diretos e imediatos, a fumaça agrava riscos de
ataques cardíacos, AVC, arritmias, infecções e problemas na garganta, além de
doenças crônicas, respiratórias e alérgicas. Após o governo Lula-Alckmin
aplicar cortes, fruto do Arcabouço Fiscal, a Ministra Nísia Trindade já
expressa preocupação com os impactos da crise atual no sistema de saúde.
A classe trabalhadora
é a principal afetada, e em particular o setor que tem condições de trabalho,
moradia e transporte mais precários, nesta crise. Neste momento, as
recomendações de especialistas passam por não se expor ao sol ou a atividades
ao ar livre. Em algumas cidades, aulas foram suspensas. Mas quais condições
setores como entregadores de aplicativo, trabalhadores da construção civil,
garis, vendedores ambulantes ou trabalhadores rurais encontram para enfrentar a
seca e a fumaça? Segundo pesquisa, uberizados já sofrem com a desidratação por
não ter acesso a água e banheiro em seu cotidiano. A classe trabalhadora, ainda
mais os negros e as mulheres, após anos de Reforma Trabalhista e ataque a
direitos, sente muito mais os efeitos do Brasil em chamas, em um sistema em que
os lucros valem mais do que nossas vidas.
Mais do que isso,
escancarando a irracionalidade desse sistema, a imprensa já noticia que o preço
de alimentos básicos vai subir, como reflexo da seca e das queimadas. Produtos
como arroz e café serão os mais impactados, além de hortaliças e frutas. Isto
é, o agronegócio devasta a natureza e são os trabalhadores que pagam do seu
bolso a conta da diminuição das safras.
O capitalismo destrói
o planeta, destruamos o capitalismo
Por isso, nós do
Movimento Revolucionário de Trabalhadores (MRT) sustentamos que somente a
classe trabalhadora, em aliança com os povos indígenas, quilombolas e com todos
os oprimidos, pode dar uma saída à crise em curso e puxar os freios de
emergência necessários para reverter a crise climática. A esse serviço, está
nosso programa emergencial contra as queimadas e a seca, um programa operário e
popular, o que só é possível enfrentando o Estado capitalista. Não existe
sustentabilidade dentro do capitalismo!
Por isso, é preciso
exigir das centrais sindicais e entidades estudantis que organizem a luta, em
aliança com os movimentos sociais, para enfrentar o agronegócio e os interesses
capitalistas que devastam o planeta. É preciso levantar uma reforma agrária e
urbana radical, que exproprie sem indenização as terras desmatadas e queimadas,
garanta a nacionalização das terras sob gestão dos trabalhadores rurais e com
demarcação de terras indígenas e quilombolas, atacando os interesses do
agronegócio e da especulação imobiliária, além de organizar um grande plano
nacional de preservação e reconstrução de biomas. Não ao Marco Temporal,
defendido pela extrema direita, pela base ruralista e pelo Ministro da
Agricultura do governo federal. Os responsáveis pelos incêndios criminosos
devem ser julgados por júri popular.
É preciso lutar pela
revogação do Arcabouço Fiscal e pelo não pagamento da dívida pública,
garantindo verbas para o combate às queimadas e à destruição ambiental, além de
para a saúde. Basta de entregar nossos recursos às potências imperialistas que
mais devastam e emitem gases poluentes! Não à exploração da Foz do Amazonas e
por um plano concreto para por fim à exploração de combustíveis fósseis,
através da luta por uma Petrobrás 100% estatal e administrada democraticamente
pelos trabalhadores e ambientalistas. Assim, também é preciso impor a revogação
integral das reformas, que aprofundam a precarização da vida e do trabalho,
mais sentida nesta crise. Não podemos pagar a conta da crise! Temos que lutar
pelo congelamento dos preços dos alimentos e também das contas de energia.
Tudo isso deve ser
motor para lutar contra esse sistema, que é baseado na exploração do trabalho e
na degradação da natureza. Não se trata de resignar-se com uma perspectiva de
fim do mundo, mas de construir uma perspectiva que arranque o fim desse sistema
que torna impossível respirar. Podemos, para além da fumaça tóxica, vislumbrar
uma sociedade superior, na qual a economia e os bens naturais comuns sejam
planificados de forma racional e democrática. Para isso, somente um governo de
trabalhadores, em ruptura com o capitalismo, pode abrir espaço para que seja
restabelecida a harmonia do metabolismo entre ser humano e natureza. O
marxismo, que foi deturpado pelo stalinismo, é uma ferramenta a serviço disso.
Essa perspectiva é a
que coloca medo na extrema direita que ataca constantemente o comunismo e em
todos os capitalistas que se sustentam sugando a riqueza produzida
coletivamente pela classe trabalhadora. Essa perspectiva é a que defendemos
nessas eleições com candidaturas comunistas pelo país, e em cada luta da qual
participamos.
Fonte: Esquerda Diário
Nenhum comentário:
Postar um comentário