sexta-feira, 20 de setembro de 2024

Agronegócio e o Estado capitalista são os culpados pela fumaça tóxica e Brasil em chamas

Milhões de pessoas, de Norte a Sul, sentem na pele os efeitos da catástrofe ambiental, respirando fumaça tóxica, adoecendo e assistindo ao Brasil queimar em chamas. Mais da metade do país está coberta pela fuligem das queimadas recordes. Segundo pesquisadora do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), a fumaça cobre uma área correspondente a 60% do território brasileiro, o que equivale a 5 milhões de km². No cenário mais pessimista, isso pode se manter até Novembro deste ano e já atinge outros países da América do Sul, como Peru, Bolívia e Paraguai, devendo nos próximos dias alcançar o Uruguai e parte da Argentina. As imagens por satélite da América Latina comprovam a gravidade da atual ruptura metabólica com a natureza, gerada pela irracionalidade capitalista.

A culpa é do agronegócio, herdeiro do latifúndio escravista, que, em sua sanha por lucros, ateia fogo nos principais biomas para avançar com as fronteiras agrícolas, batendo recordes nas queimadas. A fumaça, advinda principalmente do Pará, Amazonas, Rondônia e Acre nas últimas semanas, é empurrada pelos ventos alísios para a região da barreira dos Andes e da Cordilheira e deslocada em direção ao Sul do Brasil. Por isso, se as capitais Rio Branco e Porto Velho são as capitais com a pior qualidade do ar do país (muito insalubre), São Paulo é a metrópole com a maior concentração de poluentes em sua atmosfera no mundo.

Nesta terça-feira, o Brasil registrou mais de 5 mil focos de incêndio (5.132), e, nas últimas 24 horas, o estado do Mato Grosso teve o maior número de queimadas (2.124), seguido pelo Pará (901) e Goiás (639). Como comparativo, o Dia do Fogo, em 2019, sob o governo Bolsonaro, teve quase 1.500 focos de incêndio, o que é menos do que a metade das últimas 24 horas. Agora, as queimadas atingem os principais biomas do país, no Cerrado, na Amazônia, e há meses no Pantanal, sendo 95% das queimadas desse bioma em propriedades privadas. Também as terras indígenas da Amazônia mais invadidas pelo garimpo do ouro são foco das queimadas.

Ao mesmo tempo, o Brasil tem quase 200 cidades com umidade do ar igual ou pior à do deserto do Saara. Assim, na crise em curso, estamos sentindo a nefasta combinação entre o pior índice de queimadas em 14 anos e a pior seca histórica desde 1950, quando começou a medição. São parte dos efeitos do aquecimento global. Na Amazônia, por mais um ano, com a maior bacia hidrográfica do planeta, a intensidade do El Niño, retroalimentada pelo aquecimento anormal das águas do Atlântico Tropical Norte e temperaturas globais recordes, gera uma seca com contornos ainda mais graves do que no resto do país. Já supera a seca histórica que tinha sido registrada no ano passado.

Maior Plano Safra da história: a conciliação de classes fortalece as bases da extrema direita

A crise ambiental é necessariamente uma crise global, que desmonta qualquer ilusão na demagogia do “capitalismo verde” das potências imperialistas que mais poluem o planeta e agravam o aquecimento global. É por essas falácias que advogam meios como a Globo e Folha de São Paulo, por um agronegócio mais sustentável, como se o Brasil pudesse ser uma “fazenda do mundo” com preocupação ambiental. Nacionalmente, o agronegócio é um dos principais responsáveis pela crise atual também ao ser o principal emissor de gases de efeito estufa nacionalmente (74%). Isso tanto com a pecuária (que emite metano, CH4), quanto com o mau uso e manejo do solo (que aprofunda as emissões de CO2), além da fumaça das queimadas que utiliza como método.

É certo que esse setor é uma das bases da extrema direita no país, fortalecido pelos anos de bolsonarismo. Tarcísio, aliado de Nunes e Bolsonaro, se orgulha de investir mais de R$ 1,4 bilhão em São Paulo no agronegócio somente neste ano. Além disso, a campanha do reacionário coach Pablo Marçal foi financiada por nomes como o bilionário Helio Seibel, do agro, mostrando a busca por uma extrema direita mais radicalizada após o 8 de Janeiro. Mas justamente o agronegócio foi agraciado com o maior Plano Safra da história por parte do governo Lula-Alckmin, que, em seu site, deixa claro que serão mais de R$ 400 bilhões destinados somente “aos médios e grandes produtores”.

Com isso, mostra na prática que a conciliação de classes fortalece as bases da extrema direita e a devastação ambiental, inclusive abrindo espaço à demagogia bolsonarista - como a declaração do senador do Acre, Márcio Bittar, do União Brasil, que disse cinicamente que “não é possível que continuem culpando o governo Bolsonaro”, agora que o Brasil bate recordes de queimadas sob o governo Lula, quando Bolsonaro e seus ministros defendiam abertamente “passar a boiada”. Ao mesmo tempo, o governo Lula também vem se subordinando aos interesses das potências imperialistas e de empresas como a Shell, ao buscar avançar com a extração de petróleo na Margem Equatorial, que afeta especialmente populações indígenas e ribeirinhas.

Inclusive, foi a bancada ruralista no Congresso, que em grande parte hoje compõe a base do governo federal, quem impôs um verdadeiro pacote anti-ambiental nos anos de bolsonarismo, como o PL da Grilagem que legaliza o roubo de terras. Ao mesmo tempo, vários desses ataques estão sendo aprovados no governo Lula-Alckmin, como a votação do PL do Veneno, que flexibiliza a liberação de agrotóxicos, e o Marco Temporal, ambos aprovados no Senado. Essa situação é uma expressão do consenso extrativista que perpassa os regimes políticos latino-americanos, inseridos nas disputas entre as potências imperialistas e a burguesia reacionária da China, para roubar os bens naturais e subordinar esses países a serviço do lucro.

Também em Julho deste ano, os servidores dos órgãos ambientais federais denunciavam que seu quadro havia perdido até 30% dos novos servidores concursados, com um déficit acompanhado de arrocho salarial e condições de trabalho mais precárias. No ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), o quadro de brigadistas (que enfrentam os incêndios) caiu de 1.415 para 981. Esse é apenas um aspecto do desmonte das políticas ambientais que se aprofundaram sob o governo Bolsonaro, mas que têm sua continuidade no Arcabouço Fiscal de Lula e Haddad, que significou, no início deste ano, uma redução em 24% no combate aos incêndios no orçamento do Ibama, que o Ministério de Marina Silva alega ter reposto depois com crédito extraordinário. O arcabouço fiscal do governo federal é continuidade da agenda do golpe de 2016 e da extrema direita, e agora demonstra mais uma vez que é um obstáculo para o combate às queimadas. O PSOL de Boulos e Guajajara é parte desse governo, assumindo assim um compromisso com essas políticas de ajuste e financiamento do agro.

Tudo isso também demonstra que não é possível confiar que a saída virá do STF e do Judiciário. Agora Flávio Dino declara que “não podemos normalizar o absurdo”, comparando as queimadas ao período da Covid, e que atuará com coerção contra os incêndios criminosos. Mas a realidade é que o STF garantiu impunidade aos responsáveis do agronegócio pelo “Dia do Fogo” em 2019, ao mesmo tempo em que a justiça declarou a greve dos servidores ambientais ilegal. O autoritarismo judiciário dos últimos anos está a postos para enfrentar e reprimir trabalhadores, sempre a serviço dos capitalistas. Por isso, a culpa do ar irrespirável é também do Estado.

Quem paga a conta da seca e da fumaça tóxica?

Na capital paulista, já são pelo menos 76 mortes, desde Agosto, por Síndrome Respiratória Grave. Mas, para além dos efeitos diretos e imediatos, a fumaça agrava riscos de ataques cardíacos, AVC, arritmias, infecções e problemas na garganta, além de doenças crônicas, respiratórias e alérgicas. Após o governo Lula-Alckmin aplicar cortes, fruto do Arcabouço Fiscal, a Ministra Nísia Trindade já expressa preocupação com os impactos da crise atual no sistema de saúde.

A classe trabalhadora é a principal afetada, e em particular o setor que tem condições de trabalho, moradia e transporte mais precários, nesta crise. Neste momento, as recomendações de especialistas passam por não se expor ao sol ou a atividades ao ar livre. Em algumas cidades, aulas foram suspensas. Mas quais condições setores como entregadores de aplicativo, trabalhadores da construção civil, garis, vendedores ambulantes ou trabalhadores rurais encontram para enfrentar a seca e a fumaça? Segundo pesquisa, uberizados já sofrem com a desidratação por não ter acesso a água e banheiro em seu cotidiano. A classe trabalhadora, ainda mais os negros e as mulheres, após anos de Reforma Trabalhista e ataque a direitos, sente muito mais os efeitos do Brasil em chamas, em um sistema em que os lucros valem mais do que nossas vidas.

Mais do que isso, escancarando a irracionalidade desse sistema, a imprensa já noticia que o preço de alimentos básicos vai subir, como reflexo da seca e das queimadas. Produtos como arroz e café serão os mais impactados, além de hortaliças e frutas. Isto é, o agronegócio devasta a natureza e são os trabalhadores que pagam do seu bolso a conta da diminuição das safras.

O capitalismo destrói o planeta, destruamos o capitalismo

Por isso, nós do Movimento Revolucionário de Trabalhadores (MRT) sustentamos que somente a classe trabalhadora, em aliança com os povos indígenas, quilombolas e com todos os oprimidos, pode dar uma saída à crise em curso e puxar os freios de emergência necessários para reverter a crise climática. A esse serviço, está nosso programa emergencial contra as queimadas e a seca, um programa operário e popular, o que só é possível enfrentando o Estado capitalista. Não existe sustentabilidade dentro do capitalismo!

Por isso, é preciso exigir das centrais sindicais e entidades estudantis que organizem a luta, em aliança com os movimentos sociais, para enfrentar o agronegócio e os interesses capitalistas que devastam o planeta. É preciso levantar uma reforma agrária e urbana radical, que exproprie sem indenização as terras desmatadas e queimadas, garanta a nacionalização das terras sob gestão dos trabalhadores rurais e com demarcação de terras indígenas e quilombolas, atacando os interesses do agronegócio e da especulação imobiliária, além de organizar um grande plano nacional de preservação e reconstrução de biomas. Não ao Marco Temporal, defendido pela extrema direita, pela base ruralista e pelo Ministro da Agricultura do governo federal. Os responsáveis pelos incêndios criminosos devem ser julgados por júri popular.

É preciso lutar pela revogação do Arcabouço Fiscal e pelo não pagamento da dívida pública, garantindo verbas para o combate às queimadas e à destruição ambiental, além de para a saúde. Basta de entregar nossos recursos às potências imperialistas que mais devastam e emitem gases poluentes! Não à exploração da Foz do Amazonas e por um plano concreto para por fim à exploração de combustíveis fósseis, através da luta por uma Petrobrás 100% estatal e administrada democraticamente pelos trabalhadores e ambientalistas. Assim, também é preciso impor a revogação integral das reformas, que aprofundam a precarização da vida e do trabalho, mais sentida nesta crise. Não podemos pagar a conta da crise! Temos que lutar pelo congelamento dos preços dos alimentos e também das contas de energia.

Tudo isso deve ser motor para lutar contra esse sistema, que é baseado na exploração do trabalho e na degradação da natureza. Não se trata de resignar-se com uma perspectiva de fim do mundo, mas de construir uma perspectiva que arranque o fim desse sistema que torna impossível respirar. Podemos, para além da fumaça tóxica, vislumbrar uma sociedade superior, na qual a economia e os bens naturais comuns sejam planificados de forma racional e democrática. Para isso, somente um governo de trabalhadores, em ruptura com o capitalismo, pode abrir espaço para que seja restabelecida a harmonia do metabolismo entre ser humano e natureza. O marxismo, que foi deturpado pelo stalinismo, é uma ferramenta a serviço disso.

Essa perspectiva é a que coloca medo na extrema direita que ataca constantemente o comunismo e em todos os capitalistas que se sustentam sugando a riqueza produzida coletivamente pela classe trabalhadora. Essa perspectiva é a que defendemos nessas eleições com candidaturas comunistas pelo país, e em cada luta da qual participamos.

 

Fonte: Esquerda Diário

 

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