sábado, 31 de agosto de 2024

Rodrigo Perez: ‘Pablo Marçal, o bolsonarista atualizado’

Já há três semanas que o coach goianiense Pablo Marçal é o principal tema do debate político brasileiro. Simplesmente, não se fala em outra coisa, e nem poderia ser diferente. Afinal, Marçal, sem estrutura partidária e sem experiência eleitoral, é um dos favoritos para vencer a eleição para a Prefeitura da maior capital da América Latina.

O cenário é semelhante ao que vimos nas eleições presidenciais de 2018.  Mas também há diferenças, assim como existem diferenças entre Jair Bolsonaro e Pablo Marçal. Neste texto, quero explorar, exatamente, essas diferenças.

Lá entre 2017 e 2018, quando o bolsonarismo se formou como cultura política, a Operação Lava Jato era sucesso semântico, pois conseguiu impor uma leitura para a realidade brasileira baseada no signo da corrupção total. O principal motivo do atraso nacional seria a corrupção praticada pelos políticos profissionais, entendendo “corrupção” como roubo de dinheiro público.

O PT vivia o pior momento de sua história, juntando os cacos da humilhante derrota de Fernando Haddad nas eleições municipais de São Paulo em 2016. Lula estava preso, incomunicável. Não era absurdo decretar o fim da legenda e a morte política de Lula. Muitos analistas cogitaram essa possibilidade, inclusive esse que vos escreve.

Naquele contexto, Jair Bolsonaro, então deputado federal pelo estado do Rio de Janeiro, conseguiu se apresentar como o líder outsider capaz de moralizar o sistema político. Não nego que ele teve faro e senso de circunstância, mas a situação lhe era favorável.

O deputado de baixo clero era tão irrelevante que, de fato, não estava envolvido nos mega esquemas de corrupção que alimentavam a semântica lavajatista. E não porque era honesto, pois bem conhecemos as rachadinhas e o superfaturamento de notas em postos de gasolina. Bolsonaro não estava implicado no petrolão e no mensalão porque não tinha lugar na mesa de negociação. Assim, convenceu parte relevante da população de que era honesto, contando com a habilidade de um dos seus filhos na manipulação da tecnologia digital. Tornou-se, então, memezável, personagem pop, lacrador e fez sucesso entre os jovens.

Jair Bolsonaro, portanto, não é organicamente digital. É um senhor, tiozão analógico, esteticamente repulsivo. Seu encontro com a tecnologia digital foi circunstancial. Ele não é especialista nessa linguagem.

Corta pra São Paulo no segundo semestre de 2024...

O PT governa o país. Lula é o presidente e, apesar das enormes dificuldades, faz um mandato bem-sucedido e relativamente bem avaliado. A Lava Jato foi sepultada e não domina mais a interpretação da realidade nacional. O palco da eleição é a cidade de São Paulo, que costuma ser majoritariamente progressista. O PT já governou a cidade por três vezes, algo impensável no Rio de Janeiro, por exemplo.

Ainda assim, Pablo Marçal, sem contar com o apoio declarado de Jair Bolsonaro, lidera as pesquisas eleitorais, junto com Guilherme Boulos e Ricardo Nunes. Como explicar?

Pablo Marçal tem repertórios que faltam a Jair Bolsonaro. O coach, de fato, é um outsider, nunca ocupou cargos públicos e não tem sobre as costas a obrigação de apresentar resultados de gestões anteriores. É jovem, queixo quadrado e recentemente se aproximou do influenciador fitness Renato Cariani. Depois de dois meses de "treino", Marçal apareceu sem camisa, ostentando abdômen definido. Domina a linguagem do empreendedorismo, sendo ele mesmo o seu próprio expert no uso das mídias digitais. É mais capaz que Bolsonaro em encantar a juventude. Afinal, nos tempos em que as utopias coletivas não fazem mais sentido, quem não quer ser rico, bonito e ter abdômen rasgado? Marçal promete que isso tudo pode ser alcançado por qualquer um, desde que a pessoa seja bem "mentorada". O mentor, o coach? O próprio Marçal, é claro! Sim, é sedutor.

Por outro lado, cabe perguntar se Bolsonaro tem repertórios que faltam a Pablo Marçal.

Poderíamos dizer que Bolsonaro é mais popular? Que é mais capaz de afetar um certo perfil social que encontra na imagem do “tiozão do pavê” seu tipo ideal? Talvez sim. Mas será que esse perfil não pode ser capturado por Pablo Marçal?

A resposta passa pela relação entre linguagem analógica e linguagem digital no processo político.

Se a linguagem analógica ainda é relevante e capaz de sobreviver de forma relativamente autônoma nessa era da internet, Bolsonaro continuará por algum tempo liderando a extrema direita.

Porém, se a linguagem digital já é capaz de configurar a sensibilidade política da totalidade da população, incluindo os tios e as tias, não resta dúvida de que a liderança de Jair Bolsonaro está com os dias contados. Nesse campo, Marçal está mais preparado, pois é organicamente digital.

De todo modo, é fato que Pablo Marçal é cria do bolsonarismo, algo que ele mesmo reconhece. Mas é um bolsonarista atualizado e potencialmente mais perigoso.

 E Jair Bolsonaro? Talvez esteja começando a ficar obsoleto.

 

•        Marçal diz que se faz de idiota para se equiparar a seus eleitores

O ex-coach Pablo Marçal (PRTB), que tumultua as eleições à Prefeitura de São Paulo, teve um ataque de sinceridade em entrevista ao Flow podcast na noite desta quarta-feira (28) e disse realmente o que pensa do "povo" e como tem se comportado para atrair eleitores.

Segundo Marçal, o "povo" tem uma "mentalidade" idiota e por isso ele se faz assim para conquistar votos.

"No processo eleitoral, me perdoe, você tem que ser um idiota. Infelizmente a nossa mentalidade gosta disso. E, por ser um povo que gosta disso, eu preciso produzir isso. Preciso ter um comportamento que chame atenção. Não é uma parada que eu me divirto", afirmou Marçal.

O ex-coach ainda citou como exemplo o debate na Veja, quando polarizou com Tabata Amaral (PSB) e tomou diversas invertidas.

Segundo ele, o debate "não rendeu corte", em relação aos vídeos editados que propaga com lacrações nas redes - geralmente feitos e propagados por seguidores que recebem prêmios por isso.

"No debate da Veja uma pessoa veio para cima de mim só com baixaria de último nível. Eu falei ‘não vou cair nesse jogo’. Engraçado, não rendeu um corte, não deu nada", confessou.

•        Marçal segue táticas de influenciador acusado de estupro e tráfico humano para impulsionar popularidade

Para impulsionar suas redes sociais, Pablo Marçal (PRTB), candidato de extrema direita à prefeitura de São Paulo, adotou uma estratégia inspirada pelo influenciador britânico Andrew Tate, conhecido por seu discurso de ódio e envolvimento em crimes como estupro e tráfico humano, informa a newsletter Projeto Brief.

Marçal adaptou a estratégia de Tate, que usava seguidores para promover vídeos de forma descentralizada e agressiva. O coach brasileiro foca em promessas de prosperidade financeira, utilizando concursos online e prêmios em dinheiro para motivar a disseminação de seu conteúdo. "Eu modelei um americano que fez isso e se tornou o cara mais pesquisado do mundo na Internet", afirma, orgulhosamente, Marçal. Vale apontar que o nome de Tate liderou as pesquisas do Google em 2022.

De acordo com o Projeto Brief, Tate é um dos maiores promotores de conteúdos misóginos na internet, disseminando o discurso 'redpill'. O influencer "construiu um discurso de combate às mulheres. Enquanto incentivava seus seguidores a odiarem mulheres, Tate as seduzia, mostrando-se um namorado perfeito, e depois as prendia e forçava a produzir vídeos para plataformas de conteúdo adulto", diz a newsletter.

Tate foi extraditado da Romênia após receber uma condenação na Inglaterra. Atualmente, cumpre prisão domiciliar.

Já a abordagem de Marçal pode violar as regras eleitorais, dado seu impacto potencial na manipulação do jogo político. Mesmo assim, sua popularidade nas redes sociais cresceu rapidamente, ultrapassando outros candidatos.

Embora ele se apresente como uma vítima de perseguição política, alegando que suas práticas são mal interpretadas, as investigações sobre seu envolvimento em golpes financeiros e fraude digital continuam.

•        Marçal diz que manterá estratégia de cortes de vídeos de debates contra rivais nas redes sociais

O ex-coach e empresário de extrema direita Pablo Carçal, candidato do PRTB à Prefeitura de São Paulo, afirmou que continuará utilizando sua estratégia de cortes de vídeos durante os debates eleitorais. Em entrevista ao Flow Podcast nesta quarta-feira (28), Marçal destacou a necessidade de uma “reciclagem” na Justiça para compreender melhor as redes sociais.

Na entrevista, segundo o jornal O Estado de S. Paulo, Marçal afirmou que utiliza técnicas de storytelling em seus embates e revelou que durante o primeiro debate promovido pela Band em 9 de agosto, já estava preparado com sua carteira de trabalho, mas sentiu que o ambiente não tinha a “energia” necessária para utilizá-la.

“Foi um investimento de uma hora para entrar no emocional dele”, disse Marçal sobre as provocações feitas ao adversário Guilherme Boulos (PSOL) no debate promovido pelo jornal O Estado de S. Paulo, portal Terra e Faap em 14 de agosto. Ele mencionou, ainda, que Boulos foi sorteado para ficar ao seu lado no próximo debate, o que, segundo ele, resultará em um “corte poderoso”.

Durante a entrevista, Marçal também afirmou que no processo eleitoral é preciso “ser um idiota” e que levantará a bandeira branca após as eleições. Ele criticou a abordagem de outros candidatos, mencionando um episódio no debate da revista Veja onde, segundo ele, a falta de “baixaria” não gerou repercussão.

"No debate da Veja, a outra pessoa que veio para cima de mim só veio com baixaria de último nível. Aí eu falei, eu não vou cair neste jogo. Engraçado. Não deu um corte, não gerou nada. Não dá nada. É como se você perdesse seu tempo ali, naquele lugar", disse.

Marçal também comentou sobre a decisão da Justiça Eleitoral que pediu a retirada do ar de seus perfis nas redes sociais no último sábado (24), por indícios de abuso de poder econômico e uso indevido dos meios de comunicação. Ele afirmou que não publicará o direito de resposta de Boulos em suas redes sociais devido à suspensão de suas contas.

Em outra decisão, o TRE-SP restabeleceu o direito de resposta de Boulos nas redes sociais de Marçal, considerando que as expressões utilizadas por Marçal em seus vídeos eram ofensivas à honra e à imagem de Boulos, configurando propaganda eleitoral negativa.

Questionado sobre sua candidatura, Marçal revelou que começou a considerar a oportunidade no ano passado e expressou o desejo de entrar no PL, o mesmo de Jair Bolsonaro. Ele também mencionou sua candidatura à Presidência em 2022 pelo PROS, partido que permitiu sua filiação entre 30 siglas.

Marçal destacou sua admiração pelo presidente Lula (PT) por permanecer no mesmo partido por tanto tempo, e comentou sobre as dificuldades de lidar com a dinâmica interna dos partidos políticos.

O candidato também mencionou uma recente conversa com o vereador carioca Carlos Bolsonaro (PL-RJ), com quem “resolveu” desentendimentos. Marçal e o clã Bolsonaro trocaram ataques nas últimas semanas, mas Carlos selou a paz com o ex-coach em um post no X, na quarta-feira (28).O ex-coach também expressou seu apoio ao empresário e influenciador Renato Cariani, acusado de tráfico de drogas, associação para o tráfico e lavagem de dinheiro, afirmando acreditar na sua inocência.

A relação entre Marçal e Cariani tem sido utilizada por adversários políticos, como a deputada federal Tabata Amaral (PSB), que recentemente publicou um vídeo associando Marçal ao crime organizado.

Por fim, Marçal comentou sobre um vídeo em que tenta fazer uma mulher levantar da cadeira de rodas, expressando arrependimento por ter feito a oração durante o evento que já tentou ressuscitar pessoas. "Eu já fui no velório para ressuscitar pessoas. Eu acredito nisso, ainda vou ver isso. O fato de eu ser um fracassado ainda, que as orações não funcionaram, não invalida que eu vá conseguir. Eu quero ser um cristão que vê isso, porque isso para mim é um certificado", afirmou.

 

•        Marçal repete com Boulos estratégia que fez Dino humilhar bolsonarista: "terra plana"

Um levantamento da Folha revelou nesta quarta-feira (28) a origem da fake news criada por Pablo Marçal (PRTB) para acusar Guilherme Boulos (PSOL) de uso de cocaína.

A campanha de Marçal pesquisou o nome de Boulos no Google e encontrou um processo por porte de droga. O processo de 2002 se refere a Guilherme Barduil Boulos, empresário e candidato a vereador na chapa de Ricardo Nunes. O candidato do PSOL é Guilherme Castro Boulos, pessoa completamente diferente.

Mas a estratégia não é nova.

No ano passado, durante uma audiência na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, o então ministro da Justiça, Flávio Dino, hoje no Supremo Tribunal Federal foi alvo de fake news similar.

Na ocasião, o deputado André Fernandes (PL-CE) alegou ter encontrado informações no site JusBrasil indicando que Dino estaria envolvido em 277 processos judiciais.

Dino, que é professor de direito, explicou que o site pode listar nomes de pessoas envolvidas em diversos contextos legais, como aqueles que pedem direito de resposta ou que são testemunhas, e não apenas réus. Além disso, pasmem, Flávio Dino foi juiz federal. Por isso, seu nome constava em diferentes processos.

Em suas palavras, "Aparecem os nomes de quem pediu o direito de resposta na Justiça, de quem foi requerido no pedido de resposta, aparece o nome de quem registrou a candidatura ou prestou contas à Justiça Eleitoral".

Dino afirmou que usaria a ilação de "anedota" em sala de aula - afinal, é professor de direito - e ainda adicionou que a afirmação de Fernandes “se insere mais ou menos no mesmo continente mental de quem acha que a Terra é plana“.

 

Fonte: Fórum/Brasil 247

 

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