quinta-feira, 1 de agosto de 2024

Envio de reservas de ouro para o exterior é medida 'arrojada' ou 'desesperada' da Argentina?

O ministro da Economia da Argentina, Luis Caputo, anunciou na semana passada ter enviado reservas de ouro para o exterior a fim de obter "retorno de ativos", uma medida incomum e que tem dividido opiniões de especialistas.

Para entender os efeitos e as consequências da securitização desse ouro para melhorar o fluxo de capital externo na Argentina, o podcast Mundioka, da Sputnik Brasil, conversou com Renan Silva, professor de economia do Ibmec Brasília, e Matheus de Oliveira, professor de relações internacionais do Centro Universitário Belas Artes e pesquisador do Grupo de Estudos de Defesa e Segurança Internacional (Gedes) da Universidade Estadual Paulista (Unesp).

A saída das reservas de ouro do país foi alertada publicamente pelo deputado da oposição Sergio Palazzo, que enviou um pedido de informações ao Banco Central argentino em resposta a relatos sobre supostas "operações de envio de barras de ouro ao exterior" durante o mês de junho.

Caputo confirmou o envio de remessas de ouro para o exterior e argumentou que a ação permite "obter retorno" em um momento no qual "o país precisa aprimorar/maximizar o retorno dos seus ativos".

De acordo com o Banco Central da Argentina, o país tem o equivalente a US$ 4,6 bilhões (R$ 25 bilhões) em ouro. Dados mais precisos sobre a quantidade de ouro enviada e o destino ainda não são de conhecimento público.

Para o professor de economia, usar o ouro como ativo para atenuar a dificuldade de geração de crédito junto ao setor privado é algo positivo.

"Eles querem otimizar a utilização desse ativo. É uma medida arrojada, que pode contribuir bastante para este momento de recuperação. Até porque acho que essa transferência ficou em torno de 10% da reserva total em ouro. Então, um montante que não prejudicaria a reserva como um todo. Estando no Banco Central, guardado fisicamente, não tem muita serventia", opinou o professor do Ibmec.

Silva alertou, no entanto, que é preciso olhar as contas do governo nos próximos meses para acompanhar se a estratégia surtiu o efeito desejado, que é apaziguar a dívida e melhorar as contas.

Já para Oliveira, a medida é um ato desesperado do governo de Javier Milei para conseguir mais créditos no mercado externo.

"Acho que é uma medida desesperada, e uma medida até certo ponto atrapalhada, principalmente pela forma como as coisas foram feitas, porque ao fazer essa operação de transferência do ouro meio na surdina […], na calada da noite, digamos assim, já dá uma aparência suspeita, fica parecendo que o governo está querendo fazer alguma falcatrua."

Oliveira concorda que o ouro é uma das poucas medidas disponíveis para a Argentina conseguir acesso a crédito externo, devido às dívidas internacionais acumuladas ao longo de décadas, ainda no governo de Mauricio Macri, que antecedeu o governo anterior de Alberto Fernández.

"Mauricio Macri fez o maior empréstimo da história do Fundo Monetário Internacional [FMI] para a Argentina. O país ainda está pagando esse empréstimo. O endividamento externo do país então já é bastante elevado e, além disso, a situação econômica geral da Argentina torna o acesso a esse crédito internacional muito limitado e muito custoso, porque hoje os juros que se cobram para a Argentina são elevadíssimos e tornam quase proibitiva a busca por crédito nas praças internacionais."

O professor do Ibmec ressaltou que, a princípio, não há troca de titularidade nesse envio, mas uma transferência de custódia. Entretanto, pontuou que o governo indicou o desejo de ter mais mobilidade com esse estoque de ouro, a exemplo de operações de rede, onde esse recurso fica sob custódia do setor privado, com o intuito de ser usado como suporte a essas operações.

"Então, quando você transfere para a custódia, para uma custódia bancária, institucional, também consegue emitir títulos representativos dessa dívida e usar como garantia em diversas outras operações, otimizando esse fluxo", acrescentou Silva. "Ou até mesmo algumas operações de crédito, em que a Argentina poderia disponibilizar esse recurso como garantia a esses novos empréstimos, principalmente do setor privado", esclareceu.

Entretanto, explicou Oliveira, a depender da forma como serão construídos os eventuais acordos do governo argentino em torno do ouro, a lógica seria muito similar a de uma loja de penhores: um empréstimo de curto prazo que tem o ouro como garantia.

"Deixar o ouro que pertence a um Estado Nacional depositado em outro Estado Nacional é um risco. Sempre vai haver esse risco, que é um risco que vem principalmente de questões de caráter geopolítico, de caráter estratégico", pontuou Oliveira. "Não por acaso, a Rússia há alguns anos repatriou o ouro que tinha fora do país. A Venezuela também fez esse movimento de repatriação", destacou Oliveira.

O economista acredita que a securitização de reserva de ouro — agindo em conjunto com os cortes de gastos e desvalorização cambial, realizados pelo governo — podem surtir o efeito almejado:

"As importações recuaram porque o consumo caiu. As exportações subiram bastante, na ordem de 26% no último ano. Isso significa que está tendo uma conta corrente um pouco positiva, recompondo essa reserva também cambial. Também acaba que, lá na frente, essa reserva de ouro retorna."

"Diferente de imaginar que é uma medida desesperada, é uma medida complementar a várias outras ações positivas que estão sendo realizadas. Vejo como natural essa tentativa. E espero que, nesse cômputo, com todas as medidas aí, conjuntamente, ele consiga realmente ter mais crédito e mais folga no caixa."

O professor de relações internacionais ponderou que economia não é uma ciência exata, e suas ações têm sempre uma lógica política e um impacto social muito evidente.

"A inflação caiu às custas do aumento do desemprego, queda dos níveis de renda, redução da atividade produtiva, redução do consumo. Graças a uma série de decisões que são, do ponto de vista social, extremamente custosas e penosas. Muita gente no país está sofrendo diariamente as consequências mais agressivas e brutais desse processo. Acho que seria importante explorar outros caminhos, outras possibilidades", concluiu Oliveira.

 

¨      Aprendendo com as lutas e as vitórias bolivarianas, Por Jair de Souza

Ao derrotar eleitoralmente as forças da direita pró-imperialistas na Venezuela, os bolivarianos chavistas deram a todos os lutadores sociais do campo popular na América Latina e em todo o mundo uma das mais grandiosas lições de como travar a luta pela construção de sociedades mais dignas, justas e soberanas. Isto tudo, evidentemente, do ponto de vista das maiorias trabalhadoras.

Para confrontar e derrotar as forças alinhadas com as diretrizes do grande capital dos centros hegemônicos e de seus sócios coadjuvantes locais, os revolucionários bolivarianos sabiam que precisavam dispor não apenas de um sistema eleitoral imune à manipulação dos grandes grupos econômicos, mas também teriam de contar com um elevado nível de consciência das maiorias populares e com a edificação de sólidas estruturas de organização e luta.

Por isso, deu-se muita atenção à reformulação do aparelho do Estado com vista a torná-lo mais afinado com os interesses do conjunto da população e não apenas com os de suas classes dominantes. Quanto a isto, o bolivarianismo venezuelano foi muito além do que quaisquer outras forças latino-americanas (com a honrosa exceção de Cuba, logicamente) haviam se aventurado.

Neste sentido, o papel das Forças Armadas passou por uma drástica metamorfose. De sua costumeira função de atuar como baluarte da sustentação dos privilégios das classes dominantes latino-americanas, na Venezuela chavista sua reorientação foi tão significativa a ponto de passarem a representar quase o oposto do que tem sido habitual. Assim, hoje em dia, a defesa do processo revolucionário em curso incorpora também as bases das forças militares, policiais e as milícias populares. Cabe ressaltar que, na Venezuela, o conceito de milícia não tem nada em comum com o banditismo expressado pelo termo em sua conotação associada ao bolsonarismo brasileiro.

Por sua vez, o sistema eleitoral venezuelano foi submetido a profundas transformações, que o tornaram no mais confiável e fidedigno entre todas as nações de nosso planeta. Nas eleições realizadas na Venezuela, há absoluta garantia de que os votos dos eleitores serão fielmente respeitados na divulgação dos resultados oficiais. Portanto, o presidente Nicolás Maduro estava coberto de razão quando afirmou que o sistema eleitoral venezuelano é superior ao que está vigente no Brasil na atualidade. Na Venezuela o sistema eleitoral incorpora todas as virtudes do processo digital do modelo brasileiro, e vai muito além.

No entanto, no transcorrer dos enfrentamentos em função de sua disputa eleitoral do momento, as forças revolucionárias bolivarianas da Venezuela também estão nos proporcionando valiosas lições de como não se render às pressões, coações e chantagens provenientes de representantes do imperialismo estadunidense e de seus serviçais da extrema direita local. Os revolucionários venezuelanos nos estão deixando muito clara a importância de manter a cabeça erguida e não sucumbir diante das ameaças das máquinas de triturar reputações que os meios de comunicação a serviço do capital põem em marcha quando desejam fazer valer suas posições. Ao não ceder e nem se render, os bolivarianos nos ensinam a compreender o valor da dignidade e da luta.

Outra valiosíssima contribuição extraída das circunstâncias atuais é o desmascaramento da falsa esquerda, aquela que atua como verdadeira quinta-coluna do imperialismo e do neoliberalismo no seio das forças populares. Alguns dos expoentes dessa escória chegam até mesmo a se autoconsiderarem e autodenominarem como de esquerda e socialistas, quando, na verdade, não passam de lambe-botas das oligarquias e do imperialismo. Portanto, este é um momento de importância crucial para que saibamos quem são os farsantes infiltrados entre as forças populares de esquerda.

Sendo assim, considero que é um dever imperioso de todo humanista e revolucionário sincero prestar solidariedade ao povo bolivariano da Venezuela nesta hora em que a Revolução Bolivariana está sofrendo um violento assédio por meio de todos os instrumentos de agressão do imperialismo, de seus serviçais declarados e da “esquerda” neoliberal pró-imperialista.

 

¨      Efeitos e causas do paradoxo venezuelano. Por Ricardo Mezavila

No período que antecedeu as eleições na Venezuela, principalmente depois que Nicolás Maduro disse que haveria ‘banho de sangue’ no país caso não se reelegesse, não era incomum ser indagado pelos liberais se aquilo era normal, se a esquerda ainda apoiaria Maduro.

Normalizar derramamento de sangue caso a vontade de um mandatário não seja respeitada, é temerário quando a visão é percebida de forma simplista, sem análise razoavelmente estudada. O que para os detratores de Maduro é impossível.

O próprio Presidente Lula se viu desconcertado com a infeliz frase de Nicolás. Lula teve de passar a limpo as palavras antes de serem ditas, porque seriam desviadas de seus sentidos pela extrema-direita articulada nas redes, e ativistas antipetistas que usam órgãos de concessão pública como palanque.

O cerne da questão está no interesse dos EUA na exploração do petróleo venezuelano. Ponto. A soberania do país vem sendo colocada em risco permanentemente, desde que o Presidente Hugo Chávez, que era bolivariano, socialista e anti-imperialista, nacionalizou setores estratégicos, contrariando e afastando interesses internacionais, travestidos de investimentos.

A aproximação com Cuba e os projetos em saúde e educação tornaram Hugo Chávez ícone popular no país, ao mesmo tempo em que sua imagem era a de um ditador autoritário para o resto do mundo, tendo sofrido tentativas de golpe da oposição aliada aos parasitas liberais, também conhecidos como ‘elite’.

Esse pequeno mapa das relações entre os mandatos de Chávez e Maduro contra interesses internacionais apoiados pela imprensa, não justifica, mas traz luz às duras declarações do atual Presidente para manter resistente o cordão contra o imperialismo voraz. Nos dando a oportunidade de dizer que não defendemos a figura do Presidente, mas nos colocamos contra a invasão de um país por outro.

Agora, com a reeleição garantida, voltamos a defender a soberania do povo venezuelano e o fim das sanções comerciais impostas por aqueles que não fazem a defesa da democracia, mas a garantia da interferência em causa própria na economia da República Bolivariana da Venezuela.

 

Fonte: Sputnik Brasil/Brasil 247

 

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