Os
sentidos de um dia histórico para a Saúde
Próximo
de completar dois anos, resgatamos da memória histórica o dia 5 de agosto de
2022, quando se realizou na Casa de Portugal, em São Paulo, a Conferência
Nacional Livre, Democrática e Popular de Saúde. Mais de mil pessoas se
reuniram, vindas de todo o país, representando a diversidade do povo
brasileiro, para discutir uma proposta para a política de saúde do Brasil. O
contexto era o da disputa para a Presidência da República, onde estavam em jogo
o projeto de nação, a democracia e a retomada do desenvolvimento progressista e
progressivo das políticas sociais. O movimento social se colocou como
protagonista e, por iniciativa da Frente pela Vida e do Conselho Nacional de
Saúde, foram realizadas 99 conferências e encontros locais, espalhados pelo
território nacional, que antecederam a Conferência Nacional. Aquele momento foi
a síntese deste rico e grandioso processo.
A
Conferência teve muitos sentidos – dentre eles, o encontro em si, assim como a
ativação de coletivos nos territórios, o que garantia a continuidade daquela
mobilização. Os territórios são os lugares das grandes lutas pela saúde, como o
enfrentamento da pandemia de Covid-19 deixou muito claro. Entre múltiplos
sentidos que podem ser atribuídos esta memorável conferência, rapidamente
discuto três deles.
O
primeiro vem do protagonismo assumido pelas entidades e movimentos sociais no
contexto da política nacional. Ainda vivendo os momentos finais da pandemia de
Covid-19, onde o SUS mostrou seu enorme valor para a população, o movimento
social se mostrava forte e altivo na defesa do que é a maior política social
construída no país após a redemocratização. A luta pela proteção e defesa da
população fez com que o SUS fosse abraçado pelo povo, e era com esta
identificação potente, imbuída de força e com expressão fortemente popular que
a Conferência se realizava. O movimento social, com a multiplicidade de
pensamentos que o enriquece, tomou para si a responsabilidade de formular uma
política de saúde para o Brasil, e o fez combinando com a grandeza da verdadeira
democracia.
O
segundo sentido foi o de mostrar a potência da democracia participativa.
Formada sobre a tradição da participação comunitária conquistada na
Constituição Federal de 1988 e posteriormente regulamentada por Lei Federal,
ela é constitutiva do SUS e se concretiza através do Conselho Nacional de
Saúde, Conselhos Estaduais, Municipais e Locais; e por suas respectivas
Conferências. A própria Conferência Livre participava da fase preparatória da
17ª Conferência Nacional de Saúde. Apresentava-se como um acontecimento
original, mais livre, e com uma potência extraordinária, porque expressava
iniciativas dos movimentos nos respectivos territórios. A vida se misturava com
a luta pela saúde, formando uma síntese explosiva de vontade e compondo a força
propulsora daquele movimento. Multifacetada, reuniu a academia, trabalhadores e
trabalhadoras da saúde, associações de pessoas com deficiência, entidades de
pessoas em condições crônicas, movimentos de moradores das periferias, negros,
indígenas, da comunidade LGBTQIAP+, sindicais, e toda diversidade que um povo
livre é capaz de expressar. A
Conferência continha os valores mais nobres do que se pode entender por
democracia: a participação direta do povo, sendo ele a sua própria voz e
ação.
O
terceiro sentido remete ao caráter popular do evento. Os que foram à
Conferência haviam participado do duríssimo combate à pandemia de Covid-19.
Vinham, portanto, da experiência de luta contra o vírus e o negacionismo. O SUS
ao lado do qual lutaram foi o SUS público, estatal. A ideia de pertencer a esta
política social formou uma inquebrantável identidade e aliança entre o povo e a
política de saúde. Isto tempera um pouco mais a Conferência, que assume
claramente um caráter popular. Ela reafirma o SUS como um sistema universal e
de financiamento estatal, alinhado aos princípios e diretrizes que constam da
Constituição de 1988. A Conferência dá sentido antineoliberal à política de
saúde, como já apontei nesta coluna. Isto pode ser demonstrado pelos documentos
ali formulados: as diretrizes para uma política de saúde que foram discutidas e
a Carta Compromisso entregue ao então candidato à presidência da república,
Luís Inácio Lula da Silva, presente na Conferência.
A
potência acumulada daquele memorável dia até hoje reverbera em nossos corpos, e
é lembrada por todas as entidades e pessoas. A Conferência reuniu energia
suficiente para colocar em movimento uma onda nacional em favor da então
candidatura à presidência de Lula, impulsionada pelas ideias de resgate da
democracia, defesa do caráter democrático e popular do SUS, e do que ele
representa de proteção, cuidado e acolhimento ao povo brasileiro.
A
Carta Compromisso e as Diretrizes para uma Política de Saúde para o Brasil,
aprovadas na Conferência Livre continuam atuais. Para reafirmá-las e lembrar os
dois anos da primeira Conferência Livre de Saúde, a Frente pela Vida e o
Conselho Nacional de Saúde convocam, para o Dia Nacional da Saúde, 5 de agosto
de 2024, um Ato que vai reafirmar a luta em DEFESA DA VIDA, DA DEMOCRACIA E DO
SUS.
Fonte:
Por Túlio Batista Franco, em Outra Saúde
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